Acórdão nº 11871/2005-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Maio de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução09 de Maio de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 5ª SECÇÃO (PENAL) DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I-RELATÓRIO 1.1- No processo supra, finda a instrução requerida pela assistente por discordar de anterior despacho de arquivamento do MºPº, foi proferido despacho judicial a 27 de Junho de 2005 no sentido de : " Não pronunciar os arguidos Rui … e João … pela prática, em autoria material, de factos integradores do cometimento de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo art.º 205º/1, do Código Penal, e de um crime de infidelidade, previsto e punido pelo art.º 224º/1, do mesmo diploma legal." Já antes, em sede de inquérito, o MºPº determinara, em síntese: " A ofendida e o arguido Rui … são sócios da Sociedade por Quotas , denominada Snack Bar, Lda, como consta certidão junta a fls. 97 e ss.

Analisando os factos denunciados, bem como os elementos recolhidos, verifica-se que os mesmos são susceptíveis de se prenderem com o eventual impedimento do exercício do direito de sócio, neste caso da sócia-gerente Ana…, por parte do sócio Rui … .

Ora a "solução" para a questão não passa, a nosso ver, pela jurisdição criminal, mas sim cível.

Com efeito, o Código das Sociedades Comercias prevê, nos art°s 197° e ss, as obrigações e direitos dos sócios, designadamente no art° 214° o direito à informação, bem como a forma do exercer, recorrendo, se necessário, à realização de um Inquérito judicial, nos termos dos art°s 216° e 292°, do mesmo código.

Contudo, o exercício de tal direito, tem sempre lugar nos Tribunais Cíveis .

Pelo exposto, determina-se o arquivamento dos autos, nos termos do disposto no art° 277° n° 1, do C.P.P." 1.2- A assistente Ana… veio recorrer para esta Relação daquele despacho de não pronúncia, com as seguintes conclusões da motivação que apresentou: "1ª-O arguido Rui … é gerente da sociedade Snack Bar Lda, com sede …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial do Seixal sob o n°05817/001109.

  1. -Através de contrato de sublocação celebrado com G… a sociedade assumiu a posse do mesmo local, nele desenvolveu obras com vista à instalação e funcionamento de um estabelecimento comercial de café e snack bar, 3ª- Obras que, em material, representaram um encargo de cerca de 2.000€ acrescidos dos custos com pessoal.

  2. -Após a finalização destas obras de adaptação do local - com colocação de madeiras, tecto falso e balcão - a sociedade, apetrechada com mobiliário e maquinaria adequados ao ramo de actividade em questão, iniciou actividade de exploração do café e snack bar, a partir de Maio de 2001 até final de Dezembro de 2002.

  3. -O arguido Rui …, não obstante ser gerente da sociedade Snack Bar, Lda, titular do direito de subarrendamento relativo às instalações do estabelecimento comercial da sociedade veio, no final de 2001, fazer cessar o referido contrato, celebrando, em sua substituição, em 01.01.2002, com a sublocadora - G… - um novo contrato de sublocação relativamente ao mesmo local, sendo este agora celebrado a seu favor e não em nome da sociedade.

  4. -Para tanto e conforme declarações prestadas pela Sublocadora, G…, prestadas no âmbito do inquérito, comunicou o arguido Rui … à Sublocadora que os demais sócios da sociedade haviam desistido, perdendo interesse na manutenção do contrato então vigente.

  5. -Tendo em simultâneo, referido expressamente no contrato que veio a celebrar datado de 01.01.2002 e que se encontra junto aos autos que o mesmo contrato reflectia a situação real vigente em 2001, já que era ele que pagava as rendas da loja na qual funcionava o estabelecimento comercial da sociedade; 8ª-Desde a data em que celebrou o mencionado contrato de sublocação a seu favor, o arguido Rui … passou a explorar o estabelecimento comercial de café e snack bar em seu nome pessoal e em proveito próprio conforme se encontra indiciado pela circunstância de os talões emitidos pela caixa registadora (encontrando-se um deles junto aos autos pela Assistente) revelarem que a receita realizada é imputada ao Rui …, contribuinte fiscal n°. 177518570 e não à sociedade … .

  6. -Desde Janeiro de 2002, apropriou-se o Rui … de todos os bens móveis que compunham o recheio do estabelecimento comercial aí instalado.

  7. -Tendo posteriormente e já fazendo uso da qualidade de sublocatário que lhe assistia, transmitido o estabelecimento comercial com todo o recheio a terceiros.

  8. - Com efeito, após um período de encerramento no qual foi aposto um cartaz nas portas da fracção - cuja fotografia se encontra junta aos autos - com o aviso " Nova gerência", funciona actualmente outra sociedade naquele local.

  9. - Tendo a sociedade comercial … por exclusiva actividade a exploração do café e snack-bar que instalou na morada acima indicada, desde Janeiro de 2002, esta sociedade não possui actividade.

  10. -Não existindo quaisquer registos contabilísticos relativos ao período posterior a Dezembro de 2001; 14º-Em virtude da conduta do arguido Rui …, actualmente esta sociedade - sem actividade e desprovida de sede - não possui qualquer património.

Resultam dos autos indícios suficientes para que o arguido Rui … seja pronunciado pela prática de crime de abuso de confiança e de infidelidade, p. p., respectivamente, pelos artigos n°s 205° e 224° n.° 1 do Código Penal.

Nestes termos deverá o presente recurso ser considerado procedente e, em consequência, ser revogada a douta decisão recorrida, substituindo-se por uma outra que pronuncie o arguido Rui … pela prática de crime de abuso de confiança e de infidelidade, p. p., respectivamente, pelos artigos n°s 205° e 224° n.° 1 do Código Penal." 1.3- Em resposta, contraalegou o MºPº e rematou em síntese: "…A norma do artº 205º do Código Penal visa proteger o direito de propriedade de coisas móveis alheias , entregues sem título translativo , em razão de confiança e, ao fazer sua a coisa, trai a dita confiança , o que não aconteceu no caso presente.

No que diz respeito ao crime de infidelidade, p. e p. pelo artº 224º do Código Penal, só pode ser agente de tal crime aquele a quem foi confiado, por lei ou acto jurídico, o encargo de administrar interesses patrimoniais alheios o que, manifestamente não aconteceu no caso presente.

O despacho recorrido não violou qualquer preceito legal, designadamente as normas invocadas pela recorrente.

Deve ser rejeitado o recurso interposto nos autos e mantida a decisão de não pronúncia .

Por sua vez nesta Relação o MºPº sugeriu se convidasse a recorrente para cumprir com o artº 412º nº 2 do CPP.

No despacho preliminar entendeu-se ser desnecessário tal convite pois que do recurso se percebe, apesar da sua imperfeição, que a recorrente entendeu que estavam preenchidos dois crimes ( abuso de confiança e de infidelidade) que tipificou e que os factos em sua opinião indiciados deviam ter sido subsumidos às normas incriminadoras (artº 205 e 224º do CP), divergindo pois da interpretação dada pelo tribunal.

No fundo, entendeu-se que estava em causa a indiciação de factos suficientes para conduzirem à prolação de pronúncia nos termos juridico-penais categorizados...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT