Acórdão nº 213/09 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Vítor Gomes
Data da Resolução05 de Maio de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 213/09

Processo n.º 67/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):

    “1. A., melhor identificado nos autos, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28 de Junho de 2007 [que consta certificado a fls. 2 a 11], nos seguintes termos:

    A., recorrente com os sinais dos autos identificados em epígrafe, julgada que está em definitivo, com trânsito em julgado no próximo dia 2008.07.17, a irrecorribilidade ordinária do douto acórdão proferido, nos presentes autos, vem agora, ao abrigo do dispositivo do art.º 70.º, n.º 6, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, em referência às questões normativas suscitadas em sede de conclusões do recurso apresentado ante a Veneranda Relação de Lisboa, com decisão ainda não transitada por força da tramitação supra referida, o que faz nos seguintes termos:

    O presente recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro

    I

    Para apreciação da inconstitucionalidade da interpretação dada pelo acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, à norma do artigo 847º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, na sua conjugação e concomitância com as dos arts 224.º n.º 1, 848.º, n.º 1, e 1159.º, n.º 1, desse mesmo diploma legal, confirmando a decisão de 1.ª Instância, com o entendimento de que, em suma, reconhecer o crédito litigioso do recorrente sobre o seu credor, mera expectativa de crédito por isso, será obter fora do processo onde a controvérsia está a ser dirimida uma decisão sobre a sua real existência, o que não é aceitável nem tem fundamento legal (cf. § 3.º da pág. 8 do venerando acórdão e pág. 9).

    Esta interpretação assim sumariada, na falta de melhor esclarecimento naquela sede, viola os preceitos dos artigos 13º, 20º, n.ºs 1, 4 e 5, 26.º, n.º 1, 27.º, n.º 1, e 32,º, n.º 1, da Lei Fundamental, como expressamente se havia invocado ad cautelam nas conclusões 4ª, 6ª e 9ª do recurso admitido a fls. 1098.

    Sendo a interpretação tida por correcta pelo recorrente a expressa nas conclusões 1ª a 8ª do referido acórdão cujo integral teor aqui se tem por reproduzido em face da sua extensão, ficando elas a fazer parte integrante do presente requerimento de recurso constitucional, mas que se resume a que a declaração de compensação de créditos é eficaz com a recepção pelo declaratário, constituindo o seu silêncio uma aceitação tácita fora do âmbito do processo judicial onde está a ser exigido e onde a contestação apresentada pelo mandatário tem efeitos limitados ao âmbito dessa mesma acção, tanto mais se em perigo estão agora os valores soberanos da honra e liberdade do aqui recorrente, sendo que a norma impõe que o crédito seja exigível e não já exequível.

    II

    Para apreciação também da arguida inconstitucionalidade interpretativa da norma ínsita no n.º 2 do artigo 408.º do Código de Processo Penal, concatenado com os seus artigos 191º, n.º 1, 197.º, n.ºs 1 e 2, e 227.º, na interpretação dada pela Relação a quo no sentido de que a genérica prestação de caução em sede criminal tem em vista fins específicos prévios à sentença sem carácter de garantia de cumprimento da obrigação que dela emane e que o seu efeito suspensivo por via de interposição de recurso está dependente de depósito das quantias em causa, não substituível por caução, entendimento este que viola, na modesta opinião do recorrente, os imperativos constitucionais dos artigos 25.º, n.º 2, 27.º, n.º 1, e 202.º, n.º 2, da Lei Fundamental, o que se deixou expressa e cautelarmente arguido na conclusão 8a do requerimento recursivo apresentado ao julgamento da Relação de Lisboa, como já no anterior processado.

    O recorrente considera correcta a interpretação que deixou sumariada nas conclusões 5ª a 7ª do recurso admitido a fls. 1106 que dão aqui por integralmente reproduzidas para estes efeitos como se neste texto estivessem transcritas, e se pode resumir em que estando em causa a honra e a liberdade do arguido, ora recorrente, se justifica que possa oferecer garantia bastante para o caso de o crédito compensado deixar de existir por um hipotético decaimento na acção judicial que o exige, não podendo obrigar-se a que essa garantia se restrinja ao depósito do valor sob pena de se estar promovendo situações em que o cidadão é preso por dívidas, por não lograr solver em tempo oportuno a condição resolutiva da suspensão da pena a que foi condenado, ainda mais se os seus créditos não se afiguram líquidos por os serviços da administração da justiça excederem em muito os prazos peremptórios que a lei impõe para a resolução das causas judiciárias, à revelia do que a Constituição impõe como célere e segundo processo equitativo.

    (…)

  2. Com interesse para a decisão importa reter as seguintes ocorrências processuais [de acordo com a certidão que integra o presente traslado e os actos nestes praticados]:

    2.1. O arguido A. foi condenado, por decisão transitada em julgado, proferida no processo n.º 891/00.5 da 2ª Vara de Competência Mista do Tribunal de Família e de Menores e de Comarca de Loures, na pena de três anos de prisão, cuja execução se suspendeu pelo período de cinco anos, sob condição de pagar ao assistente B. e à demandante civil, sua mulher, C., a quantia de 28.586,50€, no prazo de um ano;

    2.2. Depois de esgotado este prazo (concretamente: em 18/3/2006), veio o arguido, juntando aos autos cópia de duas cartas por si subscritas, dirigidas ao assistente, nas quais faz uma declaração de compensação de créditos (com um crédito que alegadamente detém sobre este e que está em discussão em acção cível ainda sem decisão), requerer a homologação de tal compensação e que se considere, por tal forma, cumprida aquela condição da suspensão da execução da pena (fls. 965).

    2.3. Por despacho de fls. 1053/1054 foi indeferida a pretensão do arguido, por o crédito oferecido em compensação ser ainda litigioso (estando em discussão em competente acção cível), não podendo por isso ser considerado para o efeito pretendido.

    2.4. Inconformado com tal decisão o arguido interpôs recurso, mediante requerimento de fls. 1077 a 1084, invocando o disposto nos artigos 197.º, 227.º ou 408.º nº 2, alínea a) todos do CPP, oferecer em caução o direito de crédito que alegadamente detém sobre uma instituição de crédito e que se discute na acção ordinária nº 517/2002 que corre termos na 1a Vara Mista deste Tribunal, no valor de € 50 149,33, para suspensão da eficácia da decisão recorrida e requerer a legal tramitação processual para admissão de tal caução (para tal juntando aos autos certidão comprovativa de ter instaurado a mencionada acção ordinária contra o C. e de a mesma se encontrar pendente na 1ª vara Mista de Loures, a aguardar decisão fls.1087).

    2.5. Por despacho judicial constante de fls. 1097/1098 foi também esta pretensão desatendida, considerando o Juiz que, não só a situação não se enquadra na previsão do artigo 408.º, n.º 2, alínea a) do CPP (onde se prevê que suspendem os efeitos da decisão recorrida, os recursos interpostos de decisões que condenarem ao pagamento de quaisquer importâncias – e a decisão de que pretende recorrer não condena no pagamento de quaisquer importância – se o recorrente depositar o seu valor), como, mesmo que assim se entendesse, o recorrente teria de proceder ao depósito do respectivo valor, para obter a suspensão dos efeitos da decisão recorrida, não sendo permitida, em sede de recurso, a prestação de caução por qualquer outro meio que não seja o depósito.

    2.6. O arguido interpôs também recurso deste despacho, conforme fls. 1102 e segs. dos autos.

    2.7. No primeiro recurso (para a Relação), o recorrente formulou as seguintes conclusões:

    1. O invocado crédito declarado em compensação à quantia condenatória civil tida como condição resolutiva para a suspensão da pena está exigido em acção civil separada da penal que sustenta a causa de pedir, ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 1 do artº 72º do Código de Processo Penal;

    2. O Inquérito penal de onde essa acção civil vem separada, pese embora os pedidos de aceleração processual apresentados, encontra-se pendente desde Abril de 2002, na mais absoluta posterga, temporalmente quintuplicada, do prazo peremptório previsto no nº 1 do artº 276º da supra aludida lei adjectiva penal, com risco até de prescrição em relação ao crime de natureza particular;

    3. Ou seja que se corridos os trâmites processuais com a celeridade que a lei impõe, estaria já julgada e, possivelmente, transitada em julgado, como o está a dos presentes autos;

    4. Uma tal posterga da legalidade e dos constitucionais direitos do ora recorrente, à adequação formal e celeridade na administração da justiça em igualdade de circunstâncias com qualquer outro cidadão, designadamente o assistente, impostos nos artºs 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa, cria uma alteração de circunstâncias de tal modo relevante que não pode deixar de ser atendida na correcta interpretação da norma do artº 847º do Código Civil;

    5. Porquanto essa anormal, imprevista e indesejável delonga processual impede objectivamente o aqui recorrente de ter liquidez pecuniária ou sentença exequível que pudesse cumprir em tempo útil a condição legal da compensação, na interpretação dada pelo Tribunal a quo, sem que lhe possa ser imputada qualquer responsabilidade nessa mora;

    6. Não pode a administração da justiça ter dois tempos, duas velocidades e, por causa disso, o recorrente ver a sua liberdade colocada em perigo e, consequentemente, o seu direito ao bom-nome e reputação, na mais absoluta violação dos imperativos dos artºs 26º nº 1, 27º nº 1 e 32º nº 1 da Lei Fundamental;

    7. Esta anormalidade temporal na...

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