Acórdão nº 7917/08.2TBSTB-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12-05-2022

Data de Julgamento12 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão7917/08.2TBSTB-C.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora







I. RELATÓRIO

1. J.M.C.M., executado nos autos à margem identificados, nos quais figura como exequente, Caixa Geral de Depósitos, S.A., veio interpor recurso do despacho que indeferiu a anulação da venda do imóvel penhorado, tendo na sua apelação formulado as seguintes conclusões:

I- O despacho objeto do presente recurso encontra-se ferido de nulidade, por violação do disposto no Art.6º, n.º 6, al. b) e n.º7 da Lei n.º 16/2020, de 29/05.

11- O imóvel a que respeitam as diligências de venda (fracção autónoma designada pela letra "T", correspondente ao segundo andar direito do lote (…), destinado a habitação, sito na Rua (…), descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) com o (…) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) da União de Freguesias de (…), constitui a casa de morada de família do executado.

III- As diligências de venda deviam ter sido automaticamente suspensas, e não o foram.

IV- No que respeita às ações executivas, vigorava um regime excepcional que previa a suspensão de quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo.

V- No que respeita ao Agente de Execução, estamos em crer que todas as medidas excecionais previstas, lhe são dirigidas pois ao mesmo cabe efetuar as diligências em processo executivo, nomeadamente, as diligências de venda do imóvel;

VI- Entendendo-se que não podiam ser efetuadas notificações aos intervenientes processuais para pronúncias sobre modalidade e valor base de venda, nem ser promovidas vendas judiciais, em qualquer modalidade, nomeadamente, leilão eletrónico.

VII- As diligências de venda do imóvel em questão devem ser consideradas nulas por violação de dispositivo legal, nomeadamente, o artigo 6º, alínea b) e n.º 7 da Lei n.º 16/2020, de 29/05, uma vez que tinham necessariamente que ser suspensas.

VIII- E, consequentemente, deverá a venda realizada ser anulada, com referência ao disposto no artigo 839º n.º1, al. c) do C.P.C..

NESTES TERMOS,

E nos melhores de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, apela-se que, que deve ser dado provimento ao presente recurso, sendo aquele despacho revogado e substituído por outro que determine a nulidade dos atos realizados com vista à venda do imóvel e, consequentemente, anulando-se a referida venda.

Fazendo-se assim a habituada e sã Justiça.”.

2. Não foram apresentadas contra-alegações.

3. O objecto do recurso, delimitado pelas enunciadas conclusões (cfr.artºs 608º/2, 609º, 635º/4, 639º e 663º/2 todos do CPC) reconduz-se apenas à questão de saber se o acto de venda do imóvel em apreço deve ser anulado.

II- FUNDAMENTAÇÃO

4. Os factos a considerar na decisão deste recurso são os que constam do antecedente relatório e, bem assim, os seguintes, de acordo com a documentação junta aos autos:

4.1. No dia 24.6.2020, o Agente de Execução, notificou o executado na pessoa da sua mandatária de que “encontra-se em curso a venda do imóvel penhorado através de leilão electrónico, com a referência do leilão (…).

Sendo que, se encontra agendada cerimónia de encerramento para o dia 08.07.2020, pelas 14:30 horas, no local/morada Lisboa - Palácio da Justiça, Piso 1 – Rua Marquês de Fronteira, 1098-001 Lisboa.

Cuja consulta e apresentação de propostas deverão ser apresentadas na plataforma e-leiloes.pt (Link: (…)”.

4.2. No dia 3.7.2020, o executado requereu a suspensão da venda ao abrigo do art.6º-A, n.º7 da Lei n.º 16/2020, de 29/05;

4.3 Em 05-11-2020 foi proferido o seguinte despacho: “Vem o executado requerer a suspensão da venda do imóvel melhor identificado no requerimento de 03.07.2020 referindo que a mesma causará efectivo prejuízo à sua subsistência, mas não prejuízo grave à subsistência da exequente uma vez que esta já beneficia da penhora e dos descontos que vem sendo efectuados no seu salário.

Notificados, opuseram-se a exequente e a proponente Eloy Torres de Carvalho Unipessoal Lda.

Ora bem.

Nos presentes autos, está patenteada que a venda do imóvel acima referido foi concretizada na modalidade de venda por leilão electrónico em 08.07.2020 e que a proposta apresentada pela proponente observou todos os requisitos legais. Como se sabe, a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade resultante das alíneas d) e e) do artigo 6.º-A da Lei 16/2020 de 29.05, prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo correspondente à vigência da suspensão (artigo 6.º-A, n.º 8).

Nos casos em que os actos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis sejam susceptíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente, este pode requerer a suspensão da sua prática, desde que essa suspensão não cause prejuízo grave à subsistência do exequente ou um prejuízo irreparável, devendo o tribunal decidir o incidente no prazo de 10 dias, ouvidas as partes (artº 6.º-A, n.º 7).

Salienta-se que este regime apenas se aplica em relação aos imóveis do executado que não constituam a sua casa de morada de família, já que, no caso contrário, uma suspensão automática do processo, nos termos do artº 6.º-A, n.º 6, b), não tem sequer de ser requerida.

No vertente, constata-se que o executado não fundamentou convenientemente em que é que se traduz o prejuízo que para a sua subsistência resulta da venda do imóvel, limitando-se a decalcar o dispositivo legal que invocou em sua defesa. Com efeito, o requerimento apresentado não contém um único facto que desenvolva a afirmação conclusiva a partir do qual pode o tribunal apreciar o mérito deste incidente.

Nomeadamente não indica se obtém algum tipo de rendimento que provenha da exploração do imóvel, nem especifica o destino que é dado ao mesmo. Ora, a não alegação de factos concretos que permitam sustentar o pedido determina a ineptidão do referido requerimento. Assim, uma vez que a venda já foi efectuada, faltando apenas lavrar o documento que a consubstancia (cfr. artº 875º CC por escritura pública de compra e venda) não há motivo para obstaculizar a concretização dessa formalidade substancial, que é a derradeira, uma vez que as soluções que foram sendo adoptadas em termos de suspensão dos prazos, no quadro da legislação de emergência surgida no âmbito da pandemia mundial, provocada pelo vírus SARS- CoV-2, causador da doença COVID 19, não podem prevalecer, intemporal e indefinidamente sobre o direito da exequente que beneficia do princípio do favor creditoris inerente à finalidade da execução patrimonial, que se atinge à custa do...

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