Acórdão nº 08B877 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução10 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA intentou, no dia 6 de Fevereiro de 2003, contra BB, acção declarativa de apreciação, com processo ordinário, pedindo a declaração de serem comproprietários do prédio misto sito na Quinta de ..., freguesia e concelho de Murça, na proporção de metade, e a determinação do cancelamento do registo predial, sob o fundamento de ter sido comprado com dinheiro de ambos, em igual proporção, de o terem passado a usufruir e o haverem adquirido por usucapião.

A ré, na contestação, afirmou que o prédio foi comprado e a casa nele implantada foi construída com dinheiro exclusivamente seu.

Elaborada a especificação e a base instrutória e realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 5 de Julho de 2006, por via da qual a acção foi julgada procedente.

Apelou a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 15 de Outubro de 2007, negou-lhe provimento ao recurso.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a sentença está incompleta e é inexequível, devendo o tribunal pronunciar-se sobre a percentagem de cada uma das quotas, uma vez que o recorrido pediu a declaração de ser comproprietário na proporção de metade; - a falta de pronúncia nesta matéria gera a nulidade da sentença, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil; - provado que a recorrente participou na compra com mais dinheiro do que o recorrido e que não reconhecem ser proprietários em partes iguais, a decisão está em oposição com os fundamentos ou não especifica os fundamentos de facto em que se apoia, o que implica a sua nulidade, nos termos do artigo 668º, nº 1, alíneas b) e c), do Código de Processo Civil; - a entender-se ser a compropriedade em partes iguais, tal entendimento estaria em colisão com o facto de a recorrente comparticipar com mais dinheiro e de ambos não reconhecerem a compropriedade em partes iguais, o que implicaria a nulidade da sentença, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil; - tal entendimento contrariaria também o artigo 1403º, nº 2, do Código Civil por estar provado ser a comparticipação em dinheiro da recorrente maior do que a do recorrido e de ambos não reconhecerem a compropriedade em partes iguais, o que tornaria a sentença nula, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil; - o conluio dado como provado no sentido de a recorrente outorgar na escritura sob acordo de os prédios serem de ambos, porque não há documento que o comprove, só pode ter sido dado como provado por efeito da prova testemunhal; - como a prova testemunhal é inadmissível, face ao disposto nos artigos 393º e 394º do Código Civil, ocorre outra nulidade, que torna não provado o dito acordo, e, consequentemente, a compropriedade; - deve a sentença ser revogada, e a recorrente absolvida do pedido, ou declarada a nulidade da sentença, e ordenar-se a repetição do julgamento.

Respondeu o recorrido, em síntese de alegação: - está em causa saber se a propriedade foi adquirida por ambas as partes com recursos de ambas, para ambas, e se sempre foi possuída por ambas como coisa deles; - a sorte da acção não depende do relacionamento entre o recorrido e outrem; - a recorrente contribuiu com mais dinheiro para a compra do terreno, mas o recorrido contribuiu com maior dispêndio físico; - o recorrido e a recorrente exerceram conjuntamente a posse como comproprietários do prédio, pelo que são comproprietários dele em partes iguais, nos termos da presunção decorrente do artigo 1403º, nº 2, do Código Civil.

II É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido: 1. O autor, casado com CC sob o regime da comunhão geral de bens, com três filhas, e a ré, conheceram-se em Moçambique, em 1968, e, por volta do ano de 1970, passaram a viver juntos como se fossem marido e mulher.

  1. Face à revolução de 25 de Abril de 1974 e à sua repercussão em Moçambique, o autor e ré abandonaram aquele País e fixaram a sua residência na vila de Murça, na casa dos pais dela, sendo que, no dia 2 de Março de 1975, naquela Vila, nasceu um filho de ambos, de nome DD.

  2. Quando autor e ré vieram de Moçambique para Murça, as suas condições económicas eram precárias, e ele emigrou então, primeiro para a Alemanha, depois para França, países onde permaneceu escassos meses, apenas conseguindo empregos temporários.

  3. Em Maio de 1975, emigrou o autor para a Suíça, começando a trabalhar na cadeia de hotéis Fassbind Hotels, em Lausanne, e, em finais desse mês, a ré juntou-se-1he, deixando o filho de ambos aos cuidados dos avós maternos, e, em Novembro de 1979, deixou aquele emprego, passando a trabalhar na Clínica de Montchoisi, AS, em Lausanne, auferindo a remuneração mensal de 1 600 francos suíços, ali trabalhando até ao final de Maio de 1987, data em que regressou definitivamente a Portugal.

  4. Enquanto emigrantes na Suíça e durante a maior parte do tempo em que ambos aí residiram e trabalharam, a ré auferia rendimentos mensais provenientes do trabalho superiores aos do autor.

  5. Desde 1970 até 20 de Abril de 1987, o autor e ré sempre contribuíram para todas as despesas de alojamento, alimentação, vestuário e sustento do filho de ambos, e, entre 1970 e aquela data, residiram em Moçambique, Murça, Suíça e, novamente, em Murça.

  6. Em Janeiro de 1978, autor e ré decidiram comprar os prédios rústicos abaixo indicados e, no dia 17 de Janeiro de 1978, em escrituras públicas outorgadas no Cartório Notarial de Murça: - VS e BF, por um lado, e BB, por outro, declararam os primeiros vender e a última comprar, por 50 000$, o prédio rústico constituído por monte, sito no lugar do Atalho, freguesia e concelho de Murça, confrontante de nascente com estrada nacional, norte poente com IM e sul com A..., inscrito na matriz predial rústica sob o art. 273.

    - IM, por um lado, e BB declararam, aquele vender e esta comprar, por 350 000$, o prédio rústico composto por terra centeia e olival, sito no mesmo lugar do Atalho, freguesia e concelho de Murça, confrontante de nascente com estrada nacional, norte com Carlos José de Sousa, poente e sul com A..., inscrito ma matriz predial rústica sob o artigo 272.

  7. Tal compra foi...

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