Acórdão nº 215/08.3TBPRG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução06 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 215/08.3TPRG.P1 Peso da Régua Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Apelante/ré: Herança de B…..; Apelados/autores: C….., e mulher, D…..

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  1. No 1º Juízo do Tribunal Judicial de Peso da Régua, C…. e mulher, intentaram contra a apelante, acção especial de divisão de coisa comum, alegando em síntese que: São donos e legítimos possuidores de ¾ do prédio urbano, sito em Tabuadelo, com a área de 50 m2, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 547 e descrito na conservatória do registo predial sob o nº 3027/20050824.

    A restante quota parte, ou seja ¼ , encontra-se registada a favor de E….., partilhada por morte deste por sua mulher F…. e os seus sete filhos, na proporção de metade (1/8) para a viúva e a outra metade (1/8) para os filhos e por falecimento desta objecto de inventário que corre termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Peso da Régua.

    Nada convencionaram com os réus quanto à indivisão do prédio, este não é divisível em substância e não querem permanecer na indivisão.

    Concluem pedindo que se proceda à adjudicação ou venda do prédio e consequente repartição do valor obtido, na proporção da quota parte de cada comproprietário.

    Contestando, opuseram-se os réus a esta pretensão e formularam pedido reconvencional.

    Os autores não têm o direito de pôr termo à indivisão, sustentam, porque não são comproprietários do prédio; este, há muito mais de vinte anos, é domínio exclusivo da ré que, por si e seus antepossuidores, o vêm habitando, administrando e benfeitorizando na totalidade, o que têm feito ininterrupta e continuamente, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição de quem quer que seja e no convencimento que a sua posse não lesava direitos de outrem.

    Estado de facto possessório que se converteu em estado de direito pela usucapião e apesar dos autores alegarem a sua propriedade de ¾ do prédio, invocando como fonte do seu direito a aquisição derivada, a mesma não é constitutiva mas meramente translativa do direito e, in casu, nunca operou, pelo facto de aquela quota parte nunca ter estado na posse dos seus transmitentes.

    Por via originária da usucapião adquiriu a ré a propriedade exclusiva sobre o prédio, o que determina a improcedência da acção e judicialmente declarada, reconvêm, justifica a condenação dos autores no reconhecimento e aceitação do direito de propriedade da ré, total e exclusivo, sobre o mesmo e o cancelamento de quaisquer registos que subsistam a favor dos autores.

    Ainda assim, continuam, os autores deduzem pretensão cuja falta de fundamento não ignoram, o que justifica a sua condenação como litigantes de má fé e o pagamento à ré de uma indemnização no montante de € 2.500,00.

    Os autores responderam para assegurar a improcedência do pedido reconvencional e afastar as razões apontadas pelos réus da má fé da sua litigância.

    1.2. Frustrando-se a conciliação das partes, na audiência preliminar, que teve lugar depois de por despacho se ordenar o prosseguimento dos autos como processo comum na forma sumária, foi proferido despacho saneador e condensado o processo com factos provados e base instrutória.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, sem reclamações foi proferido despacho que respondeu à matéria de facto e depois proferida sentença que julgando “improcedente a oposição/reconvenção deduzida pelos RR., absolveu os AA. do restante pedido” e ordenou a conclusão dos autos após trânsito em julgado da decisão, “com vista à convocação da conferência de interessados prevista no artº 1056º, nº2, do Código de Processo Civil”.

    1.3. É desta sentença que a Ré inconformada interpôs o presente recurso, exarando as seguintes conclusões que se transcrevem: “1) O presente recurso vem interposto da Douta Sentença que julgou improcedente a oposição/reconvenção deduzida pela ré, concluindo que existe uma situação de compropriedade entre os AA. e a R.

    2) Verificou-se um incorrecto julgamento quer da matéria de direito quer da matéria de facto, que redundou na incorrecta interpretação e aplicação da lei.

    3) No que respeita à matéria de direito, entende a apelante que factualidade provada é suficiente para a reconvenção ser julgada integralmente procedente.

    4) Os autores peticionaram o seguinte: a) “ O prédio identificado no artigo 1º não é divisível em substância”: b) “E que deverá proceder-se à adjudicação ou venda do prédio e consequente repartição do valor obtido, na proporção da quota parte de cada comproprietário”.

    5) Por sua vez, a ré, em reconvenção, além do mais, peticionou: I – “Declarar-se que à R. / reconvinte pertence todo o prédio objecto do litígio, condenando-se os AA. / Reconvidos no reconhecimento e aceitação do direito de propriedade, total e exclusivo, da R. / reconvinte sobre o mesmo”.

    II – “Ordenar-se o cancelamento de quaisquer registos sobre ele a favor dos AA. / Reconvidos”.

    6) Os autores têm a seu favor a presunção de ¾ do urbano em causa advinda do registo (o registo dos autores é de 12.01.2006) – artigo 7º do C.R.P.

    7) Segundo a Douta Sentença Recorrida, a ré provou o corpus mas não provou o animus.

    8) O artigo 7º do C.R.P. prescreve que o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito.

    9) O artigo 1268º do C.C. estatui que o possuidor goza da presunção de titularidade do direito, excepto se existir a favor de outrem presunção fundada em registo anterior ao início da posse, pelo que se o registo não for anterior ao início da posse, tal como aqui se verifica, prevalece a presunção derivada daquela.

    10) Se o titular do registo não provar também a anterioridade deste em relação à posse, não goza da presunção da propriedade.

    11) O artigo 1252º, n.º 2 do C.C., visando facilitar a prova do animus, estabelece uma importante presunção de posse para quem tem o poder de facto.

    12) O Pleno do STJ, em Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (de 14.05.96, Rec. 85.204, publicado no D.R.II, de 24.06.96), aplicou esta doutrina ao extrair a seguinte conclusão: “Podem adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem poder de facto sobre uma coisa”.

    13) Ficou provado que “Durante mais de 20 anos, por si e seus antepossuidores, a R., representada pelos seus sucessores habitaram, tomaram refeições, receberam amigos e pagaram as contribuições do prédio identificado em A) …. de forma contínua, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer seja e agindo na convicção de exercer um direito próprio”.

    14) Tendo ficado provado que durante mais de 20 anos, por si e seus antepossuidores, a R., representada pelos seus sucessores habitaram, tomaram refeições, receberam amigos e pagaram as contribuições do prédio identificado em A), de forma contínua, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer seja e agindo na convicção de exercer um direito próprio, houve usucapião, nos termos dos artigos 1287º, 1288 e 1296º do C.C.

    15) Consequentemente, a Sentença Recorrida violou o artigo 1.252º, n.º 2, 1287º, 1288 e 1296º do C.C.

    16) Mas será que aludida presunção que beneficia a ré – artigo 1252º, n.º 2 do C.C. – não foi ilidida com o registo de aquisição de ¾ do prédio que os autores têm a seu favor, desde 12.01.2006? 17) A resposta, obviamente, terá que ser negativa, pois quando os autores levaram a registo ¾ do imóvel, já o direito de propriedade da totalidade do prédio, se consolidara, por usucapião, na titularidade da ré, pelo que se tem de considerar-se ilidida a presunção que promana do aludido registo.

    18) No nosso direito a prevalência é a da usucapião sobre o registo – Ac. RC de 26.04.94, in CJ 1994, tomo II, pág. 34.

    19) O Prof. Oliveira Ascensão, in Direitos Reais, 5ª edição, pág. 382, ensina que “É preciso não esquecer que a base de toda a nossa ordem imobiliária não está no registo, mas na usucapião. Esta em nada é prejudicada pelas vicissitudes registrais; vale por si. Por isso, o registo passa à frente dos títulos substantivos mas nada pode contra a usucapião”.

    20) Assim não se entendendo, no que respeita à impugnação da matéria de facto, sempre a pretensão da ré deveria ter sido julgada procedente, pois a factualidade constante dos pontos 1) e 2) da douta B.I., atenta a prova testemunhal produzida, foi incorrectamente julgada, não merecendo as respostas restritivas que receberam.

    21) Aos referidos pontos foram dadas as seguintes respostas: 1) Há mais de vinte anos, por si e seus antepossuidores, a R., representada pelos seus sucessores habitam, tomam as refeições, recebem os amigos, benfeitorizam e pagam as contribuições da totalidade do prédio identificado em A)? Provado apenas que durante mais de vinte anos, por si e seus antepossuidores, a R., representada pelos seus sucessores habitam, tomaram as refeições, receberam os amigos e pagaram as contribuições do prédio identificado em A).

    2) … de forma contínua, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer seja, agindo como seus donos, na convicção de exercerem um direito próprio e de não lesarem os direitos de outrem)”.

    Provado apenas que a R. utiliza o...

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