Acórdão nº 79543/21.3YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-05-11

Ano2023
Número Acordão79543/21.3YIPRT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

C... – Comércio de Automóveis, S.A., pessoa coletiva n.º ..., com sede em ..., instaurou injunção que seguiu os termos da ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias contra P... Transporte de Passageiros Lda., pessoa coletiva n.º ..., com sede em ..., destinada a obter a condenação desta no pagamento da quantia de € 4 415,39, acrescida de juros de mora legais que ascendiam, à data, a € 867,96 e despesas de cobrança no valor de € 40,00, devida por realização de serviço de reparação de veículos.

A Ré deduziu oposição, concluindo pela sua absolvição, alegando, em resumo que a Autora procedeu à reparação do seu veículo e emitiu a fatura, mas que tal não é devida porque provém de uma deficiente/negligente ou não resolução do problema de que a viatura sofreu desde que foi adquirida.

Foi agendada a audiência de discussão e julgamento e a Autora notificada para tal, veio apresentar resposta, concluindo pela improcedência, alegando, em síntese, que a viatura foi sendo reparada não tendo relação com o serviço aqui peticionado.

Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou a ação procedente e, em consequência, condenou a Ré P... Transporte de Passageiros Lda. a pagar à Autora C... – Comércio de Automóveis, S.A., a quantia de € 4 415,39 (três mil e trinta e cinco euros e dezassete cêntimos), acrescida de juros moratórios comerciais supletivos desde a data de vencimento das faturas até efetivo e integral pagamento, e da quantia de € 40 (quarenta Euros) relativa a indemnização legalmente prevista.

Inconformada com a mesma veio a Ré recorrer apresentando as seguintes conclusões:

a) Não pode manter-se a decisão recorrida no que respeita ao facto provado 1.º na parte que se transcreve: “… DESTINANDO-SE À ACTIVIDADE DA RÉ DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS”. Está errada a decisão de facto constante do facto provado 1, sendo nula a sentença recorrida porque decide sobre questão que não lhe foi colocada, ou seja, dá-se como provado no facto provado 1 que a R destinou a viatura ..-QT-.. ao transporte de passageiros. Não existe no texto da decisão recorrida, nomeadamente da fundamentação, menção a qualquer meio de prova que sustente a decisão do facto provado 1.º nesse particular facto / pormenor, nem tal decorre por acordo entre A e R, quer seja por afirmação expressa, quer seja por omissão de resposta ou de impugnação a essa alegação, que repete-se teria que ter sido feita pela A no requerimento inicial, alegação sujeita a prova igualmente feita pela A, o que não sucedeu.
b) Igualmente está errada a decisão de facto relativa ao facto provado 7.º, uma vez que inexiste prova que sustente esta decisão. Nas declarações de parte da gerente da recorrente, sujeita a juramento, esta gerente afirmou que desconhecia o valor da reparação até ter sido notificada de que a reparação estava concluída e que teria que pagar, isto porque, sempre a viatura havia feito as manutenções nas oficinas da A, havendo confiança e boa relação entre partes para que as manutenções e reparações fossem sempre feitas sem necessidade de contato prévio, independentemente dos valores a pagar e tanto assim era que a A até procurou junto da marca que representa e até conseguiu, uma comparticipação de 75% do valor da reparação, mas que depois acabou, estranhamente, diga-se, por não a refletir na conta / fatura que apresentou à recorrente. Se a M... aceitou assumir 75% do valor da reparação porque é que a A não fez refletir isso na fatura que apresentou à recorrente? Fica a explicação por dar, pois que é incongruente com o facto provado 7.º, mas também no facto provado 8.º.
c) Em 14.06.2018 o veículo entra na oficina da A com quebra de motor, inserido ainda no sistema de garantia, mas a 26.07.2018, aquando da desmontagem do motor e consequente necessidade de reparação já o referido veículo não se encontrava no sistema com garantia, decorrendo dos factos provados 3.º, 4.º e 5.º que independentemente do conhecimento e consentimento da recorrente para a desmontagem e reparação, já o motor da viatura havia sido desmontado e averiguada a causa da quebra do motor, que se identifica no facto provado 5.º como uma deficiente lubrificação do motor, mas que não tem sustentação de prova (nem documental, nem testemunhal), porque na fundamentação encontra-se escrito que “relativamente a origem da reparação, tal foi apontada como sendo da bomba de óleo ou outra causa indireta, que provocou desgaste nas capas de bielas (acrescento nosso - não vielas) e cambota (acrescento nosso - não cambotas) do motor…”; quanto à inexistência de certeza da origem da quebra do motor: foi de outra causa indireta?
Essa outra causa indireta decorre ou não da permanente luz do motor acesa que tantas vezes obrigou à paralisação da viatura nas oficinas da A e que esta nunca resolveu?
d) Consta da decisão de facto do facto provado 2.º que a viatura permanentemente entrou nas oficinas da A com a luz de motor acesa, sendo possível afirmar que o problema inicial do motor, decorrente da luz de motor acesa, manteve-se desde 10.10.2016 até à quebra do motor e que a A não o resolveu, sendo certo que a A não identificou um problema concreto externo ou autónomo ao motor da viatura que sustente a quebra do mesmo, decorrendo tal do próprio texto da decisão recorrida cuja fundamentação está em contradição com a decisão de facto constante do facto provado 5.º. Não pode a decisão recorrida dar como assente que a quebra de motor se deveu à bomba de óleo, externa ao motor e fundamentar esta decisão, referindo que a origem da reparação “foi apontada como sendo da bomba de óleo ou de outra causa indireta”. A decisão recorrida é nula porque não identifica, nem decide sobre questão que lhe foi colocada, sendo omissa nessa análise.
e) Está provado na al. d) do facto provado 2.º e nas restantes alíneas desse facto provado que a viatura sempre ostentou problemas de motor, entrando frequentemente nas oficinas da A com a luz do motor acesa até à sua quebra (de motor), não se identificando a origem concreta para a quebra do motor, que, como refere a decisão recorrida poderá ter sido a bomba de óleo ou outra causa indireta que provou desgaste nas capas de bielas e cambota do motor, não comum, diga-se para a quilometragem da viatura e na viatura e questão, atento o seu segmento alto. Se a decisão recorrida preconiza uma “outra causa indireta” para a origem da quebra do motor, não pode concluir que não há ligação entre a permanente luz de motor acesa, que os serviços da A nunca resolveram, e a quebra do motor.
f) A decisão recorrida erra quanto à decisão de direito, porque a considerar-se existir garantia de 2 anos, ela conta-se desde a data da entrega da viatura à R ou seja 04.07.2016 e não da data da matrícula (como consideram os mecânicos da A – cfr expressão da decisão recorrida inserta na pag. 9 de 10), o que significa que na data da quebra do motor e entrada na oficina da A, em 14.06.2018 – cfr facto provado 3.º, estava ainda em garantia, mas caso se considere que a garantia é a de 6 meses, igualmente assiste razão à recorrente, porque em 10.10.2016 (antes de 6 meses desde a data da entrega da viatura à recorrente, em 04.07.2016) a viatura deu entrada nas oficinas da A com a luz do motor acesa, defeito que foi perdurando, sem ser resolvido pela A, de forma reiterada, ate à quebra do motor por outra causa indireta, conforme decisão recorrida, o que equivale a dizer que a luz de motor acesa, por outra causa indireta esteve na base da quebra do motor, uma vez que foi o único e exclusivo defeito que a A não reparou nas muitas intervenções que fez à viatura desde 10.10.2016, cabendo-lhe à A a prova de que havia eliminado o defeito do veículo, o que não só não fez, como nem sequer alegou que não o poderia ter feito!
g) Está incorreta a interpretação, dos arts.º 913.º a 922.º conjugados com os art.ºs 798.º e seguintes, todos do CC, constante da decisão recorrida, porque a interpretação a conferir a essas normas é a de que vendida a coisa com defeito e denunciado o defeito junto do vendedor, cabe a este eliminá-lo, o que in casu a A não fez, não obstante a recorrente sempre ter assistido o veículo nas oficinas da A.. A A não eliminou o defeito, persistente, desde 10.10.2016, no motor da viatura propriedade da recorrente, não sendo esta responsável pelo pagamento da fatura reclamada pela A nestes autos, até porque a A não alegou no requerimento inicial de injunção que o problema / defeito decorria de deficiente lubrificação ou que não resultou de anteriores reparações, nem poderia resultar, diga-se, porque a quebra do motor vinha sendo anunciada desde 10.10.2016 através da persistente luz de motor acesa, de que a A sempre teve conhecimento, ocorrendo omissão de reparação por parte da A, pois consta da decisão recorrida que poderá ter havido uma outra causa indireta para esse surgimento (quebra do motor).
Pelo exposto deve proceder o presente recurso e ser a sentença recorrida substituída por decisão final que absolva a recorrente, por tanto ser de Direito e de Justiça.

Não foram apresentadas contra alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
II. OBJETO DO RECURSO:

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, impondo-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo certo que o tribunal não se encontra vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e que visam sustentar os seus pontos de vista, isto atendendo à liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito.
Assim considerando o teor das conclusões apresentadas pela Recorrente e atrás supra transcritas, importa ao recurso aferir...

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