Acórdão nº 633/16.3T8CHV-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07-06-2023

Data de Julgamento07 Junho 2023
Ano2023
Número Acordão633/16.3T8CHV-B.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, no seguinte:

I- RELATÓRIO

Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa que, em 23/03/2019, M..., Lda. instaurou contra AA, tendo por título executivo uma confissão de dívida assinada por esta em que se confessou devedora da quantia de 2.792,92 euros à primeira, decorrente do incumprimento de um contrato-promessa de compra e venda celebrado em 11/11/2015, correspondente ao sinal em dobro entregue pela exequente, na qualidade de promitente compradora, à executada, esta na qualidade de promitente vendedora, em que a exequente requereu que se declarasse a comunicabilidade dessa dívida ao cônjuge da executada, BB, em que a executada e marido foram citados editalmente para os termos dessa execução, em que nela foram penhorados e vendidos a metade indivisa sobre dois prédios propriedade da executada, e em que, em 05/11/2020, o agente de execução proferiu despacho declarando extinta a execução pelo pagamento, despacho esse que não foi objeto de impugnação, em 04/01/2023, a executada AA instaurou recurso extraordinário de revisão da decisão proferida pelo agente de execução com fundamento no disposto na al. e), do art. 696º, do CPC.
Para tanto alegou, em síntese, que, em 23/06/2016, a exequente instaurou a identificada execução contra a mesma e o seu marido indicando como moradas destes a Rua ..., ... ..., juntando como título executivo a “declaração e o contrato-promessa de compra e venda”.
Acontece que, na mencionada “declaração”, consta como morada da recorrente e do seu falecido marido a morada supra identificada sita em ..., mas no “contrato-promessa” também junto a essa execução consta como morada destes a Avenida ..., ..., ..., ....
A recorrente e o seu falecido marido desde que casaram, em .../.../1982, sempre residiram permanentemente no ..., na morada acabada de identificar, facto esse que é do conhecimento geral, incluindo, da exequente.
Acontece que a recorrente e o seu falecido marido nunca foram citados na sua morada sita no ... para os termos da execução.
O marido da recorrente faleceu em .../.../2016.
Após o falecimento do marido, a recorrente permaneceu a residir no ... até .../.../2022, data em que regressou para Portugal, onde passou a residir na Rua ..., ... ....
Apenas em outubro de 2022, quando se deslocou a ..., verificando que o seu prédio rústico sito em Quinta ..., estava a ser possuído por terceiros, deslocou-se à Conservatória do Registo Predial, onde constatou que o mesmo tinha sido vendido judicialmente no âmbito da supra identificada execução.
A exequente contratou imediatamente um advogado, que requereu a consulta do processo físico da execução, o qual, porque já se encontrava arquivado, apenas lhe foi facultado para consulta em meados de novembro de 2022, pelo que apenas, nessa data, a recorrente teve conhecimento da execução e dos respetivos fundamentos.
Acontece que, constando da execução instaurada contra a recorrente e o seu falecido marido, elementos suficientes em como a morada destes se situava no ... na morada antes identificada, impunha-se que o tribunal os tivesse citado para os termos da execução nessa morada, o que não se verificou e sem que, consequentemente, estivessem reunidos os requisitos legais para se ter recorrido, conforme se recorreu, à citação edital daqueles.
Concluiu pedindo que se julgasse o presente recurso de revisão totalmente procedente e, em consequência, se declarasse a falta de citação da recorrente e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da citação edital destes, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posterior à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos executados para a causa.
Em 13/02/2023, a 1ª Instância indeferiu o recurso extraordinário de revisão, com fundamento de que esse recurso apenas poderia ter por objeto uma decisão judicial, já transitada em julgado, o que não era o caso do despacho proferido pelo agente de execução em que declarou extinta a execução pelo pagamento, constando esse despacho do teor que se segue (que aqui se transcreve ipsis verbis):
“AA, executada nos presentes autos, veio interpor recurso de revisão da “douta sentença” proferida nos autos principais nos termos da alínea e) do art. 696.º CPC, invocando a falta de citação ou, pelo menos, a nulidade da citação – arts. 188º, nº 1, als. c) e e) e 191º, nº 1 CPC -, peticionando que, pela procedência do presente recurso, se declare a falta de citação da Recorrente e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da sua citação, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posteriores à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos Executados para a causa, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça.
Apreciando:
É sabido que o recurso extraordinário de revisão constitui um meio processual que alguém, vencido em determinado pleito, pode lançar mão para reabrir um processo, já findo por decisão transitada, invocando para tanto um conjunto de circunstâncias, taxativamente enumeradas no art.º 696.º do Código de Processo Civil.
É, pois, um expediente processual que faculta a quem tenha ficado vencido num processo anteriormente terminado a sua reabertura, mediante a invocação de certas causas taxativamente indicadas na lei. Diferencia-se dos recursos ordinários dado que o recurso de revisão visa a rescisão de uma sentença já transitada em julgado (Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, pág. 338).
Nessas circunstâncias, entende o legislador, que se configuram exigências de realização da justiça que contrariam, e prevalecem, sobre a segurança jurídica resultante do caso julgado, fazendo-o, contudo, em situações de tal modo graves em que a subsistência da decisão em causa, abalaria de forma clamorosa, a almejada justiça material, no entendimento que essa decisão a rever assentou num vício grave, adjetivando uma realidade patentemente desconforme com o direito reto e justo que se pretende alcançar.
A Recorrente invoca, como fundamento do seu recurso de revisão, a alínea e) do art. 696.º do CPC onde se pode ler o seguinte: “A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando tendo corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que: i) Faltou a citação ou que é nula a citação feita; ii) O réu não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável; iii) O réu não pode apresentar a contestação por motivo de força maior”.
A nosso ver, há uma condição de admissão do presente recurso que se prende com o facto de o recurso de revisão só poder incidir sobre qualquer decisão judicial, independentemente da sua natureza ou objeto, assim como da categoria do tribunal de onde emana, sendo mais vastos os fundamentos que poderão ser invocados, com relação ao recurso para uniformização de jurisprudência (neste sentido, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, pág. 403.º e seguintes), (sublinhado nosso).
Pressuposto então do recurso de revisão é o facto de a decisão judicial ter transitado em julgado, o que colide com a pendência de recurso ou de reclamação.
Assim sendo, e como ocorre com a generalidade dos recursos pressupõe-se, naturalmente, que exista uma sentença – no recurso de revisão já transitada em julgado – que possa ser objeto desse recurso.
Contudo, nos presentes autos executivo, salvo melhor opinião, não foi proferida qualquer sentença judicial, mas apenas foi proferida uma decisão pelo agente de execução que extinguiu a execução pois, como se sabe, no caso ora em apreço, não foi proferida qualquer decisão nos apensos declarativos pois não chegaram sequer a ser apresentadas oposições à execução e/ou à penhora, desde logo porque, como alega a Recorrente, não chegou a ter conhecimento de terem sido intentados os autos principais de execução.
Face à estrutura do novo Código de Processo Civil, verificamos que, presentemente, a extinção da execução opera de forma automática uma vez verificada uma das situações a que a lei atribui esse efeito (art. 849.º do CPC), devendo o agente de execução uma vez verificada uma dessas situações notificar as partes da extinção da execução e informar o tribunal dessa extinção.
Assim, salvo o devido respeito, parece-nos que, no caso concreto, não há uma sentença judicial que a Recorrente pretenda atacar.
Assim sendo, inexistindo qualquer sentença subjacente ao presente recurso de revisão, o mesmo não tem, no nosso modesto entendimento, qualquer fundamento ou viabilidade, o que implica o seu indeferimento liminar, nos termos do art. 699.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
*
DECISÃO

Pelo exposto, indefiro liminarmente o presente recurso de revisão.
Custas pela Recorrente”.

Inconformada com o assim decidido a recorrente AA interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as conclusões que se seguem:

1- Nos presentes autos, peticiona a Apelada que seja declarada procedência ao recurso de revisão da douta sentença, e se declare a falta de citação da Apelante e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da sua citação, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posteriores à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos Executados para a causa, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça, nos termos do artigo 696º aliena e) do CPC.
2- Assenta os presentes autos na decisão proferida pelo agente de execução de extinção da instância, sem que a Apelante e o seu falecido marido tivessem sido citados.
3- A Apelante pretende com o recurso extraordinário de revisão a rescisão da sentença...

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