Acórdão nº 57/09.9 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 29-02-2024

Data de Julgamento29 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão57/09.9 BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acórdão

I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 02.02.2021, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por L… (doravante Recorrido ou Impugnante), que teve por objeto as liquidações de imposto municipal de Sisa e de imposto do selo e as dos respetivos juros compensatórios, relativas à aquisição efetuada em 13.08.2001 do imóvel sito na Rua H…, Lt. …, fração “…”, em R…, concelho de Odivelas, omisso na matriz à data da transação.

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“I. O thema decidendum no âmbito dos presentes autos de recurso consiste em aferir da legalidade da liquidação ora impugnada, efetuada ao abrigo do art.º 111º do CIMSISSD, analisando se a AT logrou comprovar a existência dos pressupostos (de facto e de direito) que determinaram a correção ao valor de aquisição do imóvel adquirido pelo ora impugnante, identificado nos presentes autos, considerando como valor de aquisição o valor de 27.000.000$00 e não o valor constante da escritura pública celebrada entre o impugnante e a sociedade J… Lda. (20.000.000$00).

II. Sustenta o Mmo. Juiz a quo que “a AT não aponta qualquer facto fiscalmente relevante cujos elementos fossem adequados à comprovação direta e exata da matéria coletável em falta fixada em 27.000.000$00, antes se tendo apoiado nessa quantificação em factos indiciadores de que o preço declarado não corresponde à realidade, factos que não constituíam a base necessária para neles assentar a determinação da matéria coletável da SISA por via direta, como é o caso da venda de uma fração do empreendimento de tipologia e área idêntica à do Impugnante por preço superior ao declarado apenas em fase inspetiva”.

III. Quanto à questão da aplicação de métodos presuntivos, o nosso ordenamento jurídico consagra, como regime regra da tributação, o método declarativo, colocando nessa medida, na esfera de atuação dos particulares contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, com a inerente contrapartida da exigência de uma cooperação estreita entre a AT e o contribuinte, no desiderato de se alcançar a tributação dos rendimentos reais, cooperação essa que impõe, desde logo, que o último faculte à primeira, todos os elementos que viabilizem o correto apuramento daqueles, surgindo a possibilidade de recurso a metodologia alternativa, como consequência da rutura daquele dever vinculado a que os contribuintes se encontram adstritos, de cooperação com a AT, no sentido de viabilizar a concretização da obrigação a que esta, por seu turno, está obrigada pelo princípio da legalidade, do controle e apuramento do efetivo lucro tributável.

IV. No entanto, estabelecendo o ordenamento jurídico duas metodologias alternativas ao método declarativo - correções técnicas e presunções -, o recurso a qualquer delas não depende de um critério discricionário da AT, sendo que a AT encontra-se vinculada ao recurso às correções técnicas, quando se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efetividade os rendimentos tributar e, ao invés, se e na medida em que tal apuramento se venha a revelar inviável , então não pode, nessa mesma exata medida, deixar de lançar mão dos métodos presuntivos , mau grado o maior grau de incerteza que caracteriza estes últimos.

V. Conforme refere o Mmo. Juiz na sentença recorrida a “AT instaurou um procedimento interno em nome do Impugnante que culminou com a sua comunicação ao Chefe do SF de Odivelas que, nos termos do artigo 111º do CIMSISSD promoveu a liquidação adicional ora impugnada, considerando como valor de aquisição da fração em causa o valor de 27.000.000$00 e não de 20.000.000$00, constante da escritura pública celebrada”.

VI. A correção à liquidação do ora Impugnante para efeitos de imposto de sisa, porque efetuada ao abrigo do art.º 111º do CIMSISSD, tinha que ter por fundamento que ela continha «erro de facto ou de direito, ou houve qualquer omissão, de que resultou prejuízo para o Estado».

VII. Ora, em obediência ao princípio da legalidade, a AT só podia proceder à liquidação ora impugnada se, no exercício dos poderes que lhe competem de controlo da veracidade dos elementos declarados, tivesse adquirido a séria convicção da existência desse erro ou omissão na declaração de sisa, ou mais precisamente e no que ao caso vertente concerne, de que o preço declarado na escritura de transmissão do imóvel sito na Rua H…, Lote …, freguesia da R…, concelho de Odivelas, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, Fração “…” era inferior ao preço real da sua transmissão, convicção esta que tinha de assentar em pressupostos objetivos e não em meras suposições, suspeitas ou juízos de natureza subjetiva.

VIII. Incumbia assim à AT abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto e do respetivo documento de suporte (escritura pública de transmissão da propriedade do imóvel em crise nos autos), atento o princípio da declaração vigente no nosso direito (art.º 78º da LGT), só depois passando a competir ao impugnante o ónus de provar a veracidade do declarado. Analisando o caso dos autos,

IX. Em 13.08.2001, junto do 11º Cartório Notarial de Lisboa, o impugnante declarou adquirir à sociedade “J…, Lda.”, a fração autónoma descrita pela letra “…”, correspondente ao terceiro andar …, para habitação, do prédio sito na Rua H…, Lote …, da freguesia de R…, concelho de Odivelas, à data omisso da matriz predial urbana respetiva, pelo preço declarado de 99.759,58 € ou 20.000.000$00, cf. ponto B) do probatório.

X. Para a aquisição do supra referido imóvel o ora impugnante celebrou contrato de mútuo com o Banco …, S.A., do qual era à data seu funcionário, pelo valor de 19.900.000$00 ou 99.260,78€, conforme ponto C) do probatório.

XI. Na mesma data de 13.08.2001, o Impugnante celebrou com o mesmo Banco … escritura pública de “Abertura de Crédito com Hipoteca e Mandato”, mediante o qual aquele Banco lhe concedeu um crédito com o limite de 5.000.000$00 ou 24.939,89€, válido pelo prazo de 30 anos, sobre o qual foi constituída hipoteca sobre a fração supra identificada, cf. ponto D) do probatório.

XII. Perante a matéria descrita no probatório, constata-se que a AT tinha condições para efetuar a correção ao valor de aquisição do imóvel, identificado nos autos, considerado para efeitos de liquidação impugnada aqui em causa, não estando em causa uma situação suscetível de integrar o conceito “impossibilidade de quantificação direta” da matéria coletável, legitimador do recurso a presunções, antes permitindo o recurso a correções técnicas.

XIII. No caso vertente a AT cumpriu o ónus de recolher elementos demonstrativos que, a final, legitimam a correção ao valor de aquisição do imóvel sito na Rua H…, Lote …, freguesia da R…, concelho de Odivelas, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, Fração “…”, considerado para efeitos de liquidação ora impugnada.

XIV. O ponto C) e D) do probatório permitem constatar que o valor declarado na escritura de compra e venda celebrada entre o impugnante e a sociedade J…, Lda., referente ao imóvel sito na Rua H…, Lote …, freguesia da R…, concelho de Odivelas, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, Fração “…” foi inferior ao preço real da sua transmissão.

XV. Conforme supra se explanou a Administração Tributária logrou recolher factos concretos e objetivos de que o valor declarado na escritura de compra e venda celebrada entre o ora impugnante e a sociedade J…, Lda. não correspondia ao valor real da transação efetuada tendo, desta forma, legitimado a sua correção ao valor de aquisição do imóvel adquirido pelo ora impugnante para o montante de valor de 27.000.000$00.

XVI. Saliente-se pela sua relevância o parecer n.º 242/2017 do Exmo....

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