Acórdão nº 555/22.9T8VIS.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 10-01-2023

Data de Julgamento10 Janeiro 2023
Ano2023
Número Acordão555/22.9T8VIS.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO LOCAL CÍVEL DE VISEU, COMARCA DE VISEU)
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,

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Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço

1.º Juiz adjunto………José Vítor dos Santos Amaral

2.º Juiz adjunto……….Luís Filipe Dias Cravo


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(…)

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Recorrente ………………….Liga ....

Recorridos…………………….AA;

…………………………………..BB;

…………………………………..CC;

…………………………………..DD;

…………………………………..EE;

…………………………………..FF;

………………………………….GG;

…………………………………..HH;

…………………………………..II;

…………………………………..JJ;

…………………………………..KK;

…………………………………. LL;

…………………………………..MM;

………………………………….NN; e

…………………………………..OO.


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I. Relatório

a) O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente a ação através da qual os Autores obtiveram a anulação da deliberação tomada pela Liga ..., de dia 04 de dezembro de 2021, com fundamento na violação dos estatutos da Liga, em específico, o n.º 4 do seu art.º 11.º, onde se dispõe que os associados não podem concorrer a um terceiro mandato consecutivo, salvo se autorizados pela assembleia, com consequente repetição do ato eleitoral.

Os Autores alegaram, em síntese, por um lado, que os membros eleitos já tinham exercido funções socias nos dois mandatos anteriores, sendo certo que os estatutos impedem que os associados possam concorrer e ser eleitos num terceiro mandato consecutivo, podendo existir exceções, mas não sendo o caso; por outro, que os Autores integraram uma lista eleitoral que foi irregularmente rejeitada e, por fim, que alguns dos associados que votaram no ato eleitoral não tinham as quotas regularizadas.

A Ré pronunciou-se pela improcedência da ação argumentando que a proibição de um terceiro mandato consecutivo apenas se aplica quando se trata de mandatos no mesmo órgão social; que a rejeição da lista apresentada pelos Autores foi uma decisão da Comissão Eleitoral, não fazendo parte do conteúdo da deliberação agora impugnada e que os autores não alegaram terem deduzido oposição à Assembleia Geral de 4 de dezembro de 2021, para efeitos do disposto no artigo 178.º do Código Civil.

b) É da mencionada decisão que vem interposto o recurso por parte da Ré, cujas conclusões são as seguintes:

«1. A decisão recorrida não tomou em consideração alguns factos processuais prévios à decisão proferida e que, naturalmente, a condiciona e que tem a ver, nomeadamente, com a questão da legitimidade dos autores e da teoria da substanciação segundo a qual o objecto da acção é o pedido. A acção é, para o bem e para o mal, delimitada pela causa de pedir e pelo pedido e deve ser proposta por quem tem interesse em agir.

2. Os AA não cumpriram um pressuposto processual básico como seja alegar e demonstrar que têm legitimidade para a presente acção e, dessa forma, atento o artº. 178º nº 1 do CC, alegar e demonstrar a qualidade de «associado que não tenha votado a deliberação»

3. Não basta – como se diz na decisão recorrida - dizer que «é claro que nenhum dos autores votou favoravelmente esta deliberação, pelo que têm legitimidade para a impugnar» sem que tal convicção possa indubitavelmente extrair-se de factos alegados (e não contraditados) ou, pelo menos, de qualquer documento junto.

4. Esta convicção da Exma Sra Dra Juiz não é fundamentada em qualquer facto e, assim, porque não se afigura como facto notório, só poderia levar à conclusão que os AA não demonstraram, como lhes competia, a sua legitimidade.

5. Os AA ao não terem alegado e demonstrado a sua actuação relativamente à AG de 04.12.2021, no sentido de se saber se votaram ou não e, na afirmativa, o sentido de voto, só pode impor uma decisão diversa daquela que resulta da douta sentença a quo, a falta de legitimidade dos AA e, com isso da falta de pressuposto processual que, inevitavelmente leva à absolvição da demandada da instância.

6. E, se assim não fosse, por outro lado, deve(ria) ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto porquanto ao contrário do decidido impunha-se e impõe-se decisão diversa daquela que foi tomada relativamente aos números 12, 15 e 27 dos factos dados por provados, nos termos do artº 662º nº 1 do CPC

7. A forma como o facto provado nº 12 está dado por provado indicia um pré juízo do julgador, não é rigorosa pois que se se atentar no artº. 46 e 47 da p.i. onde consta a alegação fáctica fundamento do facto 12 e suportada no doc. ...1 junto com tal petição o que se vê do conjunto de tal doc. ...1 é que está datado de 07 de Dezembro de 2021, 3 dias depois da AG, que foi apenas e só remetido por correio registado em 10.12.2021 e apenas recepcionado em 13.12.2021.

8. Pelo que a resposta dada deve ser alterada e antes formulada nos termos que se sugerem «Os autores apresentaram ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral/Eleitoral reclamação datada de 07.12.2021, remetida por correio registado em 10.12.2021 e com aviso de recepção assinado em 13.12.2021».

9. Deu o Tribunal a quo como provado sob nº 15 que «tal deliberação contou com o voto favorável de PP, QQ e RR». Para além deste facto (ou outro) não revelar a actuação de qualquer dos sócios e AA na AG de 04.12.2021 o que manifestamente revela é um vício de raciocínio da decisão recorrida.

10. Este facto dado por provado não resulta de qualquer alegação dos AA mas dos documentos juntos, nomeadamente da acta da Assembleia Eleitoral (doc. ... junto com a p.i.). No entanto nunca se poderia concluir que aquelas 3 pessoas votaram favoravelmente a deliberação já que da acta apenas pode concluir-se que estas pessoas foram as primeiras a votar, que votaram 47 associados e que a Lista... obteve 46 votos validamente expressos.

11. Só poderia afirmar-se categoricamente que os associados PP, QQ e RR votaram nos termos provados se todos os votos fossem no mesmo sentido, se houvesse unanimidade dos votos expressos. Havendo 47 pessoas a votar e 46 votos validamente expressos resulta que houve uma pessoa, um voto, que não se sabe de quem é e como votou. Desta forma é objectivamente impossível saber a quem pertenceu o voto não concordante e como tal é objectivamente impossível dar-se a resposta ao facto 12 nos termos que foi dada.

12. Nos termos em que acta está redigida permite-se concluir que pelo menos aqueles três associados votaram, nada se sabendo se os AA votaram ou não.

13. Desta forma deve ser alterada a resposta ao facto nº 15 e, designadamente, na forma que se sugere: «tal deliberação contou, pelo menos, com o voto de PP, QQ e RR».

14. Relativamente ao facto provado nº 27 que diz «Nas eleições que ocorreram a 04/12/2021, foram admitidos a votar membros da lista vencedora que não tinham a sua situação de quotas regularizada a 31/10/2021», factualidade que corresponde ao alegado no artº. 64º da p.i. mas que foi impugnada como resulta do artº. 13 e 38º da contestação.

15. E mesmo que se considerasse os docs. ... e ...3 juntos com a p.i. e alegados no artº. 64 p.i. o que resulta é que o doc. ... diz respeito a nomes que não fazem parte da lista vencedora, não se extrai deste documento qualquer relação com o eventual não pagamento de quotas sendo que o doc. ...3 é um convite para um pagamento de quotas, um email que está datado de 09 de Janeiro de 2022 e nada diz sobre a efectiva e real situação de qualquer sócio à data de 31.10.2021.

16. Portanto, fosse porque tal artº 64 da p.i. foi devidamente impugnado fosse pela circunstância dos documentos invocados em tal artº.64, o doc. ... e ...3 juntos com a p.i., não terem as pretensas virtualidades probatórias temos como certo que nos termos do judicialmente invocado artº. 574º nº 2 CPC nunca poderia ter sido dado por provado o facto 27 que deve pura e simplesmente ser removido dos factos provados.

17. Tendo a Exma Sra Dra juiz a quo decidido justificar a motivação de facto dizendo que «os actos supra enumerados foram admitidos por acordo entre as partes, nos termos do artº 574 nº 2 CPC» é entendimento da recorrente que se impõe decisão diferente relativamente aos números 12, 15 e 27 dos factos provados e que, ainda, não se pode nunca concluir, como se faz na sentença recorrida, que «é claro que nenhum dos autores votou favoravelmente essa deliberação, pelo que têm legitimidade para a impugnar».

18. A fundamentação de uma sentença carece de ser lógica e congruente. Não é lógico que não tendo sido alegado o sentido de voto e actuação dos AA numa AG e não havendo documentos juntos donde resulte o seu modo de actuação a sentença venha a concluir que «é claro» que não votaram favoravelmente a deliberação apesar de também não constar dos factos provados o sentido de voto e actuação dos AA. em tal Assembleia Geral de 04.12.2021; o que é causa de nulidade nos termos do artº 615º nº 1 alínea c) do CPC.

19. «O artº. 178 nº 1 do Código Civil, confere o direito de arguição da anulabilidade da deliberação apenas ao sócio que expressou o seu sentido de voto contrário a essa deliberação»

20. «A acção é delimitada pela causa de pedir e pelo pedido, sendo necessário, para a procedência deste, que o mesmo seja lógico corolário daquela» Assim a alegada questão da violação estatuária da limitação de mandatos, que verdadeiramente constitui a causa de pedir desta acção, se eventual e hipoteticamente tivesse qualquer fundamento, não tem nada a ver mas rigorosamente nada, com a pretensão trazida ao Tribunal e que é a anulação de uma deliberação tomada na Assembleia Geral eleitoral de 04.12.2021.

21. Os AA não peticionam ao Tribunal, como seria corolário lógico atenta a causa de pedir deduzida que se declare a invalidade da lista concorrente e alegadamente violadora, nos termos da causa de pedir; o que os AA peticionam é coisa substancialmente diferente: a anulabilidade de uma deliberação da Assembleia Geral de 04.12.2021 que se manifestou na realização de um acto eleitoral.

22. Verdadeiramente não há qualquer correspondência entre a causa de pedir e o pedido. Os AA. ao invocarem a impossibilidade estatutária de concurso a acto eleitoral de alguns sócios da associação e de vícios na lista entretanto admitida...

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