Acórdão nº 10488/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 20 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO Maria ………………..
, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 27/06/2013 que, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma sumária, instaurada contra o Instituto Politécnico de Setúbal, julgou o pedido improcedente, absolvendo a entidade demandada do pedido de reconhecimento do direito da Autora à compensação prevista no nº 3 do artº 252º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, condenando-se o Réu ao pagamento da quantia de € 11.060,70 a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho, acrescida de juros à taxa legal.
Formula a aqui Recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 85 e segs.): “1 - A sentença ora recorrida está ferida de ilegalidade.
2 - A A. e ora Recorrente intentou acção administrativa comum, na forma sumária, contra Instituto Politécnico de Setúbal, a fim de que fosse reconhecido o seu direito à compensação prevista no n.º 3 do art.º 252º do RGCTFP, condenando-se o R. no pagamento da quantia de 11.060,70 €, a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho da A., acrescida de juros à taxa legal.
3 - Por carta registada com aviso de recepção, datada de 31 de Outubro de 2011, foi comunicada à Recorrente a caducidade do seu contrato a termo certo, com efeitos a 31 de Dezembro de 2011, o que, nos termos do disposto no art.º 252º, n.º 3 do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro e aplicável à data da cessação do contrato de trabalho da Recorrente, lhe conferia o direito à compensação ali prevista, a qual não foi paga.
4 - Considerando que a última remuneração base da Recorrente foi de 1.047,00 € (mil e quarenta e sete euros), e a duração do vínculo da Recorrente ao Recorrido de 9 anos e 6 meses, sendo 2 como contrato a termo resolutivo certo, por força do disposto na Lei n.º 12- A/2008, de 27 de Fevereiro, tem a mesma direito a uma compensação correspondente a 114,5 meses, o que perfaz o montante de 11.060,70 € (onze mil e sessenta euros e setenta cêntimos), acrescida de juros à taxa legal.
5 - Não foi esse o entendimento do Recorrido por considerar que tal compensação só era devida em caso de possibilidade de renovação do contrato, o que já não sucedia no caso da A. por ter atingido o máximo de renovações previstas no art.º 103º do referido diploma legal, o que contraria a posição sustentada quer pelo Provedor de Justiça, quer pela jurisprudência largamente maioritária dos Tribunais Administrativos.
6 - Também os contratos a termo incerto resolutivo não têm possibilidade de perdurar no tempo e os trabalhadores contratados ao abrigo dos mesmos têm direito à compensação em causa. O que se pretende, efectivamente, é a compensação do trabalhador que vê o seu contrato caducar.
7 - Atentos os preceitos legais em causa - art.º 252º, n.º 3, 103º e 92º, n.º 2 do RCTFP - a inadmissibilidade legal de renovação contratual existe e aplica-se em todos os casos em que a Administração celebre um contrato a termo certo pelo período de três anos ou o renove por duas vezes. Pelo que este contrato caducará obrigatoriamente no seu termo, por imposição legal e independentemente da vontade da entidade empregadora.
8 - Assim, verificado o condicionalismo mencionado supra, reduzia-se a uma expressão residual e particamente vazia o direito à compensação legalmente consagrado, e isentava-se o empregador público do encargo compensatório, justamente nas situações em que se prolonga até ao limite legalmente permitido uma relação laboral (a termo) cuja existência o legislador claramente quis que fosse excepcional (porque a regra é o contrato por tempo indeterminado).
9 - Há que contextualizar a compensação prevista no n.º 3 do art.º 252º dentro do regime da contratação a termo e da precariedade do vínculo laboral respectivo, e ter ainda em conta que o diploma legal em causa (RCTFP) se baseia no Código de Trabalho, mais em concreto na versão de 2003 então em vigor, reproduzindo-o e adaptando-o às especificidades da natureza pública do empregador.
10 - O Código do Trabalho de 2003 veio clarificar o regime já previsto e estatuído pelo art.º 46º, n.º 3 do Decreto-lei n.º 64-A/89 de 27 de Fevereiro, passando a ser inequívoco que, no regime laboral comum, quando a caducidade do contrato não decorra da vontade do trabalhador, este tem sempre direito à respectiva compensação.
11 - Ao transpor o art.º 388º, n.º 2 do CT de 2003 para o n.º 3 do art.º 252º do RCTFP há que verificar se se pretendia uma alteração substancial do regime da compensação pela caducidade do contrato e se se justificaria uma redução da tutela compensatória atendendo à natureza pública do empregador e ao interesse público que visa prosseguir.
12 - Nesta matéria, reconstituímos o pensamento legislativo tal como resulta da Recomendação 12/B/1012 do Provedor de Justiça.
13 - O actual regime da contratação a termo é, em substância, o que já se encontrava previsto na Lei nº 23/2004. A única diferença é que, enquanto este último diploma remetia para o CT a regulação de todos os aspectos que nele não se encontrassem especificamente previstos, o RCTFP incorporou o que no CT se dispunha, limitando-se, no que respeita à contratação a termo, a adequar o regime no âmbito da Administração Pública às exigências de interesse público e, sobretudo, conformá-lo com o direito constitucional de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso.
14 - Nem as exigências de interesse público nem a conformação com o direito constitucional de acesso à função pública e o princípio da estabilidade e segurança do emprego colidem com o regime legal da compensação pela caducidade do contrato consagrado no CT e à data aplicável à Administração Pública, nos termos da Lei nº 23/2004, ditando antes a impossibilidade de conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado. Daí resulta a necessidade de adaptar a essa circunstância as regras de renovação e de caducidade do contrato, previstas no CT.
15 - Pelo que o disposto no nº 3 do artigo 252º do RCTFP mais não é do que uma transposição do que estava prescrito no nº 2 do artigo 388º do CT. Ou seja, para que os efeitos compensatórios decorrentes da caducidade do contrato não deixassem de ser iguais - e os mesmos que à data já vigoravam na Administração Pública - houve que reformular os termos da respetiva previsão normativa de forma a tornar exequível a sua estatuição.
16 - Deste modo, reformulando o preceito do CT em termos correspondentes, o RCTFP compatibilizou-o com o seu específico regime de caducidade, decorrente da inexistência de renovação automática e de conversão contratual, não se visando excluir a compensação.
17 - Esta interpretação do nº 3 do artigo 252º do RCTFP respeita o princípio vertido no nº 2 do artigo 9º do Código Civil e é a única que traduz o pensamento legislativo subjacente.
19 - Deste modo, à semelhança do regime laboral comum, sempre que a caducidade do contrato não decorra da sua vontade, o trabalhador tem direito à respetiva compensação. Pelo que, numa interpretação correta, a previsão do nº 3 do artigo 252º só pode ser lida no sentido de que a verificação do requisito da não comunicação, pela entidade empregadora pública, da vontade de renovar o contrato se afere formalmente.
20 - Por outro lado, cabe ainda dizer que o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo é questionável face ao determinado pelo Direito Comunitário, nomeadamente no que respeita às disposições contidas na Diretiva 1999/70/CE do Conselho e no acordo-quadro anexo, relativos ao contrato de trabalho a termo.
21 - Nessa medida, a compensação mostra-se como necessária para acautelar os direitos e interesses do trabalhador a termo, e tanto o Direito nacional como o Direito europeu têm demonstrado uma maior preocupação com a situação de desemprego em que o trabalhador é colocado quando termina a relação laboral a prazo.
22 - Este é o regime que se extrai, obrigatoriamente e sem margem para dúvidas, do RCTFP mesmo antes da sua revisão pela Lei 66/2012 de 31de Dezembro.
23 - Nesse sentido se tem vindo a pronunciar a jurisprudência nacional, como se confirma através, entre outras, das decisões proferidas pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (4ª UO, Proc. n.º 39/11.0BELSB, de 30.03.2011 e Proc. n.º 544/11.9BELSB, de 27.01.2012), pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (Proc. n.º 684//10.1BECTB, de 29.06.2011), pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (U01, Proc. n.º 219/11.9BEBRG), pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (Proc. n.º 1928/10.5BESNT, de 23.11.2011), e pelo próprio Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (U01, Proc. n.º 180/11.0BEALM), confirmando que é correcto o entendimento que supra defendemos.
24 - Também assim entende o Provedor de Justiça, tanto na Recomendação 8/A/2011 como na já referida Recomendação 12/B/2012, quando recomenda que se densifique e clarifique o sentido do art.º 252º, n.º 3 RCTFP por forma a evitar o propalar de interpretações prejudiciais ao verdadeiro sentido e melhor entendimento da norma em causa.
25 - Este era o regime vigente à data da cessação do contrato de trabalho da Recorrente e não procede o argumento de que esse é o regime agora vigente desde 1/01/2013, face à nova redacção da lei que, adaptando a recomendação do Provedor de Justiça, passa a consagrar o direito à compensação sempre que o fim do contrato a termo não ocorra por vontade do trabalhador.
26 - O regime já era este, agora apenas está consagrado sem margem para dúvidas, dúvidas essas que permitiam a interpretação que tem sido feita pela Administração e também consagrada na sentença ora recorrida.
27 - Ao ser necessário alterar o diploma a fim de consagrar as...
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