Acórdão nº 92/22.1T8TVD.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 21-03-2024

Data de Julgamento21 Março 2024
Ano2024
Número Acordão92/22.1T8TVD.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
A. Seguros, S.A.,
veio intentar contra
B, Lda., e
C, Lda.,
a presente acção declarativa com processo comum,
pedindo,
-a condenação da 1.ª R. a reembolsar a A. de todas as quantias que esta despendeu a regularização de sinistro, no valor total de € 26.986,50 (vinte seis mil novecentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos), acrescido de juros de mora até efectivo e integral pagamento.
Ou, a título subsidiário, a condenação da 2ª R. no pagamento da mesma quantia.
A final, conclui, dizendo:
«Nestes termos, e nos mais de Direito, deverá a presente ação ser julgada procedente, por provada, sendo as RR. condenadas a pagar à A., a quantia de € 26.986,50 (vinte seis mil novecentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora até efetivo e integral pagamento.»
Para tanto alega, em síntese:
Celebrou com a R. B, Lda. um contrato de seguro de acidentes de trabalho;
M, funcionário da B, Lda., sofreu um acidente quando trabalhava, por ordens e instruções desta;
O acidente deu origem a processo especial de acidentes de trabalho movida pelo Fundo de Acidentes de Trabalho tendo a A., no âmbito deste processo sido condenada a pagar ao Fundo o valor de € 26.476,50, correspondente ao triplo da retribuição anual auferida pelo sinistrado, de € 8.825,50, o que fez, tendo ainda pago a quantia de € 510,00, a título de custas de parte;
Alega que o acidente de trabalho deveu-se a uma má avaliação do risco por parte das RR., entidades responsáveis por garantir as condições de segurança e saúde dos trabalhadores da obra, e caso as RR. tivessem procedido à adequada avaliação de risco e à consequente adopção das medidas de segurança adequadas o acidente não teria ocorrido.
Conclui referindo estar demonstrada a existência do nexo de causalidade entre a violação de regras de segurança e a ocorrência do acidente, devendo a R. B, Lda. ser condenada a reembolsar a A. e, subsidiariamente, deverá responder a 2ª R..
*
Devidamente citadas, as RR. contestaram.
A R. B, Lda. alega, em síntese, negando que hajam sido violadas quaisquer regras de segurança, quer antes, quer durante os trabalhos antes afirmando que as regras foram cumpridas não podendo a R. prever que o proprietário do muro que veio a desmoronar-se e a cair sobre a infeliz vítima não havia, na sua construção, construído as sapatas que eram exigíveis.
Conclui pedindo a sua absolvição do pedido.
*
A Ré C, Lda, alega a sua ilegitimidade para a causa porquanto de acordo com a tese alegada pela A., o acidente terá sido provocado pela R. empregadora B, Lda., com quem esta celebrou contrato de seguros de acidentes de trabalho.
A B, Lda., é subcontratada pela R. C.Lda pelo que não se mostram preenchidos os pressupostos do direito de regresso.
No mais impugna a factualidade alegada pela A..
*
A A. pronunciou-se quanto à excepção invocada, pugnando pela sua improcedência.
*
Foi realizada audiência prévia, proferido despacho saneador tendo a excepção de ilegitimidade sido julgada improcedente, e foi fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
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Realizada que foi a audiência final, veio a ser proferida sentença de cujo dispositivo consta:
« VI. DECISÃO
Nos termos e fundamentos expostos:
a) Condeno a R. B, Lda.a pagar à A. Seguros, SA o montante de € 26.476,50 (vinte seis mil quatrocentos e setenta e seis euros e cinquenta cêntimos), acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado.
b) Custas a cargo da A. e da R. B, Lda. na proporção do decaimento.
Notifique e registe.»
*
Não se conformando com o decidido, pela Ré B, Lda. veio interposto o presente recurso de apelação em que alinhou as seguintes:
«B - CONCLUSÕES
I. Entendemos que a decisão proferida merece censura, pois mal andou o douto Tribunal a quo ao ter condenado a R. B, Lda. na acção de que ora se recorre.
II. Bem como andou mal ao não atender a toda a prova produzida nos autos, quer documental, quer testemunhal, conforme melhor alegado infra.
III. Atenda-se pois no ponto 2, considerando o Tribunal a quo não provado que “O muro referido em 8. dos factos provados era um muro de vedação e fazia parte integrante da moradia em construção “.
IV. Contudo e salvo melhor entendimento da prova produzida resultou provado que o muro fazia parte integrante da moradia, apenas não estava ainda concluído.
V. Ou seja, o referido muro estava construído na parte em que estava implementada a zona técnica, para posteriormente ser continuada e concluída a construção, não sendo considerado provisório, mas sim definitivo.
VI. Ao considerar-se, e bem, que havia uma zona técnica, naturalmente que ela está instalada num muro de suporte.
VII. Por outro lado e a Meritíssima Juiz “ a quo” considerou como provado no ponto 12 e 13 que “ Paralelamente à zona de trabalhos onde estava a ser aberta a vala estava construído um muro, com uma altura de 1,60m por 2,60m de comprimento, que servia de suporte aos contadores da eletricidade e da água de uma obra que ali estava em execução, mais precisamente a construção de uma moradia.”; “Aquando do sinistro a vala tinha 50 cm de profundidade correspondente à cota de base de sustentação do muro.”
VIII. Ou seja, há uma clara contradição entre os factos provados e os não provados, devendo considerar-se como provado o Ponto 2, passando a ter a seguinte redacção “O muro referido em 8. dos factos provados era um muro técnico definitivo fazia parte integrante da moradia em construção “.
IX. Não se provou a profundidade de 50 cm como estava programada a abertura da vala, uma vez que logo pouco apos se iniciarem os trabalhos de escavação, o muro desabou, de onde se verificou a inexistência de fundações desse muro.
X. No que concerne aos FACTOS PROVADOS, o Tribunal a quo, considerou que no ponto 11 que “ Os trabalhos a realizar consistiam no desvio do armário referido em 8. e a sua reposição a cerca de 2,50 metros da sua posição original, e para o efeito era necessário proceder à abertura de uma vala em espaço público, com uma profundidade de 0,60 metros, de modo a destapar o cabo subterrâneo que alimentava o armário, para posterior deslocação do mesmo para o local de destino, tarefa de que o trabalhador M. foi incumbido”
XI. Ora considerando este facto provado, e tendo em conta as regras de construção, tem sido entendimento técnico, nomeadamente o entendimento dado pelo Sr. Engenheiro , Licenciado em Engenharia Civil Pré Bolonha pelo ISEL, Membro da OET nº…, “no que diz respeito à construção de muretes técnicos para instalação de infraestruturas. A construção de um murete obedece à metodologia e cumprimento das normas e regulamentos aplicáveis à construção de estruturas em betão armado, neste caso trata-se de um muro de alvenaria com componente estrutural em betão (pilares, vigas e sapatas em betão). Nas metodologias de calculo a adotar importa efetuar verificações a nível de estabilidade, tombamento e deslizamento, entrando com as respectivas sobrecargas a considerar, incluindo a preparação da estrutura para execução de abertura de vala e ligações das infraestruturas na envolvente. As referidas verificações deverão ser efetuadas de acordo com a regulamentação europeia adotada em portugal (Eurocódigo 1 - Ações e estruturas, Eurocódigo 2 - Estruturas de Betão, Eurocódigo 4 - Estruturas de Aço e Betão e Eurocódigo 5 - Alvernaria, Eurocódigo 7 - Solos) ou no caso de se tratar de uma construção mais antiga estar de acordo com o REBAP -Regulamento de estruturas de betão armado e pré esforçado, RSA -Regulamento de Segurança e Acções e demais normas, regulamentos e metodologia comprovada.
Para o cumprimento das verificações atrás referidas um murete técnico terá sempre que ser constituído por pilares que garantam a sua estabilidade (ou construção de parede em betão armado), assim como por sapatas que garantam que não ocorrem nem tombamento nem deslizamento.”
XII. O mesmo é dizer que ao homem médio, colocado naquela posição, não lhe era exigível sequer pensar que o muro em apreço estava construído como consta e bem, no ponto 13 dos Factos Provados, “ Este muro assentava numa solução construtiva em alvenaria de tijolo travado nos extremos por dois pilares, elementos assentes sobre argamassa de cimento.”
XIII. Porem e como resultou provado, neste ponto deveria também ser dado como provado que era uma argamassa de “betão de limpeza” com uma altura máxima de 2 cm” situação que se conclui pelas declarações de vários depoimentos.
XIV. Também e no que diz respeito aos Factos Provado, no ponto 14, foi dado como Provado que : “O muro não tinha sapatas e a sua alvenaria não tinha qualquer fundação.”
XV. Mais uma vez se retira a má construção violando todas e quaisquer regras, situação que considerando o caso concreto em nada se podia prever.
XVI. Quanto aos pontos 26 e 28 dos Factos Provados, foi entendimento da Meritíssima Juiz do Tribunal a quo que “ As RR. não elaboraram qualquer Plano de Segurança e Saúde para a execução dos trabalhos em causa.” e “A R. B, Lda. não elaborou qualquer ficha de procedimentos de segurança para a execução da obra, tendo adotado a ficha de procedimentos referida em 27”
XVII. Porem, a este propósito e de extrema importância releva dizer que, por não carecer do mesmo, para aquela obra em concreto não existia a elaboração de projeto de segurança e saúde de acordo o modelo que implica a existência de um projeto prévio, o que não se verificava no caso em concreto.
XVIII. Aqui no caso concreto, que é abertura de vala para deslocação de armário de rede de baixa tensão, carece de preenchimento de modelo de ficha de procedimentos de segurança para trabalhos de construção, ampliação remodelação, manutenção preventiva de redes de baixa tensão e iluminação pública, conforme imposição da E- , S.A.
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