Acórdão nº 144/07.8TBCNT.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Junho de 2013
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 20 de Junho de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I A R intentou acção declarativa com processo ordinário contra A M, M M, F T e M T pedindo para; a) Ser declarada nula, por constituir negócio simulado, a escritura de compra e venda efectuada entre as Rés e referida no nº 6 da petição inicial; b) Caso este pedido não proceda, deverá ser decretada a ineficácia em relação ao demandante do dito contrato de compra e venda, ordenando-se a restituição do bem vendido ao património dos Réus A M e mulher ou, caso também assim não seja entendido, ordenando-se se proceda à execução directa do bem no património dos Réus F T e mulher, de modo a que o Autor possa pagar-se à custa desse mesmo prédio.
Alegou para o efeito e em síntese, que por sentença transitada em julgado do Tribunal Judicial de A, proferida na acção ordinária nº 000/2000, do 2º Juízo, foi o ora Réu A M condenado a pagar ao ora demandante, além do mais, a quantia de € 20.818,63, condenação essa que veio a ser confirmada e até agravada pela Relação de Coimbra, que condenou aquele Réu como litigante de má fé.
Não tendo havido o pagamento em que o Réu A M foi condenado, propôs o ora demandante, em 16 de Janeiro de 2003, o competente processo executivo para assim conseguir o dito pagamento, e em cujo âmbito nomeou à penhora o prédio urbano composto de casa de habitação de rés do chão, primeiro andar, logradouro e quintal, sito na …., inscrito na respectiva matriz sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 000; Essa penhora a efectuar-se no dia 29 do mesmo mês de Janeiro e a ser registada a favor do ora demandante, como provisória por dúvidas, em 5 de Março seguinte, sempre do referido ano de 2003.
Tendo tomado conhecimento da decisão da Relação de Coimbra acima mencionada e tendo igualmente ficado sabedora da propositura do subsequente processo executivo pelo ora Autor, a Ré M M, representada por procurador, e através de escritura pública celebrada no Cartório Notarial de … no dia 27 de Janeiro de 2003, declarou vender à Ré M T, também representada por procurador, o prédio urbano em questão, pelo preço que disseram ter sido pago de € 100.000, e datando o registo definitivo de aquisição de 25 de Março 2003.
O prédio objecto do aludido negócio foi construído pelos Réus A M e mulher, M M, depois do casamento dos mesmos e na sua constância, pelo que constitui bem comum do casal e era, na data da propositura da acção executiva, o único bem conhecido ao Réu A M, pelo qual este poderia satisfazer a quantia em dívida para com o demandante.
Ao realizarem o contrato de compra e venda acima referido os ora Réus A M e M M pretenderam unicamente evitar que figurassem no registo predial como proprietários de qualquer bem que pudesse garantir a efectivação prática e económica do direito de crédito do Autor, agindo, assim, todos os demandados em conluio para frustrarem o pagamento do que lhe era devido.
Na realidade, não houve negócio algum entre os Réus, não houve venda efectiva nem o pagamento de qualquer preço, ocorrendo apenas uma simulação negocial, sendo que os Réus A M e M M continuam na posse do prédio em causa, habitando-o quando estão em Portugal, diferentemente dos Réus F T e M T, que nunca o habitaram ou em relação a ele exerceram qualquer acto de posse.
Por isso, atenta a divergência intencional entre a vontade declarada – de vender – e a vontade real – que é, simplesmente, a de furtar o património à garantia da satisfação do direito do Autor –, estamos perante negócio simulado, com a inerente nulidade do mesmo.
Caso não fique provada a simulação, sendo o demandante titular de um crédito sobre o Réu A M, o qual é anterior ao acto de venda realizado entre os demandados de que resultou uma diminuição da garantia patrimonial desse mesmo crédito, e não sendo conhecidos bens móveis bastantes ao Réu A M para a satisfação integral do crédito do Autor, estão reunidos os pressupostos para a procedência da impugnação pauliana.
Foi proferida sentença a julgar a acção procedente e, em consequência foi declarada nula, por simulação, a compra e venda titulada pela escritura pública datada de 27 de Janeiro de 2003, lavrada no Cartório Notarial de …. (a folhas 33 e 34 do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.º 430-B), denominada de “Compra e Venda” (e a que se refere o ponto 8 dos factos assentes da sentença), não se tendo conhecido dos outros pedidos subsidiários formulados contra os Réus e por desnecessidade, tendo os Réus A M e mulher, M M, e F T e mulher, M T, como litigantes de má fé, na multa de montante equivalente a 8 (oito) UC’s para cada um dos casais de Réus ora identificados.
Inconformados os Réus apelaram desta sentença, tendo a final sido proferido Acórdão a julgar improcedente o recurso, mantendo-se a sentença de primeiro grau.
De novo inconformados, recorrem agora os Réus, de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - Os ora Apelantes não se podem conformar com a decisão recorrida, porquanto, é desde logo seu entendimento que a prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento é mais do que suficiente, para sustentar uma decisão diversa, - Na motivação da resposta do julgador da matéria de facto, o Meritíssimo Juiz a quo não explicitou devidamente o peso relativo da prova documental, em conjugação com a prova por declaração das partes por forma a permitir caracterizar a eventual complementaridade desta prova em relação à prova documental, sendo assim, ambígua ou deficiente.
- Por isso, trata-se de uma deficiência de fundamentação que, desde já, os recorrentes cautelarmente invocam nos termos do n º 5 do artigo 712º do CPC.
- A prova documental aparece aqui residualmente, sem qualquer especificação a documentos que se relacionem com a matéria dos quesitos - dada a sua abundância e profusão - sendo certo que se não explicita sequer o peso relativo deles na formação da convicção relativamente aos quesitos - 0u seja, parece resultar que efectivamente foi determinante na convicção do tribunal as declarações das partes.
- No caso sub judicio, o Meritíssimo Juiz não podia, pois, admitir M T, a depor como parte na medida em que os factos da petição sobre os quais esse depoimento ia recair, eram (só podiam mesmo ser) favoráveis aos autores.
- No caso em apreço as referidas confissões não foram reduzidas a escrito na ata de audiência, pelo que a prova por elas produzida não pode ser sindicada para efeitos de valoração pelo Supremo Tribunal de Justiça, pese embora a fundamentação do Tribunal a quo às respostas dadas.
- Neste sentido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça - Recurso de Revista 4503/04, lª Seção onde se refere que as confissões foram provocadas por terem sido feitas em depoimento de parte - artigo 356 n.º 2 do Código Civil e teriam de ser necessariamente reduzidas a escrito nos termos do artigo 563 do CPC, ainda que a audiência tenha sido gravada.
- Refere ainda que “no caso em apreço as referidas confissões não foram reduzidas a escrito na ata de audiência, pelo que a prova por elas produzida não pode ser sindicada para efeitos de valoração pelo Supremo Tribunal de Justiça, pese embora a fundamentação do Tribunal a quo às respostas dadas.
- A falta de redução das confissões das partes a escrito na ata de audiência é do conhecimento do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do artigo 722 n.º 2 do CPC.
- Por outro lado, a redução da confissão a escrito não é mais do que a ampliação da matéria de facto, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, que o supremo Tribunal de justiça pode ordenar, nos termos do artigo 729, n.º 3 do CPC - Assim, sendo o presente processo terá de regressar ao tribunal recorrido para que em novo Julgamento, se possível pelos mesmos Juízes que intervieram no primeiro julgamento, se reduzam a escrito, na ata de audiência de discussão e julgamento, as confissões da ré M T, produzidas em depoimento de parte - No que respeita à matéria de direito, a sentença é nula, nos termos do disposto nos artigos 668.º n.º 1 al. b) e 659.º n.º 3 do Código de Processo Civil, pois ao longo da sentença não foram destacados e analisados pontos concretos de documentos juntos aos autos e considerados relevantes para a decisão de mérito, explicitando-se o seu conteúdo, pelo que não se deu dessa forma cumprimento ao estatuído no citado artigo 659.º, n.º3, do CPC.
- Por outro lado, e face à materialidade factual dada como provada, não poderia a douta sentença dar como provado a existência de negócio simulado, a falta de pagamento do preço de um contrato de compra e venda, pois dos vários depoimentos, resultaram factos suficientemente indiciadores de que negócio foi realizado validamente.
- Pelo que, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, salvo o devido respeito por opinião contrária, fez uma errada valoração dos documentos junto aos autos, aliás, ignorou por completo a autorização para consulta das contas bancárias por parte dos Réus, os documentos juntos à escritura de compra e venda designadamente certidão de teor matricial que data de 15-11- 2002, o que conduziu a uma solução de direito que não se coaduna com a matéria constante dos autos, assim e salvo o devido respeito, consideramos que o Tribunal cometeu um manifesto erro de...
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