Acórdão nº 772/19.9T8AVR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 27-09-2022

Data de Julgamento27 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão772/19.9T8AVR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
PROCESSO N.º 772/19.9T8AVR.P1

[Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro - Juízo Local Cível de Aveiro - Juiz 1]

Relator: Fernando Vilares Ferreira
Adjunta: Maria da Luz Seabra
Adjunto: Artur Dionísio Oliveira

SUMÁRIO:
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I.

RELATÓRIO

1.
AA intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra S..., S. A. (anteriormente denominada de Companhia de Seguros T..., S.A.).
Alegou, sem síntese, que a 6 de novembro de 2017 ocorreu uma colisão entre veículos, que causou danos no veículo propriedade do A.; que a responsabilidade civil do veículo que embateu no do A. estava transferida para a R. e foi assumida pela mesma a 28 de dezembro de 2017; que a proposta final de regularização de sinistro da R. foi de 1000€, por ter havido perda total do veículo; que a R. não disponibilizou ao A. o relatório de peritagem a fim de se confirmar a perda total nem lhe comunicou as propostas nos termos e prazos previstos na lei; e que o veículo em causa era usado diariamente nas deslocações quotidianas do A., tendo este necessitado de utilizar um veículo emprestado, cujo custo ascenderia ao montante global de nunca menos de 5000€, havendo por isso a considerar o dano da privação de uso, que a R. se negou a assumir.
Pediu a condenação da Ré no pagamento do valor da perda total do veículo do A., nunca inferior a 1000€, bem como de indemnização pelo dano de privação de uso do mesmo, no valor de 10€/dia desde a data do acidente, valores acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, ao dobro da taxa legal, desde a data da assunção da responsabilidade e até efetivo e integral pagamento, e ainda a aplicação de sanção pecuniária compulsória à taxa de 5% desde a data do trânsito em julgado até efetivo e integral pagamento.
2.
A Ré contestou, sustentando que o A., ainda que possa ter direito a ser ressarcido pelos danos sofridos pelo seu veículo, não tem direito ao recebimento do montante que reclama a título de privação de uso do veículo e que age em abuso de direito quando, conhecendo pelo menos desde 28 de dezembro de 2017 o valor proposto, isto é, 52 dias após o acidente, vem reclamar o pagamento de indemnização a título de privação do uso do mesmo veículo por um período de 479 dias; aceitou que o acidente aconteceu por culpa exclusiva do condutor do veículo de matrícula ..-..-FI, bem como a transferência de responsabilidade para si; mais alegou que enviou ao A. informação de que este poderia consultar o processo de sinistro através de serviço online (que este recebeu), bem como comunicação solicitando-lhe o seu contacto telefónico para agendar a peritagem ao seu veículo; que tal peritagem ocorreu na oficina para onde este havia sido transportado na sequência do acidente, estimando-se a reparação daquele em 3663,42€, tendo o mesmo um valor comercial não superior a 1000€ e os respetivos salvados um valor de 130€; que enviou uma carta ao A. comunicando-lhe essas informações e que a reparação do veículo não era viável, colocando à disposição daquele o valor de 870€; que o A. não aceitou essa proposta, alegando que a mesma não contemplava dano de privação de uso por ele alegadamente sofrido, pelo que, tendo em vista a resolução definitiva do assunto, lhe propôs o pagamento da quantia total de 1000€, já incluindo uma verba referente à paralisação da viatura; sublinhou que o A. não tem direito ao recebimento de qualquer quantia a esse título, porque já em data anterior ao acidente o veículo não era ou não podia ser utilizado, já que não possuía seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel nem certificado de inspeção periódica obrigatória em vigor, e ainda porque a simples privação do uso de um veículo, sem a demonstração de qualquer dano concreto ocasionado por essa privação não é suscetível de fundar a obrigação de indemnizar.
Aproveitou para requerer a intervenção principal provocada de BB, que conduzia o veículo de matrícula ..-..-FI com uma TAS de 1,14g/l, por ter direito de regresso sobre o mesmo por todas as quantias que venha a pagar em consequência do acidente dos presentes autos.
3.
Admitido o incidente de intervenção principal provocada, o Interveniente BB também contestou, invocando que o veículo em causa já há muito que não circulava na via pública, dado que além de não possuir seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel nem certificado de inspeção periódica obrigatória válido, estava imobilizado por avaria mecânica, pelo que, conhecendo a falta de fundamento da presente ação, o A. usa-a de forma manifestamente reprovável, aproveitando o facto de um veículo da sua propriedade se encontrar envolvido num acidente de viação, cuja responsabilidade foi transferida para a R., para reclamar danos inexistentes e sem fundamento; aderiu ao sustentado pela R. em matéria de abuso de direito e aceitou igualmente que o acidente aconteceu por sua culpa exclusiva e que a responsabilidade do seu veículo se encontrava transferida para a R.; concluiu, pedindo que a ação seja julgada totalmente improcedente e que o A. seja condenado como litigante de má-fé no pagamento de multa e indemnização.
4.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte DISPOSITIVO:
[Por todo o exposto, julga-se parcialmente procedente o pedido formulado na presente ação e:
- condena-se a R. a pagar ao A. indemnização pela perda total do veículo com a matrícula ..-..-HD, no valor de 870€ (oitocentos e setenta euros), acrescido de juros à taxa legal, desde a data da sua citação e até efectivo e integral pagamento;
- absolve-se a R. do demais pedido.
*
Custas pelo A. e pela R., face aos seus decaimentos.
(…)
Uma vez que se impõe o prosseguimento dos autos para apreciação de eventual litigância de má-fé do A., notifique-se este para, querendo, se pronunciar como tiver por conveniente, no prazo de 10 dias.]
5.
Inconformado com a sentença, o Autor interpôs o presente recurso de apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo, versando matéria de facto e de direito, assente nas seguintes CONCLUSÕES:
1.ª – O A. intentou a presente ação declarativa contra a Companhia de Seguros T..., S.A., pedindo que esta fosse condenada no pagamento do valor da perda total do veículo do A., nunca inferior a 1.000€, bem como uma indemnização pelo dano da privação de uso, no valor de 10€ dia, desde a data do acidente, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, desde a data da assunção da responsabilidade e ainda a aplicação da sanção pecuniária compulsória à taxa de 5%.
2.ª – A Sentença de que se recorre julgou parcialmente procedente a ação, condenando a Ré a pagar ao A. indemnização pela perda total do veículo com a matricula ..-..-HD no valor de 870€ (oitocentos e setenta euros) acrescido de juros à taxa legal, desde a data da sua citação e até efetivo e integral pagamento. Absolvendo-se dos demais pedidos.
3.ª – Determinou-se ainda o prosseguimento dos autos para apreciação de eventual litigância de má fé, notificando-se para se pronunciar, no prazo de 10 dias, o que se tiver por conveniente.
4.ª – NÃO SE CONFORMANDO COM A SENTENÇA PROFERIDA NOS PRESENTES AUTOS, da mesma vem interpor recurso sobre a matéria de facto e de direito.
5.ª – O Recorrente não se conforma com o julgamento da matéria de facto, no que concerne ao julgamento do ponto essencial que era o do valor do veículo. O tribunal considera o valor do veículo no montante de 870€ recorrendo à carta enviada pela R ao A, mencionada no ponto 10 da matéria provada, tão só. Nada refere de como foi aferido tal valor, apenas se dá por provado, porque o mesmo consta da informação da carta enviada pela R. ao A. que foi elaborada com base no relatório de peritagem.
6.ª – Porém, ao contrário do que se afirma na douta sentença, foi feita prova através de uma testemunha que aferiu o valor em concreto do veículo em causa. Testemunha essa, que serve de base para prova do facto 7, quando refere no seu depoimento ter existido um acordo de compra e venda do referido veículo, referindo-se expressamente na douta sentença que tal depoimento enquadrou de modo pormenorizado a negociação com o A. quanto à compra e venda do veículo, inclusivamente quanto ao intervalo de preços, consoante o da reparação.
7.ª – Porém, apesar do que é dito na douta sentença e do Tribunal ter aferido que o testemunho foi pormenorizado, até mesmo ao preço da compra, já não diz, exatamente o que foi referido pela testemunha, que concretizou o valor.
Segundo o depoimento de CC, quanto a valor do veículo, gravado sob o ficheiro 20211020095939_3859963_2870298, dia 20/10/2021 9.59.40/10.14.37, dúvidas não há que o veículo estava a andar, em pleno funcionamento, e apenas foi para a oficina em reboque porque não tinha seguro nem inspeção, o que não retira valor ao veículo, naturalmente. E que o valor acordado era entre os 1.500€ e os 1.600€. Dependendo da reparação.
8.ª – E ainda que no momento do acidente a reparação já havia sido realizada.
Ora, naquele momento o carro valia efetivamente 1.500€, 1.600€.
8.ª (a) – Tendo sido o próprio Interveniente a arrolar a testemunha que colaborou para a descoberta da verdade e apesar de não ter sido a testemunha arrolada pelo A, certo é que a mesma fez prova do valor do veículo e tal terá de ser considerado nos termos do art. 413º do CPC.
9.ª – Mais ainda porque não se determina apenas o valor comercial do veículo por si só, mas efetivamente, determina-se o valor concreto daquele veículo. Não um valor com base em veículos idênticos e aferido por semelhança, mas aquele era o valor patrimonial, pelo qual o mesmo poderia ter sido vendido não fosse o acidente.
10.ª – Como refere a mais vasta jurisprudência e doutrina, na apreciação da excessiva onerosidade importa ter em atenção fatores subjetivos, como os respeitantes ao devedor e à
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