Acórdão nº 631/13.9 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-03-30

Ano2023
Número Acordão631/13.9 BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

Banco B....., S.A. [sucessor da B..... Leasing- Sociedade de Locação Financeira S.A., que incorporou por fusão da sociedade L……….. Sociedade de Locação Financeira Imobiliária, S.A.] veio, ao abrigo do disposto nos artigos 100º e 102º da LGT, 146º do CPPT e 157, nº3 e 170º e segs. do CPTA e, por apenso ao processo de impugnação que correu termos no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa sob o nº102/01.3.1, deduzido pela Impugnante, B..... Leasing- Sociedade de Locação Financeira S.A, contra a liquidação adicional do IRC do ano de 1990 e no qual foi anulado aquele ato tributário de liquidação, requerer a execução daquela sentença, pedindo o “reembolso do imposto indevidamente pago e o pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios, no total de €836,408,72, assim como ao pagamento dos juros moratórios devidos, que nesta data ascendem a €22.322,67”.

O Tribunal Tributário (TT) de Lisboa indeferiu a pretensão executiva, com fundamento na existência de casos julgados contraditórios.

Inconformada com tal decisão, a EXEQUENTE interpôs o presente recurso jurisdicional dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo (STA), tendo, para esse efeito, apresentado a sua alegação que finalizou com as seguintes conclusões: «1.ª A douta decisão recorrida julgou improcedente a execução de anulação de atos administrativos apresentada pelo Recorrente, considerando verificar-se uma situação de casos julgados contraditórios, a qual impunha o não cumprimento da decisão ora executada;

2.ª Salvo o devido respeito, não pode o Recorrente conformar-se com o entendimento vertido na decisão sub judice, razão pela qual se deduz o presente recurso, o qual se circunscreve à parte em que indefere a execução de sentença com referência à anulação da correção efetuada ao lucro tributável por excesso de amortizações de bens em locação financeira por utilização de taxas superiores às permitidas, no valor de € 607.389,21;

3.ª No entendimento do Recorrente, a presente sentença incorre em erro, desde logo, quando suporta o indeferimento da pretensão executiva do Exequente na aplicação de normas constantes do Código do Processo Civil, na medida em que, prevendo o CPTA específicas causas legítimas de inexecução, não existe caso omisso que justifique o recurso ao CPC e, por conseguinte, não há que proceder à convocação das suas normas;

4.ª Efetivamente, foi clara intenção do legislador do processo nos tribunais administrativos, atendendo à natureza pública das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos e fiscais e em consagração das garantias dos administrados, que a administração tributária só se pudesse furtar à execução da sentença nos casos especificamente previstos no CPTA;

5.ª Ora, no caso sub judice não se verificam quaisquer causas legítimas de inexecução previstas no CPTA, as únicas que poderiam ser arguidas para obstar à execução da sentença;

6.ª De facto, face ao disposto nos artigos 163° e 175° do CPTA, apenas se poderá invocar como fundamento para a não execução de julgados administrativos duas causas, a saber (i) a impossibilidade absoluta da execução e/ou (ii) o grave prejuízo para o interesse público;

7.ª Não só não se verificam essas causas, como o Executado em momento algum as invocou;

8.ª De facto, estando em causa o ressarcimento de quantias pecuniárias não se reputa concebível a invocação de uma verdadeira impossibilidade em cumprir com o peticionado pelo Exequente;

9.ª Aliás, recorde-se que o ora Executado não alegou a existência de uma situação de impossibilidade absoluta de cumprimento nem, bem assim, a sentença recorrida fez menção à existência de tal causa legítima de inexecução, pelo que deve entender-se que não se encontram preenchidos os pressupostos que permitem a invocação desta nos termos do artigo 163°, n°1, do CPTA;

10.ª De igual modo, não se compreenderia como o pagamento das quantias peticionadas pelo Exequente constituiria um grave prejuízo para o interesse público ou lesaria de forma grave e desproporcionada a comunidade, pelo que não se deverá ter por preenchido o conceito previsto no artigo 163°, n°1, do CPTA;

11.ª Em face do exposto, resulta evidente que encontrando-se previstas causas legítimas de inexecução no CPTA, as quais não se encontram preenchidas no caso em apreço, não será concebível o recurso aos fundamentos de oposição à execução previstos no CPC, pelo que não subsistem fundamentos atendíveis que viabilizem a inexecução da sentença proferida no processo n°102/01.3.1;

12.ª Pelo que, em suma, deverá em conformidade com o exposto ser proferida uma nova decisão que julgue procedente a execução de anulação de atos administrativos deduzida pelo Recorrente nos termos acima peticionados;

13.ª Sem prejuízo do exposto, e mesmo admitindo-se que se reputa aplicável no caso vertente o CPC, o que apenas por dever de patrocínio se concebe, sem conceder, sempre se dirá, ainda assim, que aquele alegado caso julgado contraditório não constitui facto suscetível de conduzir à inexecução da sentença no caso sub judice;

14.ª É que, numa interpretação conjugada das diversas normas do CPC, facilmente se conclui que a superveniência da ocorrência do facto, assim como a tempestividade da sua invocação, são condições para a procedência desse fundamento;

15.ª Não sendo esse o caso, só pode julgar-se errónea a sentença que indeferiu a execução de julgados com esse fundamento;

16.ª Com efeito, a possibilidade de invocar o caso julgado anterior à sentença executada nos autos de execução encontra-se prevista como fundamento de oposição à execução na alínea f) do artigo 729° do CPC (correspondente ao artigo 814° na versão anterior à Lei n°41/2013, de 26 de junho);

17.ª Pese embora a Executada não tenha contestado em prazo a presente execução, pelo que não invocou no momento processual próprio a exceção de caso julgado, ainda que o tivesse feito seria inconsequente tal invocação;

18.ª De facto, é pacífico que a alínea f) do artigo 729° do CPC deve ser conjugada com a alínea g) do mesmo normativo, nos termos da qual é fundamento de oposição à execução "(...) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento (...)" (sublinhado do Recorrente), donde resulta, pois, que somente poderá ser fundamento de oposição à execução o caso julgado posterior ao encerramento da discussão no segundo processo de impugnação judicial;

19.ª Efetivamente, dever-se-á interpretar a alínea g) do artigo 729° do CPC no sentido de que perante uma sentença que determina a anulação, parcial ou total, de um ato tributário, apenas se poderá invocar como fundamento de oposição à execução circunstâncias não ocorridas à data do encerramento da discussão (superveniência objetiva) ou circunstâncias que a Executada não estivesse em condições de invocar no decorrer do processo de impugnação judicial (superveniência subjetiva), o que, assinale-se, não se verificou no caso sub judice;

20.ª Com efeito, apenas este entendimento se mostra compaginável com a noção de que no processo de impugnação judicial foram, obrigatoriamente, discutidas todas as questões, de facto e direito, com interesse para a causa, incluindo as que poderiam ter justificado a ocorrência da exceção de caso julgado;

21.ª Aliás, o facto de o direito à anulação parcial de um ato tributário se encontrar reconhecido por sentença transitada em julgado, onde foram conferidas às partes oportunidades para discutirem todas as questões pertinentes à causa - in casu, a sentença proferida no processo n°102/01.3.1 -, confere ao ora Recorrente uma robusta proteção contra as resistências daquele a quem é imposta o cumprimento da decisão, pressupondo que foram discutidas todas as questões relevantes nessa sede;

22.ª De facto, e em abono do entendimento de que aquela invocação do caso julgado só poderia ter sido efetuada se o mesmo fosse superveniente, cumpre salientar que o caso julgado configura uma exceção dilatória, nos termos da alínea i) do artigo 577°, do CPC, que pressupõe que esteja em curso uma ação na qual há o risco de o Tribunal se contradizer;

23.ª Esse risco não existe, e nunca seria suscetível de existir, no caso sub judice, já que na execução de julgados não há o risco de o Tribunal se contradizer porque já está perante uma sentença transitada em julgado, razão pela qual, a admitir-se alguma exceção de caso julgado, a mesma só será admissível se posterior ou superveniente à prolação daquela sentença transitada em julgado;

24.ª Com efeito, somente a superveniência de um determinado caso julgado justifica que se ponha em causa o trânsito em julgado da sentença que se pretende executar;

25.ª No caso concreto é por demais notório que o caso julgado que agora se vem invocar, a existir, seria muito anterior ao encerramento da discussão nos autos de impugnação nos quais foi proferida a sentença que ora se executa, pelo que não se verifica cumprida a condição de superveniência objetiva;

26.ª Acresce que, configurando o facto potencialmente gerador de uma situação de casos julgados contraditórios uma sentença, presume-se que não se encontra igualmente cumprida a condição de superveniência subjetiva, porquanto apenas se afigura razoável admitir que a administração tributária tinha conhecimento da sentença referente ao processo n°47/97 que lhe terá sido devidamente notificada, nos termos do artigo 126° do CPPT;

27.ª Daí resultando, também com esse fundamento, a ilegalidade da decisão em crise, razão pela qual se requer que seja proferida uma nova decisão que julgue procedente a execução de anulação de atos administrativos deduzida pelo Recorrente nos termos acima peticionados;

28.ª Sem prejuízo do acima exposto, e apenas para o caso de não proceder o...

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