Acórdão nº 730/20.0T8MFR.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 18-04-2024

Data de Julgamento18 Abril 2024
Número Acordão730/20.0T8MFR.L1-2
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os abaixo assinados juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
«B», réu na ação declarativa de condenação que lhe foi movida por «A» – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., notificado da sentença condenatória proferida em 10/11/2023, e com ela não se conformando, interpôs o presente recurso.
A autora intentou a presente ação contra o réu, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 7.500,00 €, acrescida de IVA, e juros moratórios calculados à taxa legal e contabilizados desde a citação até efetivo e integral pagamento, com fundamento na celebração e vigência de contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade e na não celebração do contrato visado pela mediação por causa imputável ao réu.
Pessoal e regularmente citado, o réu contestou, alegando que a autora sempre soube que o imóvel estava arrendado e que, aquando da celebração do contrato de mediação, ficou acordado que apenas venderia o imóvel sem o arrendamento se a autora arranjasse alternativa de habitação para os seus inquilinos; mais alegou que tem dificuldades em trabalhar com o email, não sabendo sequer como aceder-lhe e, na altura das comunicações sobre a existência de interessada estava em processo de divórcio e mudou de telemóvel; nunca a existência de uma interessada na compra chegou ao seu conhecimento.
Termina pedindo que a ação seja julgada totalmente improcedente com a sua consequente absolvição do pedido.
O autos seguiram os regulares termos e, após audiência final, foi proferida sentença pela qual o réu foi condenado no pedido.
O réu não se conformou e recorreu, concluindo as suas alegações de recurso da seguinte forma:
«A. O Apelante discorda, em absoluto, da decisão do Tribunal “a quo”, bem como dos fundamentos de facto e de direito em que a mesma assenta;
B. A decisão recorrida deve ser revogada, porquanto assenta em fundamentos de facto e de direito incorretos;
C. Assim, os Apelados, através da presente Apelação, visam a reapreciação da matéria de facto e de direito;
D. Quanto à matéria de facto: Do cotejo da prova testemunhal e das declarações de parte resulta que deveriam ter sido dados como provados, ao contrário do decidido, os factos elencados sob os pontos n.º 11 e 12 da fundamentação de facto da sentença, pelo que os mesmos devem reapreciados;
E. Por contraponto, do conjunto da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, deveria ter sido dado como não provado, ao contrário do decidido, o facto elencado sob o n.º 8 da fundamentação de facto da sentença, motivo pelo qual se impugna essa decisão;
F. No que à matéria de direito tange, com a devida vénia, entende o Apelante que o Tribunal “a quo” fez uma errada interpretação das normas que constituem o fundamento jurídico da decisão, no caso, artigos 370.º, 371.º, 374.º a 376.º e 394.º todos do Código Civil e artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013;
G. Com efeito, o Tribunal “a quo” interpretou e aplicou tais normativos no sentido de que o incumprimento do contrato de mediação dos autos é culposamente imputável ao Apelante;
H. Entendeu o Tribunal “a quo” que “(…) não restam dúvidas que o contrato foi celebrado no regime referido no parágrafo anterior e bem assim que a impetrante realizou a prestação que se passou a inscrever na sua esfera jurídica, ou seja, encontrou interessado na aquisição do imóvel, inclusivamente pelo preço pretendido pelo R. e por isso consignado no contrato dos autos. E também provou que o impetrado se recusou a celebrar o contrato de alienação; motivos pelos quais não pode deixar de proceder integralmente o aqui peticionado, sendo devida a remuneração acordada pela atividade de mediação efetivamente executada.”;
I. Tal conclusão apenas se compreende na medida em que o Tribunal “a quo” entendeu não poder considerar o depoimento testemunhal para prova de uma condição adicional ao contrato de mediação, no caso, que o imóvel só seria vendido caso a Apelada arranjasse uma alternativa habitacional para os arrendatários que ali residiam;
J. Olvidou o Tribunal “a quo” que a vinculação da Apelada a tal condição resultou confessada pela Apelada, nas declarações prestadas pelo seu Legal Representante;
K. Além do que a invocada norma – 394.º do Código Civil – não é aplicável aos contratos de adesão ou aos contratos celebrados com recurso a cláusulas contratuais gerais;
L. Sem prejuízo, a Apelada não atendeu ao pedido do Apelante de que a venda do seu imóvel só deveria ocorrer quando encontrasse investidor ou outro imóvel para os arrendatários tomarem em arrendamento, pelo que a não concretização do negócio visado não é de imputar ao Apelante mas apenas aquela;
M. Tem-se assim que a Apelada não completou todos os atos necessários àquela concretização, não tendo direito à remuneração;
N. Donde, ocorrendo o incumprimento definitivo e culposo do contrato outorgado por parte da Apelada, não tem direito à remuneração convencionada, nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013.
Perante o exposto, deverão V. Exas julgar procedente o presente recurso de Apelação e, em consequência, revogar a douta decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, proferindo outra na qual o Apelante seja absolvido dos pedidos.»
Não foram oferecidas contra-alegações.
Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.
Objeto do recurso
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (artigos 635.º, 637.º, n.º 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes questões:
a) A matéria de facto deve ser alterada?
b) A comissão não é devida, pois a não celebração do contrato visado não se ficou a dever (pelo menos, apenas) ao réu?
II. Fundamentação de facto
Estão provados os seguintes factos, que correspondem aos considerados em 1.ª instância, com as alterações justificadas infra em III.1. (na sequência da apreciação da impugnação da decisão de facto):
1. A A. é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de mediação imobiliária;
2. As aqui partes subscreveram o documento de fls. 12 verso e seguintes, no qual se encontra aposta a data de 23.05.2018, o qual designaram por contrato n.º 088180116 e no qual se lê, entre o que demais aí consta:
Entre:
«A» – Sociedade de Mediação Imobiliária, S.A ….., adiante designada como Mediadora,
E
«B», ……, adiante designado(s) como Segundo(s)Contratante(s), na qualidade de proprietário (…), é celebrado o presente contrato de Mediação Imobiliária que se rege pelas seguintes cláusulas:
Cláusula 1.ª (…) O Segundo Contratante é proprietário e legítimo possuidor da fracção autónoma designada pela letra B (…), destinado(a) …, …, com área total de 125 m2, sito na Rua …, Malveira …, concelho de Mafra, …
Cláusula 2.º (…)
1. A Mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra pelo preço de 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), desenvolvendo para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respectivos imóveis;
2. Qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicado de imediato e por escrito à mediadora …
Cláusula 4.ª (…)
1 – O Segundo Contratante contrata a Mediadora em regime de exclusividade
2 – O Segundo Contraente obriga-se a não promover, publicitar ou angariar interessados na aquisição do negócio objecto do contrato, sob pena de pagar a comissão devida.
3 – Nos termos de legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação de mediação durante o respectivo período de vigência …
Cláusula 5.ª (…) O Segundo Contratante obriga-se a pagar à mediadora a título de remuneração: a) A quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado, não sendo essa quantia inferior a 6.000,00 € (seis mil euros), acrescida de IVA à taxa legal em vigor. ….
Cláusula 7.ª (…) Para garantia da responsabilidade emergente da sua actividade profissional, a Mediadora celebrou um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil no valor de 150.000 € (cento e cinquenta mil euros), apólice n.º …76, através da seguradora Fidelidade.
Cláusula 8.ª (…) O presente contrato tem uma validade de 9 (nove) meses, contados a partir da data da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado pelas partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo. …
3. A A. logrou angariar interessada na compra do imóvel que apresentou a 18.02.2019 proposta de aquisição pelo valor de 150.000,00€;
4. Após o que a A. tentou contactar o R. telefonicamente para o número que
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