Acórdão nº 8723/22.7T8LSB-A.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão8723/22.7T8LSB-A.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes Desembargadores que compõem este Coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Autor recorrido: Ministério Público
Réu recorrente: FA, de nacionalidade portuguesa, residente em …, França.
O autor instaurou ação oficiosa de investigação da paternidade, nos termos dos art.ºs 1865º/5 e 1868º do CCivil, e 3º/1, al p) e 5º/1, al. g) do Estatuto do Ministério Público, pedindo que se reconheça o menor SF como filho do réu FA, e ordenando-se o averbamento de tal paternidade (e respetiva avoenga paterna) ao assento de nascimento daquele.
Para fundamentar a ação o autor invocou que em …, nasceu, em …, República Francesa, o menor SF, cujo assento de nascimento com o nº … do ano de …, foi lavrado, em …, no Consulado Geral de Portugal em Paris, França, nele se omitindo a paternidade e mencionando que o menor é filho de MF, solteira, natural …, Porto, residente em …, República Francesa. Acontece que o menor é também filho do réu.
O réu foi citado e contestou. Invocou a exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses alegando que todos os elementos objetivos e subjetivos que fundamentam a causa de pedir – local de nascimento do menor, residência da mãe do menor e do réu, relacionamento do réu com a mãe do menor, nomeadamente o relacionamento sexual de onde resultou a procriação do menor – ocorreram em França.
Foi proferida decisão a julgar improcedente a invocada exceção dilatória e competente para os termos da ação o Juízo Central Cível com base nos seguintes fundamentos:
Da Competência Internacional
Os presentes autos foram instaurados pelo Ministério Público ao abrigo do disposto nos artigos 1865º, n.º 5 e 1868º, ambos do Código Civil e nos termos das obrigações que lhe advêm do Estatuto do Ministério Público.
Veio o Réu arguir a incompetência internacional dos Tribunais portugueses, alegando que todos os factos que servem de causa de pedir nos presentes autos ocorreram em França, sendo também esse o país de residência do Réu, da criança e da mãe da criança. Cita, em abono da sua posição, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 05 de Dezembro de 2013.
Dada a palavra à Digna Procuradora para que respondesse à excepção deduzida, em sede de audiência prévia, a mesma pugnou pela sua improcedência.
Cumpre apreciar.
Conforme refere o Réu, os factos que servem de causa de pedir, como sejam os alegados factos procriadores, bem como o nascimento da criança ocorreram em França, a mãe da menor reside em França, assim como o Réu.
Mas o nascimento da menor foi registado junto do Consulado Português de Paris, sendo a menor, porque filha de cidadã portuguesa, de nacionalidade portuguesa, porquanto a mãe ao registá-la junto ao Consulado Português, assim o pretendeu (artigo 1º, n.º 1, alínea c) da Lei da Nacionalidade, aprovada pela Lei n.º 37/81, de 03 de Outubro).
Ora, a averiguação oficiosa da paternidade é uma imposição da lei civil portuguesa para os cidadãos portugueses, cujo nascimento é averbado sem paternidade conhecida, conforme dispõe o artigo 1864º do Código Civil.
A questão não se coloca quanto à dificuldade de tal averiguação de paternidade se realizar em França, mas de ser obrigatória a sua realização pela legislação portuguesa, pois o direito em causa, tal como concebido pela lei portuguesa, que é o direito à criança ter a sua paternidade reconhecida por acção do Estado, oficiosamente, nos primeiros dois anos da sua vida, só pode tornar-se efectivo por acção proposta em território português, pois apenas a lei portuguesa estabelece tal obrigação, para os cidadãos do seu país, ainda que nascidos no estrangeiro.
Face ao exposto, nos termos do artigo 62, alínea c) do Código de Processo Civil, declaro os Tribunais Portugueses, internacionalmente competentes para conhecer da averiguação oficiosa da paternidade do menor SF, ainda que os factos que levaram à sua procriação e o seu nascimento tenham ocorrido no estrangeiro, tendo em conta a sua qualidade de cidadão português.”.
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Inconformado com o decidido, apelou o réu, tendo apresentado alegações e conclusões, nas
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