Acórdão nº 341-A/1998.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2011
Magistrado Responsável | SERRA BAPTISTA |
Data da Resolução | 06 de Julho de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA, por apenso aos autos de execução em que é exequente BB, veio deduzir oposição, pedindo, para alem do mais, que se declare que não tem qualquer obrigação de pagar a quantia exequenda e o demais pedido e que se condene o embargado a pagar-lhe, como litigante de má fé, uma justa indemnização.
Alegando, para tanto, e em suma: O título executivo – cheque por si emitido, sacado sobre a CGD, com data aposta (não por si) de 3/3/98, no montante de 17.000.000$00, para ser pago a CC e cujo pagamento foi recusado com fundamento em extravio – é ineficaz por ter sido emitido sem data, sendo certo que a nele aposta não foi escrita por si.
Tal cheque fora emitido para garantia de pagamento de um empréstimo, sendo a recusa da sua devolução, depois de paga a dívida, com o pretexto de que se havia extraviado, que motivou a respectiva comunicação ao banco sacado.
Notificado o exequente, veio o mesmo contestar, dizendo, também, em síntese: O CC endossou-lhe o cheque, devidamente preenchido, por via de uma transacção comercial.
São-lhe inoponíveis as excepções pelo embargante alegadas fundadas nas relações pessoais entre ele e o sacador do cheque.
Foi elaborado o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.
Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 364 consta.
Foi proferida a sentença, que julgou os embargos procedentes e declarou extinta a execução.
Inconformado, veio o embargado interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Évora, onde, por acórdão de fls 427 e ss, na revogação da sentença recorrida, foi julgada improcedente a oposição deduzida, ordenando-se o prosseguimento dos autos.
Agora irresignado, veio o embargante pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão de fls., dos autos, que julgou a Apelação procedente; 2ª - Para boa apreciação da presente Revista devemos reter os seguintes factos (dados como provados na 1ª Instância) e, que aqui se repetem em síntese: O cheque dos autos é um cheque de garantia, foi emitido sem data, tendo sido revogado em 5/09/1995 e, apresentado a pagamento em 3/03/1998 (cfr. Alegações, Pontos 2 e 3 supra); 3ª - Ora, o facto de o cheque dos autos ter sido emitido a título de garantia, pressupõe a existência de um acordo para o preenchimento do mesmo; 4ª - O qual, aliás, foi violado após o pagamento da quantia que o mesmo cheque pretendia garantir; 5ª - Justificando-se, assim, o direito do endossante a reaver o cheque (Acórdão do · STJ, in BMJ 404, ano 1991, pág.lS7); 6ª - Acresce que, “o preenchimento abusivo do cheque é, segundo o art. 13° (da LU) motivo de oposição ao tomador (Assento do STJ, de 14 de Maio de 1996, in BMJ, n0.457, pág. 59 e sgs.); 7ª - Com efeito, a estrutura jurídica construída em torno dos títulos de crédito, pressupõe a emissão legal lícita do título; 8ª - Sendo certo que, do art. l0º da LU, não pode exigir-se a extensão da cobertura legal a actos ilícitos ou, até criminosos; 9ª - Ora, no caso dos autos, está provado que: o tomador do cheque dos autos não o devolveu após ter obtido o pagamento devido; alegando que o mesmo se tinha extraviado! 10ª- Pelo que, a partir daquele momento, o cheque dos autos passou a assumir carácter ilegal, ilícito; não podendo, por isso vincular o sacador; 11ª- Decisão, aliás, que fundamentou a douta sentença recorrida da 1ª Instância e, na qual nos louvamos; 12ª- Com efeito, a colocação em circulação do cheque dos autos, (após haver sido declarado extraviado) e, sem conhecimento do sacador, é ilícita; 13ª- Não podendo, por isso concluir-se - como o faz o douto Acórdão recorrido - estarmos perante um cheque regularmente em circulação, para efeitos da LU; 14ª- Aliás, após o momento (5/09/1995) em que o recorrente comunicou ao banco o extravio do cheque dos autos, o referido título perdeu as características de título de crédito; e 15ª- Como tal não pode tal título gozar da protecção conferida pela LU; 16ª- Decidindo, como decidiu, o Acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação da Jurisprudência deste Supremo Tribunal; 17ª- Devendo, assim, julgar-se procedente a presente Revista; 18ª- Julgando-se, a final, os embargos procedentes, declarando-se, a inexigibilidade do título executivo.
O recorrido não contra-alegou.
Corridos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.
Vem dado como PROVADO: 1 - O embargante AA assinou o cheque nº 0000000000 sacado sobre a C.G.D., no montante de Esc. 17.000.000 00, apresentado como título executivo nos autos de execução com o n° 341/98, o que estes embargos se mostram apensos [cfr doc. junto aos mencionados autos a fls 55 e cujo teor aqui se dá por integramente reproduzido - (A) dos factos assentes).
2 - Este cheque foi entregue pelo embargante a CC - (B) dos factos assentes).
3 - Apresentado a pagamento, foi o cheque devolvido pela Câmara de Compensação do Banco de Portugal com a menção aposta no verso de "extraviado" - (C) dos factos assentes).
4 - O embargante é sócio da "DD, Lda", com sede em Monte do Trigo - cfr. certidão de matrícula junta aos autos a fls. 25 a 32 cujo teor se dá por integralmente reproduzido - (D) dos factos assentes).
5 - CC foi administrador da FRASAC - Construções e Administração, S. A., com sede em Oeiras, até renúncia em 28/05/97, facto levado ao registo apenas em 17/03/98 - cfr certidão de matrícula junta aos autos a fls. 35 a 40 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - (E) dos factos assentes).
6 - Correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Beja o Proc. nº 321/99.3TABJA, em que era arguido CC, acusado pela prática de um crime de abuso de confiança, p. p. no art. 300°, n° 1 e 2, al. a), do Cód. Penal de 1982, actualmente p. p. no art. 205,°, nº 1 e 4, al. b). do Cód. Penal, o qual tinha por objecto o cheque dos autos, e veio a ser declarado extinto pelo falecimento do arguido - cfr. docs juntos a f1 S. 33 a 37 e 46 dos autos principais e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - (F) dos factos assentes).
7 - CC faleceu no dia 17 de Janeiro de 2003 - cf. certidão do assento de óbito junta aos autos principais a f1 s. 40 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - (G) dos factos assentes).
8 - O cheque em causa foi endossado e entregue ao embargado, BB, pelo CC - (1 da base instrutória).
9 - A data aposta no cheque (98/3/3) não foi escrita pelo punho do embargante - (3 da base instrutória).
10 - O cheque foi entregue ao CC sem data - (4 da base instrutória).
11 - Em 28 de Abril de 1994, o referido CC emprestou ao embargante a quantia de esc. 17.000.000$00 - (5 da base instrutória).
12 - Importância esta titulada pelo cheque n° 00000000, de igual valor, sacado sobre o Banco Bilbao e Vizcaya - (6 da base instrutória).
13 - E que foi depositada na conta da sociedade referida em D) - (7 da base instrutória).
14 - Destinando-se à aquisição de dois camiões novos para o exercício da referida sociedade -(8 da base instrutória).
15 - Foi para garantia e pagamento daquela importância que o embargante preencheu e endossou ao referido CC o cheque dado à execução - (9 da base instrutória).
16 - O embargante e o CC acordaram no pagamento do referido empréstimo mediante o aceite de seis letras de câmbio pela sociedade referida em D), e entrega do cheque nº 000000, sacado sobre o Banco Pinto &...
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