Acórdão nº 932/08.8 BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-12-19

Ano2023
Número Acordão932/08.8 BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

E. S. E M. B., vieram interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e fiscal de leiria, que julgou a impugnação judicial, deduzida contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), e respetivos Juros Compensatórios (JC) respeitantes aos anos de 2004 e 2006, improcedente quanto ao pedido de anulação do imposto e procedente quanto ao pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º, nº1, alínea a), da LGT.


***

O Recorrente veio apresentar alegações aperfeiçoadas, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

1 - Na Sentença recorrida e na parte em que julgou improcedente a impugnação apresentada pelos Impugnantes/Recorrentes quanto ao pedido de anulação dos impostos, procedeu-se a uma errada selecção e apreciação da matéria de facto e, nela, fez-se um julgamento incorrecto de pontos essenciais da matéria de facto que determinou o incorrecto julgamento do pedido de anulação da$ liquidações dos impostos e, consequentemente, a prolação de uma decisão de direito errada e,

também ela, profundamente injusta,

Vejamos:

2 - Face ao alegado nos artigos 27°, 29°, 30° e 31° da Petição Inicial de Impugnação Judicial apresentada pelos Impugnantes, conjugado com os instrumentos legais para que remeteram (o Despacho Ministerial n.° 83, de 19 de Agosto de 1964; o Decreto-Lei n.° 44.894, de 21 de Fevereiro de 1963, em particular, o seu art.° 1°; e o Despacho do Ministro da Defesa Nacional, de 7 de Junho de 1963) e, ainda, de acordo com os elementos constantes dos autos, impunha-se ao Tribunal a quo dar, também como provados, os seguintes factos essenciais para a boa decisão da causa:

i) Desde 6 de Maio de 1965 que Depósito de Munições NATO de Lisboa é uma Infraestrutura NATO;

ii) As remunerações auferidas pelo Recorrente/lmpugnante marido decorrentes do serviço que este presta àquela Infraestrutura são suportadas, na íntegra, pelos fundos próprios da NATO;

iii) As despesas resultantes da manutenção e funcionamento das Infraestruturas NATO (onde se incluem as remunerações dos seus funcionários) são encargos da NATO;

iv) O Estado Português (através da Marinha de Guerra Portuguesa - Ministério da Defesa Nacional) serve de mero intermediário no adiantamento do pagamento das remunerações, sendo depois reembolsado pela NATO.

3 - Factos estes que, ao abrigo do disposto no art.° 712° do C.P.C. (aplicável ex vi art.° 281°do C.P.P.T), deverão Vossas Excelências considerar como provados.

Corrigida a matéria de facto considerada como provada e essencial (para a boa decisão da causa, resulta que

iii) as remunerações por aquele auferidas pelo trabalho prestado à IDMNL são encargo da NATO; e

iv) os valores de € 27.737,69 e € 29.998,36 declarados pelos Recorrentes/ Impugnantes nos Anexos H referentes aos anos de, respectivamente, 2004 e 2006 dizem respeito, exclusivamente, a rendimentos de trabalha prestado pelo Recorrente/lmpugnante marido à NATO.

O que, como a seguir se demonstrará, impunham (e impõem) uma decisão diferente da contida na Sentença recorrida.

Assim:

6 - A NATO foi criada pelo Tratado do Atlântico Norte, assinado em Washington, em 4 de Abril de 1949.

Para além deste Tratado e em complemento, foram celebradas as seguintes as Convenções e protocolos de âmbito mais restrito:

i) Convenção de Londres - Convenção entre Estados, assinada de 19 de Junho de 1951, relativa ao estatuto das suas forças armadas;

ii) Convenção de Ottawa-Convenção sobre o estatuto da organização, representantes nacionais e pessoal internacional, assinada em 30 de Setembro de 1951;

e iii) Protocolo de Paris - Protocolo sobre o estatuto de quartéis-generais militares internacionais, assinado em 28 de Agosto de 1952.

7- Em qualquer um destes três Tratados (verdadeiros Tratados de direito Internacional, porquanto foram sujeitos quer a aprovação da Câmara Representativa, quer a ratificação do Presidente da República e, ainda, a publicação no Diário da República de 8 de Agosto de 1955), existe norma de isenção tributária.”

A saber:

Estipula o n.° 1 do art.° X da Convenção de Londres que “os membros de uma força ou de um elemento civil serão isentos, no Estado local, de qualquer imposto sobre os vencimentos e emolumentos que lhes sejam pagos, naquela qualidade, pelo Estado de origem.

Por seu turno, o primeiro parágrafo do art.° 19° da Convenção de Ottawa determina que os funcionários da NATO “serão isentos de impostos sobre os vencimentos e emolumentos que lhes forem pagos pela Organização, na qualidade de funcionários desta”.

E, nos termos do segundo parágrafo do mesmo art.° 19°, "um Estado membro e o Conselho, actuando em nome da Organização, poderão concluir acordos que permitam àquele Estado recrutar e afectar à Organização os seus próprios nacionais, que devem fazer parte do pessoal internacional desta”.

Por último, o Protocolo de Paris estabelece no seu art.° 7.º, n.° 1, que "a isenção de impostos concedida no artigo X da Convenção aos membros de uma força ou de um elemento civil no que respeita aos seus vencimentos e emolumentos aplica-se, no caso do pessoal dos Quartéis-Generais Interaliados abrangidos pelas definições dadas nos parágrafos 1, (a) e (b), (i) do artigo 3 do presente Protocolo, aos vencimentos e emolumentos que lhes são pagos nessa qualidade pela força armada a que pertencem ou pela qual são empregados, com a reserva todavia de que a isenção concedida em Virtude deste parágrafo aos referidos membros ou empregados hão se aplica aò imposto cobrado pelo país cuja nacionalidade têm.”

E,

Ao nível do direito interno português, o art.° 35°. n.° 1. al. b). do Estatuto dos Benefícios Fiscais (com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 3 de Julho, e pela Lei n.° 109-B/2001, de 27 de Dezembro) estipula que o pessoal ao serviço de organizações estrangeiras ou internacionais, quanto às remunerações auferidas nessa qualidade, fica isento de IRS, nos termos do direito internacional aplicável.

Resulta, assim, que são pressupostos da isenção em apreço, apenas e só. os seguintes:

i) a isenção estar prevista em direito internacional aplicável ou haver reciprocidade; ii) tratar-se de membro do quadro de pessoal ao serviço de organizações estrangeiras ou internacionais; e iii) as remunerações serem auferidas nessa qualidade.

9 - Pressupostos que, no caso dos autos, estão reunidos.

O que significa que

10-O Recorrente/lmpugnante marido adquiriu o direito à isenção em 1 de Novembro de 1985 (data em que passou a integrar os quadros de pessoal civil da Infraestrutura NATO).

Sendo que

11 A conversão da isenção prevista no art.° 1 do Decreto-Lei r.° 45.843, de 1 de Agosto de 1964, operada pela al. b) do n.° 1 do art.° 2o do Decreto- -Lei n.° 215/89, de 1 de Julho, é suficiente para que as remunerações auferidas pelo Recorrente/lmpugnante marido por trabalho prestado à NATO estejam isentas de IRS. Por tudo isto,

12- Não restam quaisquer dúvidas que, tendo o Recorrente/lmpugnante marido adquirido, como adquiriu, o direito à isenção em 1 de Novembro de 1985 (data dm que passou a integrar o quadro de pessoal civil da Infraestrutura NATO), este direito manteve-se e mantém-se ainda em vigor.

Impondo-se, assim, como necessária, a conclusão de que

13 - Os rendimentos do Recorrente/lmpugnante marido auferidos enquanto membro do quadro de pessoal civil do Depósito de Munições NATO de Lisboa não estavam, nem estão, sujeitos a tributação de IRS, sendo este benefício fiscal automático, porquanto resulta directa e imediatamente da lei (art.ºs X da Convenção de Londres, 19° da Convenção de Ottawa, 1o do Decreto-Lei n.° 45.843, de 1 de Agosto de 1964, e 35°, n.° 1, al. b), do EBF), não carecendo, por isso, de actos de reconhecimento da isenção por parte da Administração Fiscal (art.º 4º n.° 1, do EBF, e art.° 65°, n.° 1, da LGT, a contrario).

O que significa que,

14 - Ao não se considerar, nas liquidações sub judice, a isenção legal, está-se a impor aos Recorrentes/lmpugnantes o pagamento de um imposto ilegal, violando, assim:

- o art.º X da Convenção de Londres;

- o art.° 19° da Convenção de Ottawa

- o art.° 8° da Constituição da República Portuguesa;

- o art.° 1.º do Decreto-Lei n.° 45.843, de 1 de Agosto de 1964;

- o art.° 2°, n.° 1, al. b), e n.° 2o do Decreto-Lei n.° 215/89 de 1 de Julho; e

- o art.° 35° do EBF (com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 3 de Julho, e pela Lei n.° 109-B/2001, de 27 de Dezembro),

15 - Porque violadoras de uma norma de incidência tributária (no caso, norma de incidência negativa, uma vez que os rendimentos auferidos pelo Recorrente/lmpugnante marido e pagos pela NATO por trabalho por aquele prestado à Infraestrutura Nato não estão sujeitos a tributação de IRS), as liquidações de IRS em causa nos autos deviam ter sido anuladas pelo Tribunal a quo e, consequentemente, as compensações que lhes seguiram.

Termos em que

Deverão Vossas Excelências revogar a douta Sentença recorrida, procedendo-se à sua substituição por Acórdão que julgue totalmente procedente o pedido formulado na Petição Inicial de Impugnação Judicial e, assim, expressamente reconheça e declare a existência de isenção de IRS e, em consequência, anule as liquidações de IRS impugnadas.”


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A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“II FUNDAMENTOS DE FACTO.

1. O impugnante marido desempenha funções com Técnico Especialista Principal correspondente à Infraestrutura Depósito de Munições Nato de Lisboa – Serviço de Armas...

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