Acórdão nº 76/12.8BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-01-11

Ano2023
Número Acordão76/12.8BEBJA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO

A. J. S. F. (doravante Impugnante ou Recorrente) veio recorrer da sentença proferida a 12.04.2018, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, na qual foi julgada improcedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre as liquidações adicionais de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), relativas aos anos de 2007, 2008 e 2009.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Nas suas alegações, o Recorrente concluiu nos seguintes termos:

“A. Vem o presente Recurso de Apelação interposto da circunstância de o aqui Apelante não concordar minimamente com a decisão que negou provimento à Impugnação Judicial apresentada.

B. Desde logo, porquanto, em sede de douta decisão ora recorrida, considerou, então, o Dign.º Tribunal "a quo" que «a questão suscitada no projecto de decisão de indeferimento liminar da reclamação graciosa consubstanciada no facto de os actos de liquidação contra que reagem os Impugnantes não serem impugnáveis autonomamente, atendendo a que não foi apresentado pedido de revisão da matéria colectável aí fixada, procede, constituindo mesmo excepção peremptória, de conhecimento oficioso.».

Isto porque,

C. Na verdade, embora os artigos 86, n.º 5 da LGT e 177.º, n.º 1 do CPPT exijam a prévia apresentação de pedido de revisão da matéria colectável como condição da impugnabilidade judicial de actos tributários, com base naqueles erros, uma tal condição de impugnabilidade não funciona se na própria Impugnação Judicial forem invocados outros vícios legalmente previstos - conforme resulta da nossa Jurisprudência, entre muitos outros Acórdãos, veja a título meramente exemplificativo os Doutos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 19-03-2002 e de 24-09-2002, proferidos no âmbito respectivamente nos Processos n.º 6109/01 e n.º 6754/02, e mais recente, ainda, o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28-06-2017, proferido no âmbito do Processo n.º 018/17, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

D. Com efeito, e analisada atentamente a Impugnação Judicial apresentada, resulta de forma absolutamente inequívoca que o Impugnante, além do vício de falta de fundamentação, alega factos concretos que verificados, determinarão a inexistência de imposto, ou seja, o Impugnante não "ataca" directamente o recurso à avaliação indirecta e, consequentemente, os resultados obtidos por essa mesma avaliação, antes sim, alega que os factos tributários que estiveram subjacentes à liquidação de imposto em sede de IVA, não apresentam qualquer suporte real (e por conseguinte, são insusceptíveis de enquadramento normativo e que, por sua vez, não despoletam qualquer direito ao surgimento de imposto junto da Fazenda Nacional).

E. Donde, em bom abono da verdade, é precisamente a inexistência de factos tributários (seja uma conduta levada a cabo pelo Impugnante que à luz das normas legais em vigor não poderão determinar o pagamento de qualquer imposto) que permitam a liquidação de imposto, que o Impugnante alega ao longo da sua Impugnação Judicial.

F. Deste modo, a própria inexistência dos factos tributários é um vício cujo conhecimento por este Dign.º Tribunal não está sujeito à dedução prévia de um pedido de revisão da matéria tributável e, por conseguinte, não sujeita ao regime previsto nos artigos 86.º, n.º 5 da LGT e 117.º, n.º 1 do CPPT.

G. Ora, no caso, o aqui Impugnante tendo imputado ao acto tributário impugnado a ilegalidade decorrente da respectiva falta de fundamentação, e, bem assim matéria susceptível de abalar a existência do tributo em causa, não é aplicável a condição de impugnabilidade, por falta de reclamação para a Comissão de Revisão (cfr., neste sentido, os acs. do STA, de 30/11/2016 no proc. nº 0846/14 e de 20/06/2012, no proc. 0165/12, todos disponíveis em www.dgsi.pt).

H. Ou seja, é admissível a impugnação contenciosa do acto tributário, ainda que a decisão de fixação da matéria tributável não tenha sido objecto de reclamação administrativa.

I. Neste sentido, o douto Acordão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15 09-2010, proferido nos autos de proc. 0406/10, «I - Os artigo 86.º n.º 5 da LGT e 177.º, n.º 1 do CPPT exigem a prévia apresentação de pedido de revisão da matéria colectável como condição da impugnabilidade judicial de actos tributários com base em erro na quantificação da matéria colectável ou nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos. II - A expressão "erro na quantificação" adoptada nas normas referidas restringe de forma clara esse erro aos casos em que se verifica por parte da comissão de revisão erro material de cálculo fundado em dados objectivos tecnicamente apreensíveis, aí se não englobando as situações em que o impugnante alega a inexistência dos factos tributários.» (disponível em www.dgsi.pt).

J. Pelo exposto, discordando da douta sentença recorrida, sempre com a devida vénia, resulta de forma absolutamente inequívoca que não estamos perante qualquer excepção de inimpugnabilidade dos actos da liquidação de IVA, do que, resulta que a douta sentença recorrida não fez, portanto, correcta interpretação e aplicação do disposto no nº 5 do art. 86° da LGT e no art. 117° do CPPT, impondo-se, por conseguinte, a sua revogação.

OUTROSSIM, SEM PRESCINDIR,

K. Instruída e discutida a presente causa, resultou provado nos autos toda a matéria prevista no ponto "6" - "Matéria de facto", factos esses que aqui se consideram como integralmente reproduzidos, para todos os devidos e legais efeitos, tendo em conta o princípio da economia processual, designadamente, e no que aqui importa, o teor do Relatório de Inspecção Tributário em causa, conforme consta do ponto G) a I) dos factos provados.

L. Mais, foi ainda dado como provado que «S) Os Impugnantes procederam à junção à petição inicial de quatro documentos particulares de declaração de dívida sem reconhecimento notarial de assinaturas ou lavrada na presença de notário sendo que uma das beneficiárias está consignado não saber assinar.»

M. Por outro lado, foi dado como não provado que, «Especificadamente não resulta provado o teor dos documentos particulares juntos pela sua falta de autenticação das assinaturas apostas, pela ausência de qualquer outra prova de suporte como seriam talões de depósito dos montantes alegadamente mutuados e os respectivos reembolsos. Ademais, não se conferiu qualquer credibilidade ao teor dos depoimentos quer pela sua notória falta de segurança nas respostas dadas às questões, quer pela relação de amizade / familiaridade das testemunhas que intuiu, desde logo, virem depor "de favor" e ainda e especialmente pelo desconhecimento efectivos dos factos em apreço.»

N. Contudo, e sempre com todo o devido e merecido respeito, que aliás é muito, tal fundamentação, porque não tem devidamente em consideração o panorama factual e jurídico inerente, não poderá prevalecer, conforme infra se demonstrará.

O. Assim, cumpre debruçarmo-nos sobre a prova produzida, de forma a demostrar que os factos provados e não provados - aqui colocados sob sindicância - haveriam de ter tido decisão diversa da proferida.

Desde logo.

P. Conforme resulta do depoimento das testemunhas inquiridas à ordem dos presentes autos, e cujo teor de acordo com a transcrição de prova supra, aqui, por razões de economia processual, se dá por integralmente reproduzido, jamais se poderia concluir, com a certeza exigivel, que, entre outras situações, nos períodos de Janeiro 2007 a Dezembro de 2009, terá o Contribuinte A. F., aqui Apelante, feito ingressar na sua conta bancária "depósitos regulares de numerário em montante superior aos rendimentos declarados à AF", montantes esses que, no âmbito daquela inspecção tributária, foram considerados como "receitas provenientes da sua actividade de exploração de máquinas de brindes, omitidas da contabilidade/escrita e das declarações fiscais apresentadas".

Q. De facto, não corresponde de todo à verdade que tais depósitos "regulares", como bem constata a Administração Tributária, sejam receitas provenientes da actividade desenvolvida pelo aqui Apelante. Na verdade, ao contrário do vertido naquele Relatório, nada têm a ver com o desenvolvimento daquela sua actividade comercial.

R. Com efeito, concluiu a Administração Tributária que o aqui Visado procedeu a depósitos injustificados de quantias em numerário que, no ano de 2007, perfizeram €: 88.395,25, no ano de 2008 €: 77.531,77 e no ano de 2009 €: 77.913,20.

S. Ora, efectivamente, não nega o aqui Visado que tais depósitos tenham sido realizados, no entanto, sucede que, conforme melhor resulta dos extractos bancários juntos ao aludido Relatório de Inspecção Tributária, certo é que, na prática, quase todo o dinheiro depositado, em numerário, foi de imediato levantado, em cheque próprio, à "boca do balcão", resultando de uma prática diária e regular adoptada pelo aqui Apelante, no sentido de ir aumentado o seu "cash-flow" para que tivesse uma maior margem de manobra e maior facilidade na contratação de crédito imobiliário - conforme referido pela testemunha S. F.

T. Donde, nunca tais montantes poderiam ter sido considerados e qualificados como o foram, para efeitos de quantificação do "rendimento" auferido peio aqui Apelante.

U. Até porque, se devidamente analisados os extractos bancários em causa, o que, salvo o devido respeito, assim não sucedeu por parte da Administração Tributária, facilmente decorre que o aqui Visado era detentor de vários créditos pessoais,

V. O que, aliado aos demais débitos, normais e correntes de um qualquer cidadão em economia doméstica, além de remeterem para um diferencial positivo de pouca importância, claramente evidenciam que a situação financeira do aqui Apelante, afinal, não corresponde ao espelho da movimentação (em depósitos de numerário) da sua conta bancária, antes, pelo contrário!

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