Acórdão nº 4609/2007-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GALANTE
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - RELATÓRIO A propôs acção de condenação, com forma de processo ordinário (posteriormente corrigida, em razão do valor, determinando-se que a acção passasse a seguir termos sob a forma do processo sumário), pedindo que se decrete a ineficácia, em relação a si, do acto de transmissão do veículo de matrícula JQ pela 1a Ré, F. Lda, a favor do 2° R., R, mais se ordenando ao 2° R. a restituição de tal veículo.

Alega para tanto, e em síntese, que foi trabalhadora da 1a R., tendo sido despedida em 31/3/2004 em conjunto com outros trabalhadores, tendo recebido a quantia mensal correspondente ao salário até ao fim de Junho mas sem prescindir dos restantes direitos que lhe assistem. Tendo tomado conhecimento que a 1a R. estava a ceder muitos dos seus bens, pediu em Tribunal de Trabalho o arresto do veículo automóvel Audi A6 de matrícula JQ, da 1a R., que foi ordenado mas não concretizado porque desde 3/6/2004 a propriedade do veículo está registada a favor do 2° R., do que tomou conhecimento quando pretendia registar o arresto, e sendo que tal veículo seria o único bem que restava à 1a R. com o qual a mesma podia satisfazer o crédito da A.. Alega que o 2° R. é colaborador da 1a R., continuando o veículo a ser usado pelo gerente da 1a R., como sempre aconteceu antes, tendo a transmissão a favor do 2° R. sido efectuada apenas para esvaziar a 1a R. de património com o qual podia garantir o crédito da A.

Regularmente citados os RR. apresentaram contestações separadas, tendo a 1a R. alegado que o único vínculo que a ligou ao 2° R. foi o negócio da venda do veículo em 27/2/2004, arguindo a ilegitimidade do 2º R., mais alegando que o despedimento foi comunicado à A. em Dezembro de 2003, tal como aos restantes trabalhadores da 1a R., o que a A. aceitou, acordando receber a quantia correspondente a três salários a título de indemnização pelo despedimento, nada mais tendo a receber a esse título. Alega ser falso que a 1a R. tenha alienado património, já que não tinha qualquer móvel ou imóvel de sua propriedade, alegando ainda que a partir de 27/2/2004 deixou de utilizar o veículo em questão por o ter entregue ao 2° R., em consequência do contrato de compra e venda com o mesmo celebrado. Conclui pela improcedência da acção e pela condenação da A. em multa e indemnização como litigante de má fé.

Quanto à contestação do 2° R., impugna este a essencialidade da factualidade alegada pela A., sustentando que nunca teve qualquer vínculo com a 1 a R. e que lhe comprou o veículo por € 12.000,00, no âmbito de um contrato de compra e venda perfeitamente normal, tendo inclusive já vendido o mesmo. Conclui assim pela improcedência da acção.

Em resposta a A. refuta a existência da excepção dilatória da ilegitimidade do 2° R., invocando o interesse do mesmo em contradizer face ao alegado na P.I., mais alegando que o mesmo tratava de todos os assuntos da 1 a R. com uma empresa italiana da qual tinha a representação em Portugal, apesar de não ser funcionário da la R., sendo ainda sócio do gerente desta numa sociedade comercial e sendo conhecidos de longa data e com proximidade pessoal e profissional. Responde ainda ao pedido de condenação como litigante de má fé, alegando ser falso que tenha celebrado com a 1a R. qualquer acordo para não receber de indemnização mais que a quantia correspondente a três salários. Conclui como na P.I., pedindo ainda a impugnação do acto de transmissão do veículo por parte do 2° R., assim pretendendo alterar o pedido.

Vem a 1a R. apresentar articulado onde invoca a inadmissibilidade parcial do articulado da A. de reposta à contestação, mais concluindo como na contestação, e que se desentranhe um documento junto pela mesma, por inadmissibilidade legal.

O 2° R. veio apresentar articulado onde impugna a alteração do pedido, concluindo como na contestação e pedindo também o desentranhamento do documento em questão.

E a A. vem então apresentar articulado de resposta a tais articulados, o que motivou da la R. requerimento a pedir o desentranhamento do mesmo.

Foi então proferido o despacho saneador no qual ficou afirmada a validade e regularidade da instância e indeferida a pretendida alteração do pedido e parte da resposta da A. às contestações, ficando prejudicados os requerimentos e articulados subsequentes. Mais foi julgada improcedente a excepção dilatória da ilegitimidade do 2° R.

Foi dispensada a selecção dos factos assentes e controvertidos.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.

Fixou-se a matéria de facto provada e não provada, com reclamações pelos RR., desatendidas, pela forma que consta do despacho de fls. 224 a 229.

Veio, então, a 1a R., pelo seu requerimento de fls. 237, invocar que, por escritura pública de 21/9/2004 (da qual juntou a correspondente cópia devidamente certificada) se mostra dissolvida, estando registada a dissolução e encerramento da liquidação em 26/10/2004 (juntou igualmente cópia devidamente certificada do registo comercial), pelo que há fundamento para a sua absolvição da instância por falta de personalidade judiciária.

Em resposta a A. pugna pela inadmissibilidade do requerimento, por extemporâneo, mais pedindo que caso seja admitido não produza quaisquer efeitos sobre a pretensão da A., porquanto a presente acção tem por base a decisão do Tribunal de Trabalho de Lisboa anterior à dissolução da 1a R., e pede ainda que se condene a 1a R. em multa e em indemnização como litigante de má fé, já que vem invocar factos que conhecia e que podia ter apresentado muito antes, pretendendo protelar a consumação e efectivação da justiça.

Apresentou, então, a 1 a R. requerimento para responder ao pedido de condenação como litigante de má fé, impugnando os factos e considerações alegados pela A.

Foi proferida sentença que julgou a acção procedente por provada e, em consequência, declarou a ineficácia, relativamente à A., do contrato de compra e venda celebrado entre a 1 a R. e o 2° R., respeitante à alienação pela primeira ao segundo do veículo automóvel de marca Audi, modelo A6, com a matrícula JQ, mais se reconhecendo o direito da A. a executar tal bem no património do 2° R. e a praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei, na medida da satisfação do seu interesse no pagamento dos créditos emergentes da relação de trabalho subordinado que vinculou A. e 1 a R., e condenando o 2° R. a sujeitar-se à execução no seu património do mencionado veículo automóvel para pagamento dos créditos acima referidos, bem como à prática dos actos de conservação da garantia patrimonial dos mesmos créditos autorizados por lei.

Mais julgou improcedente por não provado o incidente de litigância de má fé da A. e, em consequência, absolveu a A. do correspondente pedido formulado pela la R.

Julgou-se, por fim, procedente por provado o incidente de litigância de má fé da la R. suscitada pela A. e, em consequência, condenou-se a la R. como litigante de má fé no pagamento da multa processual de 8 (oito) U.C. e bem ainda no pagamento da indemnização a arbitrar a favor da A. após serem ouvidas as partes para os efeitos do disposto no art. 457°, n.° 2, do Código de Processo Civil, sendo a responsabilidade dos pagamentos do representante da la R., Camilo dos Santos Rodrigues.

Inconformados, vieram os RR recorrer da sentença.

  1. No essencial, a 1ª Ré formulou as seguintes conclusões: 1. A douta sentença encontra-se ferida de vícios que, importam a sua nulidade ou anulabilidade daquela, designadamente, deficiente fundamentação de facto e de direito para a prolação da douta sentença; Erro notório na apreciação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nomeadamente documental e testemunhal; Relevância positiva da prova indirecta testemunhal apresentada pela Autora e relevância negativa da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento resultante do depoimento das testemunhas indicadas pela Recorrente; Contradição entre a fundamentação e a decisão e Falta de pronúncia sobre questões que devesse apreciar; 2. A Recorrente não se conforma com o facto de terem sido considerados como provados os quesitos n°: 6°, 9°, 12°, 13°, 19°, 20° e 21 da base instrutória atentas as razões de facto e de direito invocadas e a prova documental e testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento; 3. Da análise do douto despacho de resposta aos quesitos constantes da matéria de facto dada como assente e da douta sentença recorrida, resulta indubitavelmente que foram usados "dois pesos e duas medidas", ou seja, o depoimento indirecto das testemunhas da Autora "por ouvir dizer", porque nada presenciaram, mereceu acolhimento do Mmo. Juiz aquo e o depoimento directo das testemunhas de ambos os Réus, de prestaram depoimento certo, credível e com precisão não mereceram qualquer acolhimento do Mmo. Juiz a quo, 4. Não se aceita que se tivessem verificado os requisitos da Impugnação Pauliana conforme é doutamente referido da sentença objecto de recurso; 5. Não se vislumbra o fundamento jurídico que presidiu à convicção e consequentemente à prova do facto "Com a venda do veículo a R. visou unicamente evitar ser proprietária de qualquer bem com o qual tivesse de satisfazer créditos que existissem contra ela"; 6. A Recorrente ao proceder ao encerramento das suas instalações e encerramento do seu objecto social, fê-lo porque não tinha condições para continuar a laborar, não fazendo qualquer sentido a dissolução da mesma e a manutenção do parque automóvel, até porque aquela necessitava de liquidez para pagamento dos seus compromissos, designadamente os assumidos para com a Recorrida; 7. A Recorrente não concebeu nem aderiu a qualquer plano para prejudicar a aqui Recorrida, nunca teve essa intenção nem agiu dolosamente como é requisito do art. 612° do Código Civil, nem se quer de forma negligente; 8. Relativamente à questão falta de personalidade judiciária da Recorrente e à condenação...

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