Acórdão nº 684/22.9T8ALM.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão684/22.9T8ALM.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

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1. Relatório:

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1. A, identificada nos autos, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra CONDOMÍNIO DO PRÉDIO (…), também com os sinais dos autos, pedindo o seguinte:
“a) Devem serem anuladas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos de 27 de Novembro de 2021, exaradas na Acta nº 2, por ilegalidade da respectiva convocatória e do modo de realização;
Caso assim não se entenda,
b) Deve ser anulada a deliberação relativa ao ponto 5 da Assembleia de Condóminos realizada no dia 27 de Novembro de 2021 exarada na Acta nº 2.”.
Alegou, em suma, que:
- É proprietária da fração autónoma designada pela letra “E, correspondente ao primeiro andar direito, destinada a habitação, com entrada pelo n.º (…) da Rua (…);
- No dia 27 de Novembro de 2021, pelas 16.00 horas reuniu a Assembleia de Condóminos do prédio sito na Rua (…), que foi convocada para deliberar, entre outros, sobre “obras de conservação do exercício-apresentação de propostas de orçamento, discussão e votação”;
- Conforme consta da convocatória, a Assembleia foi convocada para ter lugar através de meios de comunicação à distância, exclusivamente, como veio a acontecer, mas a A. considerou não ter condições para participar nesses termos, uma vez que não dispõe de meios nem de conhecimentos informáticos suficientes para o efeito e, por esse motivo, em 24/11/2021, enviou um fax à Administração do condomínio Réu, impugnando a decisão de realizar a Assembleia exclusivamente através de meios de comunicação à distância;
- Ao verificar que, pelo menos, a A. manifestou a sua intenção de participar presencialmente na Assembleia, em modelo misto, a obrigação da Administração do condomínio Réu era dar cumprimento à al. b) do nº 2 do art.ºº 5º A da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, pelo que a realização da Assembleia e as deliberações ali tomadas, padecem de nulidade insanável;
- O facto de só terem comparecido dois condóminos à Assembleia realizada por videoconferência, (Cfr. doc. 2), indiciava claramente que provavelmente outros condóminos, para além da ora A., não reuniam as condições para tal forma de participação, o que deveria ter levado a administração, desde logo por dever de cautela, a dar sem efeito a mesma Assembleia;
- No que se refere à deliberação referente ao ponto 5, a mesma é ilegal por abuso de direito e por respeitar a um assunto (necessidade de obras de conservação na cobertura do edifício) que é controvertido e é objecto de processo judicial;
- Consta da acta que foi aprovado por unanimidade o orçamento para “reabilitação do telhado com aplicação de subtelhas tipo Onduline, impermeabilização de caleiras, chaminés e guarda-fogos e criação de acesso ao telhado através da parte comum”, no valor de 17.000,00€ mais IVA, com pagamento em 4 mensalidades de quotizações extraordinárias de acordo com as permilagens das fracções, orçamento que foi o único elaborado após acesso à cobertura, sendo que o outro com ele concorrente foi feito por aproximação, uma vez que esse empreiteiro, tal como consta da acta, não teve acesso à mesma cobertura;
- Apesar de haver só dois orçamentos, sem se ter garantido a igualdade de circunstâncias para as respectivas elaborações, foi deliberado por unanimidade aprovar o mais baixo, com possível prejuízo para o condomínio, fica-se sem saber que valor a empresa que apresentou o orçamento preterido apresentaria caso tivesse tido acesso ao telhado;
- A necessidade de três orçamentos de diferentes proveniências, já em prática corrente, teve respaldo na mais recente alteração legislativa ao Código Civil. Cfr. art.ºº 1436º nº 2 do CC, pelo que, também por tais factos a deliberação referente ao ponto nº 5 da ordem de trabalhos é nula;
- O único interessado na realização da obra aprovada é o condómino da fracção G (2º dtº), um dos únicos dois presentes na assembleia, tendo sido a seu pedido que foram solicitados os orçamentos, não tendo sido demonstrada a necessidade da realização de tal obra e a responsabilidade do condomínio no respectivo pagamento;
- O condómino do 2º dtº, juntamente com o outro condómino presente, valendo-se da ausência dos restantes condóminos e de discussão efectiva sobre o assunto em causa, fez aprovar uma obra no valor global superior a 20.000,00€, agindo (o condómino do 2º dtº) manifestamente em abuso de direito;
- O mencionado condómino do 2º dtº é Autor no processo (…) que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Local Cível de Almada – Juiz 1, e Réus o condomínio e todos os outros condóminos e no qual peticiona, entre outros pedidos, a reparação das patologias verificadas no imóvel em causa e na reparação dos vícios de manutenção e conservação do telhado e na caleira, procedendo ao seu isolamento, processo que deu entrada em juízo em 23/10/2021, ou seja, muito antes da realização da Assembleia, sendo que, tal acção foi contestada, entre outros, pela aqui A., tendo sido pedida prova pericial para averiguação das alegadas infiltrações no telhado e na caleira e a origem das alegadas humidades existentes na fracção do ali Autor, condómino do 2º dtº; e
- Ambos os condóminos presentes na Assembleia, bem como a administração do condomínio, todos partes na mencionada acção, ainda pendente, sabendo, como sabiam, da existência e do objecto da mesma, também sabiam, consequentemente, que a necessidade e a responsabilidade pela realização da obra aprovada era controvertida, pelo que a respectiva deliberação visa contornar a via judicial, fazendo “entrar pela janela o que não entrou pela porta”, pelo que, também por este motivo, tal deliberação padece de nulidade insanável.

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2. Citado, o réu contestou invocando a existência de causa prejudicial e por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.
Alegou, em suma, que:
- A assembleia reuniu em 2.ª convocatória com 2 condóminos que representavam 415% da permilagem total;
- A convocatória foi expedida em 15-11-2021 e referia que a assembleia seria realizada por meios de comunicação à distância, nos termos do art.ºº 5-A, n.º 2, al. a) da Lei 1-A/2020 (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-B/2021);
- No documento 4 junto com a petição inicial não é aduzido qualquer fundamento para impugnação;
- O facto de o Autor ter manifestado a intenção de participar na Assembleia realizada “em modelo misto”, não configura uma situação que, nos termos legais, tenha a virtualidade de impedir a realização da Assembleia nos moldes propostos;
- Compulsado o documento junto com o n.º 4, não é invocada qualquer impossibilidade, nem aduzido qualquer motivo justificativo que inviabilize a realização da assembleia através de meios à distância, pelo que, as deliberações não padecem de vício que afete a sua validade;
- Não é legítimo afirmar que “o facto de só terem comparecido dois condóminos à Assembleia (…) indiciava (…) que (…) não reuniam as condições para tal participação, o que deveria ter levado a administração, desde logo por dever de cautela, a dar sem efeito a mesma Assembleia”;
- O facto de só terem comparecido dois condóminos à Assembleia indicia o desinteresse e o alheamento da grande maioria dos condóminos face aos assuntos da generalidade dos condomínios;
- É verdade que o Administrador do Condomínio deveria ter apresentado 3 (três) orçamentos – artigo 1436.º, n.º 2, do CC -, mas a consequência legal não é a nulidade da deliberação, não existindo nenhum preceito legal que comine como nulas as deliberações tomadas face à apresentação de menos de 3 orçamentos e não é o facto de se ter aprovado o orçamento mais caro que indicia, imediatamente, a má fé da ré ou dos condóminos, não sendo condenável que a Assembleia, validamente constituída, e existindo quórum deliberativo, delibere aprovar o orçamento mais caro, desde que represente a vontade efetiva dos condóminos;
- No caso concreto, a deliberação foi tomada por unanimidade dos presentes. Não se verificou nenhuma tentativa desencadeada pelo condómino da fração G para se servir da sua posição maioritária para impor as suas medidas ao condomínio. Se votou a favor, é porque entendeu que a medida pode ser útil e favorável ao condomínio. Se compareceu, é porque entendeu que a sua presença era importante;
- O facto de a ação judicial– em que o condomínio é também réu – ter sido anteriormente contestada pela Administração do Condomínio não significa que, em momento posterior, não se possa reconhecer a existência de infiltrações, a sua origem em partes comuns do edifício nem, obviamente, que não se possa tentar resolver o litígio extrajudicialmente, até porque, a pendência de uma ação judicial acarreta vários custos, designadamente dinheiro e, sobretudo, tempo e, num cenário em que existam infiltrações, quanto mais tempo se esperar, maiores serão os danos, maiores serão os custos associados à reparação e, obviamente, maiores serão os custos imputados a cada um dos condóminos e, em especial, à Ré;
- Não existe má fé do condomínio ou do condómino da fração G; o que existe é, de facto, a tentativa de resolver extrajudicialmente um litígio que deu entrada em Tribunal, mas que não carece – em absoluto – de aí ser resolvido;
- A sentença que vier a ser proferida no processo nº (…) – que corre termos no Juízo Local Cível de Almada – Juiz 1 – do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa –esses autos terá influência na decisão dos presentes autos, porquanto: a) Ou se considera que as infiltrações têm origem em parte comum e que a responsabilidade é do condomínio, caso em que as deliberações impugnadas têm manifestamente cabimento; b) Ou se considera que as infiltrações têm origem em parte própria e que a responsabilidade é do condómino, caso em que as deliberações impugnadas não traduzem o interesse do condomínio;
- Deverá a presente instância ser suspensa, nos termos do art.ºº 272º do CPC, atendendo à
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