Acórdão nº 174/13.0GAVZL-A.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No inquérito nº 174/13.0GAVZL que corre termos nos Serviços do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da comarca de Vouzela, são arguidos......

No início de Setembro de 2013 o Ministério Público determinou a aplicação ao inquérito do segredo de justiça, tendo esta decisão sido validada pela Mma. Juíza de instrução, por despacho proferido em 6 de Setembro de 2013 (fls. 28 a 30 da presente certidão de recurso).

O arguido .......foi sujeito a 1º interrogatório judicial de arguido detido em 6 de Setembro de 2013, no termo do qual a Mma. Juíza de instrução proferiu despacho aplicando a medida de coacção de prisão preventiva (fls. 31 a 53 da presente certidão de recurso). No decurso do prazo para o recurso do despacho que decretou esta medida de coacção, o arguido ........ requereu ao Ministério Público, com vista à interposição do recurso, que fosse autorizada a consulta do processo na secretaria e passadas fotocópias ou entregue suporte digitalizado, contendo todos os elementos que fundamentaram a promoção da medida de coacção e o despacho dela determinativo, tendo especificado concretos meios de prova pretendidos (fls. 54 e 55 da presente certidão de recurso). A Digna Magistrada do Ministério Público, por despacho de 10 de Setembro de 2013, considerando estar o inquérito em segredo de justiça, nos termos das disposições conjugadas do nº 6 a contrario, e do nº 8, do art. 86º do C. Processo Penal, e por não se verificarem as excepções previstas no nº 7 do mesmo artigo, deferiu parcialmente o requerido pelo arguido, determinando a entrega de cópia do seu auto de interrogatório e do seu auto de 1º interrogatório judicial de arguido detido (fls. 56 da presente certidão de recurso).

O arguido ............., por requerimento de 11 de Setembro de 2013, reclamou deste despacho para a Mma. Juíza de instrução, invocando a violação do art. 194º, nº 6, b) e 8 do C. Processo Penal e o art. 32º, nº 1 da Constituição da República, e requereu a final que lhe fosse permitida a consulta dos autos e ordenada a passagem de cópia dos elementos pretendidos (fls. 58 a 60 da presente certidão de recurso). * Em 16 de Setembro de 2013 a Mma. Juíza de instrução proferiu o despacho recorrido, que tem o seguinte teor: ..................

* Inconformado com a decisão dela recorreu o arguido ............, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: ................

* O recurso foi admitido, para subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo.

* Respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: “ (…).

* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, defendendo a irrecorribilidade do despacho sindicado e subscrevendo, quanto ao mérito, a argumentação do Ministério Público junto da 1ª instância, e concluiu pela improcedência do recurso.

* Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

Respondeu o recorrente, reafirmando que não discute o segredo de justiça mas a violação do art. 194º, nº 8 do C. Processo Penal ao não lhe ser permitida a consulta dos elementos que fundamentaram a sua prisão preventiva, que a directiva que invocou, ainda que não transposta, já obriga a interpretação conforme o seu conteúdo, que em caso de dúvida, deve lançar-se mão do reenvio prejudicial, o que requer, a fim de se saber se o princípio da cooperação leal e do primado impõem a interpretação conforme do art. 194º, nº 8 citado com os arts. 6º do TUE, 48º, nº 2 da CDFUE e 7º, nº 1 e 2 da Directiva 2012/13/EU do Parlamento e do Conselho de 22 de Maio de 2012, e conclui pela revogação do despacho recorrido.

* Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

* * * * II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente a questão a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, é a de saber se, estando o inquérito em segredo de justiça por determinação do Ministério Público validada pelo juiz de instrução pode, nos termos do art. 89º, nº 1 e 2 do C. Processo Penal, ser restringido o acesso do arguido aos elementos do processo determinantes da aplicação da medida de coacção durante o prazo previsto para a interposição de recurso da decisão que aplicou a medida.

* * 1. A Reforma do Processo Penal operada pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto alterou o modelo até então vigente do segredo de justiça, passando a regra a ser a da publicidade do processo, nas suas fases preliminares, inquérito e instrução [o código não prevê sequer o segredo de justiça nesta última]. Assim, dispõe o art. 86º, nº 1 do C. Processo Penal que, o processo penal é, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as excepções previstas na lei.

O segredo de justiça, excepção à regra apontada, arrasta consigo um inevitável conflito entre os interesses da investigação, especialmente, o interesse na descoberta da verdade material, e os interesses do arguido, em especial, o do pleno exercício do direito de defesa.

A publicidade do processo penal tem como conteúdo essencial o direito de assistência, pelo público em geral, à realização do debate instrutório e do julgamento, o direito de narração ou reprodução dos actos processuais pela comunicação social e, o direito de consulta do auto e obtenção de cópias e certidões de qualquer parte dele (art. 86º, nº 6 do C. Processo Penal).

Inversamente, o segredo de justiça implica a proibição de assistência a acto processual a que os vinculados não tenham o direito ou o dever de assistir ou a tomada do conhecimento do seu conteúdo, e a proibição de divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus termos (nº 8 do mesmo artigo). Pode ser interno, quando se impõe aos sujeitos e participantes processuais, e externo, quando se impõe a terceiros portanto, a todas as pessoas que são alheias à relação processual. A determinação do segredo de justiça na fase do inquérito ocorre de duas distintas formas: a) a requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido, onde o juiz de instrução, ouvido o Ministério Público, decide por despacho irrecorrível (art. 86º, nº 2 do C. Processo Penal); b) quando o Ministério Público, entendendo que os interesses da investigação ou os direitos dos sujeitos processuais o justificam, o determina, ficando a decisão sujeita a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT