Acórdão nº 670/21.6BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2024-01-11

Ano2024
Número Acordão670/21.6BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - Relatório

I….. SUCURSAL EM PORTUGAL interpõe recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou intempestiva a impugnação judicial respeitante à Contribuição sobre o Setor Bancário de 2018.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

A. «O presente recurso é interposto da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa no processo n.º 670/21.6BELRS, de 3 de junho de 2022, que considerou – mal – intempestiva a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente, e julgou – mal – procedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação, absolvendo a Fazenda Pública.
B. Após a autoliquidação da CSB 2018, a Recorrente expôs os seus argumentos numa reclamação graciosa que foi indeferida a 20 de setembro de 2019.
C. Após esse indeferimento, a Recorrente apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral junto CAAD, a 10 de dezembro de 2019, na sequência do qual foi iniciado o processo .../2019-T.
D. A decisão do tribunal arbitral foi proferida a 2 de outubro de 2020 e julgou procedente a exceção de incompetência material invocada, absolvendo a AT, tendo sido o processo oficiosamente remetido, a 17 de novembro de 2020, ao abrigo do artigo 18.º do CPPT, para o Tribunal Tributário de Lisboa.
E. A 6 de setembro de 2021, o referido Tribunal emitiu despacho liminar de admissão da impugnação, notificando a Fazenda nos termos da lei, e em despacho datado de 19 de abril de 2022 notificou as partes no processo para se pronunciarem sobre a exceção de caducidade do direito de ação e de caso julgado, por si invocadas no processo.
F. Por fim, decidiu – mal – o Tribunal Tributário de Lisboa, a 3 de junho de 2022 – recusando a aplicação do artigo 18.º, n.º 1 e n.º 4 do CPPT e do artigo 24.º, n.º 3 do RJAT – julgar procedente a exceção de caducidade do direito de ação e em consequência absolver a Fazenda Pública.
G. O Tribunal a quo assume como data relevante para aferir da caducidade do direito à ação a do despacho de remessa do Tribunal Arbitral, ao abrigo do artigo 18.º do CPPT, para o Tribunal Tributário de Lisboa, enviado a 17 de novembro de 2020, decidindo assim pela intempestividade do processo de impugnação e consequente caducidade do presente direito de ação. De acordo com a Recorrente, a data relevante da entrada do processo para aferir da caducidade do direito à ação é 10 de dezembro de 2019.

Do erro de julgamento pela não aplicação do artigo 18.º do CPPT:

H. Segundo o Tribunal a quo: “O artigo 18º, n.º 1, do CPPT aplica-se aos tribunais tributários e aos tribunais administrativos apenas se estes forem os tribunais que se declaram incompetentes”
I. Não faz qualquer sentido nem decorre da norma em causa, este requisito adicional, criado ex novo pelo Tribunal a quo, de que a decisão de incompetência tenha de ser exclusivamente proferida por um tribunal compreendido na jurisdição estatal.
J. A AT e os contribuintes, quando expressam a sua vontade de submeterem o litígio às regras da arbitragem, não concordaram numa diminuição das suas garantias processuais e procedimentais (excetuando, por razões óbvias, o direito ao recurso).
K. Diga-se até, que, tendo os tribunais arbitrais uma competência material reduzida face aos tribunais estaduais, há uma intenção do legislador em reforçar a tutela das partes no processo em caso de decisões arbitrais de incompetência.
L. Atualmente, por alteração provocada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, a remessa oficiosa para o Tribunal Tributário competente passou a ser obrigatória para qualquer decisão de incompetência, incluindo assim a incompetência material do tribunal arbitral declarada nos autos, já que as decisões arbitrais têm o mesmo valor jurídico que as decisões dos tribunais judiciais.
M. Não podem, por isso, as decisões arbitrais apresentar diminuídas garantias processuais face às decisões dos tribunais estaduais – o que seria, inclusivamente violador das garantias constitucionais de acesso ao direito concedidas aos contribuintes.
N. Aliás, os Tribunais Arbitrais tributários, como se antecipou, são órgãos jurisdicionais com decisão jurídica de igual valor e a mesma dignidade constitucional, aliás, de outro modo não seria possível a criação de um verdadeiro meio alternativo de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária (inclusivamente aceites como tal pelo TJUE para efeitos de reenvio prejudicial).
O. O Tribunal arbitral aplicou o artigo 18.º do CPPT, subsidiariamente, e, fruto da decisão de incompetência arbitral, o processo foi remetido ao Tribunal competente (cf. despacho arbitral a fls …) – o Tribunal Tributário de Lisboa.
P. Espoletam-se as seguintes consequências jurídico-processuais:
a. a remessa oficiosa que deu aso ao presente processo (cfr. n.º 1 do artigo 18.º do CPPT); e bem assim,
b. a garantia de que a petição se considera “apresentada na data do primeiro registo do processo” (cfr. n.º 4 do mesmo artigo 18.º do CPPT).
Q. A aplicação do artigo 18.º do CPPT, tal como acima explicado, ou até a recusa da sua aplicação in totum, consubstanciam uma errada aplicação do direito, violadora do princípio constitucionalmente protegido de acesso ao direito e das garantias dos contribuintes.
R. Assim, adicionalmente, o despacho arbitral que aplicou o artigo 18.º do CPPT, não tendo sido objeto de recurso, fez caso julgado das consequências processuais, pelo que não pode ser agora questionado pela Fazenda ou violado pelo Tribunal a quo.
S. Ainda que se diga que o caso julgado aqui aplicável se trata de um caso julgado “formal” e que apenas tem efeitos dentro do processo, deve sempre ser respeitado pelo Tribunal a quo que, in casu recebeu a remessa do processo.
T. Pode então concluir-se que, ainda que meramente dentro do processo, a questão da remessa oficiosa entre os tribunais foi pacífica, transitou em julgado, e não poderia ter sido questionada.
U. Conclui-se que Tribunal a quo faz uma errada aplicação sectária da norma em causa, com nefastos efeitos nas garantias jurídico-processuais da ora Recorrente, quando é mais do que óbvio que aplicação do artigo 18.º n.º 4 do CPPT está umbilicalmente relacionada com a remessa do processo prevista no seu n.º 1 e criativamente decide criar ex novo requisitos legais adicionais.
V. Repisando o brocado latino: Ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus. Esta é a chave de leitura correta para a norma do artigo 18.º do CPPT no presente processo.
W. Como decorre expressamente do artigo 18º, n.º 4 do CPPT, após a remessa do processo, a petição considera-se apresentada na data do primeiro registo do processo, ou seja, 10 de dezembro de 2019, data de entrada do pedido de pronúncia arbitral junto do CAAD.
X. Uma interpretação como aquela que é veiculada na sentença a quo não só é manifestamente ilegal, como violaria grosseiramente o princípio da tutela jurisdicional efetiva e o princípio do pro actione, negando o acesso à justiça à ora Recorrente.
Y. O Tribunal a quo incorre assim em erro de julgamento na aplicação do artigo 18.º do CPPT, além do mais, violando a força jurídica do caso julgado já constituído no processo, e que não pode assim manter-se a decisão do Tribunal a quo.

Do erro de julgamento pela não aplicação do artigo 23, n.º 4 do RJAT

Z. Ainda que se considerasse que o artigo 18.º do CPPT não era aplicável, o que apenas se coloca por mera hipótese académica, e sempre sem conceder, sempre seria aplicável ao caso sub judice o artigo 23.º, n.º 4 do RJAT.
AA. À parte da manifesta falta de fundamentação para a sua decisão, a sentença recorrida decide negar à Recorrente a tutela jurisdicional pois considerou que a decisão arbitral proferida no processo que não conheceu do mérito, tendo antes apreciado procedente uma exceção de incompetência, foi proferida “por facto imputável” à Recorrente.
BB. A discussão sobre a competência do Tribunal Arbitral para dirimir o presente litígio refere-se à “arbitrabilidade” das contribuições, ou seja, a possibilidade de as contribuições financeiras, como tipo de tributo autónomo de tributo, serem objeto de apreciação por um tribunal arbitral.
CC. A competência dos tribunais arbitrais para conhecer de tributos lato sensu além dos impostos sempre foi um tema de debate na doutrina e de contradição entre a jurisprudência arbitral (relacionada com a interpretação específica de uma norma particular constante da Portaria de Vinculação da AT aos Tribunais Arbitrais). Assim, a decisão da Recorrente ter submetido o litígio à via arbitral não poderá jamais ser punida numa frontal violação das garantias de tutela jurisdicional efetiva.
DD. Tal como a jurisprudência e doutrina reconhecem, os casos de incompetência do Tribunal arbitral são casos particularmente sensíveis e, portanto, suscetíveis de preencher o requisito da “não imputabilidade” ou, se quisermos, “desculpabilidade” do erro do sujeito passivo na escolha do tribunal.
EE. Ora, com efeito, já foram publicadas algumas decisões sobre este tema, mas em ambos os sentidos, e não apenas a favor da incompetência dos tribunais arbitrais, também a favor da sua competência e decidindo as pretensões dos contribuintes em sede arbitral (e bem mais do que cinco decisões)…
FF. Aliás jurisprudência dos próprios tribunais arbitrais não é unânime e já anteriormente tantos outros casos em que os tribunais arbitrais se declararam competentes para conhecer da matéria de contribuições financeiras, em particular, sobre a CSB.
GG. Como vemos, mesmo após a entrada do processo da Recorrente no CAAD, e mesmo após o tribunal arbitral se ter considerado incompetente, (outros) os tribunais arbitrais continuam a declarar-se competentes para conhecer de liquidações de CSB e outras idênticas contribuições financeiras.
HH. ...

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