Acórdão nº 694/12.4TXEVR-V.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 19-03-2024

Data de Julgamento19 Março 2024
Ano2024
Número Acordão694/12.4TXEVR-V.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa,

Relatório
No âmbito do Processo com o nº 694/12.4TXEVR-V que corre termos no Tribunal de Execução das Penas de Lisboa (Juiz 8), foi ao recluso,
AA, actualmente em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de Monsanto, recusada a concessão de liberdade condicional.
*
Não se conformando, o recluso interpôs o presente recurso pedindo que se revogue a decisão recorrida e lhe seja concedida a liberdade condicional.
Para tanto, formula as conclusões que se transcrevem:
A. Foram os presentes autos instaurados para a apreciação, em renovação da instância, da eventual concessão de Liberdade Condicional ao ora RECORRENTE.
B. Resulta da douta sentença ora recorrida, que não foi concedida a Liberdade Condicional ao ora RECORRENTE, porquanto no entender do Tribunal a quo pese embora o percurso e evolução do ora RECORRENTE em reclusão, sejam praticamente exemplares, “A libertação antecipada não deixaria de ter reflexos negativos na comunidade, designadamente quanto à confiança na validade das normas da ordem jurídica que pelo recluso foram violadas, além de deixar a protecção dos bens jurídicos a um nível que não é comunitariamente suportável.”
C. Foram elaborados e juntos os relatórios com o conteúdo exigido pelo art. 173º, n. 1 CEPMPL.
D. O Conselho Técnico prestou os necessários esclarecimentos e emitiu parecer desfavorável por unanimidade à concessão da Liberdade Condicional (art. 175º do CEPMPL).
E. O Ministério Público emitiu parecer desfavorável quando à concessão da Liberdade Condicional do ora RECORRENTE.
F. Ouvido o ora RECORRENTE, este deu o seu consentimento quanto a uma eventual concessão à Liberdade Condicional (art. 176º do CEPMPL).
G. O instituto da Liberdade Condicional encontra-se preceituado no art. 61º do CP, quando aos seus pressupostos e duração.
H. Assim, são pressupostos formais da liberdade condicional:
- Consentimento do condenado;
- Cumprimento de metade da pena e no mínimo seis meses.
São pressupostos materiais da concessão da liberdade condicional:
- o julgador elaborar um juízo de prognose sobre a conduta do recluso no que respeita à reiteração criminosa e o seu bom comportamento futuro, a aferir pelas circunstâncias do caso, antecedentes, personalidade e evolução durante o cumprimento da pena;
- a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem e da paz social.
I. No caso concreto o ora RECORRENTE já cumpriu pelo menos seis meses de prisão, também já cumpriu metade da pena, aliás encontra-se a pouco menos de um ano de atingir o marco dos dois terços, e aceitou ser libertado condicionalmente, pelo que, se encontram reunidos os pressupostos formais para a concessão da liberdade condicional.
J. Quanto aos pressupostos materiais:
O ora RECORRENTE assume a prática dos crimes, tendo consciência da gravidade do crime que praticou, e expressa sentimentos de arrependimento.
K. Encontra-se no Estabelecimento Prisional de Monsanto desde 23 de fevereiro de 2023, não registando conflitos no dia-a-dia prisional, cumprindo as regras e normas estabelecidas, interagindo com adequação que com os seus pares, quer com funcionários.
L. O ora RECORRENTE é um indivíduo calmo, tímido e reservado que mantém uma postura correta e educada.
M. Em meio prisional frequentou o curso EFA B2 no ano letivo de 2015/2016 no Estabelecimento Prisional de Setúbal.
N. No Estabelecimento Prisional da Carregueira frequentou e concluiu o curso de formação de “Operador de Jardinagem”, em dezembro de 2014.
O. Ainda no Estabelecimento Prisional da Carregueira frequentou a concluiu o Programa GPS, em 2021.
P. Desempenha atividade laboral de forma regular, denotando adaptação ao meio prisional.
Q. Recebe visitas regulares da namorada e de uma amiga.
R. É primário.
S. Encontra-se em RAI desde 05.05.2022, beneficiando de LSJ e SCD, sem registo de incidentes.
T. Assume o crime pelo qual foi condenado, expressando vergonha, verbalizando arrependimento e revelando consciência crítica face à gravidade do crime e do impacto provocado nas vítimas, não conseguindo encontrar uma explicação para o que aconteceu.
U. Em liberdade, o ora RECORRENTE integrar o agregado familiar de uma prima, contanto com o apoio incondicional desta, bem como de uma tia e da sua namorada de há 5 anos.
V. No local onde se situa a habitação da prima, não há registo de qualquer situação anómala, em termos de incumprimentos ou de reações de rejeição ou hostilidade por parte de elementos residentes nessa zona.
W. No futuro, o ora RECORRENTE pretende retomar a sua atividade laboral no ramo da …, e eventualmente deslocar-se para o estrangeiro com a sua namorada.
X. Tendo em conta os factos dados como provados, dúvidas não restam de que todo o percurso prisional do ora RECORRENTE, tem de ser visto de uma forma positiva, bem assim como a evolução da sua personalidade, como aliás decorre da douta sentença ora recorrida, que inclusivamente o classifica como “praticamente exemplar”.
Y. Tendo o percurso de vida do ora RECORRENTE, tem-se pautado por ser conforme o direito e esta situação poderá, e deverá, ser vista como um episódio isolado da sua vida, e irrepetível.
Z. Por fim, e no que se refere às necessidades de prevenção geral, nomeadamente ao facto de não terem sido ainda atingidos os dois terços da pena, há que ter em conta o espírito da lei.
AA. Ao contrário do que acontecia antigamente, a Liberdade Condicional pode ser concedida, em todos os casos, quando o condenado tiver cumprido metade da pena e no mínimo 6 meses, desde que verificados, nos termos gerais, o disposto no art. 61º, n.º 2, a) e b) do CP, ou seja, se for possível formular um juízo de prognose favorável.
BB. Pelo que, em nosso modesto entendimento, a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo viola o espírito da lei, nomeadamente no que se refere ao art. 61º, n.º 3, omitindo a aplicação do art. 62º, ambos do CP, ignorando a filosofia dos entendimentos sobre os critérios da Liberdade Condicional.
CC. Ignorando ainda, a evolução e o comportamento prisional do ora RECORRENTE, que tem sido irrepreensível desde 2019, bem assim como o ponto 27 dos factos dados como provados de acordo com o qual e tendo em conta as LSJ, bem como as SCD, para além de não existir qualquer registo de incidentes, também não se verificou qualquer reação de rejeição ou hostilidade por parte de elementos residentes nessa zona.
DD. Veja-se que não estamos perante uma situação de um caso dito mediático, e em liberdade, o ora RECORRENTE não será certamente reconhecido, nem apontado na rua como um homicida a quem foi concedida a Liberdade Condicional cerca de um ano antes de cumprir os dois terços da pena em que foi condenado.
EE. Somos, assim, do entender que ao ser concedida a Liberdade Condicional ao ora RECORRENTE, quando este se encontra a menos de um ano de atingir o cumprimento dos dois terços da sua pena, não será perturbada a paz social, nem se colocará em causa as expetativas comunitárias na validade da norma violada, nem tão pouco reflexos negativos na comunidade.
*
A Digna Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância propugnou porque o recurso fosse julgado improcedente e confirmada a decisão recorrida alegando, em conclusão, que:
1. A decisão recorrida não concedeu a liberdade condicional, em renovação da instância, ao ora recorrente, por referência ao meio da pena, que totaliza 19 anos e 6 meses de prisão, atingido em 22-08-2021, os dois terços ocorrerão em 21-11-2024, os cinco sextos em 22-02-2028 e o termo em 22-05-2031, estando em causa a prática de um crime de homicídio qualificado e um crime de detenção de arma proibida.
2. Há que considerar as exigências de prevenção especial, porquanto o condenado deve consolidar a evolução positiva que já apresenta de forma a melhor avaliar da efetiva motivação para a mudança comportamental, sendo insuficiente a testagem em meio
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