Acórdão nº 744/18.0T8PVZ.P2 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-05

Ano2024
Número Acordão744/18.0T8PVZ.P2
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 744/18.0T8PVZ.P2



Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
AA, por si e na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de BB, CC e marido DD e EE e marido FF, intentaram a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra “A..., Lda.” e “Banco 1..., S.A.”.
O pedido formulado consistiu no seguinte:
A) Sejam as Rés condenadas a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre as frações autónomas A) e B) e consequentemente seja exarada sentença judicial da entrega das referidas frações livres de ónus e encargos a favor dos Autores;
B) Seja proferida sentença de redução judicial da hipoteca voluntária registada a favor da Ré Banco 1..., sob a ap. ...05 de 26/01/2011, sobre o prédio descrito sob o n.º ...63, da freguesia ... e se ordene a notificação da credora hipotecária «Banco 1..., SA» para passar a incidir tal hipoteca apenas sobre as frações C), D), E) e F), excluindo da mesma as frações A) e B), propriedade dos Autores, emitindo, nessa conformidade, competente título de distrate para que possa ser efetivada a entrega definitiva das moradias melhor identificadas como frações A) e B) a favor dos Autores, livres de ónus e encargos ou, alternativamente,
C) Caso assim não se entenda, se decrete a nulidade da escritura de permuta, da escritura de venda e constituição de hipoteca sobre o mencionado prédio e consequentemente, uma vez que não é possível a restituição ao status quo ante, pois que a habitação dos Autores foi demolida, sejam as rés condenadas no pagamento de €535.496,45 (quinhentos e trinta e cinco mil, quatrocentos e noventa e seis euros e quarenta e cinco cêntimos) e a reconhecer o direito de retenção a favor dos autores até que seja integralmente satisfeito o pagamento de tal quantia na sua falta perante terceiros.
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Alegam que por escritura pública de 10 de novembro de 2010, o primeiro A. e a sua falecida mulher outorgaram, com a sociedade «B..., Lda.», um contrato de permuta pelo qual declararam transmitir a esta sociedade a propriedade de prédio urbano sito em ..., em troca da entrega de duas moradias, que corresponderiam às frações “A” e “B” do empreendimento de seis moradias, em propriedade horizontal, que ali iria ser erigido pela mencionada sociedade, tendo fixado o valor do imóvel dado à troca em €500.000,00 e o valor das moradias em €250.000,00 cada.
As condições deste contrato eram do conhecimento da R. «Banco 1..., SA», junto de quem a sociedade «B..., Lda.» contraiu um empréstimo para financiamento da construção, garantido, além do mais, com hipoteca sobre o imóvel.
Em 19-2-2013, a sociedade «B...» vendeu à R. «A...» o imóvel que havia recebido do primeiro A. e sua mulher, com as benfeitorias nele implantadas, assumindo esta, solidariamente com a primeira, a responsabilidade de entregar aos AA. as duas frações livres de ónus e encargos.
Desta venda e assunção de responsabilidades perante os AA. foi inteirada a R. Banco 1..., que a consentiu.
Perante o atraso na entrega das frações, os AA. lograram a entrega das chaves das moradias que lhes estavam destinadas e que ainda se encontravam em fase de acabamento, passando a habitá-las em junho de 2015.
Em 30-1-2018, foi constituída a propriedade horizontal do dito empreendimento.
Continua registada a hipoteca a favor da Banco 1... sobre as frações “A” e “B”, impendendo ainda sobre as mesmas penhora a favor da Autoridade Tributária.
Aduzem os AA. ter adquirido o direito de propriedade sobre as frações por escritura de permuta anterior à constituição e registo dos ónus identificados, pelo que entendem ter direito a obter a entrega judicial e definitiva das duas moradias, correspondentes às frações “A” e “B”, livres de ónus e encargos.
Caso assim não se entenda, uma vez que a transferência da propriedade das duas frações permutadas para os Autores ocorreu com a constituição da propriedade horizontal, na impossibilidade da entrega formal das mesmas nos moldes acordados, ou seja, livre de ónus e encargos, ter-se-á de considerar nulo o contrato de permuta -, o que acarreta a nulidade da hipoteca porquanto incide sobre prédio alheio, que não é pertença nem da primeira R., nem da sua originária transmitente - devendo ser restituído tudo o que em consequência do mesmo tiver sido prestado.
Não sendo possível a reposição do imóvel no seu estado original, têm os AA. direito a que lhes seja restituído o montante correspondente ao preço atribuído às duas moradias, acrescido da quantia de €35.496,45, correspondente ao valor da sanção pecuniária compulsória fixada no contrato de permuta para o atraso na ali convencionada entrega das frações autónomas.
Em face deste crédito, entendem que lhes deve ser reconhecido um direito de retenção sobre as mencionadas frações enquanto não for efetivada a sua entrega definitiva livre de ónus e encargos ou, na impossibilidade da mesma, até que lhes seja pago o crédito que detêm sobre a primeira R., no montante global de € 535 496, 45.
Defendem, outrossim, que, face ao valor atual das quatro restantes frações edificadas no prédio permutado estão verificados os pressupostos para se decrete a redução judicial da hipoteca a essas quatro frações.
Finalmente sustentam que a atuação da R. «Banco 1..., SA» configura uma situação de abuso do direito e de enriquecimento sem causa.
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A R. «A...» não apresentou contestação.
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A R. «Banco 1..., SA» apresentou contestação onde conclui pela total improcedência da ação.
Reconheceu ser conhecedora dos termos do contrato de permuta celebrado entre a sociedade «B..., Lda.» e o primeiro A. e sua mulher e que quando concedeu o financiamento admitia que, uma vez concluídas as seis moradias, desde que as mesmas estivessem livre de ónus e encargos, o valor de quatro delas seria bastante para assegurar o reembolso integral do seu crédito.
Porém, nunca assumiu qualquer compromisso de libertar a hipoteca sobre as moradias a atribuir aos AA. antes do pagamento integral do seu crédito e muito menos em caso de insucesso do empreendimento.
Foram os AA. a assumir o risco inerente a qualquer vicissitude que impedisse a conclusão da obra.
Defende que a hipoteca é oponível aos AA., que o contrato de permuta é válido, que inexiste direito de retenção, que não se mostram verificados os pressupostos da redução da hipoteca, que não se verifica, nem enriquecimento sem causa, nem abuso do direito.
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No despacho saneador, foi proferida decisão de mérito que julgou a ação procedente quanto ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade dos AA. sobre as frações “A” e “B” e improcedente quanto aos demais pedidos.
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Os AA. recorreram desta decisão, tendo sido proferido acórdão que manteve a decisão recorrida na parte em que conclui pela improcedência do pedido de declaração de transmissão das frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B” do imóvel em causa livres de ónus e encargos e do pedido de declaração de nulidade da escritura de permuta e de restituição em espécie do imóvel permutado. O acórdão ordenou o prosseguimento dos autos para apreciação do pedido de redução judicial de hipotecas e das questões do abuso do direito e do enriquecimento sem causa da R. «Banco 1..., SA».
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Os autos prosseguiram com a seleção de temas da prova e com a produção de prova pericial.
Realizou-se audiência de julgamento,
Foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, considerando verificados os pressupostos para a redução da hipoteca a favor da R. “Banco 1..., S.A.” no que se refere à fração “A”, determinando o cancelamento da hipoteca registada pela apresentação n.º ...05, de 26-01-2011.
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Inconformada, a R. “Banco 1...” interpôs recurso da decisão, finalizando com as conclusões que se seguem.
(…)
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Os AA. produziram as seguintes contra-alegações:
(…)
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Os AA. interpuseram também recurso, rematando nos termos que se seguem:
(…)
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A R. “Banco 1... contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto pelos AA..
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II - Questões a dirimir:
a - Da nulidade da sentença
b - Reapreciação da matéria de facto
c - Se se deve ou não manter a redução da hipoteca registada a favor da R. “Banco 1..., S.A.” com exclusão da fração “A” e se deve ser alargada à fração “B”;
d - Se a manutenção da hipoteca sobre as frações dos AA. acarreta enriquecimento sem causa da R. “Banco 1..., S.A.”;
e - Se ao pretender a manutenção da hipoteca sobre as frações dos AA. a R. “Banco 1..., S.A.” age em abuso de direito.
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III - Fundamentação de facto

Factos Provados
1) Em 29 de janeiro de 2015, faleceu BB, no estado de casada com o Autor AA, deixando como herdeiros, para além do seu marido, as Autoras CC e EE;
2) No dia 10 de novembro de 2010, o Autor AA e a referida BB outorgaram com a sociedade “B..., LDA.” (NIPC ...10) uma escritura de permuta pela qual deram à troca o prédio urbano que era a sua habitação própria e permanente, descrito na Conservatória de Registo Predial de Matosinhos sob a descrição n.º ...63, freguesia ..., correspondente a prédio urbano destinado a habitação constituído por 2 pisos e quintal com a área coberta de 183,50 m2 e 1816,50 m2 de área descoberta, sito à Rua ..., ..., da extinta freguesia ..., concelho de Matosinhos, inscrito na competente matriz predial sob o artigo ...20, por duas moradias a erigir no prédio objeto de troca do qual eram proprietários;
3) Nos termos da referida escritura pública, o aqui primeiro Autor, por si e representação de sua mulher BB, declarou dar à mencionada sociedade o referido prédio urbano, no valor atribuído de €500.000,00 para que esta “proceda à demolição da construção lá existente e à construção de seis moradias unifamiliares conforme projeto aprovado pela Câmara Municipal de Matosinhos, no âmbito do processo de licenciamento n.º ...67..., cujas plantas de localização, implantação e telas finais ficam arquivadas a
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