Acórdão nº 158/07.8TBMDB.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelFILIPE CAROÇO
Data da Resolução30 de Junho de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 158/07.8TBMDB.P1 – 3ª Secção (apelação) Tribunal da Comarca de Mondim de Basto Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Teresa Santos Adj. Desemb. Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, solteiro, maior, com domicílio no …, freguesia e concelho de Mondim de Basto, beneficiário da Segurança Social n.º ………, intentou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra: 1. C…, com sede na Rua … n.º ..-..° A P, ….-… Lisboa; e 2. D…, COMPAGNIE LUXEMBOURGEOISE, S.A., ., Rue …, ….. Luxembourg, tendo em vista a condenação no pagamento de indemnização emergente de acidente de viação.

Alegou, essencialmente, que no dia 25 de Junho de 2005 foi vítima de um acidente de viação em Espanha quando o veículo em que se fazia transportar como passageiro entrou em despiste numa auto-estrada, por excesso de velocidade e cansaço do condutor, indo embater no rail separador esquerdo da hemi-faixa de rodagem e dela saindo de imediato, rodopiando e capotando até se imobilizar no espaço térreo situado entre as duas hemi-faixas de rodagem daquela via rápida.

Por causa do acidente, o A. foi conduzido ao serviço de urgência de um hospital espanhol onde lhe foram diagnosticadas várias lesões com origem naquela mesma situação.

O A. iniciou tratamentos ali e foi sujeito a intervenção cirúrgica antes de ser transferido para Portugal (país da sua nacionalidade) onde continuou a desenvolver o processo de cura clínica. Passou por internamentos, incapacidade temporária e ficou com uma incapacidade permanente nunca inferior a 15%.

Invoca danos patrimoniais, presentes e futuros, assim como danos não patrimoniais, achando-se no direito de ser reparado por todos eles, da responsabilidade da R. D…, por estar transferida para ela a responsabilidade por acidentes de viação originados pelo veículo causador do acidente, através do contrato de seguro, titulado pela apólice n.º …………..

A R. C… foi demandada por ser a representante daquela demandada em Portugal.

Concluiu assim o seu articulado: «NESTES TERMOS e nos mais de Direito, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, A) ser a primeira R. condenada a pagar ao A. a título de ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais, as seguintes quantias: - € 120.000,00 (cento e vinte mil euros) relativos a I.P.P.; - € 34.171,65 (trinta e quatro mil cento e setenta e um euros e sessenta e cinco cêntimos) relativos a perdas salariais, - € 30.000,00 (trinta mil euros) relativos aos danos não patrimoniais; - € 1.294,75 (mil duzentos e noventa e quatro euros setenta e cinco cêntimos) relativos aos danos patrimoniais; B) ser a R. condenada a indemnizar o A. dos danos patrimoniais e não patrimoniais, previsíveis, mas insusceptíveis de serem por ora contabilizados, e que sejam consequência directa do acidente sub judice, a liquidar em execução de sentença.

  1. ser a R. condenada no pagamento dos juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação, até efectivo pagamento e, ainda em custas, procuradoria e demais encargos legais.

  2. Para a hipótese de se vir a demonstrar nos autos, carecer a primeira R. de Legitimidade passiva, por não ser a representante da 2ª R., para efeitos judiciais, deverá ser, então, a R. D…, condenada nos sobreditos termos, a pagar ao A., as quantias acima peticionadas.» (sic) As R.R. contestaram a acção num articulado único, invocando: a) A prescrição do direito da A. relativamente às R.R. no dia 25.7.2005, em virtude do acidente ter ocorrido em, 25.7.2002 e elas terem sido citadas apenas no dia 23.7.2007, pelo que defendem a sua absolvição do pedido.

  1. A ilegitimidade da 1ª R., C… por não ser ela, em qualquer caso, a responsável pelo pagamento da indemnização, pugnando pela sua absolvição da instância.

    Quanto ao fundamento da acção, impugnando parcialmente os factos, sem que tenham obrigação de os conhecer, entendem que a acção deve ser julgada de acordo com a prova que vier a ser produzida.

    O A. respondeu à matéria das excepções, pugnando pela sua improcedência.

    Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador que:

  2. Declarou a R. C…, Lda, parte ilegítima e a absolveu da instância; e b) Relegou o conhecimento da excepção da prescrição para final.

    Foi seleccionada a matéria de facto, apenas com base instrutória, de que o A. reclamou sem sucesso.

    Após longa instrução do processo, em 26.1.2010 a R. apresentou requerimento invocando a excepção dilatória de caso julgado e pedindo que a mesma se julgue procedente e a acção improcedente, “absolvendo-se as Rés”.

    Para o efeito, alegou que, «na sequência do acidente de viação em causa nos presente autos, ocorrido em 25/07/2002, em …, …, Espanha, no qual foi interveniente o veículo de matrícula “BD …”, no qual o A. era transportado, foi instaurado processo de inquérito pelo “Juzgado de Instruccion” de Vitoria-Gasteiz, a fim de ser averiguada eventual responsabilidade criminal.

    O referido processo-crime nº 684/02 foi arquivado, encontrando-se junto a fls. 279 a 403 dos autos.

    Após o arquivamento do aludido processo-crime, o aqui A. instaurou acção de processo ordinário, no “Juzgado de Primera Instancia nº. 6” de Vitoria-Gasteiz, contra a ora R. “D…” e E…, formulando pretensão indemnizatória, com base na responsabilidade civil extracontratual, pela ocorrência do sinistro em causa nos presentes autos.

    Conforme consta da sentença nº. 119/07, o referido processo culminou com a absolvição da aqui R. “D…”… em tradução livre: “’Rejeitando a acção proposta pelo Sr. B…, representado pelo procurador, Sr. F…, devo absolver e absolvo o Sr. E… e a seguradora D…, COMPAGNIE LUXEMBURGEOISE, S.A. das pretensões exercitadas contra eles neste processo.” A sentença espanhola proferida pelo Tribunal de Vitoria-Gasteiz, País Basco, Espanha, em 25/06/2007, absolveu as aqui Rés do pedido formulado pelo também aqui A., considerando que o mesmo já não poderia ser exercitado, por força do decurso do prazo de prescrição.» (sic) Entende a requerente que o tribunal espanhol, ao conhecer da prescrição (excepção peremptória, no direito espanhol), absolveu os R.R. do pedido, o que significa que se pronunciou sobre o mérito da causa, pelo que a sentença, já transitada em julgado, constitui caso julgado material.

    Juntou cópia da sentença espanhola e, posteriormente, a respectiva tradução.

    O A. respondeu ao requerimento, considerando que não existe caso julgado, designadamente e além do mais, por o tribunal espanhol não se ter pronunciado sobre o mérito da questão. A prescrição no direito espanhol é de um ano apenas e tem natureza processual. A existir caso julgado, reveste natureza formal, pelo que não tem valor extraprocessual.

    Naquela e nesta acção não são os mesmos os sujeitos, a causa de pedir e o pedido. Também por isso não e impõe a autoridade do caso julgado.

    Por outro lado, considera ainda o A. que a arguição da excepção do caso julgado no momento processual em que ocorreu, depois da contestação, viola o princípio da preclusão plasmado no art.º 489º, nº 1, do Código de Processo Civil, constituindo nulidade processual.

    Termina no sentido de que seja julgada improcedente a excepção do caso julgado, devendo os autos prosseguir os seus termos normais até final.

    Apreciando o requerimento da R. com base num conjunto de factos extraídos da petição inicial e da base instrutória deste processo e da petição inicial e decisões extraídas do processo que correu termos nos tribunais espanhóis, o tribunal a quo resumiu a sua posição no sentido de que existe identidade entre os elementos definidores desta acção e da acção que correu os seus termos perante o tribunal espanhol e que o alcance do caso julgado da decisão neles proferida determina a impossibilidade de conhecer a pretensão formulado pelo autor na presente acção, devendo proceder o requerido, com absolvição da R. da instância. Culminou o seu despacho com o seguinte segmento decisório: «Em face de tudo o exposto, decido julgar procedente a excepção dilatória nominada de caso julgado e, em consequência, absolvo a ré D…, Compagnie Luxembourgoise, S.A. da instância.» (sic) Inconformado com esta decisão, o A. interpôs recurso de apelação com alegações onde formulou as seguintes CONCLUSÕES: «1º - Recorre-se da decisão judicial que julgou procedente a excepção de caso julgado comunitário, por existir decisão anterior espanhola que declarou prescrito o direito à acção judicial do aqui recorrente, sem ter conhecido dos respectivos fundamentos materiais.

    1. - O Tribunal Recorrido interpretou o instituto do caso julgado à luz da Lei interna portuguesa, quando o devia ter interpretado como conceito de Direito comunitário.

    2. -A presente acção entrou em juízo, de forma tempestiva, à luz das competentes normas da Lei portuguesa.

    3. -O ordenamento jurídico português é o da lei da nacionalidade e da residência do A. 5º- Os Estados-Membros da UE têm plena autonomia para legislarem sobre a questão da prescrição da responsabilidade civil extra-contratual emergente de acidente de viação (duração do prazo, data de início de contagem, natureza do instituto), uma vez que não existe nenhuma norma comunitária vigente nesta matéria.

    4. - A aplicação, pelo Tribunal recorrido, do instituto do caso julgado violou o princípio da igualdade (artigo 13º CRP e 20º e ss e 6º TUE), o princípio do Estado de Direito Democrático (artigo 2º CRP e artigo 6º n.º 1 da CARTA DFUE) e o princípio da proporcionalidade (art. 5º n.º 3, TCE).

    5. - Não existem fundamentos legítimos que justifiquem uma restrição ao princípio da igualdade in casu.

    6. - No que concerne à questão da apreciação do direito subjectivo do A., existem normas comunitárias reguladoras das questões fundamentais em matéria de responsabilidade civil extracontratual emergente de acidentes de viação.- Vide Directiva 2009/103/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 16/09/2009.

    7. - Perante sentenças proferidas por Estados-Membros que decidam do mérito da causa não se colocam situações materialmente...

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