Acórdão nº 08A3940 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, AA - Sociedade Portuguesa de Locação Financeira, SA, pessoa colectiva n.º 5000000000, com sede na Rua ...., Torre 0, 00.º Andar, 1000 Lisboa, propõe em 02/11/1995, esta acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra BB - Comércio de Automóveis, SA, pessoa colectiva n.º 500000000, com sede na Rua da Palmeira, n.º 20, 1200 Lisboa, Companhia de SegurosCC, SA, pessoa colectiva n.º 5000000, com sede na Rua ...., Torre 0, 00.º - A, Amoreiras, 1000 Lisboa e LM, residente na Rua ..., n.º 00, 5.º Esquerdo, 1000 Lisboa, pedindo (pedido principal):

  1. Que sejam a 1ª e a 2ª RR. condenadas a pagar à A. a quantia de Esc. 581.840$00, com a seguinte discriminação: a) Esc. 389.229$00, valor global das rendas vencidas e não pagas, e respectivo IVA, até à resolução do contrato pela A.; b) Esc. 63.357$00, valor dos juros de mora vencidos até 30.10.95, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos, a calcular à mesma taxa, até integral pagamento; c) Esc. 120.795$00, valor correspondente a uma renda vincenda; d) Esc. 8.459$00, valor dos juros de mora vencidos até 30.10.95, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos até integral pagamento.

  2. Que sejam a 1ª R. e o 3º R. condenados a restituir à A. o veículo locado.

    E caso assim não se entenda, formulou o seguinte pedido subsidiário:

  3. Que sejam a 1ª e a 2ª RR. condenadas a pagar à A. a quantia de Esc. 487.857$00, com a seguinte discriminação: a) Esc. 389.229$00, valor global das rendas vencidas e não pagas, e respectivo IVA, até à resolução do contrato pela A.; b) Esc. 63.357$00, valor dos juros de mora vencidos até 30.10.95, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos, a calcular à mesma taxa, até integral pagamento; c) Esc. 32.887$00, valor da indemnização calculada nos termos do artigo 15.º, n.º 2 das "Condições Gerais" do contrato de locação financeira, que corresponde a 20% da soma das rendas vincendas e do valor residual do veículo locado; d) Esc. 2.384$00, valor dos juros de mora vencidos até 30.10.95, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos até integral pagamento; B) Que sejam a 1ª R. e o 3º R. condenados a restituir à A. o veículo locado; Fundamenta estes pedidos, em síntese, dizendo que é uma instituição de crédito que tem por objecto a actividade de locação financeira, sendo que no exercício desta actividade, deu em locação financeira à 1ª R. (BB) o veículo de que identifica. Esta R. obrigou-se a pagar-lhe rendas trimestrais durante o prazo do contrato. Sucede que apesar das suas repetidas insistências, a 1.ª R. não pagou, nos respectivos vencimentos ou posteriormente, as rendas que indica. Não tendo logrado cobrar junto da 1ª R. os referidos créditos, viu-se forçada a resolver o contrato de locação financeira, mediante envio à 1.ª Ré de uma carta registada com aviso de recepção. Na carta de resolução exigiu à R. o pagamento das rendas vencidas e respectivos juros de mora e ainda a indemnização devida. Nos termos da alínea h) das "Condições Especiais" do contrato de locação financeira, a 1ª R. obrigou-se a apresentar, em simultâneo com a sua formalização, um seguro-caução cuja beneficiária seria ela, A., e válido até ao fim do período de vigência do contrato de locação financeira, tendo feito depender a celebração deste e de outros contratos de locação financeira, da prestação de uma garantia, consistindo num seguro-caução de uma companhia de seguros aceite por ela, seguro-caução que, na realidade, foi efectuado pela R. Seguradora, sendo que o beneficiário de tal seguro-caução é a A. e o tomador do seguro a R. BB. Nos termos do artigo 11º das "Condições Gerais" da apólice de seguro-caução directa, a 2ª R obrigou-se a indemnizar a A., no prazo de 45 dias a contar da data de qualquer reclamação. A A. participou o sinistro à 2ª R. em 06.06.95, por meio de carta registada com aviso de recepção, na qual também lhe comunicou que, por motivo de não pagamento por parte da 1ª R., das rendas da locação financeira do contrato, este havia sido resolvido em 05.06.95. Posteriormente a A. interpelou e reclamou da 2ª R. o pagamento da indemnização devida de Esc. 510.024$00, nos termos da apólice de seguro-caução, por meio de carta registada com aviso de recepção, datada de 16.06.95, não tendo a referida indemnização sido paga pela 2ª R. até à presente data. Na carta de resolução do contrato de locação financeira, a A. exigiu também à 1ª R. a restituição do veículo locado (da qual era proprietária), facto que até à presente data não se verificou, apesar de a isso estar contratualmente obrigada. A A. tem conhecimento de que o veículo locado se encontra na posse do 3º R. LM. A recusa da 1ª R. em lhe restituir o veículo locado levou a A. a requerer contra aquela e o 3º R. providência cautelar de Entrega Judicial e Cancelamento de Registo, já decretada.

    Contestou a R. BB, alegando, em síntese, a existência do aludido contrato de locação financeira e a falta de pagamento das rendas em causa por dificuldades financeiras. Acrescenta que o contrato foi celebrado com circunstâncias complementares e em especial a exigência por parte da A. da apresentação de uma caução que assegurasse o cumprimento da obrigação de pagamento da totalidade das rendas vencidas e não pagas pela 1ª R., bem como as vincendas, caução esta que foi efectivamente prestada mediante "seguro caução" celebrado entre a 1ª e a 2ª RR. a favor da A.. Em face desta situação, deverá a 2ª R. assumir o pagamento resultante do incumprimento dela, 1ª R.. A A. ao resolver o contrato, está em manifesto abuso de direito, dada a existência do seguro-caução, não podendo a A. vir basear o seu pedido na cláusula penal por o ter resolvido.

    Contestou também a R. Seguradora, referindo, também em síntese, que foi contactada pela BB, para celebrar um seguro de caução que garantisse as prestações a pagar pelos adquirentes dos veículos em regime de ALD (que incluiria um contrato de aluguer e um de promessa de compra e venda), garantia que esta endossaria às companhias de locação financeira que entravam no negócio, o que implicaria que o seu risco estaria repartido por diversos agentes económicos e não apenas pela mesma BB. Na sequência das negociações, foram celebrados protocolos entre a CC e a BB, que a A. bem conhece, no sentido de definir as relações entre ambas no tocante à emissão dos seguros de caução destinados a garantir o pagamento a esta última, "dos veículos vendidos por esta em aluguer de longa duração", nunca tendo estado em causa a garantia das obrigações da BB para com as sociedades de leasing a quem adquiria (neste regime) os veículos. Nestas circunstâncias, conclui esta R., que o contrato entre a A. e a BB é nulo (por fraude à lei, ao permitir a celebração de contratos de leasing com particulares relativos a automóveis quando tal não era ainda admitido pela lei), e que, em momento algum, a A. ou a BB alegam o incumprimento do locatário do veículo no pagamento das rendas, devendo ser a acção, no que a ela diz respeito, considerada improcedente. Mais alega que à data da ocorrência do sinistro a apólice em causa não se encontrava em vigor por ter sido resolvido o contrato de seguro e apólice cancelada em 06.09.1994 por falta de pagamento do sobreprémio de Esc. 37.800$00 devido ao agravamento do risco resultante da anulação da apólice emitida, proposto à A. e à 1ª Ré, por carta datada de 29 de Agosto de 1994, para pagamento, no prazo de oito dias, sob condição de resolução do contrato sem mais aviso, não tendo estas pago o sobreprémio.

    Conclui deduzindo reconvenção, pedindo a condenação da A. a pagar-lhe uma indemnização.

    O 3º R., LM foi citado editalmente, não tendo deduzido oposição.

    A A. apresentou resposta à contestação apresentada pelas RR. respondendo à questão da litigância de má fé levantada pela primeira, concluindo como na petição inicial.

    Face ao pedido reconvencional deduzido pela 2ª R., foi determinado que os autos seguissem a forma ordinária.

    Por despacho de fls. 357 foi a instância julgada extinta relativamente à 1ª R. BB, no que se refere aos pedidos de natureza pecuniária contra ela formulados, por inutilidade superveniente da lide, por ter sido declarada falida, tendo-se mantido o pedido de entrega da viatura automóvel.

    O processo seguiu os seus regulares termos com a elaboração do despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e a base instrutória, se procedeu à audiência de discussão e julgamento, se respondeu à matéria de facto controvertida e se proferiu a sentença.

    Nesta julgou-se a acção totalmente improcedente por não provada e absolveu-se os RR. dos pedidos contra eles formulados pela A..

    Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a A. de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí, por acórdão de 10-4-2008, julgado procedente o recurso e, consequentemente, julgou-se procedente por provada a acção e, nessa medida, condenou-se a R. Companhia de Seguros Inter Atlântico, SA no seguinte:

    1. Esc. 510.024$00, valor global das rendas vencidas e não pagas, e respectivo IVA, até à resolução do contrato pela A.; b) Juros de mora vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, às taxas legais que se foram sucedendo no tempo, até integral pagamento.

    Mais se julgou improcedente por não provado o pedido reconvencional formulado pela R. Seguradora, dele absolvendo o A..

    1-2- Não se conformando com este acórdão, dele recorreu a R. Seguradora para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

    A recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- A questão essencial dos autos prende-se com a interpretação da cláusula sobre objecto da garantia inserta nas condições...

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