Acórdão nº 7229/20.3T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-06-26

Ano2023
Número Acordão7229/20.3T8VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. N.º 7229/20.3T8VNG.P1



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
AA, residente na ..., ..., patrocinado por mandatário judicial, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra A..., E.M., S.A., com sede na Rua ..., ..., ..., e o Instituto da Segurança Social, I.P., com sede na Avenida ..., ..., Lisboa.
Pedidos: “ser a 1ª R. condenada:
- a pagar ao A. a retribuição mensal actualmente devida, pela categoria de administrativo, de 1.080,26€ (nível 2F da tabela salarial);
- a pagar ao A., a título de créditos laborais por diferenças salariais que lhe são devidas, a quantia de 54.125,17€;
- a pagar ao A., a título de horas suplementares prestadas e não pagas, a quantia de 23.099,34 €;
- a efectuar os descontos contributivos em falta junto da 2ª R. por tais valores;
- a pagar ao A. a quantia de 33.155,52€ a título de juros vencidos, acrescidos de juros vincendos, à taxa legal em vigor;
- a pagar ao A. a quantia de 5.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
Deve ainda a 2ª R. ser condenada a reconhecer a relação de trabalho existente entre A. e 1ª R., bem como a remuneração e respectivo período de vigência.”
Alega em síntese: O A. celebrou com a 1ª R. um contrato de trabalho em 6 de Dezembro de 1999, para desempenhar as funções de operário/aprendiz de canalizador; a partir de 6 de Junho de 2001, data da terceira renovação do contrato e consequente conversão do contrato de trabalho a termo para sem termo, o A. passou a desempenhar funções de administrativo na direcção de águas e abastecimento, até aos dias de hoje; Apesar do trabalho desempenhado, manteve a categoria de operário e, como tal, o salário inerente à mesma; Continuou também com o mesmo horário de 40 horas semanais; A progressão que teve ao longo da carreira foi sempre como se de operário se tratasse; A progressão da retribuição de operário começa no salário mínimo até à referência 4E da tabela de salários da 1ª R. (actualmente 1.690,00€), montantes que foram sofrendo actualizações anualmente, Ao passo que o salário da categoria administrativa oscila entre o nível 1F (741,55€) e o nível 4F (1.748,85€); Até Fevereiro de 2002, o A. recebeu o ordenado de 371,60 €, equivalente ao nível 1B da tabela em vigor, quando na verdade deveria ter recebido 583,59€ (1F); Apenas em Junho de 2018 é que a 1ª R. reclassifica o A. para a categoria profissional de administrativo; Em Julho de 2019 passa a receber o nível 2C (895,00€), ao invés do nível 2F (1.077,03€); A partir de Fevereiro de 2020, verificou-se novamente progressão na carreira, alcançando o nível 2E, com uma remuneração de 1.002,39€, valor que tem recebido até hoje; Por ter progredido com a categoria de operário, e não como administrativo (não obstante o reconhecimento como tal em 2018), o A. ainda está aquém de outros administrativos no seio da empresa da 1ª R.; Com os mesmos anos de casa e mesmas funções, auferem actualmente o nível 2F (1.080,26€); Toda esta situação provocou e provoca ao A. momentos de angústia, ao longo de todos estes anos.
Citadas as rés, procedeu-se a audiência das partes, resultando infrutífera a tentativa de conciliação.
A ré Instituto da Segurança Social, I.P., veio contestar, invocando a incompetência material do tribunal para o pedido contra si formulado e concluindo dever ser absolvida do pedido “por ser manifesta a falta de requisitos legais para que o pedido possa proceder”.
A ré A..., E.M., S.A., veio contestar, impugnando os factos alegados na petição inicial, e alegando em síntese: que o autor foi sendo integrado na categoria correcta; A Ré não está sujeita – nem pratica – qualquer regra de progressão automática de nível remuneratório; A alteração de nível remuneratório depende de autorização específica da Ré.
O autor respondeu a ambas as contestações sustentando o alegado na petição inicial. Pediu a condenação da ré A..., E.M., S.A., como litigante de má fé.
Fixou-se à acção o valor de €110.039,89.
Foi proferido despacho saneador no qual se decidiu: “julgo incompetente o presente Tribunal em razão da matéria para conhecer do pedido formulado pelo A no que tange à condenação da 1ª R a efectuar os descontos contributivos em falta junto da 2ª R. pelos valores reclamados contra a primeira Ré nesta acção, e bem ainda incompetente para conhecer do pedido formulado contra a 2ª Ré, e em consequência absolvo a 1ª Ré da instância, quanto a este pedido, e a segunda Ré, ISS, IP da instância”. No mais julgou-se válida a instância e fixou-se o objecto do litígio, dispensando-se a fixação dos temas de prova. Despacho saneador que transitou em julgado.
Realizou-se audiência de julgamento com gravação da prova pessoal produzida.
Foi proferida sentença, na qual se decidiu a final:
“281. Julga-se a acção parcialmente procedente e condena-se a ré a pagar ao autor:
– pelas diferenças salariais entre o pago e o devido pela categoria de administrativo 23.574,83€ (vinte e três mil quinhentos e setenta e quatro euros e oitenta e três cêntimos), acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor em cada momento, contados do termo de cada um dos períodos acima referidos nos parágrafos 248 a 263 sobre o respectivos valores parcelares.
– a título de horas suplementares prestadas e não pagas, 12.397,03€ (doze mil trezentos e noventa e sete euros e três cêntimos), acrescidos de juros de mora, à taxa legal em vigor em cada momento, contados do termo de cada um dos períodos acima referidos nos parágrafos 269 a 277 sobre o respectivos valores parcelares.
282. Do mais pedido, absolve-se a ré.
283. Improcede o pedido de condenação da ré como litigante de má-fé.”

Inconformado interpôs o autor o presente recurso de apelação, concluindo:
I. O recorrente exerce, desde 2001, funções de administrativo na R., pese embora ter sido necessário o recurso à via judicial para esse facto ser reconhecido.
II. A R. só o reconheceu como administrativo em junho de 2018 (ponto 65 dos factos provados), sendo que até aí a progressão que foi tendo na carreira era como se de operário se tratasse, apesar de desempenhar funções de administrativo.
III. Não obstante o tribunal a quo ter reconhecido a qualidade desde junho de 2001, certo é que calculou as diferenças salariais devidas ao A. somente pelo salário base de administrativo (que o A. apenas alcançou em junho de 2018).
IV. Ora, o recorrente entende que as diferenças deviam ser calculadas não pelo salário base de administrativo (nível 1F da tabela salarial da recorrida) até a momento em que o alcança, mas antes pelos níveis que lhe eram efetivamente devidos como administrativo, quando ocorria uma progressão na carreira.
V. Não obstante ter sido dado como provado que “a ré não pratica qualquer regra de progressão automática de nível remuneratório”(ponto 195), não podemos aceitar que o entendimento do tribunal recorrido, com o devido respeito.
VI. Independentemente da ação arbitrária da R. no que toca a progressões, certo é que o A. foi progredindo, com correspondente alteração da posição remuneratória (ainda que não a devida).
VII. Se a R. reconhecia a alteração de nível remuneratório – facto provado 196 – é porque via no A. qualidade.
VIII. E se era avaliado pelas funções desempenhadas, sem dúvida que o era como administrativo, pois eram essas as suas funções e mais nenhumas, desde 2001 (factos provados 22 e 23).
IX. A atribuição do salário equivalente na progressão como administrativo é um mero formalismo, pelo que a sua falta não retira a substância das avaliações da R. e do trabalho efetuado pelo A.
X. As várias progressões do A. são factos assentes, pelo que a atribuição de um salário equivalente é uma consequência inevitável, e que deve ser reconhecia ao A.
XI. Por outro lado, a tese acolhida pelo tribunal recorrido levaria a que o A. estivesse entre 2001 e 2016 (quando passa a receber o nível base 1F) sempre com o mesmo salário, sem conhecer qualquer tipo de evolução.
XII. Assim, mal andou o tribunal a quo ao aplicar erradamente o direito na resposta à 2ª questão (pontos 249 a 262), devendo antes fazê-lo da seguinte forma no que se refere às diferenças salariais devidas:
- Em julho de 2004 passou para o nível 1C, quando devia ter passado para o nível 2A (677,06 €). assim, de julho a janeiro de 2005 recebeu a menos 1.804,16 € (677,06 – 451,54 = 225,52; 225,52 x 8 = 1.804,16);
- De fevereiro de 2005 a fevereiro de 2006 (atualização de 2,2% -- 691,96 €), recebeu a menos 3.457,35 € (691,96 – 461,47 = 230,49; 230,49 x 15 = 3.457,35);
- De março a dezembro de 2006, (atualização de 1,5% - 702,34 €) recebeu a menos 2.807,40 € (702,34 – 468,39 = 233,95; 233,95 x 12 = 2.807,40);
- Em janeiro de 2007, passou a receber o nível 1D, quando na verdade devia progredir para o nível 2B (776,48 €); nesse ano, recebeu a menos 3.055,22 € (776,48 – 558,25 = 218,23; 218,23 x 14 = 3.055,22).
- De janeiro a maio de 2008 (atualização de 2,1% - 792,79 €), recebeu a menos 1.075,00 € (792,79 – 577,79 = 215,00; 215,00 x 5 = 1.075,00).
- Em junho de 2008, passa a receber o nível salarial 1E, quando devia receber o nível 2C (849,78 €), pelo que entre junho e agosto de 2008, recebeu a menos 890,04 € (849,78 – 627,27 = 222,51; 222,51 x 4 = 890,04);
- De setembro a dezembro de 2008 (ajustamento dos níveis 1B a 1E – 849,78 €), recebeu a menos 850,04 € (849,78 – 637,27 = 212,51; 212,51 x 5 = 850,04);
- Nos anos de 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 – 895,00€ - recebeu a menos 2.859,64 € por cada ano (895,00 – 690,74 = 204,26; 204,26 x 14 = 2.859,64), perfazendo um total de 20.017,48€;
- De janeiro a maio de 2016 (895,00 €), recebeu a menos 1.021,30 € (895,00 – 690,74 = 204,26; 204,26 x 5 = 1.021,30 €). - em junho de 2016, passou para o nível 1F, quando, na verdade, devia ter passado para o nível 2D (948,00 €). assim, de junho de 2016 a maio de 2018, recebeu a menos 5.780,60 € (948,00 – 741,55
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT