Acórdão nº 5802/18.9T8BRG-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-03-30

Ano2023
Número Acordão5802/18.9T8BRG-B.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:

I- RELATÓRIO

Por apenso aos autos de ação especial de alimentos que AA instaurou contra o seu ex-marido BB, em que por sentença proferida em 18/06/2010, transitada em julgado, o aí Réu BB foi condenado a pagar à aí Autora CC a quantia mensal de 250,00 euros, a título de alimentos, por transferência bancária, o identificado BB, residente na Rua ..., Lugar ... D´Ana, ... ..., concelho ..., instaurou ação especial para cessação da obrigação de prestação de alimentos contra CC, residente na Travessa ..., ... ..., pedindo que se declarasse cessada a obrigação em questão, com efeitos desde a data da propositura da ação.
Para tanto alegou, em síntese, que à data em que foi condenado a prestar alimentos à Ré exercia atividade profissional remunerada, auferindo uma retribuição mensal de 1.500,00 euros, quando, atualmente, e desde 02/08/2021, está reformado, recebendo uma pensão mensal de 465,24 euros, sendo este o seu único rendimento, com o qual tem de fazer face a todas as suas despesas.
A Ré é reformada por velhice e recebia à data da fixação de alimentos uma pensão de 386,65 euros que, fruto das atualizações anuais, deverá ser superior à recebida pelo Autor.
A Ré vive com o filho mais velho do ex-casal, maior e independente, recebe ajuda dos restantes filhos e dispõe de património imobiliário próprio, que consegue facilmente alienar, o que lhe permitirá viver confortavelmente até ao fim dos seus dias.
Finalmente, decorridos três anos sobre o divórcio, a Ré tem possibilidades de prover à sua subsistência.
Realizou-se a conferência de interessados a que alude o art. 936º, n.º 3, do CPC, onde não foi possível obter acordo das partes.
A Ré contestou impugnando parte da facticidade alegada pelo Autor, sustentando que este recebe duas pensões de reforma, num total de 915,24 euros mensais, enquanto aquela tem como único rendimento a sua pensão, que ascende a 386,65 euros mensais.
Vive em casa do filho, sozinha, em virtude desse filho se encontrar emigrado, e, embora não pague renda de casa, contribui com 150,00 euros mensais para pagamento do empréstimo bancário.
Paga quantia nunca inferior a 150,00 euros mensais em água, luz, gás, telefone e televisão e gasta cerca de 60,00 euros mensais em despesas fixas com medicamentos, praticamente nada lhe restando para fazer face à sua alimentação.
Concluiu pedindo que a ação fosse julgada improcedente.
Proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se o valor da ação em 30.000,01 euros, o objeto do litígio e os temas da prova, que não foram alvo de reclamação, e conheceu-se dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes.
Realizada audiência final, em 06/12/2022, proferiu-se sentença em que se julgou a ação parcialmente procedente e reduziu-se a prestação alimentar devida pelo Autor à Ré para a quantia de 170,00 euros mensais, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva:
“Pelo exposto, decido julgar parcialmente procedente a ação e, em conformidade, reduzo a prestação alimentícia devida pelo Autor BB à Ré CC para a quantia mensal de 170,00 euros (cento e setenta euros).
Custas por A. e R. na proporção do decaimento, fixando em 3 UCs a taxa de justiça.”

Inconformado com o assim decidido, o Autor interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões:

1. Da matéria de facto provada resulta claramente que houve alteração da situação económica e familiar quer do requerente, quer da requerida, o que permite alterar os pressupostos da pensão de alimentos que foi anteriormente fixada, pelo que se verificam os pressupostos da cessação da pensão, previstos no artigo 2013º, b) do CC.
2. Designadamente, quanto ao Recorrente, deixou de exercer uma atividade profissional pela qual auferia um vencimento líquido de 1.500,00 € mensais e passou a receber uma pensão de velhice no montante mensal de € 465,24 e uma pensão da Segurança Social Espanhola no montante mensal de € 414,34, sofrendo uma diminuição no seu rendimento em cerca de 41% - Ponto 3 e 4 dos factos provados. Tem ainda despesas inerentes ao agregado familiar que ascendem a montantes não apurados – Ponto 7 dos factos provados.
3. Relativamente à situação económico-financeira da requerida teve uma melhoria significativa, designadamente:
a) À data em que foi fixada a prestação alimentícia, a requerida vivia com o filho mais novo num apartamento arrendado, pelo qual pagava uma renda mensal de 325,00 € (trezentos e vinte e cinco euros) – Factos provados sob os pontos 8 e 9 da decisão de 18.06.2019 e ponto 10 da decisão recorrida.
b) Atualmente, a requerida deixou de ter qualquer encargo com a habitação, pois vive numa habitação que pertence ao filho mais velho (ponto 10 dos factos provados).
c) A requerida recebe ajuda por parte dos filhos, quer no que tange a refeições, quer pequenas ajudas monetárias (ponto 10 e 12 dos factos provados).
d) Durante quase 3 anos (desde a decisão que fixou a prestação de alimentos em 18.06.2019 até março de 2022) a requerida não recebeu qualquer valor a título de prestação de alimentos por parte do requerente, recebendo apenas pontualmente “pequenas quantias em dinheiro” do filho mais novo, o que é revelador da suficiência dos seus rendimentos e desnecessidade de alimentos (ponto 12 dos factos provados).
e) A requerida é proprietária de vários imóveis que pode vender e muito embora tal património imobiliário esteja na sua posse há mais de 20 anos, tal circunstância nunca foi levada em consideração ou sequer foi abordada na decisão de fixação de alimentos de 19.06.2019.
4. A requerida tem um rendimento mensal disponível de 494,66 €, valor superior ao IAS que para o ano de 2023 foi fixado em 480,43 €, pelo que, não pode ser considerada pessoa em carência económico-financeira e muito menos próxima da indigência.
5. Por outro lado ainda, se, como consta na sentença recorrida “o autor viu diminuído o seu rendimento em cerca de 41%, o que traduz uma perda significativa relativamente aos proventos que auferia e que foram considerados para a fixação da prestação alimentícia” e se a decisão recorrida utiliza fundamentalmente este argumento como circunstância superveniente, porque é que na redução do montante da prestação de alimentos não utiliza aquele mesmo critério percentual proporcionalmente para a redução da prestação de alimentos?
6. Do que acaba de se expor, ficou mais do que provado que a situação económico-financeira do requerente se alterou no sentido da sua deterioração, sendo que a situação económico-financeira da requerida alterou-se significativamente, no sentido da sua melhoria significativa.
7. Tais factos, aliados à regra geral, em matéria de alimentos entre ex-cônjuges, depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, ser a de que “cada cônjuge deve prover à sua subsistência”, constituindo o direito a alimentos uma exceção, impõe que a pensão de alimentos à ora Recorrida deva cessar, nos termos do disposto no artigo 2013.º, n.º 1, alínea b) do Código Civil, ou quando muito possa ser reduzida substancialmente, para além da redução fixada na sentença recorrida.
8. Decidindo de modo diverso, violou a sentença recorrida as normas dos artigos 2003.º, 2013.º, n.º 1, alínea b) e 2016.º, n.º 3 do CC.
Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, deverá ser julgado totalmente procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se a mesma por outra que declare a ação totalmente procedente ou reduza proporcionalmente a pensão de alimentos à requerida, fazendo-se a acostumada Justiça!”

A apelada contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação e apresentando as conclusões que se seguem:
a. O Autor, ora Recorrente intentou, ação de cessação da prestação de alimentos contra CC, pretendendo que lhe fosse reconhecida a alteração superveniente das circunstâncias e a alegada impossibilidade de continuar a prestar alimentos à Ré, ora Recorrida, requerendo que fosse declarada a cessação de tal obrigação alimentícia.
b. Da prova produzida, nomeadamente, da prova documental, prova testemunhal, declarações e depoimento de parte, resultaram como provados e não provados os factos que aqui damos por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais.
c. O Recorrente com a interposição do recurso, não impugnou a matéria de facto dada como provada e como não provada, pelo que, salvo o devido respeito por opinião contrária, são factos assentes, e no seu conteúdo, devidamente transitado em julgado.
d. Atenta a factualidade dada como provada e não provada, motivado pela prova constante nos autos, apreciada pela Exma. Sra. Dra. Juiz que dirigiu todo o processo, analisando e ponderando os elementos contantes no processo, procedendo à inquirição das testemunhas e ouvindo as partes, decidiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, decido julgar parcialmente procedente a ação e, em conformidade, reduzo a prestação alimentícia devida pelo A. BB à R. CC para a quantia mensal de € 170,00 (cento e setenta euros).”- Decisão e fundamentos que acompanhamos integralmente, e que aqui damos por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais.
e. Não se conformando com a decisão proferida, veio o Autor, ora Recorrente interpor o presente recurso, que salvo o devido respeito, deverá improceder, seja por falta de fundamento, seja por falta de verdade.
f. Relevando para a verdade material e para a decisão de mérito, a manutenção das circunstâncias da obrigação alimentícia, nomeadamente, a capacidade para o Autor ora Recorrente prestar alimentos à Ré ora Recorrida e a necessidade da Ré ora Recorrida receber os referidos alimentos;
g. Não se verificando, portanto, qualquer violação dos artigos 2003.º do Código Civil, e 2013.º, n.º 1, alínea b) CC, na medida em que não se verifica qualquer...

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