Acórdão nº 7/10.0IDFAR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 13-07-2022
Data de Julgamento | 13 Julho 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 7/10.0IDFAR.E2 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora
1.Relatório
No juízo local criminal de Loulé – Juiz 1, do Tribunal Judicial da comarca de Faro, em processo comum com intervenção de tribunal singular, foi submetida a julgamento, além de outros,[1] a arguida AA, devidamente identificada nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu condená-la, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 6º e 105° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e 30º nº 2 do C. Penal, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de 2 €.
Mais foi condenada, juntamente com os demais arguidos, também demandados, no pagamento solidário à Fazenda Nacional do montante de 59.403,87 €, acrescidos de juros moratórios e compensatórios, à taxa legal, desde a data limite de entrega das quantias devidas e até integral pagamento.
Inconformada com a sentença, dela interpôs recurso a arguida, pretendendo que seja revogada e substituída por decisão que declare prescrito o procedimento criminal em relação a ela ou, assim se não entendendo, que declare nula e de nenhum efeito a sentença na parte em que a condenou ou, pelo menos, que a absolva do crime de abuso de confiança e, bem assim, do pedido de indemnização em que foi condenada, para o que apresentou as seguintes conclusões:
1) A arguida encontra-se acusada da prática de um crime de abuso de confiança fiscal na forma continuada, p. e p. pelo artigo 105.º, n.º 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias, por omissão de entrega do IVA retido relativamente ao ano de 2006 e primeiro trimestre de 2007.
2) A prescrição do procedimento criminal do crime de abuso de confiança fiscal na forma continuada, nos termos do artigo 21.º, n.º 1 do RGIT o prazo é de 5 anos, sendo
que tal prazo corre desde o dia em que o facto se tiver consumado (Cfr. Artigo 119.º, n.º1 C.Penal.)
3) O prazo começou a correr desde o dia 15.05.2007, termo do prazo para a entrega do imposto relativo ao primeiro trimestre de 2007(art.º 41.º n.º 1 alínea B) do CIVA
4)-A arguida foi notificada da acusação contra si deduzida a 12.10.2010.
5)Verifica-se a ausência nos autos de quaisquer outras causas de interrupção da prescrição (para além da notificação da acusação a 12.10.2010) ou suspensão.
6) Em 12.10.2015 prescreveu o procedimento criminal contra a arguida.
7) Tendo o prazo de prescrição se iniciado em 15.05.2007, até à presente data decorreram 14 anos, 8 meses, pelo que nos termos do artigo 121.º n.º 3 do C.Penal, independentemente de qualquer causa de interrupção e ressalvado qualquer suspensão(que não existe até á data da sentença), o procedimento criminal encontra-se extinto por prescrição.
8)-Devendo ser declarado a prescrição do procedimento criminal relativamente à arguida, com todas as consequências legais.
Ou se assim não se entender
9) Em face do relatório pericial constata-se que durante o decurso do presente processo penal a arguida apresentava uma incapacidade de facto.
10)-Em face dessa incapacidade de facto e não existindo representante geral do incapacitado, caberia ao Juiz da causa a nomeação de curador especial ou provisório, suspendendo-se os termos do processo(Cfr Acordão do Tribunal da Relação de Évora de 28/11/2006, processo 1256/06-1).
11)-Apenas por sentença proferida em 17/06/2019e transitada em 06/09/2019 no processo nº441/18.... do Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Local Cível ..., foi nomeado Representante Geral.
12)- Tendo sido verificada a incapacidade de facto da arguida e não tendo sido nomeado um curador provisório, fica sem efeito todo o processado posterior ao momento em que a falta se deu ou a irregularidade foi cometida (Cfr Acordão do Tribunal da Relação de Évora de 28/11/2006, processo 1256/06-1).
13)-Devendo ser nula e de nenhum efeito a sentença proferida, ora em recurso, na parte em que condenou a arguida.
14)-O que se invoca, com todos os efeitos legais que isso acarreta.
Ou se assim não se entender
15-)A douta sentença de que ora se recorre, entre outros e com interesse para a decisão da causa deu como provado no ponto 24 dos factos provados o seguinte” Da perícia médica realizada à arguida AA resultou que o estado mental da mesma em 2006 e 2007 não apresentaria as alterações do foro mental e cognitivo que apresenta no momento, pela que estaria intacta a capacidade de distinguir o bem/mal, ilícito/licito, querer/poder e de se conseguir auto-determinar segundo essa avaliação.”
16)-E deu esse facto como provado com base no exame pericial junto aos autos.
17)-Do exame pericial junto aos autos, não resulta a conclusão extraída pelo Tribunal “A quo” e que motivou o facto provado nº24º
18-)O Relatório da perícia médica que foi realizada à arguida, não refere clara e objetivamente qual seria o estado mental da arguida em 2006 e 2007.
19)-Referindo concretamente que “Ainda que não seja possível aferir qual seria o estado mental da arguida em 2006 e 2007”
20)-Em face do Relatório pericial existe dúvidas qual seria o estado mental da arguida em 2006 e 2007.
21) O princípio in dúbio pró reo, é um princípio de prova, que significa que perante factos incertos a dúvida favorece o Arguido.
22)-Não pode por isso o Tribunal “a quo” dar como provado que” Da perícia médica realizada à arguida AA resultou que o estado mental da mesma em 2006 e 2007 não apresentaria as alterações do foro mental e cognitivo que apresenta no momento, pela que estaria intacta a capacidade de distinguir o bem/mal, ilícito/licito, querer/poder e de se conseguir auto-determinar segundo essa avaliação”
23)-Devendo por isso o facto 24º dos factos provados, dar-se como não provado.
24)-E dar-se como não provado que a arguida à data da prática dos factos estaria em condições e capacidade de distinguir o bem/mal, ilícito/licito, querer/poder e de se conseguir auto-determinar segundo essa avaliação.
25)-Devendo a arguida ser absolvida do crime que abuso de confiança fiscal na forma continuada bem com no pedido de indemnização civil em que foi condenada.
O recurso foi admitido.
Na resposta, o MºPº defendeu a improcedência do recurso e a manutenção da decisão recorrida, concluindo como segue:
1º. A arguida AA interpôs recurso da sentença proferida nos presentes autos, na qual foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 6.º, 7.º e 105.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias.
2º. Da sua motivação extraímos as seguintes conclusões, que se sintetizam: i) Prescrição do procedimento criminal; ii) Nulidade de actos processuais e erro na apreciação da matéria de facto.
3º. O prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado – artigo 119º, n.º 1 do Código Penal -, sendo certo que o facto se considera praticado no momento em que o agente atuou ou deixou de atuar – artigo 3º do Código Penal.
4º. No caso de infração contínua sucessiva, como é o caso dos autos, o momento relevante será aquele em que é executado o último ato que integra a infração.
5º. Ora, são imputados factos quanto a omissão de pagamentos referentes a IVA respeitantes aos períodos tributários 0603T, 0606T, 0609T, 0612T e 0703T.
6º. Actualmente, o artigo 21º do RGIT sob a epígrafe “Prescrição, interrupção e suspensão do procedimento criminal” dispõe, por sua vez o seguinte: “1. O procedimento criminal por crime tributário extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática sejam decorridos 5 anos. 2. O disposto no número anterior não prejudica os prazos de prescrição estabelecidos no Código Penal quando o limite máximo da pena de prisão for igual ou superior a 5 anos. 3. O prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo da caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação. 4. O prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos no Código Penal, mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no nº 2 do art. 42º e no art. 47º”.
7º. Dito isto, cumpre então verificar se o prazo de 5 anos está decorrido, ou ainda não, designadamente por efeitos de causas de interrupção e/ou de suspensão.
8º. Como causas interruptivas da prescrição temos, segundo a regra geral do artigo 121º do Código Penal e que determinam reinício do prazo: a) a constituição de arguido; b) a notificação da acusação, ou não tendo esta sido deduzida, com a notificação da decisão instrutória que pronunciar o arguido ou com a notificação do requerimento para aplicação da sanção em processo sumaríssimo; c) a declaração de contumácia; d) a notificação do despacho que designa dia para audiência de julgamento na ausência do arguido.
9º. Estabelece ainda o respetivo nº 3 que “(…) A prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade, (…)”. No caso sete anos e seis meses.
10º. No concernente à suspensão do prazo de prescrição, voltando a prescrição a correr, ou seja, o prazo prescricional não corre enquanto durar a mesma, voltando a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão - artigo 120º, n.º 3 do Código Penal: «1. A prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além, dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que: a) O procedimento criminal não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal ou de sentença a proferir por tribunal não penal, ou por efeito da devolução de uma questão prejudicial a juízo não penal; b) O procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação ou, não tendo esta sido deduzida, a partir da notificação...
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