Acórdão nº 6781/20.8T8LRS.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-12-07

Ano2023
Número Acordão6781/20.8T8LRS.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA


I–RELATÓRIO


A [José …] , contribuinte fiscal nº 2.......8, residente na Rua ..... – Quinta ..... ....., nº …, 1º Frt, ....-... - S____ J____ M____,
Intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma única de processo comum, contra
“Crédito Agrícola Seguros – Companhia de Seguros de Ramos Reais, SA”, pessoa colectiva com o NIPC 5.......9, com sede na Rua .....- nº ..., 3º dto, ....-...- L____,
alegando, em síntese, que no dia 11.3.2019, cerca das 07h45, sofreu um acidente de viação na Autoestrada A1, ao Km. 5,95 no sentido Norte – Sul, quando conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula XX-XX-XX, acidente que se deveu a culpa exclusiva do condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula YY-YY-YY, cuja responsabilidade civil decorrente da respectiva circulação havia sido transferida para a R. por contrato de seguro titulado pela apólice nº 01.....9, tendo a mesma aceite que a produção do acidente se ficou a dever a responsabilidade do condutor do veículo por si seguro e, em conformidade, indemnizou o A. por danos materiais no valor de € 2.100,00 por perda total do veículo.
Em resultado do acidente o A. sofreu fracturas do úmero direito e da tíbia direita que o obrigaram à sujeição a duas cirurgias com colocação de material de osteossíntese, tendo a sua condição física determinado um período de défice funcional temporário total a que se seguiu período de défice funcional temporário parcial, com a inerente repercussão profissional, sendo que durante os períodos de incapacidade - entre 12/03/2019 e 25/11/2019 - recebeu apenas € 4.092,81 da “Seguradora Fidelidade, SA”para a qual a sua entidade patronal havia transferido a responsabilidade por acidentes de trabalho, o que se traduziu em perdas salariais em valor não inferior a € 4.559,11 uma vez que o A. teria auferido nesse período uma remuneração total não inferior a € 8.651,92, pois recebia mensalmente o vencimento de € 600,00, subsídio de alimentação no valor de € 99,44, abono para falhas no montante de € 53,10, prémio de assiduidade de € 45,00, subsídio de transporte no valor de € 85,00 e compensação por encargos familiares no valor de € 120,00.
Mais alegou que a sua situação clínica se considerou consolidada com sequelas físicas que acarretam dificuldades no desempenho da sua actividade profissional e o afectam no desenvolvimento de actividades comuns do quotidiano, desportivas e de lazer, e com sequelas psicológicas compatíveis com perturbação de stress pós-traumático, com repercussões a nível pessoal, social e profissional, sequelas essas - físicas e psíquicas - que sendo compatíveis com a actividade profissional implicam esforços acrescidos e dores diárias, determinando-lhe, essa condição geral, um défice funcional físico-psíquico não inferior a 12 pontos.
Por outro lado, defende que essas limitações físicas e psíquicas decorrentes do acidente importam perda de capacidade de ganho, argumentando no sentido de que a esse título sofre um dano patrimonial correspondente a € 61.918,64; além de que tais limitações configuram dano biológico para lá da repercussão na actividade profissional, o qual configura como dano patrimonial autónomo que quantifica em € 35.000,00.
Invoca ainda ter sofrido danos patrimoniais relativos a despesas com medicamentos e ajudas medicamentosas, cirurgias, internamentos, tratamentos e deslocações inerentes, os quais, porém, não concretizou nem quantificou.
Alega ainda ter sofrido danos não patrimoniais, relativos às dores sofridas e às que se manterão, à afectação estética decorrente das cicatrizes com que ficou, ao prejuízo sexual, à perda de alegria de viver, à tristeza, angústias e padecimentos de várias índoles, entendendo ser equitativa a indemnização de € 40.000,00a título de danos não patrimoniais.
Com tais fundamentos, concluiu pedindo a condenação da R.
«- No pagamento das perdas salariais no valor de 4.559,11 €, acrescidas de juros de mora à taxa legal;
- No pagamento de todas as despesas médicas e medicamentosas, cirurgias, internamentos, tratamentos e deslocações inerentes relacionadas com as sequelas descritas, acrescidas de juros de mora à taxa legal;
- No pagamento de indemnização por perda de capacidade de ganho no montante de 61.918,64 €, acrescida de juros de mora à taxa legal;
- No pagamento de indemnização a título de dano biológico autónomo da perda de capacidade de ganho de valor não inferior a 35.000,00 €, acrescida de juros de mora à taxa legal;
- No pagamento de indemnização a título de danos morais de valor não inferior a 40.000,00 €, acrescida de juros de mora à taxa legal.»

Na sua contestação a R., pese embora refira não ter conhecimento directo dos factos relativos à dinâmica do acidente, aceitou, na decorrência das averiguações levadas a cabo, a responsabilidade do condutor do veículo por si segurado na produção do mesmo.
Impugnou os factos atinentes aos danos alegados pelo A. e o conteúdo e alcance dos documentos particulares por aquele juntos que não sejam da autoria da R., bem como impugnou os valores reclamados pelo A., destacando que o montante que vier a ser apurado terá que atender aos valores que o A. já recebeu da companhia de seguros de acidentes de trabalho e deduzido esse montante ao valor da indemnização que vier a ser fixada, uma vez que o acidente foi simultaneamente de viação e de trabalho e em sede laboral o Autor recebeu da Seguradora Fidelidade indemnização por incapacidade temporária e pela IPP que lhe foi atribuída.
Por fim, com fundamento em que assiste à seguradora laboral o direito de intervir ao lado do trabalhador/sinistrado na acção por este intentada contra a seguradora civilmente responsável, deduziu o incidente de intervenção principal provocada da“Fidelidade Companhia de Seguros, SA”, a qual, por sua vez, e antes da admissão liminar do incidente suscitado pela R., se apresentou a requerer a sua intervenção espontânea.
Nessa sede a Seguradora Fidelidade alegou que no contexto da acção emergente de acidente de trabalho suportou as despesas decorrentes do acompanhamento clínico, médico e de recuperação do A., bem como o pagamento pelos períodos de incapacidade do mesmo, tendo pago €4.385,15 relativamente ao período de incapacidade temporária absoluta e € 69,44 quanto ao período de incapacidade temporária parcial; € 6.202,86 a titulo de capital de remição e € 247,43 de juros de mora, em função da IPP de 5,92% que foi fixada ao A. no processo por acidente de trabalho; suportou ainda € 31,20 a título de despesas de transporte e juros de mora devidos por tal despesa. Pagou ainda € 7.318,70 a titulo de despesas médicas, honorários com consultas, cirurgia e elementos auxiliares de diagnóstico; €630,00 a titulo de despesas por hospitalização em ambulatório; € 1.582,00, €607.50 e € 255,00 com a realização de fisioterapia; € 424,88 como reembolso ao A. de despesas de transporte suportadas por este; e a ainda € 151,20 de despesas judiciais.
Deste modo, e com fundamento em ter ficado sub-rogada nos direitos do lesado/sinistrado ao proceder ao pagamento das referidas indemnizações ao mesmo, peticionou a condenação da Ré, na qualidade de responsável pela reparação dos danos emergentes do acidente, a reembolsá-la do montante de € 21.905,36 e bem assim no que viesse a despender por força do evento dos autos, com juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde o respectivo pagamento até integral reembolso à interveniente.
A Interveniente “Fidelidade - Companhia de Seguros, SA”, por requerimento de 16/05/2022 (ref. 12341079) e com fundamento em que após a apresentação do seu requerimento de intervenção e até ao dia 21/09/2021, por força do sinistro sofrido pelo A., suportou ainda o montante global de € 1.059,01 a titulo de despesas judiciais, despesas com elementos auxiliares de diagnóstico e transporte,requereu a ampliação do pedido para € 22.819,62.
Essa ampliação do pedido foi admitida.
O processo seguiu os seus regulares termos, tendo após audiência de julgamento sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré :
- a pagar ao Autor (a)- a quantia de € 25.000,00 a titulo de dano biológico, acrescida dos juros de mora à taxa legal desde a data da prolação da sentença até integral pagamento, e (b)- a quantia de € 28.500,00 a titulo de danos não patrimoniais acrescida dos juros de mora à taxa legal desde a data da sentença até integral pagamento.
- a pagar à Interveniente “Fidelidade – Companhia de Seguros, SA”a quantia de € 21.777,36 acrescida dos juros de mora à taxa legal contados desde a data do vencimento das prestações e até integral pagamento.
- absolveu a Ré do demais peticionado.
Inconformados recorreram o Autor e a Ré.
O Autor, juntando um parecer, apelou sustentando que a decisão recorrida deve ser revogada e em seu lugar proferida outra que condene a Ré (a)- no pagamento ao Autor da quantia de € 55.715,78, correspondente ao valor de € 61.918,64 por ele peticionado a título de perda de capacidade de ganho deduzido do montante de € 6.202,86 correspondente ao capital de remição recebido no âmbito do processo de acidente de trabalho, (b)- no pagamento ao Autor de valor não inferior a € 50.000,00 pelos danos morais e (c)- no pagamento dejuros de mora em dobro, nos termos do disposto no artº 38º nº 2, do DL nº 291/2007,de 21/08.
Terminou as suas alegações com as seguintes
Conclusões
«1.– O recorrente dá por reproduzido o teor do parecer elaborado pelo Professor Paulo Mota Pinto, cujas conclusões desde já se transcrevem (e que se junta como DOC. 1):
- A perda de capacidade de ganho da vítima que, para tentar obter o mesmo nível de rendimento ou atenuar a quebra de rendimento, realiza esforços avaliáveis em dinheiro deve ser reconhecida como dano autónomo, dentro da esfera dos danos patrimoniais futuros.
- O
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