Acórdão nº 750/10.3TBMDL-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28-09-2023

Data de Julgamento28 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão750/10.3TBMDL-G.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

Em execução movida pelo Banco 1..., SA, contra os executados AA e BB, foi penhorado o seguinte imóvel: prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...40 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...35.
No dia 15 de novembro de 2017, a Sra. Agente de Execução decidiu que o prédio urbano seria vendido através de leilão eletrónico, nos termos do artigo 837.º do Código de Processo Civil, sendo o valor base fixado em € 115 648,00 e o valor mínimo de propostas fixado em € 98 300,00 (85% do valor base).
A melhor proposta foi apresentada pelo Exequente, no dia 11 de junho de 2019, tendo a Sra. Agente de Execução decidido adjudicar o imóvel àquele, pelo valor de € 104 000,00.
O título de transmissão que documenta tal facto data de 8 de julho de 2019, sendo que o registo de aquisição em sede de processo executivo se encontra averbado sob a AP. ...46 de 26 de junho de 2019 da descrição predial n.º ...40, da Conservatória do Registo Predial ....
Por requerimento de 23 de fevereiro de 2023, veio CC, filha dos Executados, requerer que lhe fosse reconhecido o direito de remição sobre o prédio urbano penhorado nos autos, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...40 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...35.
A Sra. Agente de Execução, no dia 28 de fevereiro de 2023, decidiu não admitir o requerido, por extemporâneo, alicerçando a sua fundamentação no preceituado pelo artigo 843.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil.
Nessa sequência, CC veio reclamar do ato da Sra. Agente de Execução, por entender que, no caso, tem aplicação não o disposto na alínea a) do referido normativo, mas sim a alínea b), designadamente, na parte em que refere que o direito de remição pode ser exercido até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta. A final, requerer que seja dada sem efeito a decisão da Sra. Agente de Execução.
Cumprido o contraditório, o tribunal a quo considerou que ao caso tinha aplicação a alínea b) do n.º 1 do artigo 843.º e, nesses termos, o direito de remição podia ser exercido até ao momento da entrega dos bens (hipótese pensada para os bens móveis) ou da assinatura do título que a documenta (que, no caso de bens imóveis, é, e.g., o título de transmissão que, no caso em apreço, data de 8 de julho de 2019,– cf., ainda, artigo 875.º do Código Civil).
Nessa conformidade, decidiu que “pretendendo a requerente CC exercer o direito de remição volvidos cerca de três anos e seis meses depois do título que documentou a venda/adjudicação do imóvel ao Exequente em sede de processo executivo, age de forma manifestamente intempestiva, ao abrigo do disposto no artigo 843.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil
E por essa razão indeferiu a reclamação do ato da Sra. Agente de Execução, mantendo a decisão por esta proferida (no sentido de que o direito de remição agora exercido é extemporâneo), pese embora com outros argumentos, designadamente, por aplicação da citada alínea b), e não da alínea a), do preceito legal em análise.
*
Não se conformando com a decisão a remidora dela recorreu, apresentando as seguintes conclusões:

1ª A ora Recorrente é filha dos executados.
2ª No âmbito da presente execução, o Banco Exequente penhorou o imóvel correspondente à casa de habitação dos Executados.
3ª E, em se da acção executiva, ficou estabelecido que o imóvel fosse vendido na modalidade de leilão electrónico.
4ª No leilão electrónico, a melhor proposta de aquisição foi apresentada pelo Banco Exequente, no valor de 104.000,00 € e, por via disso, a 11/06/2019, foi-lhe adjudicado o imóvel por aquele valor.
5ª Entretanto, foi agendada para o dia 01/03/2023 a diligência para entrega efectiva do imóvel por parte dos Executados ao Banco Exequente.
6ª Nessa altura, a filha dos Executados teve disso conhecimento e a 23/02/2023 veio aos autos exercer o seu direito de remição, enviando, para o efeito, requerimento à AE, acompanhado de cheque bancário no valor de 109.200,00 €.
7ª Por decisão da AE, datada de 28/02/2023, não foi admitido o requerimento para o exercício do direito de remição, por ser extemporâneo.
8ª Por não se conformar com tal decisão da AE, a ora Recorrente, reclamou desse acto, a 02/03/2023.
9ª Por douta Decisão, datada de 16/03/2023, foi decidido indeferir a reclamação do acto da AE, mantendo-se a decisão por aquela proferida, no sentido de que o direito de remição agora exercido é extemporâneo.
10ª Fundamentado o douto Tribunal “a quo” que “tal decisão no sentido que o direito de remição no caso dos bens imóveis só pode ser exercido até à assinatura do título de transmissão, que, no caso em apreço, data de 8 de Julho de 2019 e que o texto da lei quando se refere ao momento de entrega dos bens está a referir-se para os bens móveis.
11ª Salvo o devido respeito, que é muito, não pode a Recorrente concordar com o teor da douta Decisão que, certamente, decidiu de acordo com a sua convicção, mas que a Recorrente discorda de tal interpretação legal feita à alínea b) do nº 1 do artigo 843º do CPC, pelo douto Tribunal “a quo”, quanto a prazo para o exercício do direito de remição.
12ª Efectivamente, o que diz a alínea b) do nº 1 do artigo 843º do CPC é que o direito de remição pode ser exercido até à entrega dos bens.
13ª Não fazendo o legislador, naquela alínea b) do nº 1, ou na alínea a), do artigo 843º do CPC, tal distinção, como é feita pelo Tribunal a quo entre bens móveis ou imóveis.
14ª O que lei distingue quanto ao momento em que pode ser exercido esse direito de remição é na distinção que opera quanto à modalidade de bens de bens estabelecida no respectivo processo executivo.
15ª O que se encontra escrito na alínea b) do citado artigo é que o direito de remição pode ser exercido até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta (entrega).
16ª Não faz a lei naquela alínea b) qualquer referência ao título de transmissão, nem à natureza dos bens.
17ª Na verdade, se o legislador pretendesse solução diferente da que plasmou no texto da lei, teria o cuidado de o escrever, o que não sucedeu neste caso.
18ª E o julgador deve aplicar a lei na forma em que ela se encontra escrita ou nos termos do nº2 do artigo 9º do Código Civil, não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal.
19ª Ora, o objectivo do direito de remição é a preservação do património na família.
20ª Como refere José Alberto dos Reis, Processo de Execução, Vol. 2, Reimpressão, Coimbra, páginas 488-499, que com a devida vénia se transcreve “Com a atribuição deste direito não se prejudicam os credores, pois que a estes pouco importa que o adquirente seja uma pessoa da família do devedor, ou uma pessoa estranha. O que aos credores interessa é o preço por que os bens são vendidos; ora os remidores hão-de pagar, pelo menos, o preço que pagaria um comprador alheio à família do devedor”.
21ª Acrescentando que “Desta maneira, o direito de remição representa uma homenagem prestada à família do devedor. Homenagem justa, porque evita a desagregação do património familiar; homenagem inocente, porque nenhum prejuízo causa aos credores”.
22ª Pelo que, na nossa modesta opinião e de acordo com o que se encontra plasmado na alínea b), do nº 1, do artigo 843º do CPC, o direito de remição exercido...

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