Acórdão nº 940/11.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 16-03-2023

Data de Julgamento16 Março 2023
Ano2023
Número Acordão940/11.1BESNT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I. RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada por R… e C… contra o acto de indeferimento do pedido de retroacção a 2005 do valor patrimonial tributário, bem como isenção de IMI, relativamente ao imóvel em que residem.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
«
A. Salvo o devido respeito, por opinião diversa, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.

B. No caso em apreço, não pode a Fazenda Pública concordar com o entendimento do douto Tribunal, que decidiu que a AT, ao ter constatado que existia erro dos serviços ao estabelecer o VPT inicial, deveria ter feito retroagir os efeitos do novo VPT calculado em 2010 e corrigido as liquidações de IMI, até ao limite dos quatro anos anteriores ao do pedido.

C. Salvo o devido respeito, que é muito, o douto Tribunal, fez tábua rasa ao preceito legal aplicável no caso apreço, nomeadamente o n.º 8 do artigo 130.º do CIMI, que expressamente proíbe o efeito retroativo das alterações do VPT.

D. Salvo melhor entendimento, o legislador tentou impedir o efeito retroativo quanto às liquidações já realizadas, no que concerne às alterações às matrizes, resultantes das reclamações feitas nos termos do artigo 130.º do CIMI.

E. Por sua vez, determina o n.º 1 do artigo 9.º do CC, que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

F. O n.º 2 do mesmo artigo estipula que não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

G. Salvo a devida vénia, o douto Tribunal, ao decidir como decidiu, foi além da letra da lei, tentando “abrir uma porta” para que as liquidações nunca se consolidem, bastando, uma qualquer alteração ao VPT, para que todas as liquidações anteriores sejam alteradas, pondo em causa, o princípio da segurança jurídica.

H. Ao decidir como decidiu, o douto Tribunal violou o artigo 130.º n.º 8 do CIMI, o artigo 9.º do CC bem como o princípio da segurança jurídica.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!».

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, que terminam com as seguintes e doutas conclusões:
«
1. Salvo melhor opinião, o recurso sob resposta carece na sua integralidade de qualquer fundamento.
2. Com efeito, importa notar que os impugnantes não deduziram qualquer reclamação, nem tão pouco tal meio de reação consta dos factos dados como assentes na sentença proferida pelo tribunal a quo, como se alcança dos pontos 14 a 16 da matéria de facto dada como provada,
3. nem sequer da prova documental arrolada nos autos, como se prova nomeadamente do teor do doc. 5 junto com a impugnação judicial deduzida pelos impugnantes, e do qual se constata que estes apenas se limitaram a solicitar o reembolso do IMI pago excesso, bem como requereram a isenção do mesmo imposto,
4. não podendo assim, salvo melhor opinião, tal ser qualificado como uma reclamação nos termos e para os efeitos do artigo 130.º do CIMI.
5. Na verdade, o pedido formulado pelos impugnantes, consubstancia-se num pedido de revisão dos actos tributários, nos termos e para os efeitos dos n.ºs 1 e 7 do artigo 78.º da LGT, tendo igualmente previsão no artigo 115.º do CIMI,
6. ao abrigo do qual, os impugnantes solicitaram a revisão oficiosa do acto tributário na prerrogativa que lhes assiste, e consubstanciada no prazo de quatro anos após a liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços,
7. sendo que, é absolutamente pacifico, quer na doutrina, quer na jurisprudência, que só o pedido de revisão do acto tributário feito no prazo de uma reclamação administrativa é que é qualificado como uma verdadeira reclamação, e não a que é solicitada a pedido do contribuinte, como foi o caso dos presentes autos.
8. Acresce que, delimitando o legislador no CIMI os institutos da revisão oficiosa e da reclamação, forçoso será concluir que estamos perante duas realidades jurídicas distintas, cujos efeitos da reclamação não são aplicáveis à revisão oficiosa.
9. Por tal motivo, não recai sobre o regime jurídico previsto nos artigos 78.º da LGT e 115.º do CIMI qualquer inibição de se restituir verbas indevidamente pagas a título de liquidação de impostos.
10. Acresce ainda que, aquando da elaboração da informação n.º 75/11 da Direcção de Serviços de Avaliações, na qual a impugnada não deferiu o pedido de reembolso do IMI pago indevidamente pelos impugnantes, encontrava-se em vigor a redação anterior à Lei n.º 64-B/2011 - 30/12, na qual não se considerava reclamação as correções promovidas pelo chefe do serviço de finanças competente.
11. Por conseguinte, reconhecendo a impugnada que os seus serviços tinham laborado em erro na fixação do VPT inicial, e tendo recebido quantias indevidas, tal, para além, de constituir uma situação de enriquecimento sem causa, obrigava a Autoridade Tributária a rever esse acto, mesmo que depois de expirado o prazo de reclamação graciosa,
12. atento os princípios da legalidade, justiça e igualdade que sobre a impugnada recaem, nos termos do n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa.
13. Por tal motivo, e com respaldo no regime da revisão oficiosa, impunha-se, pois, não só que a impugnada restituísse o indevidamente pago, mas também que revogasse para o futuro os efeitos do acto de liquidação.
Nestes termos, e nos mais de direito, deverá o recurso sob resposta ser julgado improcedente, por não provada, e, em consequência, ser confirmada a decisão proferida pelo tribunal recorrido, com todos os efeitos legais.».

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer concluindo ser de manter o julgado, por a decisão sob recurso não padecer de quaisquer vícios, nomeadamente os que lhe vêm imputados.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à...

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