Acórdão nº 86/08.6BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 30-03-2023

Data de Julgamento30 Março 2023
Ano2023
Número Acordão86/08.6BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida, pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por “I…, S. A”, tendo por objeto o despacho proferido em 10 de dezembro de 2007, pelo Diretor de Finanças Adjunto, que deferiu parcialmente as reclamações graciosas por si apresentadas contra o ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2004 8310022504 e, bem assim, contra os atos de liquidação de Juros Compensatórios (JC) n.º 2006 00001704791 e n.º 2006 00001704792, na parte em que indeferiu as suas pretensões, assim como do ato de liquidação n.º 2006 8310003496, emitido em 9 de agosto de 2006, que anulou e substituiu aquele primeiro despacho.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos identificados que julga parcialmente procedente a impugnação deduzida pela Impugnante C…, SGPS, S.A. do deferimento parcial das reclamações deduzidas contra o ato de liquidação de IRC n.° 2004 8310022504 e, bem assim, contra os atos de liquidação de juros compensatórios n.° 2006 00001704791 e n.° 2006 00001704792, na parte em que indeferiu as suas pretensões, assim como do ato de liquidação n.° 2006 8310003496, referente ao exercício de 2002.

B. Discorda a Fazenda Pública, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente inadequado enquadramento jurídico.

C. A Impugnante considerou para efeitos de constituição de provisões para créditos de cobrança duvidosa o valor de €34.685,51, referente a juros e encargos com letras debitados aos clientes, que a douta sentença entende admissíveis como custo, contudo, decorre do disposto da alínea a) do n.° 1 do artigo 33.° do Código do IRC que são fiscalmente dedutíveis as provisões que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal, que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e evidenciados como tal na contabilidade.

D. Por isso, se Impugnante concedia aos seus devedores, aquando do termo do prazo de pagamento estipulado, condições especiais de pagamento mediante a sujeição a juros ou a emissão de letras, certo é que tais encargos não integram o crédito principal, esse sim efectivamente decorrente do exercício da actividade normal da empresa, pois tem a Impugnante como actividade a produção e comercialização de cimento, assim como de produtos compostos por cimento, pelo que, os juros e encargos com letras não são considerados como fazendo parte do conceito de actividade normal, por se tratarem de encargos de natureza financeira, devendo os créditos a considerar para efeitos de provisão ser apenas os que resultam das operações de aquisição e transmissão concordantes com o seu objecto social.

E. Mais divergimos do entendimento da douta sentença quanto às correcções atinentes às despesas indevidamente documentadas no valor de € 14.236,93, porquanto cabendo à Impugnante o ónus da prova da verificação do encargo, não reuniu a mesma no âmbito do procedimento inspectivo provas adicionais de que tais custos foram efectivamente incorridos por si, sendo que, da produção de prova testemunhal de que resulta fixado o facto constante da alínea 60. do probatório da douta sentença não decorre a verificação circunstanciada do custo em moldes suficientemente precisos e aptos a completar a insuficiente documentação apresentada para efeitos da sua consideração, não podendo ser aceite nos termos do disposto na alínea h) do n.° 1 do artigo 41.° do Código do IRC e do n.° 1 do artigo 74.° da LGT.

F. Por outro lado, verificado pelo Tribunal a quo o cumprimento de um dos requisitos atinentes à dedução fiscal do encargo, reconduzido à existência do mesmo, caber-lhe- ia indagar da sua efectiva relação com a actividade prosseguida pela Impugnante, e aqui quebrar-se-ia inelutavelmente o elo da mínima indispensabilidade a estabelecer entre o custo e o proveito, directo ou indirecto, imediato ou imediato, obtido pela Impugnante com a assunção de tal custo.

G. Já quanto às deslocações em viatura própria, no montante de € 80.736,74, contrariamente ao entendimento sufragado na douta sentença, ainda que resulte da produção de prova testemunhal a verificação de deslocações de trabalhadores da empresa de forma genérica e abstracta, não resulta efetivamente dos documentos a que apelam os factos contidos nas alíneas 71. a 75. do probatório a discriminação individualizada de cada uma das deslocações inerentes aos supostos custos incorridos pela empresa, pois que, a par da identificação do beneficiário do encargo suportado pela Impugnante se mostra ausente a identificação dos percursos, sem identificação e explicitação circunstanciada da deslocação efetuada, daí decorrendo que não é atestada a específica veracidade da despesa quanto a cada trabalhador e a cada deslocação em causa, pelo que, em obediência ao disposto na alínea f) do n.° 1 do artigo 41.° do CIRC conjugado com a alínea d) do n° 1 do artigo 23° do CIRC, não podem tais encargos ser aceites como custo fiscal.

H. Ainda, no referente às correcções decorrentes de despesas registadas pela Impugnante relativas a encargos com viagens de pessoas estranhas ao quadro funcional da empresa, discordamos do entendimento vertido na douta sentença, porquanto a demonstração dos factos em que assenta o juízo de procedência da impugnação neste particular segmento não permite concluir no sentido propugnado pelo Tribunal a quo.

I. Efectivamente, ainda que a indispensabilidade do custo não determine que falemos de um custo que implique diretamente a obtenção de proveitos, havendo vários custos que só mediatamente cumprem essa função, e que nem por isso deixam de ser considerados indispensáveis, a obtenção de proveitos, mesmo que indirecta, não se poderá configurar de forma tão difusa que o efectivo proveito se reflicta na esfera jurídica da Impugnante de modo meramente reflexo, e é o que acontece nos presentes autos, sendo questionável, e determinante do não estabelecimento de mínimo nexo causal exigido pelo artigo 23.° do Código do IRC, a alegação do facto de que são encargos decorrentes da circunstância de trabalhadores da empresa deslocados no estrangeiro não se poderem deslocar a Portugal por razoes laborais, financiando a Impugnante viagens de familiares, e por isso, não podem ser elegíveis tais encargos a custos fiscalmente admissíveis nos termos do n.° 1 do artigo 23.° do Código do IRC.

J. Acresce que, “() se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário.» (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.° 05493/12, de 23-02-2017, disponível em www.dgsi.pt).”. o que não sucedeu, porquanto, mesmo que se admitisse uma qualquer mínima conexão, sempre impenderia sobre a Impugnante a demonstração efectiva da relação entre os beneficiários das viagens e os concretos trabalhadores deslocados em tais períodos temporais em territórios identificados que não o território nacional.

K. Finalmente, quanto à correcção operada em sede de procedimento inspectivo no montante de € 2.265.64 de juros compensatórios, constatamos que considera a douta sentença ilegal a liquidação de juros compensatórios final, por contraposição à liquidação de juros compensatório que decorre do Relatório de Inspecção, sendo que nos referimos, num e noutro caso, a realidades diversas.

L. Do Relatório de Inspecção Tributária resulta a determinação de juros compensatórios que não se referem aos juros compensatórios decorrentes das correcções no mesmo contidas - as quais se haviam de expressar, como se expressaram, em consequente acto de liquidação, com a adjacente e correspectiva liquidação dos juros compensatórios, dívida essa que se integra na dívida de imposto e cuja imposição resulta dos termos da lei, conforme decorre do artigo 35.° da LGT - mas antes decorrem de evento perfeitamente identificável, paralelo, e concernente ao retardamento da liquidação já ocorrida à data da elaboração do RIT quanto ao PEC efectuado pela Impugnante em 30-03-2000.

M. E quanto a tais juros compensatórios relativos às correcções em sede de IRC, que não a plasmada no referido 3.4.2 do RIT, foram cumpridas as formalidades exigidas pelo artigo 60.° da LGT e pelo artigo 60.° do RCPIT, pelo que, nenhuma ilegalidade se vislumbra.

N. Sobre a Impugnante impende a obrigação legal de pagamento da dívida tributária, nos termos previstos nos n.°s 1 e 2 do artigo 32.° da LGT, e tendo retardado a liquidação do imposto devido, sendo o mesmo mantido parcialmente na sequência de deferimento parcial de reclamação graciosa apresentada, são devidos os juros compensatórios na proporção do acto mantido, mais decorrendo do n.° 2 do artigo 60.° da LGT ser dispensada a audição no caso de a liquidação ser efectuada com base em declaração do contribuinte ou decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição que lhe seja favorável.

O. Ora, subsumindo-se os factos nos presentes autos em tal norma, não padece a liquidação de juros compensatórios de preterição de formalidade legal essencial por violação do direito de audição prévia, como apontado pelo Tribunal a quo.

P. Pelo que, se configura a condenação da Administração Tributária na indemnização por prestação indevida de garantia como infundamentada.

Q. Atento o exposto, incorreu a douta sentença em errónea apreciação dos factos pertinentes, conforme exposto, com consequente erro de julgamento de direito, por violação do disposto no artigo 23.°...

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