Acórdão nº 6941/06.4TBMTS-D.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelRAMOS LOPES
Data da Resolução24 de Abril de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 6941/06.4TBMTS-D.P1 Relator: João Ramos Lopes Adjuntos: Desembargadora Maria de Jesus Pereira Desembargador Henrique Araújo*Acordam no Tribunal da Relação do Porto.

RELATÓRIO.

Apelante: B…, Ldª (executada).

Apelada: C…, Ldª.

Tribunal Judicial de Matosinhos – 2º Juízo Cível.

*Na execução comum para pagamento de quantia que a apelada exequente move à apelante executada, apresentou-se o agente de execução a solicitar ao tribunal que esclarecesse sobre a susceptibilidade de penhora da ‘licença radioeléctrica de radiodifusão sonora da executada’, uma vez que a ANACOM lhe comunicara a impenhorabilidade de tal bem.

Também a ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) solicitou ao tribunal informação sobre a penhorabilidade de tal bem, noticiando que a executada havia solicitado a cessão da licença em causa a favor de outra entidade.

Após as partes se pronunciarem sobre a questão assim suscitada – a exequente, no sentido da penhorabilidade, a executada no sentido da impenhorabilidade –, a Sr.ª Juíz proferiu despacho em que concluiu pela susceptibilidade de tal bem ser sujeito a penhora.

De tal despacho apela a executada, terminando as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões:

  1. A penhora duma licença radioeléctrica para emissões de rádio é ilegal, pois não se trata de um bem livremente alienável.

  2. Como a recorrente vive apenas da emissão de rádio difusão comercial, a perda desse bem implicaria a cessação total e absoluto impedimento do exercício da sua actividade com a consequente inibição dos seus trabalhadores auferirem salários e sobreviverem.

  3. A solução defendida pelo douto despacho recorrido implicaria que a venda judicial se tivesse de transformar num concurso público (a decidir pela autoridade administrativa) que satisfizesse a Lei da Rádio nos casos excepcionais em que permite a cessão de certas horas de emissão, modelo que não cabe no processo civil em vigor.

  4. O comércio jurídico é conceito que não pode sobrepor-se ao interesse público que precede a licença penhorada.

  5. O interesse do credor está garantido com a penhora dos lucros da actividade, não com a cessação da actividade.

  6. A solução adoptada pelo douto despacho recorrido implicaria o despedimento dos seus trabalhadores por falta de trabalho, valor acautelado pela Lei da Rádio.

  7. As regras excepcionais pelas quais a Lei da Rádio permite a cedência de parte da licença em causa, não são passíveis de analogia ou generalização.

  8. A douta decisão recorrida não faz a melhor interpretação do disposto nos artigos 4º, nº 9 da Lei da Rádio, 14º do DL 151-A/2001, de 20/07 e 823º, nº 2 do Código de Processo Civil, pelo que não merece subsistir.

Nas suas contra-alegações, a exequente, louvando-se na fundamentação do despacho recorrido, defende a improcedência do recurso.

*Objecto do recurso Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações, é de linear clareza, a questão suscitada no presente recurso: apreciar e decidir se é ou não susceptível de penhora a licença de radiodifusão da executada.

*Colhidos os vistos, cumpre decidir.

* FUNDAMENTAÇÃO Fundamentação de facto A matéria de facto a considerar é a que resulta exposta no precedente relatório.

Fundamentação jurídica Analisadas as conclusões das alegações da apelante, descortina-se que ela invoca, para lá impenhorabilidade absoluta do bem em causa, face à sua impenhorabilidade e inalienabilidade (proémio e alínea a) do art. 822º do CPC), também a sua impenhorabilidade relativa, ao aludir ao art. 823º, nº 2 do CPC e ao argumentar que a perda da licença implicaria o impedimento do exercício da sua actividade.

Confrontando-se o credor com o incumprimento voluntário da obrigação por parte do devedor, põe a lei à sua disposição a obtenção da realização coactiva da prestação, através da execução do património deste – art. 817º do CC.

A garantia geral da obrigação é constituída pelo património do devedor susceptível de penhora (art. 601º do CC), podendo assim dizer-se que o objecto da execução[1] é delimitado pelo património do devedor.

Tal princípio geral relativo ao objecto da execução (art. 821º, nº 1 do CPC e arts. 601º e 817º do CC) tem restrições, seja porque existem casos de objectiva indisponibilidade do património do devedor (os bens do domínio público, os bens inalienáveis do domínio privado – por exemplo, o direito a alimentos e o direito de uso e habitação, nos termos do art. 2008º...

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