Acórdão nº 669/20.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 26-10-2023

Data de Julgamento26 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão669/20.0BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo / Social do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
P...... instaurou ação administrativa no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa contra o Ministério da Defesa Nacional e Estado Maior da Força Aérea, peticionando a anulação do ato administrativo através do qual lhe foi aplicada a sanção disciplinar de separação de serviço, datado de 05/12/2019, proferido no processo disciplinar em que a mesma foi arguida (Proc.º 01/2019/DVOPS).
Alega, em síntese, que o ato impugnado enferma de várias ilegalidades, designadamente a preterição da audiência prévia, a excessividade e desproporcionalidade do mesmo.
Citados ambos os demandados para contestar, apresentou contestação o Chefe do Estado Maior da Força Aérea. Por exceção, suscitou a incompetência do TAC de Lisboa, alegando que tendo em consideração que a sanção disciplinar aplicada à autora em causa no presente processo e o conteúdo da norma constante do artigo 6.º da Lei n.º 34/2007, de 13 de agosto, o Tribunal competente para o conhecimento da ação será a secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul. Por impugnação, sustenta a que a pretensão da autora não tem acolhimento legal, pugnando consequentemente pela improcedência da ação.
Por despacho saneador-sentença de 26/01/2021, foi julgada procedente a exceção de incompetência em razão da hierarquia e ordenada a remessa dos autos a este TCA Sul, em conformidade com o disposto no artigo 6.º da Lei n.º 34/2007, de 13 de agosto.
Por despacho datado de 06/12/2022, julgou-se procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva do Ministério da Defesa Nacional e absolveu-se esta entidade da instância.
Foi realizada audiência prévia no dia 21/12/2022, identificando-se o litígio em saber se a sanção disciplinar aplicada à autora é desproporcional e pode ser alterada/anulada, em função do contexto em que os factos em questão foram praticados. Mais foram fixados os seguintes temas da prova:
1 - Saber se ocorreram situações de assédio e perseguição em contexto de trabalho que motivaram a prática dos factos objeto da sanção disciplinar.
2 - Saber se a autora usou de meios judiciais ou outros para participar as situações descritas no ponto antecedente, antes da comunicação que dirigiu ao Exmo. Senhor Presidente da República e à publicação em causa na rede social Facebook.
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II.SANEAMENTO
O Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia e do território.
O processo é próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão regularmente representadas.
Fixa-se o valor da causa em € 30.000,01.
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III. QUESTÕES A DECIDIR
Em função das questões suscitadas, cumpre aferir se;
- ocorreu violação do direito de audiência prévia da autora;
- a sanção disciplinar aplicada à autora é desproporcional e pode ser alterada/anulada, em função do contexto em que os factos em questão foram praticados.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO
IV.1 FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão, dão-se por provados os seguintes factos:
A. A autora iniciou a sua atividade profissional como militar da Força Aérea no dia 24/06/1994, detendo o posto de Capitão à data da decisão final sobre o processo disciplinar comum n.º 1/2019/DIVOPS (Doc. 2 junto com a petição inicial).
B. A autora esteve colocada no Museu do Ar em Sintra entre 20/06/2012 e 08/09/2014 (nota de assentos constante do processo administrativo).
C. No dia 09/09/2014, a autora foi transferida para o Aeródromo de Trânsito n.º 1 (nota de assentos constante do processo administrativo).
D. Entre 15/09/2014 e 29/01/2015, a autora acumulou funções no Comando do AT1 – Chefe do Gabinete de Justiça, com funções na Esquadra de Apoio – Chefe da Esquadrilha de Pessoal (nota de assentos constante do processo administrativo).
E. No dia 29/01/2015, a autora foi transferida internamente das funções de Comandante da Esquadrilha de Pessoal para a chefia do Gabinete do Comando, o que considerou um ato de despromoção (nota de assentos constante do processo administrativo e declarações de parte da autora).
F. Em maio de 2015, a autora recebeu a sua Ficha de Avaliação Individual referente ao período de 09/09/2014 a 30/04/2015, datada de 14/05/2015, com oito dos dezoito parâmetros avaliados com a nota “insuficiente”, devendo-se os motivos apontados sobretudo a questões de relacionamento invocadas pelo avaliador, o Comandante da Unidade onde a autora se encontrava colocada (Doc. 3 junto com a petição inicial).
G. No dia 20/05/2015, foi emitido atestado médico certificando que a autora se encontrava doente e impossibilitada de comparecer ao serviço por um período de 30 dias (Doc. 4 junto com a petição inicial).
H. A autora iniciou acompanhamento psiquiátrico em maio de 2015 por sintomatologia ango depressiva compatível a reação aguda ao stress, que atribuiu a questões relacionadas com o serviço (Doc. 5 junto com a petição inicial).
I. No dia 25/05/2015, a autora apresentou reclamação da ficha de avaliação indicada na alínea F (Doc. 6 junto com a petição inicial).
J. No dia 12/06/2015, a autora apresentou recurso hierárquico do indeferimento da referida reclamação (Doc. 7 junto com a petição inicial).
K. A Junta de Saúde da Força Aérea emitiu parecer a 08/07/2015 no sentido da autora estar apta para o serviço com limitações, propondo-se, por razões de ordem clínica, mudança de colocação, confirmado a 10/07/2015 pelo CPESFA interino, por delegação do CEMFA (Doc. 10 junto com a petição inicial).
L. No dia 15/07/2015, o Chefe do Estado Maior da Força Aérea procedeu à anulação da ficha de avaliação referida na alínea F, por não cumprir os requisitos de fundamentação (Doc. 8 junto com a petição inicial).
M. No dia 01/09/2015, a autora deixou de exercer as funções de Chefe de Gabinete do Comandante do AT1 (nota de assentos constante do processo administrativo).
N. No dia 27/11/2015, a autora reforçou o pedido de transferência através de uma exposição dirigida ao General Comandante de Pessoal (Doc. 11 junto com a petição inicial).
O. Foi elaborada informação clínica pela médica psiquiatra Dra. I...... dando conta que a autora foi considerada inapta pela Junta de Saúde da Força Aérea para Curso de Promoção a Oficial Superior, com parecer que deveria ser integrada noutra Unidade, segundo a própria; referiu que se apresentou na Unidade e soube que tem processo disciplinar em curso; foi prestar declarações e refere aumento das queixas ango depressivas reativamente à situação; à observação apresenta humor ansioso e deprimido, choro fácil quando fala na situação militar; a médica reajustou terapêutica e sugeriu 30 dias de convalescença no domicílio (Doc. 12 junto com a petição inicial).
P. A 09/01/2017, a autora apresentou-se novamente à consulta da Psiquiatria para avaliação das respetivas condições de readaptação ao serviço, onde foi apurado que se mantinha instável, não devendo regressar ao serviço no prazo de 60 dias e a funções de comando no prazo de 90 dias, notando-se que o regresso à atual unidade condiciona de forma marcada a sua recuperação podendo causar um retrocesso no quadro psicopatológico (Doc. 9 junto com a petição inicial).
R. A autora foi visada no processo disciplinar n.º 12/2018, do Instituto Universitário Militar (IUM), que resultou numa pena de repreensão agravada, por se ter ausentado do serviço em desobediência a ordens superiores (registo disciplinar constante do processo administrativo).
S. A autora foi visada no processo disciplinar n.º 1/2018, do Serviço de Documentação da Força Aérea, em que lhe foi mandada aplicar a pena disciplinar de suspensão de serviço, por um período de 20 (vinte) dias, por não acatar ordens para comparecer ao serviço e receber uma guia de marcha, pena essa que ainda não cumpriu por motivo de suspensão preventiva (registo disciplinar constante do processo administrativo).
T. Foi a autora notificada em 13/12/2019 da seguinte decisão final referente ao processo disciplinar comum º 1/2019/DIVOPS:
Assunto: DECISÃO FINAL SOBRE O PROCESSO DISCIPLINAR COMUM N.° …./2Q19/DIVOPS - ARGUIDA: CAP/TPAA/……7-A P......
1. Nos termos do artigo 106.° do Regulamento de Disciplina Militar, com base nos autos que antecedem, é proferida a decisão final sobre o processo n.° …./2019/DIVOPS, em que foi constituída Arguida a CAP TPAA …….7-A P......, conforme fls. 17.
2. O presente processo disciplinar comum foi mandado instaurar por Despacho do Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA), de 24 de janeiro de 2019, a fls. 2.
3. A prova carreada para o processo consiste fundamentalmente em prova documental, atendendo a que se encontra em causa o conteúdo de um e-mail enviado pela Arguida a Sua Excelência o Presidente da República e o teor de uma publicação e comentários na página de facebook da Arguida, publicação esta dada a conhecer à Força Aérea pelo Instituto Universitário Militar, conforme fls. 3 a 16.
4. Por Despacho do CEMFA, de 20 de fevereiro de 2019, a Arguida foi suspensa preventivamente até decisão final, ao abrigo do artigo 95.° do Regulamento de Disciplina Militar, conforme fls. 26.
5. Em 25 de março de 2019, foi a Arguida notificada pessoalmente da acusação, tendo, após consultado processo pelo seu mandatário, sido apresentada defesa, em 15 de abril de 2019, que foi devidamente apreciada e na qual não foi requerida a produção de prova testemunhal.
6. Por Despacho do CEMFA, de 17 de julho de 2019, foi convocado o Conselho Superior de Disciplina da Força Aérea (CSDFA) para apreciar disciplinarmente a conduta da Arguida, atendendo à sua excecional gravidade, nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 139.º do Regulamento de Disciplina Militar.
7. O CSDFA emitiu o seu parecer, em 24 de setembro de 2019, em que se conclui que “o comportamento da CAP/TPAA/……7-A P......, pela sua excecional...

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