Acórdão nº 743/23.0T8CBR-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-01-2024

Data de Julgamento12 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão743/23.0T8CBR-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DO TRABALHO DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA)
Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

AA, residente em ...,

intentou a presente ação de processo comum contra

A..., Ldª, com sede em ...

pedindo que:

NESTES TERMOS E COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V.ª EX.ª , DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE POR PROVADA E CONSEQUENTEMENTE:

A) A ser condenada a pagar ao Autor, a importância de 3.400,00€, a título de retribuição mensal base referente ao período compreendido entre Abril a Julho de 2022;

B) A ser condenada a pagar ao Autor a importância de 419,76€ referente ao subsídio de alimentação referente ao período compreendido entre Abril e Julho de 2022;

C) A Ré ser condenada a pagar ao Autor, a importância de 794,00€, correspondente aos proporcionais de subsídio de férias e subsídio de Natal, referente ao período compreendido entre Janeiro e Julho de 2022;

D) A ser condenada a pagar ao Autor a importância de 397,00€, referente ao proporcional de férias não gozadas (14 dias);

E) A ser condenada a pagar ao Autor a importância de 196,00€, referente à formação profissional (40 horas);

F) Ser o despedimento considerado ilícito nos termos legais e a Ré condenada ao pagamento de uma indemnização ao Autor, no montante de 1.275,00€.

H) A ser condenada a pagar ao Autor juros vencidos e vincendos à taxa legal sobre as importâncias peticionadas desde a data do incumprimento e até efectivo e integral pagamento.”

*

A Ré não apresentou contestação.

*

Foi proferida a sentença de fls. 51 a 52 e cujo dispositivo é o seguinte:

“Pelo exposto, julgando procedente a acção, o Tribunal decide:

1) Declarar que entre o Autor/Trabalhador AA e a Ré/Empregadora A...,L.davigorou um contrato de trabalho subordinado sem termo entre 13-06-2021 e Julho de 2022.

2) Declarar ilícito o despedimento por extinção do posto de trabalho do Autor levado a cabo pela Ré.

3) Condenar a a pagar ao Autor as seguintes quantias:

3.1) €.3.400,00 a título de retribuições referentes aos meses de Abril a Abril de 2022;

3.2) €.419,76 a título de subsídio de alimentação;

3.3) €.794,00 a título de proporcionais de subsídios de férias e de Natal;

3.4) €.397,00 a título de férias não gozadas;

3.5) €.196,00 a título de formação profissional não ministrada;

3.6) €.1.275,00 a título de indemnização por despedimento ilícito;

3.7) Juros moratórios, à taxa legal civil, sobre as quantias referidas em 3.1) a 3.6), desde 13-02-2023 até integral pagamento.

4) Fixar o valor da Acção em €.6.481,46 (art.º 306.º/2 CPC).

5) Condenar a no pagamento das custas (art.º 527.º CPC).”

*

Notificada desta sentença, a Ré veio arguir a nulidade da citação.

*

Foi, então, proferida a decisão de fls. 65 a 66 com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, o Tribunal decide:

1) Julgar improcedente a alegada nulidade por falta de citação da para a presente Acção.

2) Condenar a nas custas do incidente, fixando a taxa de justiça em 1 UC [art.º 7.º/4 RCP].”

*

A , notificada desta decisão, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

“1. Nos presentes autos foi expedida carta registada com aviso de receção para citação da recorrente em 17.02.2022 para a sede desta tendo sido devolvida aos autos.

2. Em 08.03.2023 foi enviada a segunda carta para citação destinada à recorrente e igualmente para a sede social da empresa.

3. A recorrente também não teve conhecimento desta carta, pelo que não esteve presente na audiência de partes sendo que, nos termos da lei adjetiva, se presumiu citada.

4. Como a sede social é um endereço emprestado por um conhecido sendo que o imóvel se encontra devoluto de pessoas e bens e a recorrente estava ciente de que poderia receber cartas, em 12.10.2022 contratualizou um serviço automático de reexpedição de correspondência para empresas com os CTT, válido pelo período de um ano.

5. À correspondência que é objeto de reencaminhamento automático é aposta uma etiqueta com o endereço de reexpedição, sendo que da consulta dos presentes autos se contata que as únicas missivas recebidas pela ora recorrente e que tinham aposto tal carimbo foi a da guia de custas recebida em 24.04.2023 e a da douta sentença proferida (e recebida em data posterior, após reexpedição); as duas cartas de citação não têm aposta tal etiqueta e a recorrente nunca as recebeu.

6. Na perspetiva do Tribunal a quo, na prática nunca poderá existir nulidade de citação no caso das pessoas coletivas atento o disposto no artigo 246.º, n.º 4, do CPC, sendo que esta interpretação afasta-se da teleologia própria do artigo 246.º, n.º 4, do CPC.

7. O douto Tribunal a quo acaba por fazer um raciocínio sincopado interpretando de forma redutora o convocado artigo 188.º reportando-o, apenas, à segunda carta de citação, mas desconsiderando a postura da recorrente no que tange à primeira carta para citação violando o artigo 6.º, n.º 1, in fine do CPC pois que não garante a justa composição do litígio dado que há um prejuízo da recorrente ao não lhe ser permitir o direito ao contraditório refugiando-se o Tribunal a quo numa presunção legal que, de facto, foi objetivamente ilidida pela recorrente.

8. O regime legal do artigo 246.º, n.º 4, (e também do 229.º, n.º 5) revela-se como necessário para evitar delongas processuais desencadeadas por intervenientes processuais contumazes, o que manifestamente não é o caso da recorrente; só foi necessário enviar a segunda carta porque a recorrente não recebeu a primeira, mas não poderia o Tribunal a quo deixar de ponderar a razão pela qual foi enviada a segunda carta; na verdade, no caso concreto, optar-se por uma presunção (aparentemente) inilidível viola, de forma ostensiva, o direito ao acesso e à justiça previsto no artigo 20.º da CRP, pelo que a interpretação feita do artigo 246.º, n.º 4, in casu, revela-se materialmente inconstitucional, o que expressamente se argue.

9. À correspondência que é objeto de reencaminhamento automático é aposta uma etiqueta com o endereço de reexpedição, sendo que da consulta dos presentes autos se contata que as únicas missivas recebidas pela ora recorrente e que tinham aposto tal carimbo foi a da guia de custas recebida em 24.04.2023 e a da douta sentença proferida (e recebida em data posterior, após reexpedição). As duas cartas de citação não têm aposta tal etiqueta e a recorrente nunca as recebeu.

10. O douto Tribunal a quo desconsiderou a dilação que ao caso cabia, pelo que o prazo de contestação não findaria em 11.04.2023, mas, sim, em 10.05.2023.

11. A douta sentença foi proferida em 20.04.2023, pelo que não respeitou o prazo de que a recorrente dispunha para contestar.

12. Sob pena de violação dos artigos 246.º, n.º 4, 229.º, n.º 5, 188.º e 6.º, n.º 1, todos do CPC, bem como o artigo 9.º, n.º 1, do CC, deve o presente merecer provimento e, em consequência, julgar-se como nula a citação efetuada, ordenando-se a repetição da citação para que a recorrente possa apresentar contestação;

Quando assim não se entenda, o que não se concede,

13. Sob pena de violação dos artigos 245.º, n.º 3, e 3.º, n.º 1 e 3, ambos do CPC deve ser anulada a douta sentença e ordenada a devolução dos autos à primeira instância em ordem a que esta notifique a recorrente para contestar fixando-se o prazo que tiver por adequado ao abrigo do artigo 6.º do CPC, assim se fazendo JUSTIÇA!”

*

O Autor apresentou resposta, concluindo que:

(…).

*

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer que antecede no sentido de que a apelação deverá ser julgada parcialmente procedente.

*

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

*

II – Questões a decidir:

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C. na redação da Lei n.º 41/2013 de 26/06), com exceção das questões de conhecimento oficioso.

Assim, cumpre apreciar as seguintes questões:

1ª – Se ocorreu o vício de falta de citação da Ré.

2ª – Se não foi concedida à Ré a dilação de 30 dias prevista para apresentar a contestação.

*

*

III – Fundamentação

a) Factos provados:

Os constantes do relatório que antecede e ainda:

1. No dia 17/02/2023 foi enviada para a sede da Ré carta registada com AR para citação (constante de fls. 2) e que foi devolvida com a menção de objeto não reclamado.

2. No dia 08/03/2023 foi enviada uma 2ª carta registada com AR para citação da Ré na sua sede e que, na impossibilidade de entrega, em 09/03/2023, foi depositada no recetáculo postal domiciliário da morada indicada (fls. 64).

3. Em 12/10/2022 a Ré celebrou com CTT-Correios de Portugal, SA, um contrato de reexpedição de correspondência (fls. 62), em vigor até 14/10/2023.

*

*

b) - Discussão

Apreciando as questões suscitadas pela Ré recorrente:

1ª – Se ocorreu o vício de falta de citação da Ré.

Alega a Ré recorrente que:

- Nos presentes autos foi expedida carta registada com aviso de receção para citação da recorrente em 17.02.2022 para a sede desta tendo sido devolvida aos autos.

- Em 08.03.2023 foi enviada a segunda carta para citação destinada à recorrente e igualmente para a sede social da empresa.

- A recorrente também não teve conhecimento desta carta, pelo que não esteve presente na audiência de partes sendo que, nos termos da lei adjetiva, se presumiu citada.

- Como a sede social é um endereço emprestado por um conhecido sendo que o imóvel se encontra devoluto de pessoas e bens e a recorrente estava ciente de que poderia receber cartas, em 12.10.2022 contratualizou um serviço automático de reexpedição de correspondência para empresas com os CTT, válido pelo período de um ano.

- À correspondência que é objeto de reencaminhamento automático é aposta uma etiqueta com o endereço de reexpedição, sendo que da consulta dos presentes autos se contata que as únicas missivas recebidas pela ora recorrente e que tinham aposto tal carimbo foi a da guia de custas recebida em...

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