Acórdão nº 709/23.0T8GRD.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-12-13

Ano2023
Número Acordão709/23.0T8GRD.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DO TRABALHO DA GUARDA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA)


Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

A arguida A..., Ldª, veio impugnar a decisão administrativa que lhe aplicou uma coima no valor de € 1.875,00 pela prática de uma contraordenação muito grave p. e p. pelos artigos 40.º, n.ºs 1, 2 e 5 e 233.º, ambos do CRC.

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A Exm.ª Juíza proferiu o despacho constante de fls. 110 que não admitiu, por intempestiva, a impugnação judicial apresentada pela arguida ora recorrente.

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A arguida, notificada desta decisão, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

“A) A arguida não se pode conformar com a decisão proferida, embora douta, nos termos da qual se decidiu rejeitar, por intempestiva, a impugnação judicial da decisão proferida no âmbito de contra ordenação da Segurança Social.

B) A arguido não se pode conformar com a decisão aqui posta em crise, por padecer a mesma de nulidade insanável e inconstitucionalidade, para além de efetuar a mesma uma errónea apreciação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso sub judice. Mas vejamos melhor!

C) Importa referir, desde logo e antes de mais, que a arguida invocou na sua impugnação judicial diversas nulidades insanáveis, as quais são de conhecimento oficioso, pelo que, mesmo que se considerasse extemporânea a impugnação, na parte em que se impugna a matéria dos autos, sempre deveriam ter sido conhecidas – OFICIOSAMENTE – as nulidades insanáveis de que enfermam os presentes autos.

D) Desde logo, a decisão impugnada considerou extemporânea a impugnação judicial, porque apresentada para além de 20 dias apos a notificação da decisão. Ora, salvo o devida respeito, tal decisão labora em erro.

E) Na verdade, a arguida considera-se notificada, em 30/01/2023, do ultimo acto decisório no processo administrativa, tendo apresentado a sua impugnação judicial 20 dias após a notificação de tal acto, pelo que sempre deveria ter sido tal impugnação recebida e apreciada.

F) Tal como já se mencionou, a decisão administrativa posta em crise enferma de nulidade e inconstitucionalidade, na exata medida em que viola as garantias de defesa da arguida.

G) Notificada da acusação, a arguida exerceu o seu direito de contraditório, apresentou defesa e arrolou testemunhas. Sucede que, a entidade administrativa cerceou as garantias de defesa da arguida, ao preterir formalidades legais, impedindo a inquirição das testemunhas arroladas pela arguida. Na verdade, agendada a data para inquirição de testemunhas, e mediante impedimento da sua mandatária, foi solicitada alteração da diligência, conforme requerimento junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido. Porém, da nova data designada não foram a arguida, nem a sua mandatária notificadas, motivo pelo qual não foi apresentada a testemunha para depor.

H) Ora, a referida nulidade foi invocada junto da entidade administrativa, tendo sido julgada improcedente, sem qualquer justificação, fundamento ou prova. A referida nulidade foi também invocada em impugnação judicial, e é do conhecimento oficioso, pelo que sempre deveria ter sido conhecida pelo tribunal recorrido.

I) Assim, e uma vez mais, expressamente se invoca tal nulidade e inconstitucionalidade, para todos os efeitos legais, devendo ser declarada nula a decisão recorrida, e absolvida a arguida.

J) Acresce ainda que, a decisão administrativa padece de nulidade insanável, na exacta medida em que os factos provados e que servem de base à condenação se encontram em oposição evidente com o enquadramento jurídico que é efetuado dos mesmos e que sustenta a condenação.

K) Desde logo, da decisão que lhe foi notificada, resulta que a arguida regularizou a situação, ou seja, salvo melhor entendimento, a previsão normativa que consta da imputação que lhe é dirigida não se encontra corretamente enquadrada, na exata medida em que, caso se considerasse verificada a infração, sempre a norma aplicável seria o n.º 6 do art.º 40.º do Código Contributivo, e não o n.º 5.

L) Para além do mais, não resultam dos autos quaisquer elementos que permitam imputar a presente infracção à arguida a título de dolo ou de negligência. A infracção contra-ordenacional pressupõe a imputação do facto ao agente a título de dolo ou de negligência, em obediência ao princípio “nulla poena sine culpa”. Ora, desde logo, analisando a descrição fáctica, constata-se que nenhum facto subjetivo susceptível de implicar a prática de uma infracção é imputado à arguida, sendo que, tal descrição fáctica sempre seria insuficiente para sustentar uma qualquer condenação (arts. 8.º, n.º 1 e 58.º, n.º 1, b) do RGCO – DL 433/82, de 27/10 e art.º 8.º RJCE).

M) Dispõe o art. 32.º, n.º 8 da Constituição da República portuguesa que “nos processos de contra-ordenação sãoassegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.”. Porém, as aludidas garantias de defesa só estarão plenamente asseguradas quando, além do mais, a descrição fáctica se encontre suficientemente realizada, tanto relativamente aos elementos objectivos, como quanto aos elementos subjectivos do tipo de ilícito imputado à arguida.

N) Sem prescindir, sempre se dirá que, a arguida encontra-se em situação económica difícil, atendendo ao facto de se encontrar instalada numa zona desfavorecida do interior, e ainda em decorrência da Pandemia Covid 19 que assolou o país e o mundo, tratando-se de uma empresa de serviços essenciais, e atendendo também à actual conjuntura económica nacional e internacional. A arguida sobrevive a custo, apenas com muita dedicação e trabalho dos seus sócios gerentes, lutando diariamente pela manutenção dos postos de trabalho. Ora, não tendo retirado qualquer benefício económico da prática da infracção, o diminuto grau de culpa, o qual apenas indirectamente lhe poderá ser imputado, inexistindo dolo, sempre a arguida deveria ser dispensada do pagamento de qualquer coima ou, ser a mesma especialmente atenuada.

O) Também neste aspecto, foi invocada a nulidade da douta decisão impugnada, por omissão de pronúncia, na exata medida em que não analisou os pressupostos de aplicação da pena especialmente atenuada, aplicada subsidiariamente nos presentes autos, nulidade esta que expressamente se invocou, que também deveria ter sido conhecida.

P) Nestes termos, e nos melhores de direito, deve a decisão proferida ser anulada, conhecendo-se e julgando procedente a impugnação judicial apresentada, absolvendo-se a arguida.”

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O Ministério Público contra-alegou formulando as seguintes conclusões:

(…).

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O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 130 a 131 no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

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II – Saneamento

A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.

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III – Fundamentação

Matéria de facto com interesse para a decisão:

1 – A decisão administrativa proferida nos presentes autos foi comunicada à arguida por carta recebida na sua sede no dia 06/12/2022 (AR de fls. 90).

2 – A mesma decisão foi comunicada à advogada da arguida por carta recebida no escritório da mesma no dia 13/12/2022 (AR de fls. 87).

3 – No dia 20/02/202 (fls. 7 v.º), a arguida remeteu ao ISS, IP o requerimento de impugnação judicial da decisão administrativa.

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b) - Discussão

A recorrente suscita as seguintes questões:

1ª – Nulidade e inconstitucionalidade da decisão recorrida.

2ª - Se a presente impugnação é tempestiva.

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1ª questão

Nulidade e inconstitucionalidade da decisão recorrida

Alega a recorrente que:

- A arguida não se pode conformar com a decisão aqui posta em crise, por padecer a mesma de nulidade insanável e inconstitucionalidade.

- A arguida invocou na sua impugnação judicial diversas nulidades insanáveis, as quais são de conhecimento oficioso, pelo que, mesmo que se considerasse extemporânea a impugnação, na parte em que se impugna a matéria dos autos, sempre deveriam ter sido conhecidas – OFICIOSAMENTE – as nulidades insanáveis de que enfermam os presentes autos.

- A decisão administrativa posta em crise enferma de nulidade e inconstitucionalidade, na exata medida em que viola as garantias de defesa da arguida.

- Notificada da acusação, a arguida exerceu o seu direito ao contraditório, apresentou defesa e arrolou testemunhas. Sucede que, a entidade administrativa cerceou as garantias de defesa da arguida, ao preterir formalidades legais, impedindo a inquirição das testemunhas arroladas pela arguida.

- A referida nulidade foi invocada junto da entidade administrativa, tendo sido julgada improcedente, sem qualquer justificação, fundamento ou prova. A referida nulidade foi também invocada em impugnação judicial e é de conhecimento oficioso, pelo que sempre deveria ter sido conhecida pelo tribunal recorrido.

- Assim, e uma vez mais, expressamente se invoca tal nulidade e inconstitucionalidade, para todos os efeitos legais, devendo ser declarada nula a decisão recorrida, e absolvida a arguida.

- Acresce ainda que a decisão administrativa padece de nulidade insanável, na exata medida em que os factos provados e que servem de base à condenação...

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