Acórdão nº 68/12.7TBCMN.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16-03-2023

Data de Julgamento16 Março 2023
Ano2023
Número Acordão68/12.7TBCMN.G2
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 68/12.7TBCMN.G2

I - A Assembleia de Compartes dos Baldios de ... representada pelo Conselho Diretivo dos Baldios da freguesia de Venade, ..., instaurou a presente acção contra a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia ..., a Freguesia ..., a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia ..., a Freguesia ... e Empreendimentos Eólicos do ..., S.A. pedindo que se declare que os Baldios n.ºs 1 e 2 descritos, o n.º 1, de arts. 5.º ao 33.º da p.i. e o n.º 2, de arts. 34.º ao 49.º da PI, pertencem à Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia de ..., Concelho ...; os 9,97 hectares (99.700m²), correspondentes à Parcela de terreno dos Baldios objeto do Contrato e identificados na cl.ª 2.ª do doc. n.º ...1, fazem parte integrante dos referenciados Baldios n.ºs 1 e 2. Requer o A. ainda que se declare que os 3 (três) aerogeradores referenciados de arts. 65.º ao 83.º da PI se encontram implantados dentro dos limites dos Baldios n.ºs 1 e 2 referenciados na alínea a) do pedido, cabendo um destes 3 (três) aerogeradores ao Baldio n.º 1 e os 2 (dois) outros aerogeradores ao Baldio n.º 2. E, consequentemente, requer o A. que as 5 (cinco) RR. sejam solidariamente condenadas no pagamento à primeira das quantias peticionadas na ação (o pedido é alterado no decurso da ação).
Alega o A. que a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia de ..., do Concelho ..., foi constituída em 27 de fevereiro de 1977. Tal constituição ocorreu nos moldes e em obediência aos fins previstos no Dec. Lei n.º 39/76, de 19 de janeiro e da mesma (constituição) foi dado conhecimento aos Serviços Florestais e ao Sr. Presidente do Conselho Diretivo dos Baldios da freguesia de Venade. Havendo, por sua vez, o Conselho Diretivo da Freguesia ... sido constituído na mesma data da constituição da Assembleia de Compartes, ou seja, em 27 de fevereiro de 1977, pese embora este haver deliberado, o exercício de funções da Administração dos Baldios no Presidente da Junta de ..., em 26 de fevereiro de 1995.
Sobre o Baldio n.º 1 refere o A.: desde tempos imemoriais e, pelo menos há mais de 200 (duzentos) anos, que um monte baldio, situado junto dos limites das freguesias de ...
e de ..., se tem mantido na posse da população da Freguesia .... E, por tal população, tem vindo este baldio a ser fruído e utilizado como coisa de sua pertença. Os limites e confinâncias deste baldio com a Freguesia ... são descritos na p.i. O baldio em referenciação, tem, segundo o A., de área 128 hectares (o A. junta o documento n.º ... composto por 2 mapas e seus complementos, o qual constitui um levantamento topográfico, sob a forma de um Laudo de Peritagem, levado aos autos do Processo n.º 263/04.... e sendo o A., do referido Processo, o ora A., e RR., a Junta de Freguesia ... e outros).
Diz então o A. que, desde há mais de 200 anos e até aos dias de hoje, os residentes na Freguesia ... vêm apascentando os seus gados nesse baldio, retirando matos, pinheiros e lenhas e tudo isto fazendo à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja. O que o mesmo é dizer, retirando desse seu terreno baldio todas as utilidades de que o mesmo é suscetível.
Prossegue o A. dizendo que os atos referenciados nos arts. 25.º e 26.º da p.i. são e têm sido, desde tempos imemoriais, levados a cabo pelas pessoas pertencentes à comunidade da Freguesia ... e que, atualmente, conformam a respetiva Assembleia de Compartes da Freguesia ...; comunidade e respetiva Assembleia de Compartes que hoje e tal como desde sempre se mantêm na perfeita convicção e consciência de que aquele terreno baldio lhes pertence como um bem comunitário dos habitantes da referida Freguesia .... Daí que, por afetação tácita, tal propriedade do baldio em questão se foi instituindo como um bem social e a favor dos habitantes de ... e daqui se invoque a certificação da sua posse e domínio e, sempre por mera cautela, se invoque a seu favor e na medida do legalmente possível, a respetiva usucapião.
Por outro lado, acrescenta o A. que, por sentença já transitada em julgado e confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o baldio em questão foi considerado pertença da Freguesia ..., ou melhor dizendo, da sua Assembleia de Compartes dos Baldios. Comprova-o a sentença proferida pelo Tribunal da Comarca ... na acção ordinária n.º 263/04....; o Acórdão, proferido na Relação de Guimarães, sob o n.º 2.583/07; e o Acórdão de Revista n.º 2076/08.2, proferido no Supremo Tribunal de Justiça, todos transitados em julgado (docs. nºs ..., ... e ... juntos aos autos pelo A.).
Conclui o A. referindo que, efetivamente, o baldio em questão, sempre circunscrito à área e confinâncias alegadas na p.i., foi declarado no respetivo processo pertencer, em exclusivo, aos habitantes da Freguesia ..., ou seja, à sua Assembleia de Compartes.
Sobre o Baldio n.º 2 alega o A.: Pelo ano de 1873, as Juntas de Freguesia ... e ... e mais precisamente a 4 de Janeiro, reunidas na Câmara Municipal do Concelho de ..., em acto solene, deliberaram e exararam no Livro de Atas das Sessões da referida Câmara Municipal e correspondentes aos anos de 1873, a págs. 102 e seguintes, a Demarcação do Monte Baldio cujo aproveitamento (e fruição) era feito por ambas freguesias, de forma indiscriminada (cfr. docs. n.ºs ... e ... juntos com a p.i.). De tal modo de usufruir aquele referido Monte Baldio vinham resultando sérios distúrbios entre as populações de ambas referidas freguesias. Daí que em função da referenciada demarcação daquele Monte Baldio, antes indiscriminadamente usufruído pelas duas citadas populações (de ... e ...), o (baldio) efetivamente atribuído a ... ficou a constar do referenciado Auto e, para todo o sempre, circunscrito às confinâncias que ainda hoje se mantêm (descritas na p.i.). O Baldio em referência, atribuído à Freguesia ... e nos termos do referenciado Auto de Vistoria e Demarcação tem, segundo o A., a área de 718,076m².
Assim, se os residentes da Freguesia ..., até 1873, (ano em que se procede à Divisão e Demarcação do Monte Baldio em referenciação) vinham usufruindo indiscriminadamente do Baldio, em parceria, com os habitantes da Freguesia ..., dali em diante passaram a usufruir esse Baldio que, em termos de exclusividade, assim lhes foi atribuído. Desta sorte, os residentes de ..., vendo-se donos e exclusivos possuidores daquela propriedade social, que como tal lhes foi atribuída, dali por diante e até aos dias de hoje, e com carácter de perpetuidade, aí têm vindo a apascentar os seus gados, a roçar os matos que ali espontaneamente crescem, a cortar pinheiros que em qualquer estado do seu desenvolvimento utilizam, quer para lenha quer para obras, nas suas unidades agrícolas/familiares. Praticam estes atos de posse – e posse ainda que entendida no âmbito da atribuição da propriedade social em que os baldios se integram - como os verdadeiros donos que são; e os residentes das demais freguesias circunvizinhas, maxime os da Freguesia ..., não se lhes opõem, nem lhes reivindicam o aproveitamento e fruição desse seu Baldio.
Então os residentes da Freguesia ..., sempre têm agido no exercício de tais direitos, de forma ininterrupta, pacífica, à vista de toda a gente (pública) e de boa fé.
Nos termos em que legalmente for possível, a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia de ..., na qualidade de legal sucessora dos usufruidores dos Baldios da referida freguesia, invoca a seu favor a usucapião deste referido Baldio.
Pelo que, na opinião do A., juntando a aquisição derivada (resultante do Auto da Vistoria e Demarcação, celebrado com os representantes dos residentes da Freguesia ...), à aquisição originária que, ab initio, vêm detendo sobre tal Baldio, a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia de ... é a exclusiva possuidora e titular desse baldio.

O A. diz ainda que, efetivamente, nos termos do Título (do Auto de Vistoria e Demarcação), depois de identificado o respetivo terreno baldio, estabelece-se que:

a) -“a roça de mato e mais plantas silvestres ou outra qualquer coisa, seja qual for a sua espécie que produza na actualidade ou venha a produzir no futuro, este terreno acima demarcado e confrontado, desde hoje para todo o sempre, fica pertencendo à Freguesia ... para o uso exclusivo dos seus habitantes, pois que os habitantes da Freguesia ... lhes cedem e transferem todo o direito, acção, gozo e fruição que sobre a dita produção tenham ou venham a ter para as presentes, e gerações futuras”;
b) -“...exceptuando, todavia, duas prezas com os respectivos rocios circundados por parede que dentro da demarcação e confrontação acima se acham, que ficarão para o uso exclusivo dos habitantes da Freguesia ..., e também fica exceptuado do terreno acima demarcado e confrontado o direito ao usufruto, digo ao mesmo terreno, por continuar a pertencer aos habitantes da Freguesia ..., e a cedência e «transferência que fazem estes aos habitantes da Freguesia ..., entender-se somente quanto à produção do dito terreno como dito fica.”
c) -“...que todos aceitaram livremente, de comum acordo foi resolvido...”

O próprio A. alega que, em face do assim expresso no Título em apreciação, pareceria inequívoco que a vontade das partes aqui manifestada fosse a de atribuir aos habitantes da Freguesia ... apenas a gestão do Baldio assim demarcado, ficando o respetivo terreno a pertencer aos habitantes da Freguesia .... Porém, defende o A. que tal fracionamento dos terrenos baldios entre a propriedade, posse e respetiva gestão, são institutos jurídicos incompatíveis com o quadro Legal e Constitucional vigente no nosso ordenamento jurídico.
Daí que, no entender do A., o título em referenciação, devendo ser interpretado em conformidade com a Lei, constitui e fundamenta o uso e fruição do terreno a favor dos habitantes da Freguesia .... E, mediante...

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