Acórdão nº 909/12.9BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-02-16

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão909/12.9BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO
I- Relatório
S........ P...........- Equipamento de Escritório, S.A. veio deduzir contra o Instituto da Segurança Social, IP., impugnação judicial pedindo a anulação do acto de liquidação de contribuições fixada oficiosamente, no valor total de EUR: 834.832,67, notificado em 11/01/2012, pelo Centro Distrital de Lisboa do ISS e emitido na sequência de uma de acção fiscalização que visou o pagamento de prémios aos trabalhadores, no período compreendido entre Abril de 2005 e Maio de 2007 e em Março de 2010.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 934 ss. (numeração do SITAF), datada de 9 de Novembro de 2021, julgou procedente a Impugnação judicial e, em consequência, determinou a anulação da liquidação sindicada nos presentes autos.
O Instituto da Segurança Social, I.P. interpôs recurso jurisdicional contra sentença, conforme requerimento de fls. 987 e ss. (numeração do SITAF), formulando as seguintes conclusões de recurso: «
A - Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual julgou a impugnação procedente e, em consequência anulou a liquidação oficiosa sindicada nos autos emitida pelo “Instituto da Segurança Social, I.P. – Núcleo de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo”, no montante de €834.832,66, relativa aos exercícios dos anos de 2005 a 2007 e de 2010.
B - Entende o ora Recorrente que o Tribunal a quo realizou um manifesto erro na avaliação da prova produzida e um flagrante erro de julgamento, porquanto realizou uma errada interpretação dos factos ao direito aplicável, daí se justificar a interposição do presente recurso.
C - No essencial, nos presentes autos estão em causa a liquidação de contribuições para a Segurança Social referente aos exercícios dos anos de 2005 a 2007 e de 2010, no montante de € 692.357,52, conforme taxa contributiva de 34,75% e € 142.475,15, à taxa de 31,25%, perfazendo o total de € 834.832,67 por parte da empresa “S........ P........... – Equipamento de Escritório, S.A.”.
D - Situação e factos que, entende o Recorrente, foram ignorados pelo Tribunal a quo, quando em sede de fundamentação considerou como assente determinadas matérias de facto dadas como provadas e descorou outras matérias da sua inclusão e, incumprindo as regras do processo tributário que cominam, de forma inultrapassável e inequívoca, a decisão ora recorrida de ilegalidade.
E - Relativamente à matéria de direito entende o Recorrente que existiu uma errada apreciação, ponderação e valoração da matéria de facto dos autos e, bem assim, uma incorreta aplicação do direito, o que imporia uma decisão diferente daquela que foi levada a cabo pelo Tribunal a quo.
F - Sendo esse erro de julgamento, que passa pela errada decisão tomada relativamente aos factos constantes do processo, que vem inquinar irremediavelmente e, última ratio, a Sentença ora colocada em crise. Senão vejamos,
G - Para além dos factos dados como provados na Sentença, também, deveria ter sido dado como provado pelo Tribunal a quo, que a atribuição dos prémios aos funcionários recebedores dos mesmos tinha carácter de pagamento regular e, ao assim, não ocorrer, comprometeu de forma irremediável e incontornável a decisão proferida.
H - Pois, quanto a verificação dos requisitos da regularidade do pagamento dos prémios extraordinários e da expectativa dos trabalhadores quanto ao seu recebimento certo é que os serviços do Recorrente procederam à análise de toda a documentação entregue pela Recorrida, tendo constatado, através dos processamentos de vencimento e dos recibos de vencimento que, no período em análise, foram efetuados pagamentos a título de diversas rubricas aos trabalhadores e órgãos sociais, tais como prémio extraordinário, suplemento de integração, complemento de estágio, desafio de vendas, adiantamento e desconto de adiantamento, ajudas de custo, entre outras.
I - Da análise efetuada aos balancetes apresentados, verificou-se que no quadro da política salarial praticada pela empresa assumia particular importância, tanto pela sua estabilidade como pelo seu peso relativo no total das remunerações de pessoal, a componente de bónus, conforme os registos existentes na subconta 64.2.099 — Outras Remunerações (em 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009), onde se encontram contabilizados montantes referentes a bónus, designados no processamento de vencimentos por “Prémio Extraordinário”.
J - Com base na realização de testes de controlo aos custos com pessoal, foram obtidas provas que demonstram que existem valores registados na subconta atrás referida, naqueles anos, que não estariam a ser sujeitos a incidência de contribuições.
K - E, apesar de a Recorrida apresentar tais prémios como excecionais e de tal aparentemente resultar do teor das comunicações internas por aquela emitidas e dos contratos de trabalho a termo certo celebrados, a verdade é que essa qualificação está em flagrante contradição com as provas de continuidade e regularidade desses pagamentos, os quais foram efetuados normalmente no mês de abril de cada ano, abrangendo um conjunto estável de colaboradores, bem como o gerente/administrador C……………….
L - Ademais, nos Key Management Bónus Plan apresentados pela Recorrida, consta explicitamente a orientação de que todos os impostos e descontos para a Segurança Social serão retidos dos awards bónus antes do seu pagamento, (alínea o) do ponto VII nos planos de 2005 e 2006 e, a alínea o) do ponto VIII dos planos de 2007 e 2009, a fls. 147-A, 148-A, 150-A e 153 do PA).
M - Tais bónus foram pagos anualmente aos colaboradores sob a designação de prémio extraordinário, verificando-se que a maior parte dos trabalhadores, bem como o gerente/administrador C……., receberam nos anos de 2005 a 2007 esses montantes.
N - No âmbito do processo de averiguações, verificou-se, também, que um grupo de trabalhadores com cargos de direção, incluindo o administrador C………, receberam ainda este prémio no mês de março de 2010.
O - Importa, ainda, salientar as declarações prestadas pelos trabalhadores J …………………., A ……….. , e Á ………………….., vide fls. 161, 166 e 172, que declararam que o prémio extraordinário era pago anualmente, sendo delineado pela S........ Internacional com base em pressupostos objetivos que passavam pela concretização de objetivos a nível nacional, internacional e outros, com conhecimento prévio dos trabalhadores, pois sabiam que receberiam esse prémio se os objetivos se concretizassem; e ainda que os prémios dependiam de uma avaliação da pessoa, da empresa em si e da loja em particular, criando nos trabalhadores a expectativa de receber efetivamente o prémio em causa.
P - Ora, da prática e da documentação analisada ficou demonstrado que os referidos prémios eram pagos anualmente e que tinham carácter regular.
Q - O que leva a crer, ainda, quiça que os denominados “requisitos de atribuição” não são verdadeiros requisitos, que constituem apenas generalidades e que a realidade dos factos, ou seja, o pagamento periódico das ditas “gratificações” assim o demonstra.
R - Por outro lado, a noção legal de retribuição encontra previsão no Código de Trabalho (na sua versão de 2009, artigo 258.º, e na versão de 2003, artigo 249.º), que a define como a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho, compreendendo a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro e em espécie.
S - O caráter regular e periódico da retribuição justifica-se pela própria natureza do contrato de trabalho, como contrato de execução duradoura ou continuada – daí que as atribuições patrimoniais tenham caráter de permanência e se vençam regularmente.
T - Estabelece também o artigo 2.º do Decreto Regulamentar nº 12/83, de 12 de fevereiro, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto Regulamentar nº 53/83, de 22 de junho, na parte que interessa para o efeito, que são consideradas remunerações “as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação de trabalho e pela cessação do contrato”.
U - Designadamente, a alínea d) “Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de assinatura de contratos, de economia e outros de natureza análoga”.
V - Segundo a doutrina, são dois os critérios utilizados pelo legislador para determinar a qualificação de certa quantia como retribuição: o primeiro sublinha a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial - é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força do trabalho; o segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expectativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato, vide Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 11.ª edição, Coimbra.
W - Também neste sentido, Acórdão do STJ de 15-9-2010, proc. 469/09.4, que define os elementos de “contrapartida da atividade do trabalhador e natureza periódica e regular da prestação” como sendo “caracterizadores e enformadores do conceito de retribuição”.
X - Por outro lado, constituirão retribuição todas as gratificações que o trabalhador tem legítima e fundada expectativa de receber, quer por a sua atribuição estar prevista no contrato ou nas normas que o regem, quer em virtude da regularidade com que são atribuídas durante um período significativo, a esse respeito veja-se Abílio Neto, Contrato de Trabalho. Notas Práticas, 8ª edição, Lisboa.
Y - E: “IV - Enformando o conceito de retribuição, surgem, também, as características da periodicidade e da...

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