Acórdão nº 55/21.4T8LSA.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-06-27

Data de Julgamento27 Junho 2023
Ano2023
Número Acordão55/21.4T8LSA.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA)
Proc. Nº 55/21.4T8LSA.C1- Apelação

Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juízo Central Cível de Coimbra-J1.

Recorrentes: AA e BB

Recorrido: CC

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves

Juízes Desembargadores Adjuntos: Sílvia Pires

Henrique Antunes


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Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:



RELATÓRIO

AA e BB vieram instaurar a presente acção de apreciação positiva, sob a forma de processo comum, contra CC, pedindo que seja:

a) Declarado que os AA são donos únicos e legítimos proprietários do prédio identificado em 1 da p.i.

b) Ordenado ao Serviço de Finanças e à Conservatória do Registo Predial que actuem em conformidade com o doutamente decidido, designadamente, proceder à inscrição na respectiva matriz e descrição no registo”.

Para o efeito, alegam que são possuidores e proprietários do “prédio rústico sito na .../..., Freguesia e Concelho ..., actualmente omisso na matriz, com área de 613.475,00 m2 (61,3475 ha), a confrontar do Norte com limite da Freguesia ... (...) e N... (construções e empreendimentos urbanos), Sul N..., Poente Limite do Concelho ... (...) e Nascente com DD e N....”, por lhes ter sido doado verbalmente pelos pais da A., de que a A. e R. eram as únicas herdeiras e, com o conhecimento e consentimento para a doação da R.

Alegam que ainda que assim se não entenda, exerceram a posse exclusiva, em nome próprio, sobre este prédio desde o ano de 1975 até aos dias de hoje, na convicção de que são os seus únicos possuidores e proprietários, sobre ele praticando actos de posse de forma ininterrupta, pacifica, pública e de boa – fé, tendo-o adquirido por usucapião.

No que se reporta ao interesse em agir, alegam que o aludido prédio não foi incluído nas avaliações gerais de prédios rústicos ocorrida no concelho ... no ano de 1990 e assim ficou omisso na matriz, com a agravante de o Serviço de Finanças não estabelecer correspondências com artigos da anterior matriz, pelo que se torna necessário que seja ordenada a inscrição do prédio na matriz.


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Citada a R. não contestou.

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Pelo tribunal a quo foi proferido despacho em 06/12/2022, no qual se convidou os AA. a exercerem o contraditório, quanto ao propósito de o tribunal conhecer “ex oficio” da excepção dilatória inominada de falta de interesse de agir dos autores, tendo estes vindo responder a este convite por requerimento datado de 04/01/2023, no qual alegam, em síntese, o seguinte:

atento à informação prestada pelo serviço de Finanças ..., o artigo 7342 não existe na actual matriz, não sendo possível fazer correspondência com algum artigo actual, uma vez que não foi feita em 1990 a correspondência dos novos artigos da matriz com os da matriz existente até essa data.

(…)

Como consequência dessa omissão, sendo certo que a mesma não é suprível junto dos respectivos serviços, a não ser pela via judicial, não podem os AA lançar mão da via notarial através da escritura de usucapião, nem podem recorrer ao processo de justificação na conservatória do registo predial, já que em ambas as situações é obrigatória a existência do artigo matricial.

(…)

Nessa medida, não têm os AA qualquer outra via, senão a judicial para verem reconhecido o seu direito, sob pena de estarem condenados a terem um prédio fisicamente existente, sem nunca o poderem legalizar, passando o mesmo a ser “terra de ninguém”.

(…)

Ao que acresce, que neste momento é obrigatório o cadastro geométrico da propriedade rústica (CGPR), cujo prazo encontra-se em curso, pertencendo o Município ... aos concelhos aderentes ao BUPI, tendo os AA já sido advertidos para a referida cadastração obrigatória.

(…)

Pelo que, é manifesto que os AA têm um interesse em agir, até porque a via judicial é a única que lhes resta, não se tratando de um capricho ou mero interesse vago, já que, se administrativamente ou notarialmente tivesse sido possível a regularização da situação, não tinham os AA recorrido à via judicial, com todos os custos inerentes ao processo.”


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Após foi proferida a seguinte decisão:

i) Julgar “ex oficio” a insuprível excepção dilatória inominada de falta de interesse de agir por parte da autora, e em resultado disso, absolve-se da instância a Ré CC.

ii)Fica consignado que, por despacho proferido, com Refª Citius nº 87561969, de 09/02/2022, pelo Juízo de Competência Genérica ... – Juiz ..., já se fixou aí o valor da causa.

iii)Custas a suportar pelos Autores AA e BB - cf. 527º, do CPC.”


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Não conformados com esta decisão, vieram os AA. interpor recurso, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:

“I- O tribunal “a quo”, muito sumariamente, afirma que não existia ou existe qualquer litígio entre as partes envolvidas e que aquilo que os Recorrentes pretendem com a presente acção era obter a justificação que lhes permita a inscrição no registo do direito de propriedade sobre o prédio identificado nos autos a seu favor, não tendo interesse em agir.

II- De tal desiderato, discordam os aqui Recorrentes, uma vez que foi peticionado o reconhecimento do direito de propriedade sobre o referido prédio e, como causa de pedir, foi invocada a identificação do prédio, a usucapião, e os factos que consubstanciam a posse que vem sendo exercida pelos Recorrentes, pelo menos desde 1975, sendo certo, que atento à origem do mesmo, existe sempre uma contra interessada, aqui Ré na acção, irmã da Autora.

III - A falta de contestação da Ré, aqui Recorrida, não pode ser tida como falta de interesse de agir por parte dos AA, ou de conflitualidade, já que, como a competência em razão da matéria deve ser aferida pelo pedido formulado na petição inicial em articulação com a causa de pedir, e não pela posterior postura dos RR., seja ela activa ou passiva, cabe, então, ao caso vertente uma acção comum e não uma acção de justificação (acção registral). (Ac. R.Évora - 504/19.1T8ABT.E1).

IV Ao invés do que tipicamente acontece com a acção de condenação, a acção de simples apreciação não pressupõe qualquer lesão ou violação de um direito, são meios de tutela de direitos em que não é posta em causa a sua violação, quer efectiva, quer receada. Porém, o autor na acção tem de demonstrar que tem um interesse na obtenção da declaração judicial da existência ou inexistência que pede, pois esta, como qualquer outra acção, supõe a existência de interesse em agir. (vide Ac.R.C - 32/18.2T8MGR.C1)

As acções de simples apreciação são meios de tutela de direitos em que não é posta em causa a sua violação, quer efectiva, quer receada. Versam, pois, situações em que se visa, apenas, a certificação do direito. (vide Ac.R.C - 32/18.2T8MGR.C1).

V Enquanto, na epígrafe e no...

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