Acórdão nº 562/21.9GAPRD-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 10-01-2024

Data de Julgamento10 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão562/21.9GAPRD-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 562/21.9GAPRD-A.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este – Juízo Local Criminal de Paredes – Juiz 1




Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto


I. Relatório
No âmbito do Processo Comum Singular n.º 562/21.9GAPRD, a correr termos no Juízo Local Criminal de Paredes, Juiz 1, por despacho de 17-05-2023, na sequência de promoção nesse sentido, a Senhora Juiz do Juízo Local Criminal de Paredes decidiu, com fundamento na abstenção injustificada de acusar, condenar a assistente AA em 1 (uma) UC de taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 515.º, n.º 1, al. d), do CPPenal, 8.º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa.
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Inconformada, a assistente AA interpôs recurso, solicitando que se reconheça a ilegitimidade da Senhora Juiz que proferiu o despacho para esse efeito e, assim não se entendendo, a revogação do despacho recorrido, apresentando em apoio da sua posição as seguintes conclusões da sua motivação (transcrição):
«1. Vem o presente recurso interposto do despacho de condenação da assistente em pagamento de taxa de justiça, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 515º nº 1 d) do CPP e artigo 8º e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
2. A assistente argui a ilegitimidade da Meritíssima Juiz de Direito para a prolação do referido despacho porquanto o mesmo resulta da remessa por parte do Ilustre Procurador da fase de inquérito ao juiz de instrução criminal.
3. Era o Juiz de Instrução Criminal que tinha a legitimidade para proferir este despacho porquanto o processo ainda nem distribuído foi.
4. O despacho recorrido é motivado pela não dedução de acusação particular nos autos.
5. Os presentes autos iniciaram-se com apresentação de queixa crime por parte da assistente contra as arguidas BB e CC, pelo cometimento de um crime de ofensa à integridade física simples e um crime de ameaça, respetivamente.
6. Factos que conduziram à dedução de acusação das arguidas nos termos requeridos.
7. Durante o inquérito resultou também indiciado que a assistente tivesse ainda sido vítima de um crime de injúrias, porquanto foi chamada de “vaca” por uma das arguidas.
8. Tendo sido notificada para deduzir a respetiva acusação particular, dada a natureza particular do crime em questão.
9. O Ministério Público conclui pela existência de indícios suficientes da prática do crime de injúrias contra a assistente.
10. A assistente pretendia procedimento criminal pelos outros dois crimes (ofensa à integridade física e ameaça), mais gravosos.
11. “É devida taxa de justiça pelo assistente se fizer terminar o processo por desistência ou abstenção injustificada de acusar” (art. 515º, nº 1 al. d) do CPP)
12. O processo continuou os seus trâmites legais por crimes com uma moldura penal abstratamente mais elevada e pelos crimes que realmente afetaram a assistente.
13. Com o devido respeito, a assistente pode discordar da existência de indícios suficientes do cometimento de crime de injúrias.
14. A atividade processual desenvolvida em sede de inquérito não foi inutilizada.
15. A assistente manteve um comportamento processual coerente, não retirou eficácia à queixa apresentada, queixa esta que se mostrou fundada pois até deu lugar à dedução de acusação pública.
16. Face ao exposto, não deve a assistente ser condenada ao pagamento de qualquer taxa de justiça pela não dedução da acusação particular»
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O Ministério Público junto do Tribunal recorrido apresentou resposta, considerando que o recurso deve ser rejeitado por falta de indicação das menções referidas no art. 412.º, n.º 2, al. a), do CPPenal, afirmando, não obstante, que o despacho foi proferido por Juiz de Direito com competência para o acto com base no Despacho n.º 51/2022, de 15-09-2022, da Sra. Juiz Presidente, homologado pelo CSM em 19-09-2022 e, quanto ao demais, que o recurso não merecia provimento.
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Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer onde acompanhou a argumentação do Ministério Público junto do Tribunal recorrido, defendendo igualmente a rejeição ou, assim não se entendendo, o não provimento do recurso.
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Notificada nos termos do disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPPenal, a recorrente não apresentou resposta.
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Realizado o exame preliminar, e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, nada obstando ao conhecimento do recurso.
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II. Apreciando e decidindo:
Questões a decidir no recurso
É pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objecto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso[1].
As questões que a recorrente coloca à apreciação deste Tribunal de recurso são as seguintes:
- Ilegitimidade da Juiz de Direito que proferiu o despacho recorrido;
- Ausência de pressupostos para que a assistente fosse condenada em taxa de justiça por desistência ou abstenção injustificada de acusar;
- A assistente apenas pretendia procedimento criminal pelos crimes de ofensa à integridade física e ameaça.

Para análise das questões que importa apreciar releva o teor integral do despacho recorrido, que é o seguinte:
«A assistente AA foi notificada com a menção da existência de indícios do cometimento do crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º, do Código Penal, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não tendo a mesma deduzido acusação particular dentro do prazo legal.
Nessa sequência, após determinar o arquivamento dos presentes autos, nessa parte, nos termos do disposto no artigo 277.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a Digna Magistrada do Ministério Público promoveu a condenação da assistente em custas nos termos do disposto do artigo 515.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal (cfr. folhas 166).
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Cumpre apreciar e decidir:
Estabelece o artigo 515.º, do Código de Processo Penal o seguinte: “1 – É devida taxa de justiça pelo assistente nos seguintes casos: a) Se o arguido for absolvido ou não for pronunciado por todos ou por alguns crimes constantes da acusação que haja deduzido; b) Se decair, total ou parcialmente, em recurso que houver interposto ou em que tenha feito oposição; c) (Revogada pelo DL 34/2008, 26/2.); d) Se fizer terminar o processo por desistência ou abstenção injustificada de acusar; e) (Revogada pelo DL 34/2008, 26/2.); f) Se for rejeitada, total ou parcialmente, acusação que houver deduzido. 2 – Havendo vários assistentes, cada um paga a respectiva taxa de justiça. 3 - (Revogado pelo DL 34/2008, 26/2.)”.
Já vimos que o Ministério Público promoveu a condenação da assistente no pagamento da taxa de justiça atenta a não dedução de acusação particular.
Pois bem.
Como é consabido, nos crimes de natureza particular, como é o caso dos autos, é exigível, como condição de procedibilidade, a apresentação de queixa pelo respetivo titular, para além da respetiva constituição como assistente – cfr. artigos 48.º a 50.º, todos do Código de Processo Penal e 113.º, do Código Penal.
Desta forma, estando na sua disponibilidade iniciar o competente procedimento criminal, com a apresentação da respetiva queixa e constituição como assistente, também está na sua disponibilidade pôr termo a esse procedimento, declarando expressamente não pretender mais o prosseguimento criminal contra o arguido, através da desistência de queixa ou, então, implicitamente, não deduzindo acusação particular, não obstante notificado para o efeito nos termos do disposto no artigo 285.º, do Código de Processo Penal.
Assim, a desistência de queixa e/ou a abstenção de deduzir acusação nos crimes particulares é um meio de que o titular do interesse juridicamente
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