Acórdão nº 07406/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Junho de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução22 de Junho de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO Manuel ...

, soldado da GNR, veio recorrer do despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, datado de 29-9-2003, que indeferiu o recurso hierárquico por si interposto da decisão de aplicação da pena disciplinar de 40 dias de suspensão, sustentando para o efeito que o mesmo enferma dos vícios de violação de lei e de forma, por erro sobre os pressupostos de facto.

A entidade recorrida respondeu, sustentando que o acto recorrido não padece dos vícios que lhe são imputados, pelo que, em seu entender, o recurso não merece provimento.

Ordenado o cumprimento do disposto no artigo 67º do RSTA, veio o recorrente apresentar alegações, nas quais conclui nos seguintes termos: "

  1. A execução imediata da pena disciplinar na fase administrativa do processo viola os direitos e garantias de defesa mais elementares, tanto mais que não existe ao alcance do recorrente qualquer meio de suspensão de eficácia, revelando-se, pois, violado o artigo 170º do CPA; b) Sendo que, a considerar-se viabilizada tal execução imediata, por via do artigo 124º do RDGNR, o mesmo revela-se inconstitucional, por confronto com o artigo 268º da CRP; c) Estando desprezados os prazos determinados pelos artigos 102º e 105º, nº 4 do RDGNR, precludida se revela a possibilidade de exercício do poder disciplinar pela entidade recorrida, sendo que a consideração de tais prazos como meramente ordenadores, contrariamente ao que ocorre com os prazos determinados aos particulares, viola o artigo 13º da CRP; d) Contendo a decisão punitiva meras considerações conclusivas, sem remissão expressa para as normas legais violadas e ao abrigo das quais se pune, carece a mesma, em absoluto, de fundamentação, estando ferido de vício de forma, nos termos do artigo 125º do CPA; e) Para além de não estarem reunidos elementos de facto integradores dos artigos 9º, nº 2, e 11º, alíneas c) e d) do RDGNR, revelando-se a sanção ferida de vício de violação de lei; f) Tanto mais que não se revela preenchida a integração no Decreto-Lei nº 457/99, de 5 de Novembro, em termos geradores de igual vício; g) A omissão de pronúncia sobre a inconstitucionalidade invocada e sobre o erro sobre os pressupostos de facto por parte da decisão recorrida viola os artigos 6º e 9º do CPA".

    Por seu turno, também a entidade recorrida alegou, concluindo nos seguintes termos: "

  2. A administração está obrigada a cumprir a Lei, não podendo atribuir efeito suspensivo ao despacho impugnado, sob pena de violação do artigo 124º do RDGNR, e do artigo 170º, nº 1, segunda parte, do CPA; b) O despacho punitivo encontra-se devidamente fundamentado pois remete expressamente para as peças processuais relevantes em matéria de fundamentação, que fazem parte integrante daquele despacho, confirmado pelo acto contenciosamente impugnado nos presentes autos; c) Os prazos estabelecidos nos artigos 102º e 105º, nº 4, do RDGNR são meramente ordenadores do procedimento disciplinar, não podendo a sua inobservância provocar a extinção do poder/dever de administrar a justiça disciplinar; d) Os elementos de prova recolhidos nos autos não revelam os menores indícios de que o então arguido, ora recorrente, tenha actuado em estado de necessidade, tendo em consideração o disposto no artigo 35º do Código Penal, subsidiariamente aplicável ao caso em apreço".

    E, finalmente, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer: "O recorrente impugna o acto que negou provimento ao recurso hierárquico da decisão que lhe infligiu a pena disciplinar de 40 dias de suspensão, imputando-lhe os vícios de violação de lei e de forma, por falta de fundamentação.

    Alega, para tanto, em síntese, que viola o artigo 170º do CPA, por não ter conferido carácter suspensivo ao recurso hierárquico, sendo inconstitucional o artigo 124º do RDGNR por afrontar o artigo 268º da Constituição; que a qualificação dos prazos dos artigos 102º e 105º, nº 4, do RDGNR, como meramente ordenadores contrariamente ao que ocorre com os prazos determinados aos particulares, viola o artigo 13º da Constituição; que a decisão contém meras considerações conclusivas; que não estão reunidos elementos de facto integradores do ilícito disciplinar sancionado; e que a falta de pronúncia sobre a questão da inconstitucionalidade suscitada implica a violação do dever de decidir.

    A autoridade recorrida, na resposta e nas alegações, demonstra, em termos que merecem a minha concordância, que o recorrente não tem razão.

    Na verdade, os factos apurados no processo disciplinar integram a matéria infraccional sancionada e não se descortina o vício de fundamentação invocado, pois está suficientemente esclarecida, "per relationem", a motivação do acto.

    Por sua vez, a decisão de não conceder efeito suspensivo ao recurso hierárquico encontra fundamento no citado artigo 124º, que constitui excepção também prevenida pelo artigo 170º, nº 1, do CPA, não havendo razão para o considerar inconstitucional, por alegadamente impedir a defesa dos direitos e interesses legítimos do recorrente - cfr. Acórdãos do TCA, de 22-9-2004, processo nº 0189/04, e de 1-9-2004, processo nº 0208/04.

    Por outro lado, a autoridade recorrida não deixou de decidir o recurso hierárquico e até de se pronunciar sobre a questão de constitucionalidade suscitadas, não violando, pois, o dever de decisão.

    Finalmente, a extinção do procedimento disciplinar pelo decurso dos prazos dos artigos 102º e 105º, nº 4 não tem qualquer fundamento legal, sendo inoperante para esse fim a invocação do princípio da igualdade, pondo em confronto realidades de natureza diversa. Aqueles prazos são meramente ordenadores ou disciplinadores, como entendeu a recorrida - cfr. o Acórdão do STA, de 14-6-2005, processo nº 0108/2005, e a jurisprudência do mesmo tribunal aí amplamente citada, a propósito da generalidade dos prazos deste tipo.

    Parece-me, assim, que o recurso deverá improceder".

    Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência para julgamento.

    1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a decisão, consideram-se assentes os seguintes factos: i.

    Na sequência de uma participação apresentada em 28-10-2002, foi ordenada, por despacho do Chefe do Estado-Maior da GNR, datado de 29-10-2002, a abertura de um processo de averiguações respeitante ao aqui recorrente [Cfr. fls. 2/4 do processo instrutor apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    ii.

    O recorrente foi ouvido no âmbito do processo de averiguações, em 13-11-2002, bem como as pessoas directamente envolvidas [Cfr. fls. 6, 11, 13, 14 e 15 do processo instrutor apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    iii.

    Em 22-11-2002 foi elaborado relatório, propondo a conversão do processo de averiguações em processo disciplinar, o que veio a ser determinado por despacho do Chefe do Estado-Maior da GNR, datado de 29-11-2002 [Cfr. fls. 23/24 e 33 do processo instrutor apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    iv.

    Com data de 17-12-2002, foi elaborada a nota de culpa, com o seguinte teor:"NOTA DE CULPA I - FACTOS PROCESSUALMENTE APURADOS 1. O arguido, soldado de cavalaria [285/811382], Manuel Alves da Fonseca, do Agrupamento de Apoio e Serviços, no dia 27 de Outubro de 2002, no Alto de Stº Amaro, em Lisboa, conduzindo a viatura de matrícula 71-29-GJ, propriedade da GNR, moveu perseguição ao veículo de marca Opel Vectra, matrícula AS-25-62, por, em momento imediatamente anterior, ter sido injuriado pelo seu condutor, Nuno Miguel Lima Peres Rosa [fls. 11, 13, 14 e 19].

    1. Na Rua Leão de Oliveira, em Lisboa, o arguido conseguiu ultrapassar e fazer parar, próximo da Esquadra da PSP do Calvário, o veículo Opel Vectra, saiu da viatura e exibiu a carteira profissional numa mão [fls. 7, 19, 39 e 40].

    2. Na outra mão exibiu o seu revólver de marca Taurus, de calibre 32 [fls. 7, 19, 39 e 40].

    3. No mesmo momento, o Nuno Rosa manobrou o veículo e dirigiu-se para a Esquadra da PSP [fls. 11, 13, 14 e 40].

    4. Devido à manobra, o arguido teve necessidade de saltar para fora do alcance do veículo, caso contrário seria colhido [fls. 7, 11, 13, 14, 19, 39 e 40].

    5. Após a manobra efectuou um disparo para o ar com o seu revólver [fls. 13, 14, 19 e 40].

    6. De seguida, o arguido dirigiu-se à Esquadra da PSP onde já se encontrava o Nuno Rosa e onde ambos prestaram declarações [fls. 8, 11, 13, 14 e 19].

    7. Da conduta do arguido e da sua condição de militar da Guarda tiveram conhecimento directo os agentes da PSP de serviço na Esquadra do Calvário e as testemunhas [fls. 11, 13, 14 e 19].

    8. O arguido encontra-se colocado na 1ª classe de comportamento, com um louvor, foi provocado por parte de terceiro, imediatamente antes da infracção e tem boa informação de serviço do superior hierárquico [fls. 11, 13, 14, 19, 26 e 29].

      II - ACUSAÇÃO 1. A conduta praticada pelo arguido, emergente dos factos processualmente apurados, referidos em 3 e 6 de l deste documento, subsume-se às normas: a. Do artigo 2º, nº 1 do Decreto-Lei nº 457/99, de 05Nov, por recurso à sua arma de defesa pessoal de uma forma desproporcionada às circunstâncias e não tendo absoluta necessidade de o fazer; b. Do artigo 13º, nº 3, a) do Decreto-Lei nº 265/93, de 31 Jul [EMGNR] e do artigo 30º, nº 1 a) do Decreto-Lei nº 231/93, de 26Jun [LOGNR], por ter utilizado a arma sem ter por fim repelir uma agressão iminente ou em execução, em defesa própria; c. Do artigo 7º, nº 1 da Parte III da Portaria nº 722/85, de 25Set [RGSGNR], por recorrer à sua arma fora das circunstâncias de legítima defesa.

    9. Desta forma, desrespeitou os seguintes deveres a que se encontra adstrito: a. Dever de obediência por violação do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 9º do RDGNR, aprovado pela Lei nº 145/99, de 01Set, em virtude de não ter observado completa e prontamente as leis e regulamentos.

  3. Dever de proficiência por violação da alínea c) do nº 2 do...

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