Acórdão nº 621/04-2 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Junho de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução03 de Junho de 2004
EmissorTribunal da Relação de Évora

* **Acordam em Conferência os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: Apelação: 2ª Secção Tribunal Judicial da Comarca de ....... - 3º Juízo Cível - Proc. n.º 2/2000 Recorrentes: A.. e B....

Recorridos: A.. e B....

* **A..., solteiro, ......, residente em ......... veio propor acção declarativa de condenação com processo ordinário contra, B..., divorciada, comerciante, residente ............pedindo: a título principal, que seja declarado que entre autor e a ré foi celebrado um contrato de mandato sem representação; que a ré desobedeceu injustificadamente ao disposto no nº 1 do artigo 1181 do Código Civil não tendo até à data transferido para o autor os direitos de propriedade dos imóveis descritos na Conservatória do Registo Predial de Loulé, com os números 04246 e 04249 da freguesia de Almancil e, que seja declarado que a sentença produz os mesmos efeitos que uma declaração negocial de venda ao autor pela ré, declaração que está em falta e cuja causa é o contrato de mandato, transmitindo-se deste modo, por efeito da sentença, o direito de propriedade sobre os referidos imóveis para a esfera jurídica do autor.

Subsidiariamente, caso não se entenda que a qualificação do contrato como contrato de mandato sem representação é a correcta, deverá a sentença declarar que entre autor e ré foi celebrado um contrato de promessa de compra e venda que não foi cumprido pela ré, cuja obrigação é susceptível de execução específica, devendo a sentença produzir os mesmos efeitos negociais da declaração de venda da ré, promitente faltosa.

E, que a não se admitir a possibilidade de execução específica do contrato, dever-se-á considerar que o contrato se encontra resolvido por incumprimento definitivo imputado à ré, condenando-se a pagar ao autor todas as quantias por este já pagas, no montante total de Esc. 10.864.617$00 e em todas as outras que também já pagou, acrescidas das que vier ainda a pagar, cujo total será apurado em sede de liquidação de sentença, bem como no pagamento de indemnização no total de trinta milhões de escudos, tudo acrescido de juros de mora legais sobre as quantias já vencidas e nas vincendas.

Por último, pede, caso se conclua pela improcedência de todos os pedidos acima formulados, que a ré seja condenada a restituir ao autor todas as quantias em dinheiro que foram por este adiantadas e entregues à ré por conta do negócio celebrado entre ambos, com fundamento em enriquecimento sem causa da ré, acrescidas dos juros legais vencidos e vincendos após a citação e até integral pagamento.

Para tanto alega, em suma, que autor e ré viveram desde Janeiro de 1994 a Setembro de 1996 como se de marido e mulher se tratassem e no decorrer desse período o autor decidiu adquirir a propriedade de um prédio rústico da freguesia de Almancil e de um prédio urbano da mesma freguesia, com o intuito de no terreno resultante da junção dos dois prédios, construir um complexo habitacional com várias lojas e escritórios. Sucede que, para tanto, não tinha o dinheiro necessário para pagamento do preço e precisava de financiamento bancário, tendo a ré convencido o autor que deveria ser ela a pedir o financiamento como se fosse a compradora dos imóveis embora, na realidade pretendessem ambos que fosse o autor o verdadeiro comprador e a pessoa que sustentaria todas as despesas inerentes à aquisição. Assim, combinaram que a ré figuraria como promitente compradora dos prédios em todos os actos negociais tendentes à aquisição e que posteriormente transferiria o direito de propriedade para a titularidade do autor de forma adequada e que todas as despesas necessárias à aquisição do prédio seriam pagas pelo autor, incluindo o pagamento do financiamento bancário.

Pelo que em concretização do acordado, a ré outorgou em 29 de Outubro de 1996, procuração através da qual lhe concedeu poderes para em seu nome negociar a compra dos prédios já identificados, o que foi efectuado pelo autor, tendo celebrado em 13 de Janeiro de 1997 um contrato de promessa de compra e venda sobre os referidos prédios.

Acontece que em 30 de Abril de 1997, a ré sem o conhecimento do autor, celebrou a escritura de compra e venda e de mútuo com constituição de hipoteca sobre os referidos prédios e registou-os em seu nome.

E, em 24 de Julho de 1997, autor e ré celebraram um contrato que apelidaram de promessa de compra e venda em que reconhecem que a ré é dona e legítima possuidora dos dois prédios em causa nos autos e esta promete ceder todos os direitos sobre esses prédios ao autor ou a quem este indicasse e, em contrapartida dessa cedência o autor comprometeu-se a responsabilizar-se e a garantir o cumprimento do contrato de mútuo celebrado entre a ré e o BNU, tendo o autor nessa mesma data pago a quantia correspondente a duas mensalidades do empréstimo bancário, no montante total de Esc. 375.300$00 e desde então tem vindo a pagar as mensalidades referentes ao pagamento do empréstimo bancário, depositando ou transferindo quantias em dinheiro para a conta que a ré abriu para o efeito no BNU de Loulé.

Pagou, ainda, o autor outras quantias em dinheiro relativas à aquisição do prédio, contudo a ré não concretizou a transferência da titularidade dos prédios para a esfera jurídica do autor nem envidou qualquer esforço de modo a transferir para o autor a sua posição no contrato de mútuo que celebrou com o BNU e recusa-se a fazê-lo.

Pelo que conclui pela procedência dos pedidos efectuados.

Devidamente citada veio a ré contestar dizendo, em suma, que é verdade o que autor alega relativamente ao relacionamento amoroso havido entre ambos e que a ré decidiu comprar os referidos terrenos para satisfazer a vontade do autor, uma vez que tinha crédito junto da banca, o que não acontecia com o autor à data dos factos e, efectivamente, dispôs-se depois a vendê-los ao autor pelo mesmo preço que os adquirira desde que este cumprisse o contrato e assumisse todas as obrigações e encargos relativos ao empréstimo bancário celebrado.

Reconhece, também, que em vista à aquisição dos prédios outorgou uma procuração a favor do autor de modo a que este pudesse negociar tal aquisição, o que realmente ocorreu nos termos relatados pelo autor e que celebrou com este um contrato promessa de compra e venda com transferência de mútuo em Julho de 1997, contudo assinou tal contrato sem se aperceber da existência de uma cláusula indemnizatória no valor de trezentos milhões de escudos, obrigação que não corresponde à real vontade da ré, tendo o autor enganado a autora de modo a obter a sua assinatura em tal contrato.

Alega, ainda que o autor não cumpriu pontualmente as obrigações assumidas perante a ré, pelo que foi obrigada a resolver o contrato com justa causa, por falta de cumprimento, tendo o autor, só depois de tal resolução, comparecido, manifestando vontade de celebrar a escritura definitiva de compra e venda.

Pelo que conclui que deve ser absolvida de todos os pedidos efectuados, declarando o Tribunal resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre o autor e a ré, considerando consequentemente perdidas todas as quantias prestadas pelo autor.

E, sem conceder, pede que seja declarada nula e de nenhum efeito a clausula penal estabelecida no contrato promessa com o nº 11 e que o autor seja condenado como litigante de má fé, por utilização tortuosa do presente processo, no pagamento de uma indemnização à ré no valor pelo menos de dez milhões de escudos.

O autor veio apresentar réplica alegando que a ré defende-se por excepção quando afirma que o autor a enganou, o que aquele contesta, dizendo que todas as cláusulas do contrato foram objecto de discussão e posterior acordo entre as partes, que a ré percebe muito bem o português, uma vez que vive em Portugal há cerca de vinte anos, e que o contrato foi lido pelo notário em voz alta e o respectivo conteúdo explicado à ré.

Mais, diz que sempre cumpriu com o acordado, continua a pagar o financiamento pedido ao banco e, finaliza, pugnando pela improcedência das excepções deduzidas pela ré e, ainda, a condenação da ré como litigante de má fé em quantia não inferior a um milhão de escudos.

A fls. 183 dos autos veio o autor apresentar articulado superveniente dizendo que em 26-06-2000, o Banco Nacional Ultramarino informou o autor que a ré tinha dado instruções para não efectuar qualquer crédito referente a transferências da conta do autor para a conta da ré e que foram transferidas, por ordem da ré, para a conta do autor montantes em dinheiro relativos a pagamentos efectuados pelo autor por conta das prestações relativas ao mútuo. A fls. 199, em resposta, veio a autora dizer que o ora aduzido pelo autor corresponde à verdade, tendo procedido à devolução de tais quantias e recusado o recebimento de prestações vincendas porque considera resolvido o contrato desde 20 de Janeiro de 1999, por incumprimento da parte do autor, tendo procedido à sua devolução apenas em tal data por ter estado até então a aguardar a possibilidade de efectivação de um acordo com o autor.

Os autos foram objecto de saneamento.

A fls. 241, veio o autor deduzir ampliação do pedido principal, ao abrigo do disposto no artigo 273 do Código de Processo Civil, nos seguintes termos: caso se entenda que o contrato celebrado entre autor e ré constitui um contrato de mandato sem representação, poderá o Tribunal entender, como alguma jurisprudência mais recente, que o pedido de execução específica não é adequado à transferência de direitos, adquiridos em execução de mandato sem representação, sendo apropriada a condenação do mandatário a transferir, por qualquer modo legal, esses direitos para o mandante. Pelo que, assim sendo, o autor pode pedir ao Tribunal, nos termos do disposto no artigo 829-A do Código de Processo Civil que a ré seja condenada no pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso verificado no cumprimento da sentença que condenar a autora a transferir para o autor o direito de propriedade sobre os prédios que adquiriu em...

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