Acórdão nº 02462/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelElsa Pimentel
Data da Resolução17 de Maio de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I- RELATÓRIO O presente recurso jurisdicional vem interposto pela REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA (RAM), da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, de 28-11-2006, que, julgando procedente o processo cautelar intentado por MARIA ...

e OUTROS, determinou a suspensão da eficácia "das alterações ao loteamento urbano n° 12/89, da Resolução do Governo Regional, do licenciamento destas obras de construção do C-I Larião e ainda dos despachos de prorrogação dos prazos para conclusão das obras", e proibiu ao "C-I Larião, "continuar a executar as obras".

A Recorrente defende que a sentença recorrida deve ser revogada, para o que formula as seguintes conclusões: «1. A douta sentença recorrida ao considerar improcedente a excepção de extemporaneidade da providência cautelar, fez errada interpretação dos arts 112° e 114° do CPTA, e respectiva articulação com o art. 133° do CPA, prendendo-se em demasia à letra deste preceito.

  1. Esquece, assim, em violação do art. 10° do CCivil, que a letra da lei é apenas a face visível do icebergue normativo, ignorando, com violação dos princípios da necessidade, da urgência e da instrumentalidade inerentes à excepcional tutela cautelar, que não pode considerar-se protelado até à eternidade, o prazo para requerer a suspensão de eficácia, apenas porque a impugnação de actos nulos, a título principal, não está sujeita a limite temporal.

  2. A não ser assim estar-se-á a permitir um uso abusivo da tutela cautelar que repugna ao sistema jurídico interpretado na sua globalidade (...) 4. Por outro lado, deveria ter conhecido oficiosamente do pressuposto processual do interesse em agir cautelarmente/ necessidade de tutela cautelar.

  3. Assim, encerra erro de julgamento a parte decisória onde se refere que a instância se apresenta válida e regular, violando o essencial do princípio da necessidade da tutela cautelar.

  4. Já que, como expressamente reconhece a sentença recorrida não está alegado, e muito menos provado, qualquer facto que permita concluir que existe qualquer perigo para os direitos que os requerentes (alegadamente) visam defender, pela normal demora de um processo principal.

  5. O acto imputado à entidade requerida, RAM, é um mero parecer emitido em sede de consulta prévia a que está sujeita a alteração de loteamento, produzindo apenas efeitos internos, dentro do procedimento.

  6. Não tem assim qualquer eficácia jurídica externa, susceptível de lesar quaisquer direitos ou interesses legalmente protegidos.

  7. A douta sentença recorrida, ao considerar a Resolução do Conselho de Governo da entidade requerida como acto administrativo impugnável, viola os arts 120° do CPA e o art. 51° do CPTA.

  8. Por último, ao considerar este acto nulo, por incompetência absoluta, aplica equivocadamente o art. 133° do CPA, em violação dos arts 36°, n° 2 e 40°, n° 2 do Dec-Lei n° 448/91, adaptado à RAM pelo Decreto Legislativo Regional n° 16/92/M, de 30-04-1992».

    Nas contra-alegações, os Agravados defendem que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra, sustentando, em síntese, que: - O Tribunal "ad quem", reconhecendo a complexidade, extensão e profusidade das conclusões da Recorrente, deve convidá-la a sintetizá-las, sob pena de não se conhecer do presente recurso, cfr. art. 690°, n° 4 do CPC, ex vi arts 1° e 140° CPTA; - No que tange às Conclusões 1ª a 3ª, a Recorrente verdadeiramente o que tenta fazer é litigar nesta instância de recurso contra lei expressa, pois, à luz da solução legal expressamente adoptada pelo legislador e em vigor, à semelhança do regime do processo civil [cfr. arts. 383 e 389° CPC], foi posto cobro "à discussão sobre o prazo das providências cautelares de suspensão de eficácia de actos, no âmbito da LPTA, quando estava em causa a adopção de providências respeitantes a actos nulos ou inexistentes, e que era feita em torno do disposto no art. 79°, nº 3, da LPTA"; - Quanto às Conclusões 4ª a 6ª, está vedado o seu conhecimento ao TCAS, por, sendo questões novas, que em momento algum foram invocadas pela ora Recorrente na sua oposição e não são de conhecimento oficioso, não foram apreciadas pelo Tribunal "a quo", não podendo, por isso, ser objecto do presente recurso; - De todo modo, os Recorridos, que intentaram a acção popular em defesa dos interesses difusos atinentes ao urbanismo, ordenamento do território, ambiente, qualidade de vida do domínio municipal, têm, enquanto autores populares, todo o interesse processual em agir; - "No que respeita aos acervo das Conclusões 7ª a 10ª, para além do que já consta da sentença cautelar (cfr. item c), fls. 7), é evidente que se trata de um acto administrativo externo praticado pela Recorrente, que produziu efeitos, maxime, nas esferas jurídicas do Município de Santa Cruz e dos Contra-Interessados, como denota a tramitação procedimental havida nos serviços daquele, e "viabilizou " o projecto de arquitectura, sendo que não provém de órgão do Município de Santa Cruz nem tão pouco do órgão da Recorrente competente (a Direcção Regional do Ordenamento do Território, organismo da Secretaria Regional do Equipamento Social)".

    O Exmº Magistrado do Ministério Público, ao abrigo da faculdade que lhe é conferida pelo nº 1 do art. 146º do CPTA, emitiu parecer a sustentar que a sentença recorrida merece censura, sendo mesmo nula, em síntese, por: - Como se alcança de fls. 85 e segs, não ter sido ordenada a citação dos titulares dos interesses difusos (sobretudo aqueles a quem, de acordo com os artigos 86º e 99º da petição, a construção da muralha junto ao ribeiro prejudica, nomeadamente os proprietários confinantes com o prédio onde está a ser executada a obra), o que constitui uma omissão de "formalidade essencial prescrita na (...) lei (...), com prejuízo de eventual coligação, com cuja omissão ficou irremediavelmente prejudicada a decisão da tutela cautelar em causa que, nos termos dos art. 195º als a) e b), 198 n° 1 e 201 n° 1 do CPC e 88 n° 2 do CPTA», o que torna «o despacho de fls 85 nulo (...), nulidade de conhecimento oficioso, nos termos dos art. 494º als b) e f) do CPC e 88 n° l e 2 do CPTA e implica a anulação de todo o processado»; - Ter sido omitida a "citação" e entrega ao M°P° da petição e documentos com ela juntos para os efeitos dos arts 9°, n° 2 e 85º, n° 2 do CPTA, sendo certo que o Ministério Público tem, de modo expresso na primeira destas disposições, a sua legitimidade assegurada para intervir nas providências cautelares quando o seu objecto seja constituído pelos direitos e valores consagrados nesse preceito, não merecendo acolhimento os argumentos de que a "citação ora reclamada não está expressamente prevista nos art. 112º e segs do CPTA" e de que, nos processos cautelares, lhe está vedado intervir por razões de urgência e celeridade processual; A Agravante respondeu a concordar com este parecer, acrescentando que, oportunamente, foi formulado um pedido de reforma da sentença quanto a custas que não foi objecto de decisão, "irregularidade que deve ser igualmente suprida com a baixa dos autos à 1ª instância".

    Os Agravados responderam àquele parecer, argumentando que: - No artigo 404º da p.i., indicaram expressamente os interesses difusos cuja salvaguarda pretendem garantir, sendo impossível identificar os seus titulares por força da natureza difusa de tais interesses; - O art. 85º do CPTA é exclusivamente aplicável a processos principais e o art. 9º, nº 2 do mesmo diploma confere legitimidade ao Mº Pº para intentar e intervir em acções públicas autónomas que visem salvaguardar os interesses difusos aí elencados, mas tal só acontece "nos termos previstos na lei", no caso, nos termos do regime jurídico aplicável, não prevendo qualquer intervenção do MºPº nos processos cautelares para além dos que intente no exercício da acção pública.

    Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência para julgamento.

    II- MOTIVAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida deu por "Sumariamente Provados" os seguintes factos: «1. Por requerimento de 24/9/1988, o primeiro Contra-Interessado requereu "lhe fosse concedido o alvará de loteamento de um terreno que possui", "com a área de 3.360 m2 e fica dividido em 6 lotes", o qual requerimento tem-se aqui por reproduzido. - cfr. documento junto n° l (fls. 443).

  9. O Chefe de Gabinete do SRES, pelo ofício n° 4224, de 22/2/1989, deu a conhecer que o "terreno a lotear situa-se à margem de uma Estrada Municipal (antiga E.R. 101), pelo que o referido pedido encontra-se fora do âmbito da Direcção Regional de Estradas desta Secretaria Regiona". - cfr. doc. junto sob o n° l (fls. 449).

  10. O mesmo Chefe de Gabinete, pelo ofício n° 4902, de 15/3/1989 e sob a epígrafe "Pedido de parecer sobre loteamento junto ao Ribeiro da Azenha - Caniço", informou o seguinte: i. "l- A intenção de lotear é viável, aliás, já existe anterior parecer, a quando do pedido de viabilidade e condicionamentos, no entanto, o processo deverá ser revisto, pois o lote l, face às características do terreno e à proximidade com linha de água, fica na prática, com a área livre muito reduzida, assim como não nos parece aceitável a reduzida frente do lote 6.

    ii. 2- Em termos de apresentação do projecto, os elementos apresentados são insuficientes, devendo o processo, após revisto, ser completada com as peças desenhadas e descritivas exigidas pela legislação sobre loteamentos, em vigor. Sugere-se, para além de um levantamento da arborização existente, a indicação das áreas necessárias a abater para a implantação das construções.

    iii. 3- O interessado antes de iniciar quaisquer obras, deverá canalizar o Ribeiro em epígrafe na zona que delimita a sua propriedade, para tanto terá de apresentar um levantamento topográfico de modo que abranja as duas margens do Ribeiro.

    iv. 4- O requerente terá de pagar a quantia de DUZENTOS E QUARENTA ESCUDOS referente à vistoria". - c/r. doc. junto sob o n° l(fls. 450 e 451).

    v. Em face desta informação, o GT da...

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