Acórdão nº 2937/06-2 de Tribunal da Relação de Évora, 19 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelACÁCIO NEVES
Data da Resolução19 de Abril de 2007
EmissorTribunal da Relação de Évora

* PROCESSO Nº 2937/06 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA "A" intentou, em 13.01.1997, acção declarativa ordinária contra "B", pedindo que a ré seja condenada: - a pagar-lhe, a quantia de Esc. 31.854.690$00, actualizada mediante o índice de inflação, acrescida de juros de mora vincendos desde a prolação da sentença e até integral pagamento, à taxa legal de 10% ou à que entretanto viesse a ser fixada em sua substituição; - e a pagar todas as despesas realizadas em virtude do acidente ferroviário em causa, nomeadamente intervenções cirúrgicas, internamentos, consultas médicas, medicamentos, tratamentos, sessões de fisioterapia, exames, análises e deslocações, bem como todas as outras que venham a decorrer do mesmo - "maxime" as próteses de que a autora venha a necessitar - quantia esta a ser reclamada pelo "C", e à qual deverão acrescer juros vincendos, à taxa legal, até integral pagamento.

Alegou, para tanto e em resumo, a ocorrência de determinado acidente por si sofrido na Estação da C.P …, quando ao tentar subir para o comboio que já havia iniciado a sua marcha escorregou e caiu junto da linha, do que lhe resultaram danos diversos relacionados com as inúmeras e graves lesões.

Mais alegou ainda que quando tentou entrar no comboio este ainda tinha as portas abertas, circunstância essa, aliás habitual, da qual decorre a culpa e consequente responsabilidade da ré na produção do acidente.

Citado, contestou a ré, defendendo por impugnação e invocando a culpa exclusiva da autora na produção do acidente.

Foi proferido despacho saneador e foram elaborados os factos provados e a base instrutória após o que, instruído o processo, teve lugar a audiência de julgamento.

Seguidamente foi proferida sentença, nos termos da qual a acção foi julgada parcialmente procedente, condenando-se a ré a pagar à autora a quantia € de 103.500,00, acrescida de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal e até efectivo pagamento e ainda metade das despesas que esta vier a realizar em sessões de fisioterapia e colocação de próteses em montante a liquidar em execução de sentença, com juros que se vieram a vencer, à taxa legal em vigor desde a respectiva liquidação no mais se absolvendo a ré do pedido.

Inconformada, interpôs a ré o presente recurso de apelação, em cujas alegações, pedindo a sua absolvição do pedido, apresentou as seguintes conclusões: A) É facto notório e do conhecimento geral que as portas dos comboios ou são automáticas ou de funcionamento manual. No primeiro caso, são comandadas pelo condutor do comboio, No segundo caso, são os passageiros que procedem à abertura ou fecho das portas. Em qualquer dos casos, o chefe da Estação não pode autorizar ou impedir o acto de abrir ou fechar as portas. Nem é essa a sua função nem pode sequer visionar se as portas estão abertas ou fechadas. E como poderia dar autorização para irem abertas? Dava autorização a quem? B) Estes factos são notórios e não carecem de alegação ou de prova pelo que, por força do disposto no art. 514°, n° 1 do Código de Processo Civil, devem ter-se como não escritas as respostas aos dois últimos quesitos.

  1. De qualquer modo, não está sequer alegado pela autora que a mesma tivesse tentado entrar no comboio porque as portas estavam abertas ou que tenha havido qualquer nexo causal entre esse facto e o acidente.

  2. O art. 42° do Regulamento para a Exploração e Polícia dos Caminhos de Ferro impõe aos passageiros que só com o comboio parado entrem ou saiam do comboio, bem como proíbe os passageiros de abrir as portas exteriores durante a marcha, o que só reforça que só os passageiros podem abrir as portas.

  3. A autora adquiriu o bilhete poucos minutos antes da partida do comboio, saiu do edifício da Estação, atravessou de uma gare para a outra e, quando chegou à segunda gare, o comboio já estava em andamento. Tendo tentado entrar com o comboio já em andamento, a sua conduta é, mais que meramente negligente, temerária.

  4. A autora tentou entrar na última carruagem mas veio a ser colhida pelo rodado do furgão, o que manifestamente demonstra que a marcha do comboio já se iniciara antes da autora chegar ao local de embarque. Ao embarcar, naquelas condições, colocou em risco a sua integridade física, como veio a suceder.

  5. A conduta da autora é assim ilícita, porque violou uma norma, e culposa, porque foi imprudente, temerária mesmo.

  6. Porque o comboio já tinha partido, aos funcionários da ré não era possível dar ordem para parar. Até porque não é possível deter rapidamente a marcha de um comboio. E, face à conduta da autora, tentar deter a marcha, poderia, isso sim, provocar danos avultados. E se a autora surgiu repentinamente numa gare, vinda de outra, e imediatamente tentou entrar no comboio em andamento, como poderiam os funcionários da ré impedi-la de tal acto? Será que eram obrigados a prever tal conduta e a estarem no exacto local onde a autora tentou entrar? A resposta é obviamente negativa.

  7. A ré não pode assim ser responsabilizada nem a título de culpa nem a título de risco.

  8. O acidente só ocorreu por virtude da ilicitude da conduta da autora.

  9. A douta sentença recorrida violou o disposto no art. 514°, n° 1 do Código de Processo Civil...

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