Acórdão nº 843/21.1T8TVD.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 06-12-2022

Data de Julgamento06 Dezembro 2022
Ano2022
Número Acordão843/21.1T8TVD.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - RELATÓRIO
Em 10 de Fevereiro de 2021, A intentou junto do BNA um procedimento especial de despejo contra B, destinado a efectivar o despejo desta e a entrega de locado por cessação do arrendamento decorrente de resolução por falta de pagamento de rendas desde Abril de 2020.
Em 10 de Maio de 2021, reconhecendo a falta de pagamento das rendas e a sua pretensão de entregar voluntariamente o locado, B apresentou um pedido de diferimento da desocupação, por razões sociais imperiosas, nos termos do art. 15º-N da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro (NRAU).
Por decisão proferida em 6 de Julho de 2021, foi concedido a B “o diferimento da desocupação do imóvel arrendado pelo período de quatro meses”, nos termos dos art.ºs 15º-N e 15º-O do NRAU (cfr. Referência Citius nº 149166076).
Esta decisão transitou em julgado em 11 de Agosto de 2021.
Em 9 de Fevereiro de 2022, A veio informar que, decorrido, há muito, o prazo de diferimento da desocupação, o locado não foi entregue, motivo pelo qual requereu a imediata execução do despejo, sendo convertido o requerimento de despejo em título para desocupação do locado e requerendo a emissão do título respectivo, tendo em vista a imediata desocupação do locado.
Em 24 de Fevereiro de 2022, B requereu que lhe fosse “permitido” “a manutenção no imóvel”.
Esta pretensão foi indeferida por decisão proferida em 28 de Fevereiro de 2022, “por falta de fundamento legal” (cfr. Referência Citius nº 151786788), decisão esta, que transitou em julgado.
Nesta sequência, em 21 de Março de 2022, o Requerimento de Despejo apresentado por A foi convertido em Título para Desocupação do Locado.
Em 3 de Junho de 2022, B apresentou requerimento, peticionando que: “seja declarada suspensa a execução nos termos da alínea c) do nº 7 do artigo 6.º E da Lei n.º 1 A/2020, de 19 de Março. Ou, caso assim não se entenda nos termos do artigo 15.ºM da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro”.
Alegou factualmente para o efeito:
“1. A Requerida tem três filhos; um menor de quatro anos, uma filha portadora de uma deficiência profunda com 80% de incapacidade, conforme atestado que se junta como Doc. 1 e que se dá por integralmente reproduzido.
2. outro maior, de 23 anos, com um provável diagnóstico de artrite psoriática, doença grave nas articulações que, atendendo às fortes dores o impede de trabalhar, conforme declaração médica que se junta como Doc. 2.
3. Com efeito, a situação clínica de ambos o filho da Requerente é grave, pelo que a execução do despejo, coloca em risco a saúde e a vida dos mesmos, cfr. relatório médico que se protesta juntar.
(…)
5. Importa salientar que, após a douta sentença que decretou o deferimento da desocupação do locado e pese embora os inúmeros esforços, a Requerida não logrou encontrar outro lugar onde viver com os seus filhos, conforme requerimento já junto aos autos com a ref. 12009812.
6. Conforme aí se explana a Requerida tem desenvolvido todos os esforços para encontrar um imóvel no mercado de arrendamento compatível com os rendimentos do agregado familiar e condições do mesmo e disponível para acolher a família.
7. Todavia, considerando os baixos rendimentos e as especificidades do agregado familiar, nomeadamente a situação clínica dos seus filhos, ainda não se logrou qualquer sucesso.
8. Mais se diga que a Requerida tem mantido uma postura ativa de procura de um imóvel, contactando regularmente com várias imobiliárias, e outras estando inclusivamente inscrita em diversos sites online, conforme docs que se protesta juntar.
9. Todavia, não consegue encontrar qualquer imóvel compatível com os seus rendimentos.
10. Ainda não tendo logrado sucesso na sua procura a Requerida já contactou quer a Câmara Municipal, quer a Segurança Social, por diversas vezes, conforme doc. que se protesta juntar, sendo que nenhuma das Instituições, até à data conseguiu responder aos seus apelos.
11. Pelo que desde já se requer que o Douto Tribunal oficie as Instituições supracitadas para que venham aos autos esclarecer as soluções e apoios existentes para dar resposta à situação da Requerida que poderá ficar em situação de sem abrigo, com três filhos dela dependentes.
12. Com efeito, até à presente data e atendendo às vicissitudes e circunstâncias do mercado imobiliário e os baixos rendimentos da Requerida ainda não foi possível o arrendamento de outro imóvel.
13. Ou encontrar outra solução onde a família possa viver.
14. Veja-se que a Requerida Não detém outra alternativa, pese embora os vários esforços desenvolvidos.
15. A Requerida continua impossibilitada de trabalhar para conseguir prestar auxílio permanente à família, que tanto necessita.
16. Os rendimentos que aufere são, somente as ajudas estatais, conforme documentos que se protesta juntar.
17. Tendo inclusivamente requerido o estatuto de cuidadora informal, também junto aos autos.
18. Sobrevivendo com ajudas de amigos,
19. Reitere-se a Requerida procura incessantemente um lugar onde viver com os seus filhos e desocupar o imóvel o mais rapidamente possível.
20. Ora que atendendo à situação desta família estamos perante um caso social e até humanitário que não pode ser ignorado pelo douto Tribunal.
21. Com efeito, não podemos ignorar que, para além de um filho menor de 4 anos a Requerida cuida de outro com doença crónica grave, e uma filha com deficiência profunda e que todos precisam de cuidados permanentes.
22. Face ao exposto, a Requerida atentas as concretas circunstâncias em que se encontra, não dispõe imediatamente de outra habitação bem como, igualmente perante o número de pessoas que habita o local arrendado e que compõem o agregado familiar, bem como o substancial agravamento dos valores do mercado de arrendamento, tornam ainda mais complexa a procura de habitação alternativa, isto sem desconsiderar a idade dos envolvidos logística envolvida e estado de saúde dos filhos da Requerida, ademais atendendo à situação pandémica existente.”
Com este requerimento, B juntou documentos e requereu: “Que seja oficiada a Câmara Municipal de Torres Vedras e a Segurança Social para que venham aos autos esclarecer as soluções e apoios existentes para dar resposta à situação da Requerida”.
Em 15 de Junho de 2022, foi proferido despacho determinando a notificação de B para “juntar aos autos os documentos que protestou juntar” e da “Câmara Municipal de Torres Vedras” e do “ISS conforme requerido” (cfr. Referência Citius nº 153133090).
Nesta sequência, B juntou aos autos documentos em 30 de Junho de 2022; a Câmara Municipal de Torres Vedras juntou aos autos a informação solicitada em 27/06/2022; e o ISS juntou aos autos a informação solicitada em 12/07/2022.
Em 16 de Agosto de 2022, foi proferida decisão com o seguinte teor (cfr. Referência Citius nº 151786788):
“Com o seu requerimento de 03/06/2022, a requerida pretende a suspensão das diligências executórias, quer ao abrigo da alínea c) do nº 7 do artigo 6.º E da Lei n.º 1 A/2020, de 19 de Março, quer nos termos previstos no art.º 15.ºM da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro.
*
No que concerne à pretensão deduzida ao abrigo do art.º 15º-M, como resulta dos autos, o agente de execução não determinou a suspensão das diligências executórias nem consta dos autos atestado médico que indique fundamentadamente o prazo durante o qual se deve suspender a execução, que a diligência põe em risco de vida a pessoa que se encontra no local, por razões de doença aguda (conforme previsto no n.º 2 do citado normativo) nem, consequentemente, o agente de execução procedeu em conformidade com o disposto no n.º 3 do mesmo preceito.
Deste modo, afigura-se estar vedado ao tribunal proferir qualquer decisão a esse respeito, nos termos previstos no n.º 4 do referido art.º 15º-M.
*
Quanto ao mais, considerando todas as soluções plausíveis de direito e face às informações entretanto trazidas aos autos pela Câmara Municipal de Torres Vedras e pela Segurança Social (ofícios de 27/06/2022 e de 12/07/2022), notifique a requerente para:
- A alegar e comprovar quais os exactos rendimentos de que dispõe o respectivo agregado familiar;
- A alegar e comprovar quais as despesas mensais fixas que detém o respectivo agregado familiar;
- Esclarecer quais as diligências concretas de procura de casa para arrendamento que efectuou após reunir com a Câmara Municipal em 16/11/2021 e quais as propostas de renda que lhe foram apresentadas.
Prazo: 5 dias.”
Esta decisão transitou em julgado.
Nesta sequência, em 26 de Agosto de 2022, B apresentou requerimento alegando os rendimentos e as despesas do agregado e juntou documentos comprovativos (cfr. Referência Citius nº 12708313).
Em 16 de Setembro de 2022, foi proferida a decisão ora em recurso, indeferindo a pretensão de B (cfr. Referência Citius nº 153944701).
Inconformada, B recorre desta decisão, requerendo a sua revogação; terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“a) O objeto do Recurso prende-se com o facto de a Recorrente entender que na sentença proferida existiu uma errónea interpretação e aplicação do direito mormente da aplicação do disposto no artigo 6º-E, nº 7, alínea c), da Lei nº 1 A/2020, de 19 de março, e bem assim da análise da prova produzida e junta aos autos.
b) Dispõe o artigo 6º E, nº 7, alínea c) da Lei 1-A/2020, de 19 de março, ficam suspensos no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório previsto no presente artigo: (…) c) Os atos de execução da entrega do local arrendado, no âmbito das ações de despejo, dos procedimentos especiais de despejo e dos processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa
c) A norma supra mencionada mantem-se em vigor.
d) Ora que o Douto
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