Acórdão nº 6113/21.8T8GMR-J.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2024-04-04

Data de Julgamento04 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão6113/21.8T8GMR-J.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I RELATÓRIO (através de consulta dos autos principais e apensos).

EMP01..., LDA., NIPC ...57, com sede na Rua ..., freguesia ... (...), concelho ..., veio intentar, no âmbito dos autos de insolvência nos quais foi declarada insolvente a sociedade EMP02... LDA., a presente ação declarativa de Impugnação da Resolução em Benefício da Massa Insolvente contra a Massa Insolvente, requerendo a sua procedência e, consequentemente, seja declarada nula, ineficaz e sem qualquer efeito a declaração de resolução extrajudicial em benefício da massa insolvente do negócio de cessão (à Autora) da posição contratual de locatária (da insolvente) no contrato de locação financeira imobiliária, em que figura como locadora o Banco 1... SA, relativo à fração autónoma designada pela letra ... do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...19 da freguesia ... (...), e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...14 da mesma freguesia, pelo preço de € 200.000,00.
Se assim não se entender, a manter-se a resolução, deve ser reconhecido como dívida da massa o valor de 200.000,00€ pago pela impugnante à insolvente e ao Banco 1..., bem como os montantes pagos ao Banco 1... desde ../../2021, até ao presente, juros desde a data da celebração do negócio, e bem assim, a condenação por todos os danos que a resolução está a causar e causa à A., a liquidar em execução de sentença.
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Citada a massa insolvente, na pessoa do Sr. Administrador de Insolvência (A.I), esta contestou, impugnando a factualidade alegada.
Refere que o negócio em causa configura uma verdadeira dação em pagamento, e que o preço da cessão foi de € 133.757,84 (€ 68.460,22 de rendas em atraso e € 65.297,82 de valores em dívida, abertos na conta corrente da Ré na contabilidade da Autora). E que, perito isento e imparcial, atribuiu à fração em causa o valor de € 386.281,25. Por isso do negócio resulta um prejuízo para a insolvente, face ao valor de mercado apresentado, de € 252.523,41. Daí que, tendo sido altamente vantajoso para a Autora, foi excessivamente oneroso para a Ré.
Igualmente se tivesse sido considerado aquele valor, o total da dívida da insolvente para com a Autora, ao invés de ter passado a ser de € 784.855,28 (depois de abatido o valor de € 133.757,84), devia ter passado a ser apenas de € 532.331,87 (se tivesse sido deduzido antes o valor de € 386.281,25).
Invoca o disposto na alínea h), do n.º 1, do art.º 121º do CIRE.
E se assim não se entender, diz que se mostram preenchidos os requisitos legais previstos no art.º 120º do CIRE, porque se tratou de ato prejudicial à massa, e face à presunção de má fé que a Autora não ilidiu.
Os credores da Ré foram prejudicados, pois existem credores privilegiados e a Autora é uma credora comum.
Diz ainda que a Ré é alheia à diferença entre os € 200.000,00 e os € 133.757,84, alegadamente pagos pela Autora ao Banco.
E pugna ainda pela falta de fundamento do restante peticionado, e pede a improcedência da ação.
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A Autora apresentou resposta, que termina dizendo que “…lhe assiste, nos termos do artigo 754º do C.C., o direito de retenção do imóvel enquanto desse valor não for ressarcida, direito este que desde já declara exercer nessas mesmas condições.”.
No exercício do contraditório a massa insolvente veio pedir que não se admita este requerimento.
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Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador que decidiu pela inexistência de nulidade resultante de falta de fundamentação da carta resolutiva, e remeteu para posterior decisão a exceção de caducidade.
Foi definido o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova.
Realizada audiência de julgamento, da ata respetiva e ouvido o AI ficou a constar: “Factos confessados:
- Artº 5º; e
-Artº18º, do requerimento junto aos autos pela requerente em 25.01.2023, refª ...24.”
Concluída a audiência, foi proferida sentença que decidiu julgar a ação integralmente procedente por provada, e declarou inválida e, consequentemente, sem nenhum efeito, a declaração de resolução do contrato de cessão de posição contratual celebrado entre a insolvente e a Autora, mantendo-se válida e eficaz a referida cessão.
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Inconformada, veio a massa insolvente de EMP02... LDA., interpor recurso, tendo apresentado alegações com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)

“I.- A Recorrida, Sociedade EMP01..., Lda, através da presente acção, peticionou, que fosse declarada procedente a impugnação (e consequente revogação da resolução) do contrato de 19/11/2021, celebrado entre si e a sociedade “EMP02..., Lda”, ora Recorrente, no qual esta última cedeu a sua posição de locatária no contrato de locação financeira imobiliária, celebrado com o Banco 1... S.A, pelo prazo de 120 meses, a contar do dia 08/08/2014, tendo por objecto o imóvel designado pela B do prédio urbano descrito sob o número ...19, da freguesia ... (...) da Conservatória do Registo Predial e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...14 da mesma freguesia.
II- O Tribunal a quo, julgou, na íntegra a acção procedente, considerando não estarem preenchidos todos os requisitos de que dependia a resolução deste acto, pois não se tratou de um acto prejudicial à massa e não se presume, nem foram alegados ou provados factos atinentes à má-fé da terceira nele interveniente. A Recorrente não pode conformar-se com tal decisão, por não concordar, como de seguida se logrará demonstrar, com o facto n.º 8 dado como provado, com os factos considerados como não provados (considerando que deviam ter sido considerados outros como provados) bem como, s.d.r, com a aplicação do direito aos factos.
III.- Quanto aos factos considerados como provados. A Recorrente não se conforma que tenha sido provado (no facto n.º 8 dos factos provados da douta sentença a quo) que: “Se não fosse a cessão todos os credores ficariam privados do direito à aquisição do imóvel, pela destruição do contrato por via da resolução”.
IV.- Da valoração da matéria de facto, expressa na sentença, foi referido que AA, auxiliar do A.I., que o interesse era “cumprir o contrato, pagar a dívida e vender o imóvel”. Daqui resulta que o Administrador de Insolvência da Recorrente teria optado por uma estratégia para cumprir o contrato, não optando pela sua resolução.
Assim, cumprir-se-ia o negócio.
V.- Indício de que a estratégia do Administrador de Insolvência resultaria encontra-se no facto de que a Locadora, em sede de reclamação de créditos, veio reclamar o montante das rendas vencidas (conforme junto com doc. n.º... com a contestação).
VI.- Para além desta evidência que corrobora o depoimento de AA (expressa na motivação de facto da sentença) e que contraria o dito no ponto 8 dos factos dados como provados, s.m.o., não se logrou provado o contrário, i.e., não foi, para os autos, carreada qualquer prova da qual se inferisse que não seria possível manter o negócio em curso, e da qual se concluísse que “Se não fosse a cessão todos os credores ficariam privados do direito à aquisição do imóvel, pela destruição do contrato por via da resolução”.
VII.- Assim, s.d.r., não devia o Tribunal “a quo” ter considerado como provado o facto n.º 8 da douta sentença, impondo-se, outrossim, atentos os argumentos aduzidos, que seja este facto considerado como não provado.
VIII.- Relativamente à matéria de facto não provada: 1) não tendo sido considerado na douta sentença, dever-se-ia ter dado como provado que “A Autora conhecia o estado de insolvência iminente da Ré Massa Insolvente da Sociedade EMP02..., à data da realização do negócio”. Tal facto, resulta do depoimento de BB, ilustrado na douta sentença em crise, concretamente quando refere que:
“BB, também antiga funcionária da insolvente (…)” depôs no sentido “de saber, com segurança da existência da dívida muito grande à Autora e que tentaram chegar a acordo (na altura não tinham malha e era para receber malha).” Assim muito se requer que seja por V. Exas. considerado tal facto como provado.
IX.- 2) Ao contrário do aduzido na douta sentença, os factos 1,2 3 dos factos dados como não provados, à excepção do valor que lá é demonstrado, resultaram, em parte, provados, já que, conforme resulta da factura junta como Doc. n.º... à Petição Inicial, é notório que a Recorrente recebeu da Recorrida (seja a título de abatimento de dívida, seja a título de pagamento das rendas vencidas à massa insolvente) o valor de €133.757,84.
X.- Por outro lado, quanto a este aspecto, resulta do facto dado como provado no Art.º 22 da douta sentença que: “sic” “Desse relatório resulta que foi indicado como valor da venda imediata do imóvel, lote n.º...7, artigo matricial ...44 (aqui em discussão) um valor de mercado do imóvel devoluto de € 225.000,00 (abordagem de mercado) e de €207.000,00 (abordagem de rendimento), sendo da conclusão de que o valor de € 207.000,00, exprime nos pressupostos estabelecidos, o valor de mercado do imóvel legalizado, devoluto, livre de ónus e encargos”.
XI.- Ora, da conjugação dos dois factos IX e X resulta claramente que, pelo menos, e só sobre esta fração em causa, a massa insolvente teve um prejuízo de € 13.168,784, sem prejuízo de, caso a venda da fração fosse realizada com as restantes duas, o valor a arrecadar pela Recorrente poderia ter sido superior a € 300.000,00, o que resulta, claramente num prejuízo para a massa insolvente, ora Recorrente, sendo que, por isso desde já se requer que, em conformidade, sejam os factos 1,2 e 3 da matéria dada como não provada na douta sentença, alterados em conformidade, o que se requer a V. Exas.
XII.- Sem prejuízo da alteração da matéria de facto acima requerida, a discussão nos autos, sempre determinaria outra solução jurídica que aquela que foi considerada pelo Tribunal “a quo”.
XIII.- Em suma, considerou o Tribunal “a quo” que não se encontra preenchida a...

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