Acórdão nº 973/10.5 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11-01-2024

Data de Julgamento11 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão973/10.5 BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I - RELATÓRIO

1. A FAZENDA PÚBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, proferida em 18/05/2023, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por R......., contra o indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra o deferimento parcial da reclamação graciosa que teve por objeto a retenção na fonte de IRS, referente ao ano de 2006, no montante de € 34.565,89, efetuada aquando do pagamento pela seguradora G....... do montante previsto no contrato de seguro existente entre a G....... e a TAP (entidade patronal do impugnante, ora recorrido)

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I) Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pelo ora impugnante, devidamente identificado nos autos, contra o indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra o deferimento parcial da reclamação graciosa que teve por objeto a retenção na fonte de IRS, referente ao ano de 2006, no montante de € 34.565,89, efetuada aquando do pagamento pela seguradora G....... do montante previsto no contrato de seguro existente entre a G....... e a TAP (entidade patronal do impugnante).

II) A questão a analisar nos presentes autos consiste em saber se a retenção na fonte, em sede de IRS, efetuada pela seguradora G....... Seguros de Vida SA aquando do resgate de capital por parte do Impugnante se revela em conformidade com o artigo 2.º, n.º 3, alínea b), do CIRS, ou, se pelo contrário, não se inclui no âmbito de aplicação desta disposição.

III) O Mmo. Juiz a quo na douta sentença recorrida entendeu que “podemos afirmar que tendo o impugnante efetuado o resgate do fundo aos 60 anos de idade, na data em passou à reforma, não ocorreu qualquer antecipação de recebimento do mesmo, motivo pelo que as importâncias recebidas não são enquadráveis, no exposto na subalínea 3) da alínea b) do n.º 3 do art.2º do CIRS.

IV) Ora, não pode a Recorrente, Fazenda Pública, com o devido respeito, concordar com tal segmento decisório, face à interpretação da lei aplicável ao caso em apreço.

V) Como emerge do ponto 7 do probatório: “Em 17.08.2006 a empresa seguradora “G....... SA.,” emitiu em nome do impugnante, ao abrigo do contrato de seguro, dois documentos intitulados “Quitação de Resgate”, no montante total de €139.272,87 e retenção na fonte da Categoria “A” €34.565,89 e Categoria “E” €2.307,55, cfr. doc. fls. 13 e 14 do Processo de Reclamação Graciosa”.

VI) Importa assim apreciar se se verificam os pressupostos que determinam a aplicação do artigo 2.º, do CIRS, na componente que aqui releva, à data do facto tributário, ou seja em 17 de agosto de 2006.

VII) Preceituava o artigo 2.º, n.º 3, alínea b), do CIRS “Rendimentos da categoria A” (na redação à data dos factos) que se consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente as remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica, designadamente: “3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo ‘Vida’, contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado;”

VIII) Da norma transcrita extrai-se que são objeto de tributação os rendimentos que decorram de importâncias despendidas pela entidade patronal com seguros e operações do ramo ‘Vida’, que não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos beneficiários, sejam por estes recebidas, ainda que já tenham passado à situação de reforma.

IX) A parte final da subalínea 3) é especialmente incisiva, quando comina que esses rendimentos são tributados “em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado” (sublinhado nosso).

X) Este segmento tem uma implicação imediata, a antecipação da disponibilidade do capital não constitui a condição determinante para a tributação ou não destes rendimentos.

XI) O trecho final da norma prescreve que a tributação incide sobre esses rendimentos “em qualquer caso, de recebimento de capital”.

XII) Ora, o Impugnante recebeu o capital, em 17 de agosto de 2006, pelo que esses rendimentos estão sujeitos a tributação, em sede de IRS.

XIII) A este respeito, o Supremo Tribunal Administrativo já decidiu que “Nos termos do ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS (na redacção vigente ao tempo), as importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição a favor dos seus trabalhadores de seguros de vida, se estes forem objecto de resgate antecipado pelos beneficiários são considerados rendimentos do trabalho dependente sujeitos a tributação (categoria A) ainda que os beneficiários, à datado resgate antecipado, reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem, efectivamente, nessa situação.” (acórdão, de 13 de dezembro de 2017, processo n.º 0303/17).

XIV) No caso dos autos, está evidenciado que, na data do pagamento, o tomador de seguro era a TAP, entidade patronal do Impugnante, que este efetuou o resgaste do seguro de vida, que se traduziu num recebimento em capital, que não constituía um seu direito adquirido e individualizado, independentemente de estarem reunidos os requisitos aplicáveis para passar à situação de reforma ou mesmo de já estar reformado.

XV) A ser assim, como resulta dos factos provados, conclui-se que estão preenchidos os requisitos que convocam a aplicação do normativo transcrito e que determinam a sujeição a tributação, em sede de IRS, dos montantes recebidos pelo Impugnante e que a entidade pagadora, nos termos legais, deduziu a título de retenção na fonte.

XVI) Face ao supra exposto, pugna a Fazenda Pública pelo entendimento de que o ato tributário ora impugnado se deve manter na ordem jurídica, porquanto não enferma da ilegalidade que lhe assacou a douta sentença recorrida, afigurando-se que a atuação da Administração Tributária foi conforme à lei.

XVII) Conclui a Fazenda Pública que o Tribunal a quo errou no seu julgamento de facto e direito, enfermando a sentença de uma errónea apreciação dos factos relevantes para a decisão e de uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas excelências suprirão, e atento aos fundamentos expostos, deve o presente Recurso ser dado como procedente, e em consequência ser revogada a decisão recorrida e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente

3. O Recorrido, R......., apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

«a) A Recorrente apresenta um corpo alegatório composto por 22 artigos e depois abrilhanta tal articulado com 17 conclusões, o que viola de forma grosseira o artigo 639º do CPC.

b) Pelo que o recurso, nos termos em que foi apresentado, deve ser rejeitado.

c) Como se alcança do probatório fixado, que a Recorrente não coloca em causa pelo que nem sequer pode ser alvo de alteração nesta sede recursória, o Recorrido efectuou o resgate da parte que lhe cabia no fundo após perfazer 60 anos de idade, e era nessa idade que o podia fazer por passar à reforma (ponto 1.3 dos Princípios subjacentes à Apólice), pelo que tendo-o o feito nesse momento temporal fê-lo sem que tenha ocorrido qualquer antecipação.

d) Antecipação ocorreria se o tivesse feito aos 556, 57, 58 ou 59 anos de idade, o que aquele não fez como se encontra documentalmente provado nos autos.

e) Para que ocorresse tributação era condição sine qua non que houvesse uma antecipação no resgate em relação à data prevista no contrato de seguro e contra isto nem se adverse com o segmento do referido preceito do CIRS que assim reza:

«ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.»

f) Pois que a norma em causa tem a seguinte redacção:

«3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.»

g) O preceito, embora de leitura difícil, permite identificar duas situações matriz, a saber:

I) A de direitos adquiridos e individualizados;

II) A de não existência de direitos adquiridos e...

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