Acórdão nº 96A809 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Fevereiro de 1997
Magistrado Responsável | FERNANDO FABIÃO |
Data da Resolução | 04 de Fevereiro de 1997 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Na Comarca de Lisboa, A propôs contra República da Bolívia, representada pelo seu Embaixador, a presente acção com processo ordinário, na qual pediu que esta fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 49322860 escudos de indemnização pelos danos decorrentes da falta de pagamento de 11 cheques no valor global de 24661430 escudos subscritos por B, cônsul da ré e seu representante em Lisboa e que nesta qualidade agiu, importância esta última correspondente a quantias que o autor lhe emprestou, certo sendo que tais cheques não foram pagos por falta de provisão. Citada a ré, não contestou. Mas o Ministério Público, ao abrigo do artigo 3 n. 1 alíneas d) e i) da Lei Orgânica do Ministério Público, veio dizer que um Estado Soberano goza de imunidade de jurisdição quanto às causas em que for réu, pelo que deverá ser dado sem efeito o despacho que ordenou a citação, mas o autor veio contestar tal requerimento e pediu a manutenção do despacho que ordenou a citação. Foi proferido o saneador sentença que julgou internacionalmente incompetente o Tribunal para conhecer da causa. Desta decisão agravou o autor, mas a Relação negou provimento ao recurso. Deste acórdão voltou o autor a recorrer e, na sua alegação concluiu assim: I - o que está a ser julgado é um conjunto de actos ilícitos praticados por uma pessoa que agiu a coberto do seu estatuto de cônsul e não a actividade de um consulado; II - os actos ilícitos praticados foram actos "de jure gestionis" e não actos "de jure imperii"; III - a regra consuetudinária "par in parem non habet juridictionem" não tem aqui aplicação justamente porque, no âmbito da evolução doutrinal e jurisprudencial, não se aplica aos actos "de jure gestionis"; IV - não existe um só conceito de imunidade mas sim dois: os de imunidade absoluta e relativa; V - os actos praticados não estão cobertos pela imunidade de jurisdição; VI - o que está em causa é que os Tribunais portugueses franqueiem a porta para se conhecer a questão de fundo que, na esteira dos trabalhos da C.D.J., é a da imputação ao Estado da conduta do agente no âmbito de uma evolução doutrinal e jurisprudencial que por aqueles Tribunais não deve ser desconhecida. Por não ter especificado a norma ou normas jurídicas violadas, convidou-se o recorrente a fazê-lo, após o que ele quis indicar o n. 1 do artigo 8 da Constituição da República Portuguesa. Na contra-alegação, o Ministério Público concluiu deste modo: I' - a emissão de cheques de que é titular o consulado de um Estado para pagamento de dívidas a um cidadão nacional ou estrangeiro, emitidos e devolvidos por falta de provisão em Portugal, devem ser considerados actos de gestão privada e não actos de gestão pública; II' - de qualquer modo, os Estados estrangeiros gozam de imunidade de jurisdição local quanto às causas em que intervierem na posição de réus; III' - assim, os tribunais portugueses são internacionalmente incompetentes para conhecer de acção cível contra um Estado estrangeiro e, consequentemente, deverá ser negado provimento ao recurso. Segundo a petição, o autor emprestou a B, cônsul honorário da Bolívia em Lisboa, a quantia de 24661430 escudos, para cujo pagamento este último passou 11 cheques, por si assinados com a indicação (não a chancela, como resulta de folhas 13 a 23) de ser o cônsul, cheques estes provenientes de Contas do Consulado da Bolívia em Lisboa, e que acabaram por não ser pagos por falta de provisão; mais se diz, na petição, que o autor desconhece quais os fins visados pelo...
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